Transcrição integral da entrevista feita a José Diogo Ferreira Martins e Carminho Cordovil, a propósito do Congresso de Campos de Férias Católicos, que se realiza no dia 31 de Outubro. A reportagem pode ser lida aqui.
Vai haver então um encontro de campos de férias católicos. Que realidade é esta?
Vai haver então um encontro de campos de férias católicos. Que realidade é esta?
Zé Diogo: Vai haver um encontro no dia
31 de Outubro, de todos os movimentos e grupos que em Portugal fazem campos de
férias católicos.
Nós começámos aqui há uns meses largos a perceber que na
realidade cada um de nós que faz parte de movimentos diferentes não éramos os
únicos. Havia várias pessoas em Portugal a fazer vários campos de férias. Então
decidimos reunir-nos, um grupo de cinco campos de férias: Os Carraças, o SAIREF
e três grupos de inspiração inaciana, o Campinácio, os Gambuzinos e o Camtil,
para em conjunto percebermos o que é isto de fazermos campos de férias, qual é
a diversidade, o que nos une, quais são as formas diferentes de trabalharmos
nesta perspectiva.
Depois de termos feito algum caminho e de termos tido
algumas reuniões, percebermos que não éramos três, nem cinco, somos quase 30 em
Portugal. Quase 30 significa milhares e milhares de jovens e crianças que todos
os anos em Portugal fazem campos de férias católicos.
Decidimos então pensar que era uma boa oportunidade, esta
de vivermos esta realidade também conversando sobre ela, apresentámos a nossa
ideia ao Sr. Patriarca, que rapidamente ficou entusiasmado, com este processo e
se disponibilizou para se juntar a nós no dia 31, proferindo uma conferência
final e também celebrando a missa.
O que é que
determina se um campo de férias é católico ou não é? Há um reconhecimento
oficial da Igreja, depende da boa vontade de quem organiza? No caso dos jesuítas
é evidente, mas no caso do SAIREF, por exemplo?
Zé Diogo: É uma
pergunta interessante porque essa é uma das grandes diversidades destes
movimentos de campos de férias católicos. Porque nós não temos propriamente a
chancela da Igreja e muitas vezes são movimentos mais amadores, mas isso
confere-lhes uma grande riqueza e é uma coisa muito engraçada ver como existe
uma autonomia muito grande, uma grande facilidade de um grupo de pessoas se
reunirem e dizerem vamos, vamos viver o Evangelho com muita alegria entre nós e
vamos convidar uma série de miúdos para o fazerem connosco, e vão crescendo,
até que a certa altura têm uma dimensão tal que de facto têm de olhar para si
mesmos, organizar-se, criar estruturas, regras e funcionamento nesta forma, por
isso esta oportunidade de estarmos juntos é também isso, partilharmos
experiências, olharmos uns para os outros e ver como cada um de nós faz.
Costuma haver um
padre que acompanha cada campo de férias?
Carminho: Sim.
Por regra tenta-se que isso aconteça durante o campo de férias. Há campos que
não conseguem, só conseguem que um padre vá celebrar uma missa, mas o grande
objectivo deste encontro é também perceber como é que os diferentes campos de
férias fazem e se têm ou não têm padres.
No teu caso,
Carminho, que percurso fizeste nos campos de férias? Foste monitenda também?
Carminho: Sim.
Eu fui participante, faço parte do Camtil e comecei aos 12 anos a fazer campos
de férias no Camtil. Fui crescendo e o Camtil foi crescendo comigo, até que
comecei a ter idade para ser animadora e monitora e entrei também para a
direcção do Camtil.
Comecei então a estar do outro lado, a organizar, mas
mesmo nesta história toda nunca perdi a paixão pelos campos.
No caso do Camtil,
por exemplo, que é dos Jesuítas, que papel é que os leigos têm nestes campos de
férias? Não é só uma coisa organizada pelos jesuítas, e depois os jovens
aparecem...
Carminho: O
Camtil é todo organizado por leigos, tendo um assistente espiritual, da
Companhia de Jesus, que é cedido ao Camtil para apoiar a direcção e ao longo do
ano tem uma direcção de 17 pessoas, que se vai juntando de três em três meses,
para garantir que chegamos ao final do ano e conseguimos ter 10 campos de
férias, cada um com 42 miúdos e com 17 animadores.
Portanto se só o
Camtil tem cerca de 420 miúdos por ano, entre os outros todos estamos a falar
para cima de mil miúdos por ano nestes campos de férias...
Zé Diogo: Muito
mais. Se fizermos as contas, só os Carraças têm 10 campos de férias com 60
miúdos cada. Temos aqui 600 miúdos. Mais os 400 do Camtil, só estamos a falar
de dois movimentos. Somos 30 em Portugal.
