Anthony Esolen |
No curto mas assinalável tratado, The
Christian Idea of Man, Joseph Pieper explica porque é que a prudência é
a maior das virtudes, aquela que está na origem de todas as outras. O seu
raciocínio é claro: “O bem pressupõe a verdade, a verdade pressupõe o ser”.
Logo, “a realização do bem pressupõe o conhecimento da realidade”, pois, “quem
não sabe como as coisas verdadeiramente são, não pode fazer o bem; pois o bem
está em concordância com a realidade”.
Pieper esclarece que não está a falar das ciências
empíricas, mas do “contacto verdadeiro com a realidade objectiva”, especialmente
a mediada pela audição. Pois o homem prudente anseia por conhecer a partir do
“conhecimento genuíno da realidade de que beneficia a mente superior”,
incluindo a mente de Deus, como revelada nas Escrituras.
Por isso o homem prudente “olha primeiro para a
realidade; e em virtude de, e com base nesse conhecimento da realidade, decide
o que deve ser feito e o que não deve ser feito, como deve ser feito e como não
deve ser feito”. Logo, “toda a virtude depende da prudência”, e cada pecado é
uma violação da prudência.
A prudência é a sanidade em acção, e a sanidade, como nos
ensinam na escola, é a adaequatio mentis ad rem: A adequação do intelecto à realidade.
Conheço uma mulher que tem pavor de pássaros, por mais
pequenos e inofensivos. Ela sabe que o pardal não a vai magoar, e por isso
compreende que o seu medo é injustificado e procura adequar as suas acções à
realidade. Seria melhor se conseguisse deliciar-se com a beleza destas
simpáticas criaturas, mas pelo menos colocou-se no caminho da sanidade.
Conheço outra pessoa que finge não temer o Senhor, embora
passe a vida a murmurar e a esquivar-se na sua pose de ateísmo. Seria melhor se
temesse, porque devemos temer o Senhor; e as murmurações e o esquivar são
recordações teimosas do que lhe resta da sanidade.
O oposto desta adequação é o abraço voluntário da
irrealidade. Podemos chamá-lo coercio rei ad phanstasiam: coacção da realidade para concordar com as
suas fantasias. Estes dias as fantasias tendem a ter a ver com sexo.
Devia ser mais fácil enlouquecer devido a abstracções do
que realidades que são imediatamente perceptíveis. Devia ser mais fácil ficar
confuso acerca do patriotismo, do que o facto de se ser rapaz ou rapariga.
Devia ser mais fácil desviar-se do caminho certo quando se está a tentar perceber
o que é o dinheiro, do que quando se tenta perceber o que é um bebé.
A profundidade da nossa loucura pode ser avaliada de
acordo com isto. É uma loucura o Walter Mitty pensar que é um líder de nações;
mas para confirmar que não é precisa de consultar a sua mente, o seu coração e
o seu percurso de vida. É loucura em cima de loucura acreditar que é Napoleão, para
isso apenas tem de consultar a certidão de nascimento.
Imaginemos então que estamos perante um rapaz. Chamemos-lhe
Jim. Jim é um rapaz. Não há dúvidas sobre isso. Não é por alguns nascerem
hermafroditas que podemos duvidar da masculinidade do Jim.
Salvo acidente ou doença, em breve o Jim será mais forte,
mais rápido e mais ágil que a sua mãe. Pouco depois disso será também mais alto
do que ela. As suas mãos e os seus pés serão maiores que os dela. A sua voz
mais profunda. O seu sistema adrenérgico será mais rápido. Os seus músculos e
ossos mais grossos. Tudo isto são factos. Vemo-los todos os dias.
Carregará no seu seio as sementes de crianças. Isto é um
facto. Tornar-se-á um pai in potentia. Se os seus pais e
professores forem sãos, educá-lo-ão, dia após dia, de forma a adequar a sua
mente à realidade do seu corpo. Muito antes de ter a forma de um homem será
encorajado a adoptar os hábitos de um homem.
Para perceber como isto funciona, coloquemos o Jim numa
quinta. Qualquer dia ele terá de fazer o grosso do gradar e do lavrar, semear e
colher. Terá de lidar com maquinaria pesada e animais domésticos de grande
porte. Por isso preparamo-lo já para essas realidades. Conduzimo-lo, em mente e
em hábito, ao lugar para onde caminha o seu corpo.
O mesmo se aplica à sua paternidade. Jim é um rapaz. Os
rapazes casam-se com raparigas e tornam-se pais. Estas são realidades. Por isso
treinamo-lo já para a paternidade. Por vezes fala-se do assunto, mas na maioria
das vezes mostramos essa realidade em acção. Não se trata tanto de determinação
severa, tem a ver com amar o rapaz e conduzi-lo à maturidade. Torna-se a
maturidade uma coisa natural.
Uma vez que o Jim carrega com ele as sementes de crianças humanas, e não de cães ou
gatos, todos os dias abrimos-lhe os olhos para a realidade do casamento. Um cão
tem vida, mas não tem história. Um gato enrola-se ao sol e aí se encontra a sua
única aproximação à eternidade. Mas o ser humano coloca o seu olhar nos
próprios limites do universo, e mais além.
Uma criatura destas
requer pais que a amem, que voltem os seus olhares para os limites da vida e
mais além. Este é um facto.
Quando chegar a altura de Jim conhecer estas coisas, os
seus pais ensinar-lhe-ão a realidade: que tem dentro dele o potencial da
paternidade e que foi criado para um amor que só dá, nunca se retrai. Isto não
é fantasia. A vida será dura, as pessoas são pecadoras, mas a palavra de um
homem é a sua obrigação.
A alternativa é a loucura, aquilo que Pieper define como
ideologia: “Uma percepção não objectiva da realidade, ditada pela vontade”.
Trata-se de obrigar o mundo a obedecer aos ditames da vontade. É povoar o mundo
de Napoleões.
Anthony Esolen é tradutor, autor e professor no
Providence College. Os
seus mais recentes livros são: Reflections on the Christian Life:
How Our Story Is God’s Story e Ten Ways to Destroy the Imagination
of Your Child.
(Publicado pela primeira vez na Quarta-feira, 22 de
Outubro de 2014 em The
Catholic Thing)
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