Friday, 26 May 2023

A lei é má, mas Deus é Bom

A lei da eutanásia já foi publicada em Diário da República. A partir de agora não há nada a fazer. Ou há? Foi isso que tentei saber neste artigo publicado no The Pillar, em inglês, cuja leitura recomendo.

Uma das pessoas que entrevistei para esta reportagem foi a presidente do Conselho de Ética, que apontou duas grandes falhas na lei, que os deputados ignoraram. Dada a importância das suas palavras para se entender tudo isto, decidi publicar na íntegra a transcrição do que ela me disse, em português, claro. Está aqui, não deixem de ler.

Ainda em inglês, tenho uma pequena nota sobre o assunto na edição desta semana do The Tablet, aqui.

Há anos que escreve sobre a questão da eutanásia. Era bastante evidente que este dia ia chegar, se calhar há sete anos poucos acreditavam que demoraria tanto… Desta vez, notei alguma saturação por parte das pessoas em relação ao assunto, daí que seja importante reafirmar muitas vezes, e de forma clara, que a eutanásia é sobre muito mais do que o direito de alguém escolher como e quando morrer e tem muito mais implicações do que apenas acabar com o sofrimento. A eutanásia estabelece que há vidas que são indignas, e isso é uma monstruosidade. Temos a obrigação de continuar esta luta. Não é fácil, pelo contrário, é muito difícil. Mas ainda bem! Se fosse fácil deixávamos para os outros.

O Papa vai estar em Portugal mais dias do que originalmente previsto. É, claro, uma excelente notícia!

Francisco pede liberdade para a Igreja na China, algo que tarda em manifestar-se!

Recentemente partilhei que o meu filho fez a primeira comunhão. Tenho outro, o mais velho, que será crismado no final do mês. Muitos de vocês estarão na mesma situação, tendo filhos, irmãos ou netos que estão a passar importantes marcos nesta altura, que é também tempo de ordenações. Leiam, por isso, este artigo do Stephen White no The Catholic Thing de hoje. É um texto simples para ler numa altura de incessantes polémicas e guerrinhas, para nos recordarmos de que Deus é Bom. Não é bonzinho, é mesmo Bom. Com B grande e tudo! Louvado seja!

Thursday, 25 May 2023

Doentes poderão pedir eutanásia só para ter direito a cuidados paliativos

Esta é a transcrição integral, no português original, da minha entrevista a Maria do Céu Patrão Neves, presidente do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, para a reportagem que publiquei recentemente no The Pillar

Incomoda o facto de os sucessivos pareceres negativos do Conselho terem sido ignorados?

O Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida não deu um Parecer negativo ou positivo; apreciou os textos das propostas de lei que lhe foram enviados, identificou os aspectos eticamente problemáticos e apontou caminhos alternativos a considerar, através das suas recomendações.

O facto de entidades públicas, nomeadamente as que detêm competências legislativas, solicitarem parecer ao CNECV, no âmbito das suas competências específicas, e posteriormente não o tomarem em consideração, evidencia que contributos que poderiam ser efectivamente integrados em prol de uma melhoria da qualidade legislativa não foram. São oportunidades perdidas.

 O Conselho tem um largo espectro de sensibilidades ideológicas, filosóficas, com um largo espectro de formação académica, científica, profissional, funcionando quase como uma micro sociedade. Por isso o parecer do conselho e os consensos que são possíveis de construir ao nível do Conselho, reflectem em grande parte a sensibilidade do que seria a sociedade portuguesa, se fosse possível ouvir cada um dos cidadãos.

Daí a nossa convicção de que as recomendações do Conselho deveriam merecer uma atenção maior por parte do legislador. Receamos que, por vezes, quando a lei exige um pedido formal de parecer, quando os processos democráticos de decisão estipulam como conveniente a solicitação de pareceres, nos quedemos pela formalidade, isto é, o parecer é oficialmente solicitado, mas não substantivamente acolhido. Importa reflectir sobre o teor desses mesmos pareceres e integrá-los, mesmo que não necessariamente na íntegra, atendendo a outros valores ou interesses que os legisladores tomem em consideração. Em todo o caso, surpreende-nos que, no mínimo, as grandes questões éticas apontadas pelo Conselho sobre o diploma da eutanásia, bastante sólidas do ponto de vista ético, e consensualizadas entre conselheiros que são a favor e contra a eutanásia, tenham sido ignoradas ou descartadas.

