David G. Bonagura, Jr |
Que diferença é que a fé traz para a vida dos crentes? O
que é que os crentes têm que falta aos não crentes?
Há sondagens que indicam que os crentes são mais felizes
que os não crentes, e outras que indicam o contrário. Mas a mera experiência
diz-nos que nem todos os crentes são felizes (no sentido de bem-estar geral),
ou sequer pessoas com quem queiramos passar uma tarde. E há mais do que um caso
de não crentes cuja boa-disposição faz deles excelente companhia.
Por isso a fé tem de servir para algo mais do que
felicidade individual, embora as duas coisas não se excluam. Se a fé vale mesmo
a pena, tem de transcender os limites da pessoa que a possui.
O que é que a fé dá aos crentes? Uma forma de vida e
disposição completas. Uma relação pessoal e ilimitada com Deus, seu criador,
que lhes fala no interior do coração. A pertença a uma Igreja que os une a
todos, vivos ou mortos, como irmãos e irmãs no Espírito Santo. Um compromisso
para com a caridade que, quando vivida como deve ser, enaltece a relação com
Deus e com os outros. A certeza de que as suas vidas e o universo, criadas com
um propósito e um valor intrínsecos, estão nas mãos da providência. Uma
verdadeira esperança de que existe uma vida para além deste vale de lágrimas.
Estes dons da fé não são do género que marca pontos nas
sondagens seculares, mas continuam a ser atributos indispensáveis daquilo a que
Sócrates chama uma vida examinada – imbuída de sentido, direcção e esperança.
Mas a vida da fé não é uma mera visão intelectual ou compromisso, como o
optimismo ou o humanismo. A fé é uma realidade vivida, não apenas uma ideia que
se tem, porque consiste de um encontro dinâmico com um Deus vivo que ama.
Os não crentes não reconhecem esta relação fundamental
com Deus que devia, por sua vez dar forma a todas as relações humanas. Sem
Deus, estão desprovidos de um sentido para a vida e uma esperança. Em vez
disso, são obrigados a criar o seu próprio sentido para a vida, os seus
próprios princípios para se relacionarem com outras pessoas, os seus próprios
desejos. Com uma estranha ironia, comportam-se como directores executivos de
vidas que nunca pediram e para cuja existência nada contribuíram.
Que sentido da vida é que os seres humanos criariam por
si? Segundo Henri de Lubac, criam “deuses antropomórficos”, que podem ser os
ideais ou os valores de qualquer época. Hoje, pensadores seculares como Steven
Pinker defendem o “humanismo científico”, segundo o qual o sentido e a
moralidade humanas são determinados pelas conclusões da ciência. Pinker baptiza
esta visão do mundo como “a moralidade, de facto, das democracias modernas,
organizações internacionais e religiões liberais e as suas promessas por
cumprir definem os imperativos morais que enfrentamos actualmente”.
Mas o que acontece aos não crentes que abraçam
(supostamente com bases científicas) as hipóteses filosóficas do darwinismo:
que a vida humana não tem qualquer sentido inerente e a vida é apenas o produto
do acaso acidental? O que acontece se interpretarem as provas científicas sobre
quem deve ser considerado “inteiramente humano” de forma errada, como, por
exemplo, os esclavagistas, eugenistas, nazis e abortistas? Afinal de contas foi
a ciência que levou Richard Dawkins a dizer, recentemente, que qualquer mulher
cujo embrião tivesse trissomia XXI devia: “abortá-lo e tentar de novo. Podendo
escolher, seria imoral trazer essa criança ao mundo.”
Por maravilhosa e poderosa que seja a ciência, ela
continua a ser um instrumento feito pelo homem para medir a realidade, mas que
não a transcende e é a transcendência da nossa condição humana limitada que
todos os corações buscam. Mas é também por causa dos nossos limites, diz De
Lubac, que o homem “é incapaz de transcender os seus próprios recursos,
permanece sempre um prisioneiro da noção muito limitada de individualidade que
projectou nos seus deuses”. Logo, o seu “desejo de transcendência… continua
sempre a ser ambíguo; um sonho, mas um sonho em que está ameaçado pela ruína e
o desespero de acordar”.
Em contraste, os crentes sabem pela sua fé que Deus é
simultaneamente a fonte e o objectivo dos desejos dos seus corações. Entre os
caprichos da vida – alegria e tristeza, prazer e dor, sucesso e desilusão –
mantêm a confiança de que existe uma razão e um propósito para tudo, mesmo que
não encontrem respostas para todas as suas questões. Ao aceitar livremente o
dom da fé, tornam-se livres para viver as suas vidas, não sem tristeza ou
infortúnio, mas sem dúvidas e desespero.
A diferença que a fé traz pode ser vista, então, pela
analogia de dois homens deixados sozinhos no meio da Amazónia. O homem de fé
tem com ele uma bússola, um mapa, uma mochila, comida, água e botas; o outro
insistiu que não precisa senão de si mesmo. Parece evidente qual dos dois está
em melhor posição para conseguir regressar a casa.
David G. Bonagura, Jr. é professor assistente de Teologia
no Seminário da Imaculada Conceição, em Huntington, Nova Iorque.
(Publicado pela primeira vez na Quarta-feira, 8 de Outubro
de 2014 no The
Catholic Thing)
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