Eu diria, sem fazer assim contas muito profundas, que
cinco mil miúdos por ano têm esta possibilidade de viver o Evangelho com muita
alegria nos campos de férias.
Obviamente uma
coisa que diferencia estes campos de férias é a sua identidade católica. Isso
dá frutos na vida dos miúdos?
Carminho: Vê-se
sempre muitos miúdos a irem contrariados, sem perceberem porque é que os pais
os estão a obrigar a ir e porque é que os irmãos mais velhos gostam tanto, e
irem mudando ao longo do campo. O campo, no fundo, são dias vividos com muita
simplicidade, com muita verdade, e em que é dada a capacidade aos miúdos de
pensarem pela própria cabeça e terem uma equipa de animadores, de adultos e de
padres que são um exemplo para eles e eles olharem para esses animadores e
adultos e perceberem que eles são felizes porque seguem Jesus e quererem, nessa
simplicidade, fazer isso.
Há aqui uma
identidade católica vincada, mas não é só oração e doutrina...
Carminho: Claro
que não. Há muitos jogos ao longo do campo, há um muito conhecido que é o
Survivor, que implica muita lama, há caminhadas, há campos que vão a Fátima, há
campos que são no meio do nada e passeiam a pé, há campos que sobem rios...
Zé Diogo: Nós
tivemos uma oportunidade recente de ver um musical sobre campos de férias, um
teatro que simulava um destes campos, e o testemunho de um dos padres deste
musical resumia muito bem a espiritualidade dos campos de férias. Ele dizia:
"Os campos de férias são oração e lama" é esta alternância entre
olharmos Jesus nos olhos, com intimidade, e cinco minutos antes tivemos numa
piscina de lama a fazer um jogo incrível, que é tão atraente… É atraente para
os miúdos porque acho que lhes muda mesmo a vida. Lembro-me uma vez de um caso,
seguramente há muitas histórias do mesmo género, estava um miúdo num campo em
que eu estava também, e ele não tinha uma vivência da fé muito profunda ou
regular, e estamos a falar de uma altura em que estamos já no fim do campo e
por isso as pessoas já tiveram uma experiência muito forte de amizade e também
de oração, e ele, o miúdo de 14 anos, levanta-se no meio de uma roda de 60
crianças, e do nada diz assim: Se o que vocês dizem é verdade, então eu já não
tenho medo de morrer.
Isto diz tudo, diz tudo.
O Zé Diogo tem
filhos?
Zé Diogo: Tenho
três filhos.
Já com idade de
fazer campos?
Zé Diogo: Um
deles já está a acabar o circuito de fazer campos e está a entrar na idade de
animador. Os outros ainda estão completamente na idade de fazer campos.
Mas o Zé Diogo não
fez?
Zé Diogo: A
minha mulher fez, quando era mais nova, há 30 anos, a Filipa fez campos, depois
esteve alguns anos sem fazer e agora fomos convidados como casal para fazer
campos.
Portanto em casa já tiveram as vivências todas, enquanto
pais, participantes, casal...
Uma das grandes riquezas para nós tem sido viver isto em
família, estarmos ao mesmo tempo o pai e a mãe e os três filhos, em que destes
três um ou dois participam e os outros fazem de irmãos, mais novos e mais
chatos, ou mais velhos e mais divertidos.
Estavam a dizer há
bocado que há miúdos que vão contrariados, mas também acontece o contrário, de
serem os próprios miúdos a serem evangelizados nos campos e depois a puxarem
pelos pais?
Carminho: Claro
que sim.
E acontece muitas vezes. Temos casos muito giros de
miúdos que chegam a meio do campo e não percebem porque é que os pais não os
levam à missa ao domingo. Não percebem... Neste musical de que o Zé Diogo
estava a falar há uma miúda que diz: "Não percebo porque é que os meus
pais me mandam para aqui, sabendo que isto é tão bom, e não fazem esta vida o
resto do ano inteiro”. Por isso acontece muitas vezes, serem os miúdos a
levarem os pais à missa. Este ano recebemos uma carta de uma mãe a agradecer a
forma como o filho chegou a casa. A dizer: "O meu filho veio uma pessoa
completamente diferente, muito obrigado, não sei o que é que fizeram durante
esses dez dias, mas só tenho a agradecer a maneira como ele chegou".
Há aqui uma
questão que pode ser injusta, ou preconceito, do pouco que conheço destes
campos fico com a ideia que é de uma faixa social bastante restrita. Isso é
transversal? Pode não ser uma coisa negativa, há-de haver projectos para todos,
mas existe a tentativa de variar as experiências do ponto de vista social
também?
Zé Diogo: Sim.
Temos uma grande diversidade de campos. Alguns são mais homogéneos, do ponto de
vista da faixa social, para pessoas que não têm dificuldades económicas, e há
outros que são mais dirigidos para pessoas carenciadas, há uns muito focados em
bairros carenciados, há uns que procuram uma mistura destas duas realidades,
portanto eu diria que há as três vertentes.