Esta não é uma realidade constante. Há outras situações em que os pareceres do conselho foram acolhidos, ainda recentemente, na regulamentação sobre a gestação de substituição: na segunda proposta de regulamentação, encontramos muitas das recomendações do Conselho à primeira proposta bem integradas. No que diz respeito à eutanásia, lamentavelmente, descartaram-se as recomendações do Conselho, não obstante serem absolutamente estruturantes.

Qual é a principal preocupação do CNECV agora?

Em relação a esta matéria, aguardamos a respectiva regulamentação. A lei já foi promulgada, e fica como está. Agora vamos apreciar a proposta de regulamentação na expectativa que possa vir a acautelar alguns aspectos, certamente menores, que apontámos anteriormente. Quanto aos estruturantes omissos…, perdeu-se a oportunidade. Identifico dois. O primeiro diz respeito ao facto de o texto aprovado e já promulgado sobre a eutanásia prever que quem solicita a eutanásia tem efectivamente acesso a cuidados paliativos. O Conselho pergunta se realmente a solicitação da eutanásia constitui uma porta facilitadora do acesso a cuidados paliativos sabendo-se que, em Portugal, apenas 30% da população que carece de cuidados paliativos tem acesso aos mesmos. 70% dos que necessitam de cuidados paliativos não têm acesso a eles. Agora temos uma lei da eutanásia que afirmar solicitar a eutanásia dá acesso aos cuidados paliativos. Parece francamente discriminatório e, no limite, quase que encorajador da solicitação da eutanásia, mesmo que depois se revogue esse pedido, utilizado como acesso a cuidados paliativos. Claro que esta interpretação é absurda, mas resulta do texto da lei.

O segundo aspecto é também bastante gravoso. Sendo ao abrigo do princípio da autonomia que se descriminaliza a eutanásia, verificamos que todo o poder ao longo do processo está nas mãos do médico orientador. Esta sua quase hegemonia tem o seu corolário no facto de ser ele a escolher e /ou a autorizar quem estará presente no acto de eutanásia. A pessoa que vai ser eutanasiada pode propor as pessoas que gostaria de ter presente nos seus últimos momentos de vida, mas a autorização tem de ser dada pelo médico assistente. Isto é um contrassenso, que não respeita de todo a autonomia de quem solicita a eutanásia.

Estes são apenas dois dos mais graves erros estruturantes que a actual lei apresenta, tendo havido extensa oportunidade para serem corrigir, o que não foi feito.

Vai nomear alguém para a Comissão de Avaliação?

O Conselho nomeará um conselheiro para integrar esta comissão quando tal nos for solicitado.

Wednesday, 24 May 2023

Deus é Bom

Stephen P. White

A minha filha mais velha foi crismada esta Primavera e escolheu como padroeiro o Papa João Paulo II. Foi uma escolha dela, mas da qual eu não poderia aprovar mais. O bispo veio à nossa paróquia e selou-a com o Espírito Santo. A sua cabeça ficou com a fragrância do Crisma, tal como no dia do seu baptismo. Cresceu tanto, como as crianças tendem a fazer, para a eterna alegria (mas também tristeza) dos seus pais.

Agora entrámos na época das Primeiras Comunhões. Na nossa paróquia, tal como noutras paróquias por todo o país, meninos e meninas estão a receber Nosso Senhor na Eucaristia pela primeira vez. O meu filho fez a sua Primeira Comunhão no passado fim-de-semana, juntamente com muitos dos seus amigos e colegas. Foi um momento de grande alegria, com pais e avós cheios de orgulho, a babarem-se com a inocência dos pequenos.

Chegámos meia hora antes da missa começar. O meu filho voltou-se para mim e perguntou: “Pai, quando chegar a hora da Comunhão, já terá passado uma hora desde o pequeno-almoço?” Disse-lhe que seriam quase três horas, não tinha de se preocupar com isso hoje. Sorrimos os dois, mas por razões diferentes: ele, porque tinha cumprido o jejum eucarístico, eu por causa da sua inocência.

