Wednesday 4 January 2017

Islamismo e o Ocidente, o Grande Desafio para 2017

Alguns jornais europeus noticiaram – muito discretamente – que de acordo com polícia na região alemã de Vestefália/Renânia do Norte, entre 2011 e 2016 houve 3.500 casos de vandalismo/profanação de igrejas cristãs. Corresponde a cerca de dois por dia, só numa região da Alemanha, todos os dias, ao longo de cinco anos.

O mais provável é que nunca tenha ouvido falar disto. A maioria dos europeus também não, porque… Bom, porque não. Mesmo estes números vagos são difíceis de conseguir. Em vários países a polícia não quer assustar o público, dando a ideia de que não consegue fornecer segurança básica – lembram-se dos casos de assédio sexual a mulheres na passagem de ano o ano passado? E, claro, há ainda o factor do politicamente correcto.

As autoridades alemãs dizem que os ataques em Vestefália são em larga medida da responsabilidade de salafitas jihadistas, que roubam dinheiro das caixas de esmolas para ajudar a financiar as suas actividades. Os salafitas tendem a proibir o uso da razão (kalam) em assuntos de religião e entre eles há opiniões divergentes em relação à jihad violenta. Há cerca de 7.500 salafitas na Alemanha, 17.000 em França, milhões no Egipto e na Índia e grupos mais pequenos na Suécia e na China. Há-de haver um número significativo, mas desconhecido, nos Estados Unidos.

Se quer saber qual será um dos factores decisivos em 2017, pode bem ser como o Ocidente lida, ou deixa de lidar, com desafios como aqueles que são apresentados por movimentos como o salafita, ao estilo do massacre no mercado de Natal em Berlim, inspirado pelo Estado Islâmico.

A China e a Rússia exigirão políticas externas duras e criativas do ponto de vista da economia. A política interna americana vai ser uma batalha campal. Mas o islamismo envolve desafios fundamentais ao nível do pensamento e das crenças.

De facto, mais do que uma ameaça externa, o islamismo envolve uma crise no próprio Ocidente. A chanceler alemã Angela Merkel disse que o problema na Europa não é um excesso de muçulmanos, mas uma escassez de Cristianismo. É uma forma já tardia de justificar a entrada de mais de um milhão de muçulmanos, sem qualquer examinação, na Alemanha e, por consequência, para toda a Europa e até mais além, devido aos acordos Schengen.

Mas Merkel não deixa de tocar uma verdade, embora talvez não aquela que pretendia. Não é só o Leste que está em tumulto, o Ocidente também está, como se torna evidente pelos primeiros sinais de desintegração da União Europeia e a revolta populista que levou à eleição de Donald Trump.  

A velha ordem liberal, baseada no pluralismo e na tolerância, foi boa enquanto durou, enquanto o Ocidente gozava da protecção providenciada pela tradição judaico-cristã. Quando se acredita, como se lê no Génesis, que os seres humanos são feitos à imagem de Deus, é fácil compreender porque é que devemos respeitar-nos uns aos outros, na medida em que todos temos livre arbítrio e uso da razão.

Mas quando, como acontece com as elites ocidentais, se deixa de acreditar que a dignidade humana é transversal, é difícil explicar porque é que o outro merece respeito enquanto ainda está no ventre, ou quando discorda de nós no que diz respeito à política ou à fé.

Os nossos partidos políticos foram-se alinhando em posições radicalmente opostas, com os republicanos a promover a fé, família e nação e os democratas a raça, género e classe. Claro que isto é uma simplificação, mas traduz em linhas gerais o destino do país sob um partido ou outro. Com o Presidente Trump, as irmãzinhas dos pobres não têm nada a temer mas a Planned Parenthood sim. Se Hillary tivesse ganho, seria ao contrário.

Existe uma divisão semelhante no que diz respeito à defesa do Ocidente. Trump defende medidas mais severas, os democratas acreditam que podemos continuar a tratar os muçulmanos como apenas mais um grupo religioso numa América religiosamente pluralista.

Há aqui questões delicadas, e outras não tão delicadas. A administração Democrata que atropelou os cristãos e outros que resistiram a nova moral do Estado moderno, mas que desdramatizou a ameaça islamita, não foi capaz de fazer esta distinção.

Salafitas na Alemanha
É evidente que podemos coexistir com muçulmanos que queiram coexistir connosco. Mas a presença de jihadistas – que essencialmente compõem uma força armada amorfa na nossa sociedade – há-de conduzir-nos cada vez mais na direcção de testes religiosos para entrar no país, ou até mais longe.

O filósofo político Pierre Manent argumenta que a França está perante esta crise porque as suas elites ainda acreditam, em larga medida, que de acordo com as regras iluministas da revolução francesa, este problema não deve sequer existir. Pensam que se todos forem acolhidos pelo Estado secular, verão que só têm a ganhar em assimilar-se e dar-se com a sociedade. Logo, os conflitos que possam existir só podem ter a ver com dinheiro e exclusão social. Como se não houvesse quaisquer outras visões da política, sociedade ou religião.

Isso tem sido dado como falso repetidamente. No dia 11 de Setembro em Nova Iorque e em Washington, e noutras ocasiões em Madrid, Copenhaga, Boston, Paris, Bruxelas, Saint-Étienne-du-Rouvray, Nice, San Bernardino, Columbus, Orlando, Cairo e há dias em Istambul.

Os nossos líderes seculares e – infelizmente – religiosos, têm feito verdadeiras manobras de contorcionismo para negar que haja qualquer factor “autenticamente” religioso nestes ataques. Até o Vaticano, que pensar-se-ia poder apreciar o papel central da religião na vida humana, se juntou ao coro, afirmando que os verdadeiros motivos são dinheiro, poder, petróleo, o negócio das armas – tudo menos religião.

Tudo isto faz lembrar o debate sobre a União Soviética durante a Guerra Fria, quando uma fatia significativa da opinião pública do Ocidente quis desdramatizar as diferenças em relação a um sistema agressivamente ateu e armado com milhares de armas nucleares, principalmente, deve-se dizer, por medo das consequências de enfrentar a verdade.

Actualmente o Ocidente está quase tão dividido como o Oriente em termos de religião e aquilo que a fé significa para as pessoas. Não vamos ultrapassar esta brecha em 2017 – pelo contrário, é natural que se torne ainda maior, à medida que a já forte resistência ao Presidente Trump ganha força. Mas uma sociedade sã encararia 3.500 ataques a Igrejas cristas – e sabe-se lá quantas mais noutros locais – como um sinal de alarme.

Nada disto corresponde a uma “guerra contra o Islão” – isso é um falso problema – mas sim a uma batalha perpétua contra todos aqueles, incluindo os da nossa própria cultura, que ameaçam as fundações da dignidade e liberdade humanas.

Feliz Ano Novo.


Robert Royal é editor de The Catholic Thing e presidente do Faith and Reason Institute em Washington D.C. O seu mais recente livro é A Deeper Vision: The Catholic Intellectual Tradition in the Twentieth Century, da Ignatius Press. The God That Did Not Fail: How Religion Built and Sustains the West está também disponível pela Encounter Books.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na Segunda-feira, 2 de Janeiro de 2017)

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