Têm saído muitas notícias de Roma nos últimos dias, mas nem
toda a gente poderá estar a acompanhar tão bem como queria, por isso este
artigo serve para fazer um resumo breve e, se possível, ajudar a interpretar
alguns dos factos.
O que se está a passar agora é que os cardeais, todos os que
estão em Roma e não só os eleitores, estão a reunir diariamente nas Congregações
Gerais. Podemos ver isto como uma Assembleia Geral da Igreja, que na ausência
do "chefão" tem a seu cargo o Governo da Igreja.
As congregações são importantes por várias razões. Em
primeiro lugar porque é lá que se decidem as questões práticas para o Governo
da Igreja em Sede Vacante. Regra geral, sem Papa, passa-se muito pouca coisa,
mas há decisões que têm de ser tomadas e essas são discutidas e votadas aqui.
Informalmente, contudo, esta é também uma excelente
oportunidade para os cardeais se conhecerem melhor. Não esqueçamos que embora
muitos cardeais trabalhem em Roma, a maioria vive e trabalha nas suas dioceses,
por isso não têm muitas oportunidades para se conhecerem. É importante, por
isso, este período em que podem falar, trocar ideias e ainda beneficiar dos
conselhos e opiniões dos não eleitores que, na altura do Conclave, estarão,
como nós, sem acesso ao interior. É por isso significativo que tenham decidido
que, ao contrário do que estava planeado, apenas reunirão de manhã e as tardes
serão livres precisamente para se poderem encontrar num ambiente em que estejam
mais à vontade.
É também nas congregações que os cardeais vão decidir a data
do próximo conclave e muita gente tem sido apanhada de surpresa pelo facto de
que, aparentemente, os cardeais não têm grande vontade de acelerar as coisas. Incrivelmente,
e apesar de todo o tempo que tiveram para preparar as coisas, ao segundo dia
das congregações ainda há cardeais eleitores que não apareceram em Roma! Tudo
indica, porém, que ao terceiro dia lá estarão e imagino que até ao fim da
semana tenhamos data para o Conclave.
Do que é que se tem falado dentro das congregações? Os cardeais
evitam falar sobre isso. Na primeira congregação todos os cardeais juraram
cumprir as normas estabelecidas pela Igreja e guardar segredo sobre tudo o que
tenha a ver com a eleição do próximo Papa. À medida que cada novo cardeal chega
tem de fazer o mesmo juramento antes de se juntar aos trabalhos.
Isto significa que tudo o que se passará no Conclave é
segredo, mas não significa que todos os assuntos nas Congregações sejam
segredo, particularmente os que não estão directamente relacionados com a eleição
do próximo Papa. Neste sentido, todos os dias há uma conferência de imprensa na
qual o padre Federico Lombardi explica por alto do que é que se falou naquele
dia.
Foi assim que soubemos que na Terça-feira os cardeais
decidiram redigir um telegrama para enviar a Bento XVI, mas foi também assim
que soubemos, sem grandes elaborações, que muitos cardeais exigem ter acesso ao
dossier secreto sobre o caso vatileaks, que Bento XVI colocou sob segredo
pontifício, apenas para ser visto pelo próximo Papa. Terão os cardeais o
direito de revelar o seu conteúdo integral? Duvido. Contudo, há três cardeais
presentes que fizeram o relatório e esses, certamente, conhecem o seu conteúdo.
Poderão falar sobre isso? Fá-lo-ão? Ao que parece as exigências são muitas e,
estritamente falando, falar sobre o dossier não é o mesmo que mostrá-lo aos
outros. Se o Papa colocou o documento sob segredo mas não pediu aos cardeais
que guardassem segredo em relação ao que sabiam, haverá espaço de manobra. Não
faço ideia o que se passará...
O que mais me tem surpreendido, a mim que sou novato a
cobrir conclaves, é a “rebeldia” dos cardeais. Na verdade, muitos deles estão a
participar pela segunda vez neste processo e por isso sentem-se mais à vontade
para reivindicar e colocar questões e mudar as regras.
Claramente, os cardeais não estão com pressa. Por um lado
ainda bem. Claro que todos nós estamos ansiosos para saber quem será o próximo
Papa, mas mais importante que isso é que, de facto, a escolha seja acertada. Se
para isso é preciso mais tempo, mais convívio, mais conversa e mais informação,
que seja.
Filipe d'Avillez
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