Disse-lhe que quando ele recebesse a Eucaristia estaria a receber o próprio Deus – o Deus que criou o universo, que fez tudo o que é bom, que nos criou a nós. Disse-lhe que estaria a receber o mesmo Deus que libertou o seu povo da escravatura no Egipto e que cuidou dele mesmo quando os israelitas pecaram. Disse-lhe que estaria a receber o mesmo Jesus que nasceu a Maria, em Belém, que trabalhou lado-a-lado com José, que curou os doentes e deu vida aos mortos – que sofreu, morreu e ressuscitou para nos libertar do pecado.

E disse-lhe que quando recebemos o corpo e sangue de Jesus, quando estamos unidos tão intimamente a Ele, estamos também unidos a todos os que estão unidos a Ele – aos grandes santos, aos nossos antepassados no céu, à nossa família e amigos, de longe e de perto. Disse-lhe que penso muitas vezes no meu pai, que morreu quando o meu filho era ainda muito pequeno, e como posso sempre encontrar-me com ele no Senhor, na missa. Disse-lhe que por causa disso nunca me sinto sozinho, e que ele, o meu filho, nunca estará sozinho.

E penso para comigo: Ele sabe tudo isto, mas compreende? Compreende verdadeiramente tudo o que eu gostaria que ele percebesse? Sabe o que tudo isto significa? É tão novo. Mas depois lembro-me da expressão na sua cara quando voltou para o seu banco depois de comungar. Radiante. Até brilhava. E não posso se não pensar: Será que eu compreendo? Será que eu compreendo mesmo o que tudo isto significa? Ou tornei-me demasiado sofisticado para o meu próprio bem? “Em verdade vos digo, se não vos transformardes e tornardes como crianças, não entrareis no Reino dos Céus”. Graças a Deus pela inocência das crianças.

Estamos na época das ordenações. Na minha diocese o bispo ordenará nove novos padres este fim-de-semana. Conheço alguns destes homens. São bons tipos, serão excelentes padres. Somos abençoados.

Esses nove homens foram chamados pelo seu bispo para servir a Igreja com toda a sua vida. Ao responder a esse chamamento estão, sem dúvida, a sacrificar muito mais – e a ganhar muito mais – do que até eles podem verdadeiramente compreender. Serão mudados para sempre, conformados através do sacramento da Ordem ao sacerdócio do Sumo Sacerdote.

Alguém me disse em tempos que se um homem nunca sentiu alguma vontade de ser padre é porque simplesmente não compreende o que é um padre. Acredito que seja verdade. Que homem não compreende o desejo de ser posto de parte, para defender o seu rebanho, para guiar e pastorear as suas ovelhas, até dar a vida por elas?

Que homem não deseja aquela liberdade de compreender aquilo pelo qual está a dar a vida? Que homem não quer dar àqueles que lhe foram confiados um dom maior do que qualquer dom feito por mãos humanas? Que homem não se comove com as palavras do salmo: “um sacerdote para sempre, na ordem de Melquisedeque”?

O matrimónio não é assim. O matrimónio termina na morte: “Na ressurreição eles nem casam nem são dados em casamento, mas são como os anjos do Céu”. Isto costumava entristecer-me. Não porque amo a minha mulher (e amo), nem porque imagino que o Céu será menor por não haver casamento. Sentia-me triste porque todos gostaríamos que as coisas boas perdurassem, até depois da morte. Ficava triste simplesmente porque um dom tão maravilhoso como é o casamento – um dom que nem se perdeu na queda, nem foi levado pelo dilúvio – não perdura na morte.

Mas para aqueles de nós que somos abençoados com filhos, pode-se dizer que perdura, sim. A aliança matrimonial poderá não perdurar para além da morte. O matrimónio poderá não afectar-nos de forma ontológica e indelével, como o baptismo e a ordem. Mas o meu filho será sempre meu filho e da minha mulher. As minhas filhas serão sempre filhas dos dois. A paternidade perdura. A maternidade perdura. Para além da morte.

O Pentecostes está a chegar. Este tempo pascal, tão cheio de graça para a nossa família, a nossa paróquia e nossa diocese terminará na grande solenidade do Espírito Santo. O nosso mundo está quebrado. A nossa Igreja também está ferida. Sobra pecado e sofrimento. Mas o “mundo real” de lá fora não é um mundo diferente daquele que está atravessado pelos ritmos da liturgia, dos sacramentos e da graça.

Não há dúvida de que o Espírito Santo se move pelo mundo. E no meio de todo este aparente caos Ele respira riqueza e a bondade e ordem: Ele renova todas as coisas. É uma maravilha de contemplar.


