Pe. Mark Pilon |
Talvez a coisa mais surpreendente sobre as novas Perguntas para o acolhimento e o aprofundamento da Relatio Synodi – o pedido de
opiniões em preparação para o sínodo de Outubro 2015 – não seja o que contêm
mas a ausência de questões sobre um assunto que se poderia esperar de um
documento deste género. Entre as 46 questões, nem uma toca directamente a
questão da contracepção.
É incrível. Como é que um sínodo que lida com o
tratamento pastoral do casamento e da família nos dias de hoje consegue excluir
completamente qualquer pergunta que tenha a ver especificamente com um assunto que
tem sido central para essas mesmas questões ao longo dos últimos cinquenta
anos?
Não acredito que seja coincidência. A contracepção tem
tido um impacto inegável e grave sobre a instituição do casamento. Pode-se
argumentar que o impacto tem sido positivo, mas ninguém pode dizer que se trata
de uma preocupação marginal. E, todavia, aqui temos um documento que nem sequer
menciona a questão directamente. Há uns pontos gerais sobre o encorajamento da
generosidade no acolhimento da vida e a relação essencial entre o casamento e a
abertura à vida; e bem. Mas nunca se toca na relação evidente entre a
contracepção e o facto de muitos casamentos estarem fechados a ambos.
O documento menciona as “mudanças” demográficas e
perguntas se as pessoas têm “consciência das graves consequências” que daí
advêm, sem nunca explicitar de que mudança se fala realmente e evitando assim
usar descrições mais sérias como “suicídio demográfico” ou “inverno
demográfico”, a formulação usada por São João Paulo II.
No Humanae Vitae, esta “mudança” era entendida como sendo
uma explosão demográfica, mas hoje não é o caso. Quão importante pode ser esta
questão, se não merece mais do que uma frase na pergunta 43? Os países europeus
estão em queda-livre demográfica e o documento contém uma referência vaga e
nenhuma referência a contracepção nem aqui nem em parte alguma?
Mas não é só a crise demográfica que pede alguma
referência de contracepção e da mentalidade contraceptiva. Um dos
discernimentos centrais do Beato Paulo VI e, sobretudo, de São João Paulo II
era de que o uso de contraceptivos num casamento é destrutivo não só do sentido
procriativo mas também da sua dimensão unitiva.
Mas a aparente falta de preocupação com a questão da
contracepção parece trair uma convicção de que a instabilidade marital e a
crise das famílias tem pouca ou nenhuma relação com o facto de a vasta maioria
dos casais católicos usarem contracepção.
Mais, existe uma miopia notável em não compreender os
falhanços da catequese e das preparações para o matrimónio por todo o mundo no
que diz respeito ao mal moral que é a contracepção. E porém, enquanto o
documento inclui questões sobre a catequese e a preparação dos matrimónios no
que diz respeito à indissolubilidade do casamento, por exemplo, não existe
qualquer questão relacionada com uma correcta catequese e preparação para o
casamento no que diz respeito à contracepção - a não ser que se acredite
que a referência à “abertura à vida” cobre o assunto, o que seria absurdo.
Então o que é que se passa aqui? Durante meio século,
segmentos inteiros da hierarquia da Igreja, tanto padres como bispos, têm-se
mantido em silêncio, para não usar um termo pior, no que diz respeito à
contracepção e à preparação para o casamento. O mesmo em relação ao
confessionário. Tem sido uma revolução silenciosa. Não podiam mudar a doutrina,
por isso ignoravam os ensinamentos.
Será que isto explica o silêncio do documento sinodal?
Este ensinamento não pode ser alterado, como o Papa Francisco já disse
claramente. E porém, parece claro que muitos líderes na Igreja continuam a
manter-se cegos à verdade dos ensinamentos de dois grandes papas, de que a
contracepção é um veneno para o casamento e para a sociedade em geral.
Então qual é a solução? Faz-se o mesmo que se tem feito
ao longo das décadas, enterra-se a questão com silêncio. Fala-se vagamente da
“abertura à vida” da “generosidade” no casamento, mas não se especifica que a
contracepção leva as pessoas a estarem fechadas à vida ou egoístas em relação a
ter filhos. É como uma comissão médica a falar de SIDA sem referir que ter
relações promiscuas tem muito a ver com a sua transmissão.
A velha “Aliança Europeia”, que teve tanta influência nas
primeiras fases do Concílio Vaticano II, poderá ter voltado ao poder neste
sínodo. Os principais defensores da contracepção no Vaticano II eram
principalmente teólogos e bispos europeus que faziam parte desta Aliança
Europeia, tão bem retratada no livro “The Rhine Flows into the Tiber”.
Os nomes podem ter mudado, mas a rejeição básica do
ensinamento da Igreja sobre contracepção mantém-se. A “sensibilidade” pastoral
exige que se as pessoas querem contraceptivos, então devem tê-los. Esse não é
certamente o objectivo do sínodo, mas é uma questão que não vai desaparecer. Se
o sínodo se mantiver silencioso sobre o assunto, isso será entendido quase de
certeza como um abandono da Igreja em relação a este assunto, ao nível
“pastoral”.
A tragédia é que este sínodo poderia ter tido um impacto
positivo, não só para a renovação do casamento, mas para salvar um continente
Europeu apostado em autodestruir-se. Se não lidarmos directamente com a questão
da contracepção de forma frontal e positiva, então o Sínodo terá pouco impacto
na renovação e estabilidade do casamento, e a Europa, bem como a América e
grande parte do resto do mundo, continuará a trilhar o caminho do suicídio
demográfico, não por meio de armas de destruição maciça, mas através de pílulas
minúsculas, mas poderosas.
O padre Mark A. Pilon, sacerdote da Diocese de Arlington,
Virginia, é doutorado em Teologia Sagrada pela Universidade de Santa Croce, em
Roma. Foi professor de Teologia Sistemática no Seminário de Mount St. Mary e colaborou
com a revista Triumph. É ainda professor aposentado e convidado no Notre Dame
Graduate School of Christendom College. Escreve regularmente em littlemoretracts.wordpress.com
(Publicado pela primeira vez no Sábado, 24 de Janeiro de
2015 em The Catholic Thing)
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