Wednesday 7 June 2023

Junho é mês do Sagrado Coração

Stephen P. White
O mês de Junho é dedicado ao Sagrado Coração de Jesus. O amor de Deus manifestado em Cristo crucificado tem sido alvo de devoção e piedade desde o início do Cristianismo, mas a devoção específica ao coração de Cristo só surgiu na Idade Média.

A devoção ao Sagrado Coração, como é conhecida hoje, levantou voo mais a sério em França, no Século 17, através das revelações feitas a Santa Margarida Maria Alacoque, e com a ajuda do seu director espiritual, o jesuíta São Claude de la Colombière.

No Século 18 a devoção ao Sagrado Coração – e a consagração formal ao Sagrado Coração – já tinha espalhado por França e mais além. Durante a Revolução Francesa o Sagrado Coração tornou-se um símbolo das forças lealistas católicas que se opunham as forças ateias e anticlericais da Revolução. Os contrarrevolucionários da Vendeia usavam insígnias com a imagem do Sagrado Coração.

Em 1856 o Papa Pio IX estabeleceu a Solenidade do Sagrado Coração para a Igreja Universal. Em 1899 o Papa Leão XIII emitiu a encíclica Annum Sacrum, onde declara que “na principal Igreja de toda a cidade e aldeia” os féis de todo o mundo deviam ser solenemente consagrados ao Sagrado Coração de Jesus.

O Papa queria que a devoção da Igreja unida ao Sagrado Coração de Jesus servisse como recordação importante, para os próprios fiéis, e também para o mundo em geral, do facto de Cristo ser rei de toda a criação – uma realeza exercida tanto por direito, como Filho de Deus, como em virtude do terrível preço que teve de pagar para a redimir.

Entre as outras razões dadas pelo Papa Leão para exortar a Igreja a fazer esta consagração estava a sua grande preocupação com o aumento do ateísmo, sobretudo nas nações cristãs. Via a religião a ser excluída cada vez mais da vida pública, como se “um muro estivesse a ser erguido entre a Igreja e a sociedade civil”.

Este desrespeito pela autoridade do sagrado e da lei divina na vida pública, escreveu Leão XIII, tende para um “arrancar [d]a fé em Cristo, e se fosse possível, banir o próprio Deus da terra”. Continuou, descrevendo um estado que revela uma semelhança desconcertante com os nossos tempos turbulentos e ansiosos:

Com tamanha temeridade de ânimos, não há de que se admirar que grande parte da humanidade esteja envolvida em tal desordem e presa por estorvo tão grave que não deixe mais ninguém viver sem temores e perigos? Não há dúvida que com o desprezo da religião, são atingidas as bases mais sólidas da incolumidade pública. Justo e merecido castigo de Deus aos rebeldes que, abandonados às próprias paixões e escravos de sua própria cobiça, acabam vítimas de sua libertinagem.

Bandeira de guerra da Vendeia
Este é um dos grandes temas, talvez o grande tema, do pontificado do Papa Leão XIII. Quando o homem, no seu orgulho, tenta “libertar-se” de Deus, acaba por se tornar escravo das suas paixões. Quando o homem se esquece de Deus, perde-se a si mesmo.

O Papa João Paulo II resumiu a posição de Leão XIII, quase um século mais tarde: “uma liberdade que por si própria recusasse vincular-se à verdade, degeneraria em arbítrio e acabaria por submeter-se às paixões mais vis, e por se autodestruir”.

Não é difícil ouvir nessas palavras proféticas do Papa Leão XIII os ecos da carta de São Paulo aos Romanos. “Por isso Deus abandonou-os às paixões dos seus corações e caíram em ações vergonhosas desonrando os seus próprios corpos. Trocaram o verdadeiro conhecimento de Deus pela mentira. Adoraram e serviram coisas criadas em vez de adorarem e servirem o próprio Criador, Ele que deve ser adorado eternamente”

Trata-se da mesma história de rebelião orgulhosa que se repete ao longo da salvação – desde os israelitas teimosos que se revoltaram no deserto, à Torre de Babel e à própria Queda, quando foi prometido a Adão e Eva que a sua desobediência os tornaria semelhantes a deuses.

Esta é a história da humanidade, na sua simplicidade exasperante e teimosa estupidez: Tentados no nosso orgulho a sermos como deuses, revoltamo-nos contra Deus, que nos criou para sermos como Ele.

E, apesar de tudo, “o Filho de Deus se tornou homem para que o homem se torne Deus”, para usar a famosa frase de Santo Atanásio.

Por esta razão, a devoção ao Sagrado Coração de Jesus não é menos importante, nem tem menos valor agora do que em França no Século 17, ou na Idade Média, ou aos pés da Cruz, no Calvário. O Sagrado Coração de Jesus é o antídoto perfeito para o orgulho dos nossos corações. Deus ama-nos com um coração humano, para que possamos aprender a tomar parte no seu amor divino.

No Sagrado Coração “são postas todas as nossas esperanças”, escreveu o Papa Leão, e “dele devemos implorar e esperar a salvação”.

No Sagrado Coração de Jesus descobrimos a humildade de Deus que esmaga e destrói o orgulho. No seu Coração Sagrado e Sofredor os nossos próprios corações são levados à contrição. No seu Sagrado Coração todo o nosso egoísmo se consome no fogo do seu amor e da sua misericórdia. No seu Sagrado Coração encontramos o amor que criou, ordena e sustém todas as coisas. No seu Sagrado Coração encontramos a força e a graça para amar como Ele ama.

No seu Santíssimo Coração encontramos refúgio e paz, mesmo por entre – ou especialmente por entre – todas as dificuldades e tribulações dos nossos tempos.


Stephen P. White é investigador em Estudos Católicos no Centro de Ética e de Política Pública em Washington.

(Publicado em The Catholic Thing na Quinta-feira, 1 de Junho de 2023)

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