Stephen P. White é investigador em Estudos Católicos no Centro de Ética e de Política Pública em Washington.

(Publicado em The Catholic Thing na Quinta-feira, 18 de Maio de 2023)

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Friday, 19 May 2023

Não basta selo, é preciso não parecer ser do Estado Novo

A polémica religiosa desta semana foi a questão do selo. Os serviços postais da Cidade do Vaticano apresentaramu m selo comemorativo da JMJ que parecia decalcado do livro de leitura da terceira classe do Estado Novo e houve quem não gostasse. Também houve quem não gostasse do facto de no selo figurar o Padrão dos Descobrimentos. Como explico aqui, tenho alguma simpatia pelos primeiros, e nenhuma pelos segundos. A polémica – polemicazinha, vá – chegou de volta à Santa Sé, que decidiu retirar o selo de circulação, tornando-o de um momento para o outro uma joia para os coleccionadores, entre os quais não me incluo.
 
Nem toda a gente criticou o selo. Houve até quem gostasse bastante. O que tenho tentado explicar a essas pessoas é que o gosto pessoal pelo selo ou a sua estética involuntariamente Estado Novo, é irrelevante. A questão está em saber se um selo que remete imediatamente para uma época política divisiva em Portugal serve para representar um evento desta importância e magnitude. Parece-me evidente que não. Da mesma forma, eu gosto muito deste desenho alternativo que fiz usando tecnologia de inteligência artificial, que também evoca um importante símbolo nacional, mas duvido que ele seja consensual.
 
A maioria de esquerda no Parlamento, com a honrosa excepção do PCP, conseguiu finalmente que a eutanásia fosse legalizada e promulgada. Eu estou a preparar um artigo sobre o assunto que espero poder partilhar para a semana, mas entretanto podem ver várias reacções de grupos católicos e religiosos aqui.
 
O Patriarcado de Lisboa emitiu um comunicado pedindo a todas as vítimas ou testemunhos de abusos sexuais na Igreja para por favor contactarem a Comissão Diocesana. Também eu já escrevi sobre esta necessidade. Não basta desejar uma Igreja mais segura, é preciso fazer alguma coisa nesse sentido.
 
A Fundação AIS em Portugal inaugurou uma exposição sobre o drama dos raptos e violência contra raparigas cristãs em países onde estas são minoria.
 
Na semana passada falei do importante gesto que foi o Papa Francisco convidar o Papa Tawadros, da Igreja Copta Ortodoxa, a falar com ele numa audiência geral. Nessa altura ainda não sabia que o Papa iria decidir inscrever no martirológio católico os 20 coptas ortodoxos e um ganês de confissão desconhecida que foram mortos pelo Estado Islâmico em 2015. Um gesto ecuménico magnífico e belíssimo.
 
Não deixem de ler o artigo desta semana do The Catholic Thing em que Robert Royal alerta para a importância não só de identificar e combater os vícios que existem no nosso tempo, mas também as virtudes desordenadas que podem causar ainda mais prejuízos.É um texto importante para compreender o estado actual da nossa cultura, e vem com uma excelente citação de G.K. Chesterton.

Thursday, 18 May 2023

Reacções à legalização da eutanásia

Aqui pretendo juntar as várias reacções que vão surgindo, de organizações de teor religioso, à legalização e promulgação da lei da eutanásia. Agradeço que partilhem outras que possam ainda não constar, para acrescentar. 

Conferência Episcopal Portuguesa

Comungamos da tristeza do Papa Francisco manifestada no passado dia 13 de maio, após a confirmação parlamentar do diploma sobre a morte medicamente assistida: “Hoje estou muito triste, porque no país onde apareceu Nossa Senhora foi promulgada uma lei para matar. Mais um passo na grande lista de países com eutanásia”.

Como reafirmámos por diversas vezes ao longo do processo legislativo que agora chegou ao seu termo, com a legalização da eutanásia quebra-se o princípio fundamental da inviolabilidade da vida humana e abrem-se portas perigosas para um alargamento das situações em que se pode pedir a morte assistida.

Com a despenalização da eutanásia, a vida humana está desprotegida e sofre um grave atentado ao seu valor e dignidade. A morte passa a ser apresentada como solução para a dor e sofrimento, ao invés de uma promoção dos cuidados paliativos humanizantes até ao fim natural da vida.

