Joseph R. Wood |
Ao longo das últimas semanas vimos as forças da desordem a
avançar, entusiasmadas com os seus triunfos dos últimos anos. Assim rapidamente
temos:
• A ex-estrela e mais-valia da Disney, Miley Cyrus, deu um
espectáculo pornográfico nas MTV Video Music Awards. As suas simulações
explícitas de actos sexuais, para uma audiência que os produtores sabiam que incluiria
crianças, atraiu a atenção e o dinheiro que os seus managers provavelmente
ansiavam. Apesar de algumas críticas, o seu desempenho reforça o argumento do “sexo
enquanto entretenimento” como norma cultural, para todas as idades.
• O Internal Revenue Service [Finanças], anunciou que casais
do mesmo sexo que se tenham casado em Estados que o permitem, podem preencher a
declaração de rendimentos em conjunto estejam onde estiverem, mesmo em Estados
que não reconhecem o seu casamento. Em linha com o chumbo do Supremo Tribunal a
aspectos do Defense of Marriage Act [que proibia o reconhecimento de casamentos
homossexuais a nível federal], o Estado progressista e a sua agência fiscal
criaram mais um “facto no terreno” em relação à legitimação legal do casamento
homossexual e a ostracização daqueles que se opõe ao seu reconhecimento.
• Hadley
Arkes deu a conhecer a decisão do Supremo Tribunal do Novo México de manter
as multas aplicadas a um casal que se recusou, com base em argumentos
religiosos, a fotografar actos de intimidade homossexual num casamento. A
autoridade do Estado para descartar objecções religiosas e de consciência à sua
visão de igualdade acaba assim por ser alargada.
• O Huffington
Post alertou-nos para a entrada rápida no mercado de testes fáceis e
baratos de despistagem de anormalidades em nascituros, tão cedo como as dez
semanas de gestação, sobretudo de trissomia 21. “Estes testes… dão às mulheres
mais tempo para tomarem uma decisão informada sobre se continuam com a gravidez
ou para se prepararem médica e emocionalmente para o desafio de criar uma
criança diferente daquela que talvez esperassem”. Um médico descreve os testes
como a “entrada” que pode, se necessário, conduzir a outros mais invasivos e certos,
durante a gravidez. É interessante que a reportagem tenha incluído entrevistas
e fotografias de mães que ou recusaram estes testes mais invasivos (devido ao
risco de aborto espontâneo) ou escolheram levar a termo a gravidez de uma
criança com trissomia 21. Mas a autonomia da escolha da mãe sobre a vida e
morte do seu filho vê-se assim alargada.
• O Médio Oriente tornou-se mais caótico. A administração
americana, que tem resistido a intervir na Síria para ajudar a depor Assad,
aceitou como verdadeiras as alegações de que a Síria, um cliente da Rússia e do
Irão, tinha morto centenas de civis não combatentes, com armas químicas. Entre
os cerca de 75 mil a 100 mil mortos nesta guerra civil, desde os inícios de
2011, os cristãos, muitos dos quais já tinham fugido da violência islamista no
Iraque após a remoção de Saddam Hussein por parte dos americanos, têm
enfrentado consequências particularmente duras. Nesta fase não é possível
determinar quem é que os americanos poderiam apoiar, entre os carrascos ao
serviço de Assad e os grupos de oposição na Síria, que incluem tanto adeptos do
liberalismo ocidental, como islamistas.
Igualmente, no Egipto, a América enfrenta uma escolha entre
um Governo da Irmandade Muçulmana, devidamente eleito e que estava a
implementar uma agenda islamista tanto no Egipto como no resto da região, e uma
retoma do poder por parte das Forças Armadas. E os cristãos, que nas últimas
décadas tinham encontrado um modus
vivendi desconfortável com o Governo militar, tornaram-se o alvo da ira da
Irmandade. Mais uma vez, a confusão é tanta que nesta altura é impossível
avaliar as consequências de qualquer acção ou inacção.
• Na América os católicos ficaram incomodados com o caso
Jody Bottum, ou Bottumgate, que gerou um poço sem fundo de
descontentamento. Bottum, por razões intelectualmente flácidas e quem sabe por
outras, concluiu num artigo que os católicos devem aceitar o casamento
homossexual como um facto consumado na praça pública.
Como vários críticos fizeram questão de assinalar, contudo,
perder a discussão política sobre o casamento não vai apaziguar aqueles cujo
propósito final é a eliminação de qualquer referência a uma ordem de vida que
não foi criada por eles próprios.
Dito isto, simpatizo com Bottum a respeito de uma coisa. A
confusão actual é tanta, como demonstrado pelos exemplos recentes nos campos de
cultura popular, direito, ciência e política, que qualquer resposta coerente
política ou na praça pública é difícil de imaginar.
Um físico famoso disse, certa vez, que por mais que a
ciência goste de divergir, “a realidade acaba sempre por contra-atacar”.
Chegámos ao ponto, no nosso abandono cultural colectivo de verdadeira ordem, em
que a realidade tem de contra-atacar, talvez de forma suave e lenta, talvez de
forma rápida e violenta.
A questão está em saber como testemunhar a verdade
entretanto. Uma resposta é a defendida por Alasdair MacIntyre, que passa por criar
pequenas comunidades que, de forma generalizada, se isolam da praça pública.
É uma posição desconfortável para católicos, e são muitos os
que a rejeitaram, porque a Igreja está interessada em todos os aspectos da
verdade, incluindo a forma como a verdade molda a acção política. Mas até que a
nossa cultura niilista e a política de poder dos progressistas seculares forem
reformadas por alguma forma de renascimento espiritual, ou cedam debaixo do seu
próprio peso morto, haverá sérios limites ao que é possível alcançar na praça
pública. E a participação nessa praça pública tem de ser avaliada contra o
risco de legitimar e perpetuar tudo o que ela tem de mal.
Teremos de aprender dos cristãos no Médio Oriente, dos
cristãos na Europa central durante o tempo do comunismo e, sobretudo, dos
cristãos dos primeiros séculos. Todos eles sobreviveram a uma grande dose de
contra-ataque da realidade. E testemunharam Jesus Cristo, sempre e em primeiro
lugar.
Joseph Wood
é professor no Institute of World Politics em Washington.
(Publicado pela primeira vez no sábado, 31 de Agosto de 2013 em The Catholic Thing)
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O artigo coloca a questão, interessante, de como lidar simultaneamente com a "praça pública" e com a nossa consciência e convicções pessoais... a primeira é hoje ilimitada e tão multifacetada que difícilmente se criam consensos! Mas é da reflexão informada que depende o reforço da segunda...creio que o melhor modelo é o que Jesus nos oferece nos Evangelhos: participa na praça publica até ser "silenciado" mas o seu investimento é em nas pessoas, isoladas ou em pequenos grupos...
ReplyDeleteGostei muito! Saliento este último parágrafo: «Teremos de aprender dos cristãos no Médio Oriente, dos cristãos na Europa central durante o tempo do comunismo e, sobretudo, dos cristãos dos primeiros séculos. Todos eles sobreviveram a uma grande dose de contra-ataque da realidade. E testemunharam Jesus Cristo, sempre e em primeiro lugar.» Ao ler este e outros textos tenho sempre a sensação de que caminhamos a passos largos para o fim do "império romano".
ReplyDeleteMuito obrigado, Filipe d'Avilez. É um santo serviço que presta.
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