Transcrição integral da entrevista a Maria Cortez de Lobão
sobre o papel do Espírito Santo no Conclave. Reportagem aqui.
Como é que funciona a
inspiração do Espírito Santo no Conclave?
O Espírito Santo é o amor de Deus e a teologia da encarnação
diz que aquilo que acontece na perfeição e definitivamente em Jesus, que é a
encarnação do próprio Deus, acontece em nós de maneira progressiva, se o
deixarmos.
Isso é o que permite a São Paulo dizer Deus habita em mim e,
à comunidade nascente, vós sois Templo do Espírito Santo.
Esta realidade faz com que este amor de Deus que habita em
nós não funcione contra a nossa natureza, nem apesar da nossa natureza, mas com
a nossa natureza. Isto porque Jesus prometeu que ficava connosco até ao fim dos
tempos e que nos enviaria o espírito. O Espírito é este amor com que o pai e o
filho se amam e que é de tal forma grande e total que pode ser partilhado por
nós, sobretudo os que foram baptizados e vivemos desta realidade.
Se pensarmos, até o nosso amor humano faz coisas deste
género. Duas pessoas que se amam podem estar longe fisicamente mas sentem se
está a acontecer alguma aflição ao outro, se há um momento de especial alegria.
Este amor que partilhamos já é indício deste amor que Deus
quer partilhar connosco e que partilha através dessa presença a que chamamos o
Espírito Santo.
O que se pretende aqui perceber é que temos os cardeais, que
são pessoas que dedicam a vida à procura da vontade de Deus e que, com as suas
características, feitios, capacidades e dons querem por isso ao serviço de
Deus. Essa escuta, a que chamamos oração, essa atitude, que é a que tem Nossa
Senhora, permite-nos grandes coisas. O Espírito Santo é por vezes inesperado e
temos grandes exemplos disso na história da Igreja. O primeiro concílio de
Jerusalém é exemplo disso. Havia uma divergência entre Pedro e Paulo sobre como
acolher quem vinha de fora do Judaísmo e o que parecia lógico era que se
pedisse que primeiro fizessem um trajecto dentro da fé judaica para
compreenderem a promessa, a fidelidade de Deus e onde é que se caminhava para
compreender o que era o Messias.
São Paulo dizia que não faz sentido porque Em Cristo somos
homens novos.
Foi preciso juntarem-se em oração e depois de explicadas as
razões de cada um chegaram à conclusão na oração que o caminho era não pedir
aos gentios que se convertessem ao judaísmo e surge uma frase nos Actos dos
Apóstolos que diz “pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor outras
obrigações que não estas.
A força do Amor de Deus naquela comunidade que procura
sinceramente a vontade de Deus é tão real que é possível dizer uma coisa
dessas.
Aqui, cada um dos Cardeais, com as suas características e os
seus dons, quer pôr esses dons ao serviço de Deus. Portanto, como o Espírito
Santo trabalha através dos Dons e não contra os dons, com certeza que podemos
dizer, compreendendo bem isto, que o Espírito está presente no Conclave e faz
com que o coração de cada um se abra àquilo que é a perspectiva do que é
preciso para a Igreja neste momento.
Não intervém contra a
liberdade dos cardeais, nem por magia…
A liberdade é sempre preservada. São Tomás de Aquino diz que
isso é o mais importante. A liberdade de consciência, uma consciência formada,
educada e informada, muito rezada, é o nosso reduto precioso e ninguém força a
mão a ninguém. O Espírito Santo não funciona através da violência, mas sim do
amor, e o amor consegue coisas inesperadas, mas sempre de uma maneira positiva
e criativa, que é o seu apanágio.
Já houve maus papas,
mas nem estes conseguiram atentar contra o depósito da fé…
Bento XVI disse a certa altura que da promessa que temos de
Jesus, que fica connosco até ao fim dos tempos, e que as portas do Inferno não
prevalecerão contra a Igreja, temos a certeza que o erro não vai ser ensinado e
não vai prevalecer. É uma certeza pela negativa, mas muito importante. Deus não
se impõe. Espera que sejamos dóceis a esse amor, ao Espírito Santo, mas de
qualquer maneira daquilo que é importante, e até os Papas menos desejáveis
nunca ensinaram nada contra o depósito da fé, isso dá-nos uma grande confiança,
saber que quem conduz a Igreja, de facto, é Jesus, como o Papa disse antes de
ir para Castel Gandolfo antes da última audiência. Por isso temos de ter toda a
confiança e serenidade, apesar dos nossos erros.
Mas da mesma maneira que o Espírito Santo apoia-se nas
nossas qualidades para ir à frente com o projecto de amor que tem para nós, os
nossos defeitos às vezes até servem para algumas coisas que seriam inesperadas
de perceber e através dos nossos defeitos podemos perceber o que não devemos
fazer.
Há épocas históricas que explicam certos acontecimentos.
Hoje em dia o Papado não tem poder temporal, não é apetecível, e isso é uma
grande vantagem para a acção do Espírito Santo se poder fazer com maior
liberdade e com maior amor.
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