Leia o comunicado na íntegra aqui

Associação de Juristas Católicos

[A AJC] quer também deixar claro que este combate em defesa da vida não termina agora.

Está ainda aberta a possibilidade de declaração, através da fiscalização sucessiva, de inconstitucionalidades da lei em aspetos ainda não analisados pelo Tribunal Constitucional.

Há que apoiar os médicos e profissionais de saúde que, de diferentes modos, tentarão preservar as ancestrais normas deontológicas que, mais do que quaisquer outras, definem a sua missão ao serviço da vida.

Porque em democracia não há leis irreversíveis, não desistimos de propor a revisão desta lei na primeira ocasião em que tal venha a ser possível. A experiência de outros países diz-nos que é muito difícil e reversão de leis como esta (pelo contrário, têm-se sucedido muito rapidamente leis cada vez mais permissivas). Mas considerar intocável e indiscutível a legalização da eutanásia e do suicídio assistido contraria todos os princípios e regras democráticas.

Leia o comunicado na íntegra aqui

Associação dos Médicos Católicos Portugueses

Portugal vive hoje um dia negro da sua história, uma ocasião de afrontamento à dignidade dos portugueses.

Manifestámos publicamente, por mais diversas vezes, mormente desde que o processo parlamentar se iniciou, em 2017, quer junto dos órgãos decisórios quer junto da opinião pública, a nossa radical oposição à legalização da eutanásia em Portugal. 

Esta firme oposição mantém-se hoje como então e assenta na ética médica e no Código Deontológico, que não pactuam com a lei aprovada.

De novo reiteramos que a eutanásia e o suicídio assistido atentam contra a própria Medicina, são atos vedados aos médicos, não são atos médicos.

Quando os médicos se deparam com um doente em sofrimento de grande intensidade, cuidam e acompanham-no com humanidade e proximidade. Dispomos hoje de meios muito eficazes, para apaziguar o sofrimento físico, psicológico e espiritual dos nossos doentes.

Leia o comunicado na íntegra aqui

Grupo de Trabalho Inter-Religioso | Religiões-Saúde

A aprovação da lei que agora se discute constituiria um tremendo e grave ato de demissão coletiva face aos membros mais vulneráveis da sociedade que constituímos, para com os seus membros mais frágeis. Ora, há um princípio ético que as religiões que representamos ofereceram à civilização que somos, de tal modo que, tendo origem religiosa, faz já parte do sentir comum da sociedade, constituindo um traço civilizacional essencial, determinante e estruturador: os mais vulneráveis têm no próprio facto da sua vulnerabilidade um título de especial dignidade e requerem especial solicitude.

(…) 

A situação que decorreria da legalização da eutanásia e do suicídio assistido, precisamente porque pode empurrar para a morte os frágeis e os vulneráveis, é um atentado aos seus direitos humanos fundamentais: a vida, a dignidade e a liberdade. Ainda que isto seja supostamente feito em nome da qualidade de vida, da dignidade da pessoa e da liberdade individual.

(...)

Aliança Evangélica Portuguesa; Comunidade Hindu Portuguesa; Comunidade Islâmica de Lisboa; Comunidade Israelita de Lisboa; Igreja Católica; Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias; Patriarcado Ecuménico de Constantinopla; União Budista Portuguesa; União Portuguesa dos Adventistas do Sétimo Dia

Leia o comunicado na íntegra aqui

Federação Portuguesa pela Vida

A Federação pela Vida lamenta o dia, que se vestiu de negro, por ter sido promulgada a lei da Eutanasia. Triste! Dor e tristeza!

O País foi esquecido, os cidadãos ignorados, os valores do Humanismo descartados, a Ciência envergonhada, os profissionais de saúde ostracizados e dezenas de creditadas Instituições que se pronunciaram, foram silenciadas.

A aprovação e promulgação desta lei é um retrocesso e um caminho para a barbarie.

Leia o comunicado na íntegra aqui

Wednesday, 17 May 2023

A que devemos comparar esta geração?

