Wednesday 22 October 2014

Sanidade em Tempos de Loucura

Anthony Esolen
No curto mas assinalável tratado, The Christian Idea of Man, Joseph Pieper explica porque é que a prudência é a maior das virtudes, aquela que está na origem de todas as outras. O seu raciocínio é claro: “O bem pressupõe a verdade, a verdade pressupõe o ser”. Logo, “a realização do bem pressupõe o conhecimento da realidade”, pois, “quem não sabe como as coisas verdadeiramente são, não pode fazer o bem; pois o bem está em concordância com a realidade”.

Pieper esclarece que não está a falar das ciências empíricas, mas do “contacto verdadeiro com a realidade objectiva”, especialmente a mediada pela audição. Pois o homem prudente anseia por conhecer a partir do “conhecimento genuíno da realidade de que beneficia a mente superior”, incluindo a mente de Deus, como revelada nas Escrituras.

Por isso o homem prudente “olha primeiro para a realidade; e em virtude de, e com base nesse conhecimento da realidade, decide o que deve ser feito e o que não deve ser feito, como deve ser feito e como não deve ser feito”. Logo, “toda a virtude depende da prudência”, e cada pecado é uma violação da prudência.

A prudência é a sanidade em acção, e a sanidade, como nos ensinam na escola, é a adaequatio mentis ad rem: A adequação do intelecto à realidade.

Conheço uma mulher que tem pavor de pássaros, por mais pequenos e inofensivos. Ela sabe que o pardal não a vai magoar, e por isso compreende que o seu medo é injustificado e procura adequar as suas acções à realidade. Seria melhor se conseguisse deliciar-se com a beleza destas simpáticas criaturas, mas pelo menos colocou-se no caminho da sanidade.

Conheço outra pessoa que finge não temer o Senhor, embora passe a vida a murmurar e a esquivar-se na sua pose de ateísmo. Seria melhor se temesse, porque devemos temer o Senhor; e as murmurações e o esquivar são recordações teimosas do que lhe resta da sanidade.

O oposto desta adequação é o abraço voluntário da irrealidade. Podemos chamá-lo coercio rei ad phanstasiam: coacção da realidade para concordar com as suas fantasias. Estes dias as fantasias tendem a ter a ver com sexo.

Devia ser mais fácil enlouquecer devido a abstracções do que realidades que são imediatamente perceptíveis. Devia ser mais fácil ficar confuso acerca do patriotismo, do que o facto de se ser rapaz ou rapariga. Devia ser mais fácil desviar-se do caminho certo quando se está a tentar perceber o que é o dinheiro, do que quando se tenta perceber o que é um bebé.

A profundidade da nossa loucura pode ser avaliada de acordo com isto. É uma loucura o Walter Mitty pensar que é um líder de nações; mas para confirmar que não é precisa de consultar a sua mente, o seu coração e o seu percurso de vida. É loucura em cima de loucura acreditar que é Napoleão, para isso apenas tem de consultar a certidão de nascimento.

Imaginemos então que estamos perante um rapaz. Chamemos-lhe Jim. Jim é um rapaz. Não há dúvidas sobre isso. Não é por alguns nascerem hermafroditas que podemos duvidar da masculinidade do Jim.

Salvo acidente ou doença, em breve o Jim será mais forte, mais rápido e mais ágil que a sua mãe. Pouco depois disso será também mais alto do que ela. As suas mãos e os seus pés serão maiores que os dela. A sua voz mais profunda. O seu sistema adrenérgico será mais rápido. Os seus músculos e ossos mais grossos. Tudo isto são factos. Vemo-los todos os dias.
 
Não stresses Jim, a coisa melhora!
Carregará no seu seio as sementes de crianças. Isto é um facto. Tornar-se-á um pai in potentia. Se os seus pais e professores forem sãos, educá-lo-ão, dia após dia, de forma a adequar a sua mente à realidade do seu corpo. Muito antes de ter a forma de um homem será encorajado a adoptar os hábitos de um homem.

Para perceber como isto funciona, coloquemos o Jim numa quinta. Qualquer dia ele terá de fazer o grosso do gradar e do lavrar, semear e colher. Terá de lidar com maquinaria pesada e animais domésticos de grande porte. Por isso preparamo-lo já para essas realidades. Conduzimo-lo, em mente e em hábito, ao lugar para onde caminha o seu corpo.

O mesmo se aplica à sua paternidade. Jim é um rapaz. Os rapazes casam-se com raparigas e tornam-se pais. Estas são realidades. Por isso treinamo-lo já para a paternidade. Por vezes fala-se do assunto, mas na maioria das vezes mostramos essa realidade em acção. Não se trata tanto de determinação severa, tem a ver com amar o rapaz e conduzi-lo à maturidade. Torna-se a maturidade uma coisa natural.

Uma vez que o Jim carrega com ele as sementes de crianças humanas, e não de cães ou gatos, todos os dias abrimos-lhe os olhos para a realidade do casamento. Um cão tem vida, mas não tem história. Um gato enrola-se ao sol e aí se encontra a sua única aproximação à eternidade. Mas o ser humano coloca o seu olhar nos próprios limites do universo, e mais além.

Uma criatura destas requer pais que a amem, que voltem os seus olhares para os limites da vida e mais além. Este é um facto.

Quando chegar a altura de Jim conhecer estas coisas, os seus pais ensinar-lhe-ão a realidade: que tem dentro dele o potencial da paternidade e que foi criado para um amor que só dá, nunca se retrai. Isto não é fantasia. A vida será dura, as pessoas são pecadoras, mas a palavra de um homem é a sua obrigação.

A alternativa é a loucura, aquilo que Pieper define como ideologia: “Uma percepção não objectiva da realidade, ditada pela vontade”. Trata-se de obrigar o mundo a obedecer aos ditames da vontade. É povoar o mundo de Napoleões.


Anthony Esolen é tradutor, autor e professor no Providence College. Os seus mais recentes livros são:  Reflections on the Christian Life: How Our Story Is God’s Story e Ten Ways to Destroy the Imagination of Your Child.

(Publicado pela primeira vez na Quarta-feira, 22 de Outubro de 2014 em The Catholic Thing)

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