John M. Grondelski |
Até agra o debate sobre o
aborto tem sido sobretudo político, em termos da sua legalidade nas
legislaturas e – ao longo de quase 50 anos – nos tribunais. Depois de Dobbs,
porém, devemos esperar que parte do debate passe do campo político para o
económico, com alguns defensores do aborto a recorrer a incentivos financeiros
para tentar inclinar a mesa de jogo numa sociedade capitalista que,
ocasionalmente, gosta de falar de “justiça social”.
Desde que a decisão do caso
Dobbs reverteu o direito constitucional ao aborto temos visto grandes empresas
a atropelarem-se para anunciar que terão todo o gosto em financiar os abortos
dos seus funcionários, ao ponto de pagar viagens para estados que permitem
matar os nascituros, caso o aborto seja ilegal nos estados em que se encontram.
Várias grandes corporações pressionaram legislaturas estaduais para não
contemplarem adoptar leis pro-vida. O Governador
de Nova Jérsia, Phil Murphy, e o
da Califórnia, Gavin Newsom, têm estado a promover os seus estados como
destinos para empresas, não por causa da sua pesada carga fiscal, mas porque
ambos codificaram o aborto a pedido, até ao nascimento.
Um argumento tradicional dos
defensores do aborto é que é essencial que este seja legal, e a pedido, porque
sem “controlo e cuidados de saúde reprodutiva” as mulheres encontram-se em
inerente desvantagem económica. Claro que essa afirmação colide diretamente com
o mito do aborto como um “cuidado de saúde”. Mas com a saúde a ser definida,
cada vez mais, como algo tão vago e sujeito a manipulação como “saúde
financeira”, os alegados “benefícios” do aborto podem ser racionalizados quase
de qualquer maneira.
Claro que ninguém aponta um
foco à verdade crua e obscenamente nua de que é substancialmente mais barato
para uma empresa abortar bebés do que fornecer cuidados de saúde maternos e
infantis, bem como suportar licenças de maternidade, de doença, de
acompanhamento escolar, etc., bem como as mudanças de horário que se seguem ao
parto.
As empresas que financiam
abortos insistem, claro, que essas suas políticas se devem ao seu “compromisso
para com o direito a escolher”, sem querer admitir que a sua própria saúde
financeira vê com melhores olhos certas “escolhas” em detrimento de outras.
É de suspeitar que as mesmas
empresas que estão a comprometer-se tão “generosamente” com a interrupção de
gravidezes (isto é, a matança de bebés no útero) protestariam fortemente caso
fossem chamadas a cobrir cuidados maternais com a mesma liberalidade, para
criar um ambiente onde fosse possível fazer “escolhas” verdadeiramente livres.
Daí que seja fundamental que
neste momento ambos os nossos principais partidos políticos sejam desafiados a
criar políticas económicas verdadeiramente amigas das famílias e das crianças.
A justiça social não se
alcança sem a protecção dos direitos individuais e sociais mais básicos, isto
é, o direito à vida. Independentemente das diferentes filosofias políticas,
quase todos os pensadores concordam que é um absoluto sine qua non que
uma sociedade proteja os direitos mais básicos dos seus membros.
Logo, os católicos devem tomar
a dianteira nesta discussão sobre justiça social. Revertida a decisão de Roe v.
Wade, já não existem obstáculos constitucionais à reformulação da discussão.
Mas a narrativa alternativa precisa de ser articulada de novo numa sociedade
que não a escuta claramente há cerca de 50 anos.
Esquecemo-nos de liberais como
Mark Hatfield, William Proxmire e Harold Hughes, que eram pro-vida precisamente
porque reconheciam, correctamente, que a vida intrauterina era uma questão de
direitos civis, provavelmente a maior do nosso tempo.
A reformulação deste debate
implica perguntar porque é que o aborto é visto como factor essencial para a
ascensão económica das mulheres. Será porque no mundo económico as mulheres não
conseguiam avançar pelo facto de não serem homens? Isto é, porque engravidavam,
porque tinham filhos e os queriam criar, e porque queriam carreiras que se
adaptavam a essa realidade, em vez de esperar que essas realidades se
adaptassem aos seus empregos?
Será que a actual “generosidade”
das empresas, dispostas a pagar por abortos, é apenas a expressão de uma visão
empresarial que entende as suas trabalhadoras como “machos malparidos?”
A década que se segue ao fim
da escola, seja o ensino secundário ou superior, costuma ser marcado por um
“deixar para trás as coisas de criança” (I Cor 13,11) e pela transição para uma
vida de permanência. Isso costumava implicar arranjar um emprego, mudar-se para
o seu próprio espaço, casar e ter filhos.
A nossa configuração económica
actual – incluindo as empresas financiadoras de abortos – está a minar o
equilíbrio entre a vida e o trabalho.
Salários mínimos e
expectativas máximas são uma mistura que torna cada vez mais difícil atingir a
independência económica, levando ao adiamento do casamento e da paternidade.
Não é de admirar que muitas destas mesmas empresas “woke” estão dispostas a
pagar às suas trabalhadoras para congelar óvulos e adiar a gravidez, como se
fosse a mesma coisa ter filhos aos 45 ou aos 25.
O professor Henry Higgens torna-se,
assim, um modelo para qualquer director de Recursos Humanos de uma grande
empresa moderna quando pergunta, em My Fair Lady, “porque é que uma
mulher não pode ser mais como um homem?”
John Grondelski (Ph.D.,
Fordham) foi reitor da Faculdade de Teologia da Seton Hall University, South
Orange, New Jersey. As opiniões expressas neste texto são apenas
suas.
(Publicado pela primeira vez
em The Catholic Thing na Quarta-feira, 7 de Setembro de
2022)
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