Robert Royal

Um dos aspectos mais impressionantes dos Evangelhos é a facilidade com que Jesus profere frases inesquecíveis, do género que grandes pensadores e poetas só muito raramente conseguem produzir. O escritor americano Randall Jarrell disse que: “Um bom poeta é alguém que, numa vida inteira de se colocar no meio de tempestades, consegue ser atingido cinco ou seis vezes por relâmpagos. Se for uma ou duas dezenas de vezes, então é verdadeiramente grande”. Jesus era – claramente – muito mais que um poeta. Mas não deixa de ser incrível que ele possa ter dito mais coisas memoráveis em poucos minutos de um dia normal do que qualquer outra figura na história. Coitados dos biblistas míopes – ou os muitos por eles influenciados – que crêem que uma boa parte daquilo foi inventada por um bando de pescadores, cobradores de impostos e pregadores itinerantes.

Os ditos, frequentemente simples, de Cristo, são tão grandiosos que mesmo uma multidão de teólogos, filósofos, santos, místicos, mártires, padres, bispos e até papas, ao longo de milénios, só conseguiram começar a compreender o que Ele disse. E, porém, ao mesmo tempo, as suas palavras têm atingido os corações de pessoas comuns, não só nos tempos dele, mas ao longo dos tempos, nas mais diversas culturas, apesar de obstáculos aparentemente inultrapassáveis. São Tomás de Aquino acreditava que um dos maiores milagres do Cristianismo era o facto de um grupo de homens humildes, de uma província longínqua, terem conseguido converter o maior império daqueles tempos, Roma. Trata-se de um mero facto histórico, e foi dito muito antes de a fé ter chegado à América, à maior parte de África, Ásia e ao mundo inteiro.

Esse facto é particularmente reconfortante agora que tudo parece estar ameaçado, pois sugere que por mais que as coisas pareçam ensombradas agora, tanto na Igreja como no mundo, o Evangelho tem mostrado ter um poder escondido e imprevisível. Sempre excedeu o que poderíamos “razoavelmente” esperar. E pode voltar a fazê-lo, a qualquer momento, ainda hoje.

Por outro lado, parece justo preocupar-nos com esta geração que parece não só estar submerso no lodo habitual de pecado e ignorância. A nossa incultura ocidental parece apostada em não só opor-se, como apagar mesmo a memória dos melhores dos nossos antepassados, que fizeram de nós quem somos.

Chega a pintar o passado como um conto irrepetível de opressão – escravatura, patriarcado, colonialismo, “privilégio branco”, etc. Mas todas essas acusações, embora parcialmente verdadeiras, estão a ser usadas não apenas para criticar elementos do passado, mas para obliterar o conhecimento da nossa tradição, que é uma combinação valiosíssima de elementos greco-romanos, bíblicos, medievais, renascentistas, iluministas e modernos. As nossas escolas e universidades dão a impressão de que não vale a pena ensiná-la, quanto mais recordá-la. Todas as culturas são agora “afirmadas” – excepto uma. Nunca aconteceu nada deste género.

Quando as coisas parecem estar mesmo mal, existe uma tentação humana de considerar que é uma situação sem precedentes. Mas esse parece ser mesmo o caso actual. Vale a pena, contudo, recordar um dos ditos de Jesus que parece referir-se ao passado, mas como em tudo o que ele diz, também se aplica a nós. “A que podemos comparar esta geração?” (Mt. 11, 16) No seu tempo, diz ele, as pessoas nem regozijam como deve ser perante as boas notícias, nem lamentam as más. As suas visões das coisas, e por isso as reações às mesmas, estavam distorcidas.

Também o nosso tempo revela reacções estranhas, de um tipo de que vale a pena tomar nota. Chesterton já tinha reparado em parte nisto há um século:

Chesterton
Quando se estilhaça um esquema religioso (como o Cristianismo foi estilhaçado com a Reforma) não são apenas os vícios que ficam à solta. Os vícios ficam, de facto, à solta, e deambulam, e prejudicam. Mas as virtudes também são libertadas; e as virtudes deambulam ainda mais, e as virtudes causam prejuízo ainda maior. O mundo moderno está cheio das antigas virtudes cristãs enlouquecidas. As virtudes enlouqueceram porque se isolaram umas das outras e estão a deambular sozinhas. Assim, alguns cientistas preocupam-se com a verdade; e a sua verdade não tem misericórdia. Assim, alguns humanitários preocupam-se apenas com a misericórdia, e a sua misericórdia (lamento dizê-lo) frequentemente não é verdadeira.

