Tracey Rowland |
De 9 a 15 de Fevereiro a Ordem Soberana e Militar
Hospitalária de São João de Jerusalém, de Rodes e de Malta celebra o seu 900º
aniversário.
A Ordem de Malta, como é normalmente conhecida, é a mais
antiga Ordem Cavalheiresca do mundo e a quarta ordem religiosa mais antiga da
Igreja.
O aniversário assinala a data em que o Papa Pascoal II
emitiu a bula Pie
Postulatio Voluntatis, dando a sua aprovação à fundação do hospital de São
João, em Jerusalém. A bula teve o efeito de transformar os responsáveis do
hospital em membros de uma ordem religiosa de leigos.
Hoje a Ordem de Malta funciona como uma ordem religiosa, uma
ordem cavalheiresca e como um sujeito jurídico à luz do direito internacional. As
suas duas principais missões são o serviço aos mais pobres e a defesa da fé.
Em determinados períodos da história esta defesa da fé
assumiu contornos militares. Em 1565 os cavaleiros da ordem derrotaram uma
força sarracena muito superior no Grande Cerco de Malta. A vitória removeu o
risco imediato de uma invasão da Sicília e até, mais grave, da própria Cidade Eterna.
Seis anos mais tarde, na batalha de Lepanto, membros da
Ordem contribuíram com três galés para as forças da coligação que combateram sob
o nome Santa Liga. Apesar de os turcos, que atacaram numa ameaçadora formação
em forma de crescente, estarem em muito maior número, uma súbita mudança no
sentido do vento ajudou grandemente à vitória das forças cristãs.
Pio V, o pontífice da altura, atribuiu a vitória à
intercessão de Nossa Senhora, a quem reinos cristãos inteiros estavam a
oferecer terços, rezando pela sua maternal protecção. É por causa deste evento
que hoje temos a solenidade de Nossa Senhora do Rosário e o título Nossa
Senhora da Vitória.
A Ordem tem relações diplomáticas com 104 países e está
representada nas Nações Unidas e no Parlamento Europeu. Tem 13.500 membros e
80.000 voluntários permanentes. Está particularmente activa no auxílio a
vítimas de conflitos armados e de desastres naturais, através do fornecimento
de ajuda médica.
Gere hospitais gerais na Alemanha, França, Inglaterra e
Itália e uma maternidade em Belém. Financia também centros médicos no Benim,
Burkina Faso, Camarões, Madagáscar, Togo e Líbano. No Senegal e no Camboja a
Ordem estabeleceu centros para leprosos e está a desenvolver programas de
tratamento de vítimas de HIV tanto em África como na América Central. Há ainda
instituições especiais para tratar mães e os seus filhos, vítimas de HIV, na
África do Sul e nas Filipinas.
Nos países mais desenvolvidos os cuidados paliativos estão a
tornar-se uma preocupação central para a Ordem. Compreensivelmente os doentes
católicos não querem morrer em hospitais geridos com critérios utilitaristas.
Querem capelas e não salas de oração, crucifixos e não velas de lavanda, padres
com o poder de administrar sacramentos e não trabalhadores sociais com cursos
em gestão de sofrimento.
Membros portugueses da Ordem de Malta |
Médicos e advogados que pertencem à Ordem estão nas linhas
da frente, a defender a ética cristã de instituições médicas contra as
ideologias da cultura da morte.
A Ordem financiou também o Fundo Global para Pessoas
Esquecidas. Estas incluem pessoas com doenças negligenciadas, filhos de
reclusos, crianças nascidas com deficiência e mães de recém-nascidos sem
cobertura médica.
Em Madrid e São Petersburgo a Ordem opera cantinas sociais
para os pobres e sem-abrigo e os membros parisienses da ordem amarraram duas
barcas no Sena para dar guarida a sem-abrigo e aos seus cães. Para muitos
sem-abrigo um cão é literalmente o melhor amigo e não alguém de quem se querem
separar à noite. Os franceses estão muito orgulhosos do facto de terem pensado
nos cães.
Vale a pena por isso, nesta semana em que a Ordem celebra
900 anos, reflectir sobre quanta falta faz o cavalheirismo.
Popularmente o termo cavalheirismo é sempre associado à
prática de um homem oferecer o seu lugar a uma senhora ou a um idos num
transporte em hora de ponta. Mas fundamentalmente o cavalheirismo é uma questão
de pessoas com força e poder a usar os dons que a educação ou a natureza lhes
deram para ajudar pessoas menos fortes. É a completa antítese dos princípios de
sobrevivência dos mais fortes, que governa vida dos primatas.
As feministas tendem a ser contra o cavalheirismo porque não
gostam de pensar que as mulheres possam ser o sexo fraco, mesmo que fraco,
neste contexto, signifique algo como “fisicamente menos capaz de mover uma
árvore caída ou mudar um pneu” e não intelectualmente menor. Do mesmo modo os
ideólogos liberais não gostam do conceito simplesmente porque sugere que existem
pessoas na sociedade que são mais fortes e capazes que outras. A mera
existência destas personagens significa que um século de engenharia social
falhou na criação de uma utopia sem classes.
Em contraste, a ideia cristã de cavalheirismo afirma
simultaneamente o talento e a habilidade enquanto defende que tais talentos
deve ser colocados ao serviço pessoal de quem for menos capaz.
Talvez uma afirmação mais firme de cavalheirismo nos nossos
currículos escolares possa ajudar a ultrapassar uma série de patologias
sociais, incluindo o feminismo, o machismo o igualitarismo irreflectido e a
ideia de que o serviço aos pobres e a defesa da fé é algo que se consegue
melhor pela burocracia do que através de pessoas reais.
É algo paradoxal que a defesa da fé no século XXI implique
também uma defesa do valor antigo de cavalheirismo.
Tracey Rowland é reitora e membro permanente do Instituto João Paulo II para o Casamento e
para a Família em Melbourne, Austrália. É autora de Culture
and the Thomist Tradition after Vatican II (2003) e Benedict
XVI: A Guide for the Perplexed (2010), entre outras obras.
(Publicado pela primeira vez no Domingo, 10 de Fevereiro
2013 em www.thecatholicthing.org)
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Catholic Thing. Direitos reservados. Para os direitos de
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The Catholic Thing é um fórum de opinião católica inteligente. As opiniões expressas são da exclusiva responsabilidade dos seus autores. Este artigo aparece publicado em Actualidade Religiosa com o consentimento de The Catholic Thing.
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