Decorreu nos últimos dias um caso que dá muito que pensar
sobre o papel de uma instituição católica na sociedade. Neste caso é a
Universidade Católica Portuguesa, mas a situação podia-se colocar (e coloca-se
com alguma frequência) em relação à Renascença, onde trabalho.
A UCP publicitou uma pós-graduação sobre Saúde Mental para o
Serviço Social. Na lista de docentes estavam os nomes de quatro médicos que são
publicamente defensores de posições contrárias às da Igreja Católica, por
exemplo na questão do aborto.
Um movimento pró-vida, a Associação Mulheres em Acção, emitiu um
comunicado a denunciar a situação. A Renascença fez notícia com base nisso
e contactou a Universidade que, mais tarde, veio
dizer que afinal o curso não se iria realizar, devido a erros processuais na
aprovação do mesmo.
Claro que todo o caso levantou muita discussão. Deve uma
instituição católica empregar e dar voz a pessoas que defendem posições
incompatíveis com as cristãs?
Do meu ponto de vista depende, de várias coisas. A matéria que
o docente vai leccionar toca nestes pontos sensíveis? Deve-se rejeitar um
professor de Comunicação Social por ser defensor da liberalização do aborto?
Deve-se rejeitar um professor de Segurança Social que seja defensor do
capitalismo desregrado? Não me parece que seja o caso, a não ser que essas posições
sejam defendidas de forma pública e obstinada ao ponto de poder causar escândalo.
Por exemplo, até um bibliotecário que seja aberta e publicamente Neo Nazi não
deve trabalhar numa instituição católica, isso parece-me evidente.
Mas o caso é diferente quando o docente em questão vai
leccionar matérias sensíveis. Nesse caso não concordaria que um professor de Economia
na UCP fosse comunista, nem concordo que um médico que vai falar de saúde
mental na área de Serviço Social seja defensor de posições éticas contrárias às
da Igreja, como por exemplo o aborto e a eutanásia.
Fazendo o paralelo com a Renascença, uma rádio católica, não
me parece mal que se coloque em antena um destes mesmos médicos para comentar
assuntos da actualidade de saúde, como acontece frequentemente com o Dr.
Francisco George, que é Director Geral da Saúde, mas já me chocava se ele fosse
convidado a fazer opinião para a rádio e usasse o seu lugar para defender a
liberalização do aborto, por exemplo.
Da mesma maneira eu tenho vários colegas que não são católicos, ou até defendem posições contrárias em muitos sentidos, mas desde que isso não interfira no seu trabalho de fazer jornalismo numa instituição com identidade católica, não vejo problema.
A questão aqui é de fidelidade à missão. Uma UCP ou uma RR
não são apenas mais uma universidade ou mais uma emissora. Têm princípios
claros, católicos, e um sentido de missão social e evangélica. Os seus ouvintes
e estudantes têm o direito a esperar e a receber uma educação ou programação condizentes
com esse espírito. Ainda por cima, num país como Portugal, será complicado
encontrar pessoas mais bem enquadradas na doutrina católica a quem se possa
recorrer? Duvido.
É verdade que as instituições não são perfeitas, a Igreja
também não a é, na sua vertente humana. Penso que é importante, em casos
destes, evitar promover o escândalo, procurar resolver os assuntos de forma
cordial e sensata em vez de vir logo a público atirar pedras aos alegados
pecadores. Isto não é uma crítica ao comunicado das Mulheres em Acção, que até
me pareceu respeitoso, é só uma consideração porque esta não será a última vez
que a situação se coloca.
Por fim, um aspecto importante. No artigo no site da
Renascença em que se dá conta do cancelamento do curso existe um comentário de
um leitor a dizer que se é verdade então o Estado deve deixar de financiar a
Católica.
É isto que acontece quando as instituições começam a tentar
ser fiéis a si mesmas. Já aconteceu em muitos outros países, está a acontecer
neste momento nos EUA e no Reino Unido também. Esta ideia de que as instituições, neste caso
católicas, têm de abdicar dos seus princípios para poderem receber dinheiro
público é talvez uma das maiores ameaças à liberdade religiosa nos nossos
tempos e nas nossas sociedades. Podem esperar muito mais deste género de argumentos,
preparem-se.
Filipe d’Avillez
Esta é uma questão procedente...as instituições com cariz confessional (neste caso católicas)devem ser coerentes com a sua opção. Ainda recentemente S.S. Bento XVI se referiu a este assunto, em relação às instituições com fins sociais pertencentes à Igreja e afirmou que elas não se podiam limitar a prestar serviços a quem precisa mas tinham tambem que dar um testemunho assumidamente cristão.
ReplyDeleteE no grupo da RR haver ofertas de fins-de-semana para namorados?
ReplyDeleteEscandaloso, não?