Isso explica muita da actual cultura “woke” e de “sinalização de virtudes”. Há muito que compreendemos que nas questões morais, como diz Santo Agostinho, o mal é a ausência de algum bem, qualquer coisa que devia estar presente mas não está, ou que está, mas num grau demasiado grande ou demasiado pequeno. Por outras palavras, é um afastamento da ordem plena do nosso universo. A Igreja é “Católica” precisamente porque é universal, “kata-holos”, em grego, “de acordo com o todo”.

Um excelente contraexemplo é a actual loucura do movimento “trans”. Trata-se de mais do que grupos e indivíduos radicais a promover a mutilação infantil sob o disfarce de “cuidados de afirmação de género”. Uma virtude – a compaixão por jovens com ideias confusas sobre género – cresceu e atingiu proporções tão monstruosas que eclipsou tudo, desde os simples factos da bilogia até milhares de anos de experiência humana. Basta pensar no que significa quando pessoal com formação médica fala em “género atribuído à nascença”, como se a observação normal de que um recém-nascido é rapaz ou rapariga fosse uma mera convenção, notada por um burocrata desconhecido e porventura tendencioso.

Seria fácil gozar com tudo isto, não fosse o facto de haver crianças a serem cirurgicamente desfiguradas ou a levar doses cavalares de químicos para evitar que os seus corpos se desenvolvam de acordo com as suas naturezas.

E é por isso que me parece que há outro factor em jogo, para além do enlouquecimento das virtudes, de que fala Chesterton. É cada vez mais evidente que há um elemento demoníaco em tudo isto.

O Demónio não tem nada de seu para nos propor, por assim dizer. Apenas pode recorrer aos bens criados pelo Criador para tentar criar desordem na criatura. Um dos grandes desafios para os cristãos na presente geração é conseguir identificar e resistir às virtudes desordenadas, e poder resistir às ofensas sobre preconceitos e ódio, reafirmando antes a plenitude da verdade – e do amor. Não é tarefa pequena, nem fácil. Mas foi a ela que a Divina Providência nos chamou.


Robert Royal é editor de The Catholic Thing e presidente do Faith and Reason Institute em Washington D.C. O seu mais recente livro é A Deeper Vision: The Catholic Intellectual Tradition in the Twentieth Century, da Ignatius Press. The God That Did Not Fail: How Religion Built and Sustains the West está também disponível pela Encounter Books.

(Publicado pela primeira vez na Segunda-feira, 15 de Maio de 2023 em The Catholic Thing)

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Tuesday, 16 May 2023

O selo do Vaticano para a JMJ

Está aí uma nova polémica, desta vez com o selo do Vaticano que comemora a Jornada Mundial da Juventude de Lisboa 2023.

Tanto quanto consigo perceber há duas razões pelas quais o selo está a ser criticado:

Por aqueles que simplesmente não gostam do desenho, nomeadamente porque tem tons inegáveis de arte do Estado Novo, com as criancinhas a seguir o líder – neste caso o Papa – enquanto abanam bandeiras nacionais. Neste contexto, o Padrão dos Descobrimentos não ajuda.

Por aqueles que identificam o próprio padrão dos descobrimentos como um símbolo fascista, e por isso opõem-se ao seu uso neste ou em qualquer outro contexto.

Sem me querer alongar, simpatizo com os primeiros e não tenho grande paciência para os segundos.

Em relação ao primeiro ponto, parece-me que bastaria que alguém em Portugal tivesse olhado para o selo para poder identificar as suas fragilidades estéticas. Isto não aconteceu? Noutros casos semelhantes a emissão de selos foi feita em conjunto com os serviços postais dos respectivos países, houve algum contacto com os CTT a este respeito? Já não seria expectável que o artista italiano que desenhou o selo tivesse conhecimentos para saber que o Padrão dos Descobrimentos, que é de facto um monumento magnífico e emblemático de Lisboa, tem esta associação tão grande ao Estado Novo e aos descobrimentos, que a Torre de Belém e os Jerónimos, por exemplo, não têm.

Por fim, cumpre dizer que esta polémica, por mais piada que possa ter, não é mais do que um fait divers. É um selo, não um manifesto político; é uma emissão do Estado do Vaticano, não de Portugal; é de um artista italiano, não português. O mundo continua e não será certamente isto que vai manchar as memórias que a JMJ vai deixar nas mentes dos lisboetas e dos portugueses.

Para permitir alguma comparação, junto aqui os selos de edições das JMJ anteriores. Penso que não há mais do que estes, pelo menos eu não encontrei.








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