Isabel Moreira Fundamentalista religiosa |
Foram
ontem aprovadas alterações à lei do aborto. Nomeadamente:
-
As mulheres que pensam abortar são agora obrigadas a fazer consultas de aconselhamento
durante o período de reflexão;
-
Algumas mulheres, as que não seriam isentas de taxas moderadoras de qualquer maneira,
terão de passar a pagá-las para abortar;
-
Os objectores de consciência passam a poder fazer consultas de aconselhamento.
A
pergunta do referendo de 2007 foi esta:
"Concorda
com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por
opção da mulher, nas 10 primeiras semanas, em estabelecimento de saúde
legalmente autorizado?"
Ou
seja, não há aqui nada sobre as consultas de aconselhamento, nada sobre taxas
moderadoras e nada sobre a exclusão de objectores de consciência de eventuais
consultas de aconselhamento.
Contudo,
ainda assim, a esquerda conseguiu vislumbrar na decisão de ontem uma “adulteração”
do referendo. Segundo o expresso, as várias bancadas consideram que se trata de
uma violação do “espírito” do referendo. São os tempos em que vivemos. Os fetos
não têm direitos nem dignidade, mas os referendos têm espíritos (mas só alguns…
o referendo de 1998 foi bastante menos espirituoso).
A
questão dos objectores de consciência sempre me pareceu uma das maiores
injustiças da actual lei (deixando de parte a óbvia injustiça que é o próprio
aborto). Porque o que o Estado está a dizer quando exclui os objectores de
consciência das consultas de aconselhamento é que as pessoas que acreditam que
o aborto é um mal, e que por isso não o querem praticar, são de alguma forma
incapazes de exercer outros aspectos da sua profissão e não conseguem sequer
aconselhar mulheres em situações dramáticas sem tentar impor as suas crenças
medievais.
O
comunista António Filipe considera mesmo que a direita quer “transformar os
objectores de consciência numa tropa de choque”. Mas se pensavam que o
dramatismo se resumia ao menino do PCP que se veste à Bloco de Esquerda,
enganam-se! Temos sempre a Isabel Moreira.
Não.
Eu não vou fazer um post a destruir ou a criticar a Isabel Moreira. Isto porque
embora eu possa discordar muito do aborto, sou um fervoroso defensor da
liberdade religiosa e Isabel Moreira, nestes casos, está a agir claramente em
defesa da sua fé.
Porque
para quem ainda não percebeu, esta questão não é menos que uma questão
religiosa. Toda a revolução sexual, que tanto mal tem feito às famílias, às
crianças e às próprias mulheres que supostamente seriam as suas grandes
beneficiárias, é hoje defendida com fervor religioso, contra todos os factos.
(Nesse
sentido, permito-me regozijar no facto de que pelo menos a minha religião defende
– e tem longa tradição de defender – que a fé não pode ser incompatível com a
razão, coisa que aos fiéis da Igreja da Revolução Sexual não se aplica, mas
crenças são crenças e temos de respeitar.)
E
como qualquer religião que se preze, a Igreja da Revolução Sexual tem liturgias
– ver aqui um exemplo recente e perturbador –, tem apologistas – ver Isabel Moreira
–; tem doutrina (e por consequência considera hereges que não segue a
ortodoxia) e tem sacramentos: o aborto*.
Só
assim é que se explica a paixão com que pessoas como Isabel Moreira, mas não
só, defendem algo que até recentemente os seus correligionários classificavam
apenas como um “mal necessário”. Só assim se explica que, segundo a própria, a
existência de consultas de aconselhamento, com o intuito de informar as
mulheres daquilo que vão fazer e das consequências, é uma forma de “terrorismo
psicológico sobre as mulheres” praticada por pessoas imbuídas de “maldade pura”.
Os
fiéis desta igreja até reivindicam para os seus praticantes a isenção de
impostos que tanto criticam nos outros credos. Mas porque razão as nossas irmãs
têm de pagar taxas moderadoras quando são operadas a um tumor no útero, mas as
nossas primas devem ser isentas quando optam por abortar?
Um
dos problemas desta religião é que nem sequer é fiel à sua própria tradição.
Hoje diz uma coisa, amanhã diz outra. Lembram-se quando nos pintavam a imagem
da pobre mulher, forçada a abortar numa clínica de vão de escada, sozinha e sem
apoio? Pois Helena Pinto critica precisamente que com as alterações à lei a
mulher pode abortar, pode decidir, “mas não pode decidir sozinha”.
"Recebei Senhor este sacrifício das nossas mãos" |
Pois
quem diria! É uma coisa tão terrível que os únicos que trabalham no terreno
para ajudar as mulheres a não o praticar são “terroristas imbuídos de pura
maldade” e os médicos que se recusam a desmembrar os nossos filhos, apenas
porque a mãe, na sua sagrada autonomia o deseja (ou, o que é mais comum, porque
os seus pais ou o seu parceiro a pressiona), são uma “tropa de choque”.
Sim,
é verdade… A revolução sexual é uma religião, a nova religião oficial. E o
facto de o PS deixar que Isabel Moreira seja a face visível da sua política
neste campo diz tudo o que eu preciso de saber sobre esse partido, obrigado.
É
que eu nunca gostei de partidos de inspiração religiosa.
*Caso seja um defensor do aborto e esteja irritado com o facto de eu o ter chamado um "sacramento" de uma nova religião, fique descansado que a equiparação não é original. Foi uma das vossas que o fez primeiro, eu limitei-me a roubar.
Filipe d'Avillez
Filipe d'Avillez
No comments:
Post a Comment