Não há ninguém a
ganhar dinheiro com estes campos, pois não?
Carminho:
Ninguém ganha dinheiro com estes campos. Posso contar o exemplo do Camtil. O
Camtil tem cinco mil sócios, que estão organizados em famílias e todos os anos
as famílias pagam uma quota e essa quota ajuda-nos a gerir o Camtil ao longo do
ano inteiro. Para irem para os campos cada miúdo tem de pagar um valor que, se
não conseguir pagar, a organização assume. Ou seja, ninguém deixa de fazer
campos por não ter dinheiro.
Paralelamente temos o caso dos Gambozinos, que precisam
de fazer uma angariação de fundos para os seus miúdos, que são de uma situação
mais carenciada, conseguirem fazer campos de férias no Verão.
Carminho: Sim,
há quem fique de fora por não haver vagas.
Muitas pessoas?
Carminho:
Muitas, muitas pessoas. Mas ficam de fora um ano, esperamos que no ano a seguir
consigam entrar. A oferta de campos está cada vez maior, porque de facto isto
está a mudar a vida de muitas pessoas e as pessoas querem todas vir fazer um
campo também.
Se calhar os campos fazem parte de uma faixa social
diferente, é uma coisa de que estávamos a falar o outro dia, mas depois é essa
faixa que vai criar outros campos para outro tipo de pessoas, com mais
dificuldades.
Ou seja, acaba por ser um ciclo que só vai dar bons
resultados mas que tem de passar sempre por uma fase mais fechada.
Zé Diogo: E
depois há um ponto importante que achamos que é relevante, que é o facto de as
pessoas terem uma faixa social mais elevada não significa que não precisem de
ouvir falar de Deus, da mesma forma que aqueles que têm uma vida economicamente
mais desfavorecida. Todos eles precisam dos campos de férias, como nós também
precisamos.
Ainda a propósito de outra coisa, e que é um dos grandes
objectivos do nosso seminário, é precisamente conseguir mostrar a todos aqueles
que estejam interessados em ir lá no dia 31 que é fácil fazer um campo de
férias, que é possível fazer um campo de férias e queríamos muito chegar a todos
os párocos da diocese de Lisboa, a todas as instituições católicas, a todas as
organizações sociais que tenham uma matriz cristã, todos os colégios católicos,
porque de facto há em todas estas instituições ou tipos de instituições que
mencionei.
Algumas já conseguem organizar campos de férias, por isso
a grande proposta que queremos fazer é, durante o período da manhã vamos
discutir e partilhar este dom e durante a parte da tarde vamos partilhá-lo com
todos os que quiserem ouvir. E nós gostaríamos muito que todas as pessoas que
ainda não fizeram um campo de férias na vida pudessem ir ter connosco, ouvissem
o que temos para dizer, conversassem connosco e percebessem que é possível
também eles fazerem um campo de férias, porque de facto a procura é uma coisa
que nos parte o coração, nós sabemos que temos dois mil miúdos inscritos para
fazer um campo dos Carraças e só 800 é que fazem, todos os anos há 1200 que
ficam de fora, nós não queremos que isto seja assim, queremos que esta mensagem
de Jesus chegue a todos em tempo útil, porque se eles chegam aos 18 anos depois
já não há quem lhes ponha na cabeça que vão fazer um campo de férias, porque
então já não querem.
Dia 31, onde e a
que horas?
Carminho: Dia
31 no Colégio São João de Brito, depois do almoço, mas podem ver todas as informações na internet, vamos ter também uma página no
Facebook que vai ter todas essas informações. Se quiserem falar
directamente connosco podem enviar-nos um email para redecfc@gmail.com
Numa altura em que
se está a falar tanto de Nova Evangelização e de responsabilizar os leigos pela
nova evangelização, esta é uma via?
Zé Diogo:
Claramente. Aliás quando pensámos na razão de fundo deste seminário, depois
havia também uma razão de facto, uma coisa circunstancial, que é o Sr. D.
Manuel Clemente ter convocado um sínodo diocesano para Lisboa para 2016, em que
lançou este desafio a todos os que querem viver o Evangelho de uma forma
diferente e actual, que nos contem que nos contem como é que fazem. E a nossa
intenção é precisamente, no final destes trabalhos, resumir isto num documento
que entregaremos depois à organização do Sínodo para que seja tornado público
por essa via.
Têm ideia de isto
acontecer noutros países?
Carminho: Não.
Não há campos de férias [deste género] sem ser em Portugal. Um dos nossos
objectivos era também conseguir enviar uma carta ao Papa a explicar este
fenómeno que está a acontecer em Portugal e explicar este fenómeno e o impacto
que está a ter na sociedade portuguesa.
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