James V. Schall S.J. |
Num artigo chamado “A próxima guerra cultural”, publicado no New York Time, no passado dia 30 de
Junho, David Brooks nota que o Cristianismo está em rápido declínio, se não
mesmo em vias de eliminação. O seu termo para descrever o que resta –
conservadores sociais – é infeliz. Tal como Chesterton anteviu há mais de 100
anos, este resto será composto por “hereges”. Só eles terão a coragem de
afirmar que a relva é verde, ou que casamento é casamento, e não, segundo a
nossa percepção voluntarista da realidade, aquilo que nós queremos que seja. “A
revolução sexual não será desfeita tão cedo. O desafio mais prático passa por
reparar uma sociedade atomizada, sem compaixão e inóspita”, escreve Brooks, num tom
que recorda claramente o Papa Francisco.
Depois de ler o artigo de Brooks, acabei de ler o livro
de Daniel James Brown, “The Boys in the Boat”, um relato dos oito tripulantes que ganharam a medalha de ouro nos
Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936. Na nota de autor, Brown escreve: “Por fim,
este é, em muitos sentidos, um livro sobre a longa viagem de um jovem de volta
ao lugar a que chama casa; escrever esta história recordou-me novamente que
ninguém é mais abençoado no seu lar do que eu”. Brown é casado e tem duas
filhas.
Não pretendo fazer aqui uma crítica a este excelente
livro. Há um clube de leitores em Maryland que diz que todos os habitantes do
Estado o deviam ler. É um bom conselho. Mas seja como for que se vê este livro,
é claramente contra-corrente. Hesito dizê-lo com medo de que hesitem lê-lo.
Brown presta particular atenção à vida familiar de Joe
Rantz, o herói do livro, e à vida dos outros rapazes tripulantes, bem como
aquilo que lhes acontece até às suas mortes. Todos menos um casam, têm filhos,
lares, memórias. O livro depende em grande parte das memórias da filha de
Rantz. É um livro sobre homens, homens bons e novos que, como muitos turistas
de visita à Alemanha pela primeira vez, bebem demasiada cerveja. Mas é também
um livro sobre mulheres, filhas, irmãs e mães, nenhuma das quais remava. É um
livro que compreende o casamento, a sua relação aos sexos, a filhos, a pais e
mães. Relações que podem ser, por vezes, agonizantes, mas não existem dúvidas
sobre o que deviam ser.
O protagonista filosófico do livro é um inglês chamado
George Pocock. Cada capítulo começa com uma afirmação de Pocock sobre a
majestade do remo. Pocock é o construtor dos melhores skiffs de cedro de oito
lugares. É também uma figura importante na sede da tripulação na Universidade
de Washington, onde constrói e vende os seus barcos. O drama do livro está
centrado em Joe Rantz, um dos principais remadores da tripulação. A sua vida
familiar foi afectada pela morte da sua mãe e o segundo casamento do seu pai,
que resultou em quatro meios-irmãos e irmãs. Para todos os efeitos o seu pai e
a sua madrasta abandonaram-no quando ainda era rapaz.
Ao analisar a psicologia de Joe e o seu enquadramento na
equipa, Pocock chega à conclusão que o que o incomoda é a sua relação difícil
com o seu pai que, como Joe, é muito pobre. Esta é uma das passagens centrais
do livro:
O facto de a mãe de
Pocock ter morrido seis meses depois de ele ter nascido ajudava. A segunda
mulher do seu pai morreu poucos anos depois, antes de George ter idade sequer
para se lembrar dela. Ele sabia bem o que era crescer numa casa sem mãe, do
buraco que isso deixa no coração de um rapaz. Conhecia bem aquela vontade
incessante de se tornar completo, esse desejo infindável. Lentamente, começou a
compreender a essência de Joe Rantz.
Mas que coisa estranha esta?! Um rapaz precisa de uma
mãe? Da sua mãe?
Joe Rantz teve apenas uma namorada na sua juventude.
Casou com ela no mesmo dia em que ambos se licenciaram na Universidade de
Washington. A sua mulher, Joyce, que também ajudou a criar os seus meios-irmãos, foi
uma esposa dedicada, descrita da seguinte maneira por Brown:
Ao longo dos anos
Joe e Joyce tiveram cinco filhos – Fred, Judy, Jerry, Barb e Jenny. Em todos
esses anos, a Joyce nunca se esqueceu do que o Joe tinha passado nos seus
primeiros anos e nunca se desviou do juramento que fizera a si mesma no início
da sua relação: Acontecesse o que acontecesse, ela nunca o deixaria passar por
algo do género, nunca o deixaria sentir-se abandonado, ele teria sempre um lar
caloroso e cheio de amor.
Joyce morreu antes de Joe. Na sua velhice e morte, os
seus filhos cuidaram dele.
“A próxima guerra cultural?” Homem, mulher, fidelidade,
votos, trabalho, lar, glória – estas são as coisas que temos estado a destruir,
as coisas que os homens e as mulheres, rapazes e raparigas, mais querem, se é
que querem algo para além disso. Porque será, perguntou Chesterton, que
sentimos “saudades de casa em nossa própria casa?” Se os “rapazes no barco” nos
ensinam alguma coisa é que para sermos o que somos temos de saber, por
experiência ou por esperança, o que é um lar – pai, mãe e os seus filhos. A
transcendência passa pelo lar.
James V. Schall, S.J., foi professor na Universidade de
Georgetown durante mais de 35 anos e é um dos autores católicos mais prolíficos
da América. O seus mais recentes livros são The Mind That Is Catholic, The Modern Age, Political Philosophy and Revelation: A Catholic Reading, e Reasonable Pleasures
(Publicado pela primeira vez na Terça-feira, 21 de Julho
de 2015 em The Catholic Thing)
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