Wednesday 18 June 2014

E Por Fim, o Amor?

Sempre que se fala de sexo e direito nas minhas aulas, a atitude automática dos meus alunos é de dizer que estas questões de amor e de atracção sexual são inescrutáveis e subjectivas: A razão tem pouco a ver com o assunto e por isso também não deve ser invocada para lançar juízos morais sobre o amor que se expressa através de relações sexuais.

Então coloco aos meus alunos a seguinte questão: Um homem diz-nos que se sentiu atraído pela sua mulher por causa dos seus “belos cabelos loiros, as suas feições perfeitas, que ligavam lindamente com os meus cortinados”. Mas essas feições alteraram-se ao longo dos anos e agora, explica, “estou a redecorar o apartamento todo ao estilo Art Deco e ela já não encaixa no novo visual”.

Mesmo com as sensibilidades dos jovens de hoje, esta narrativa continua a despertar risos. Já notei várias vezes a ligação entre comédia e filosofia e a forma como os humoristas ganham a vida jogando com a lógica e as nuances da linguagem. Os risos mostram que os alunos compreenderam a questão central.

Mas convém explicar. Existe aqui uma reacção natural a algo que é claramente, comicamente, fora de escala: tratar a decisão de casar ao mesmo nível que a escolha dos cortinados implica reduzir a relação matrimonial para o plano do acessório. E de igual forma seria reduzido o “amor” que essa relação assinalaria. Trata-se de um amor e de um casamento que não fazem pretensões de durar mais do que as “sensações” que, na altura, tornavam os cabelos loiros e as feições tão agradáveis. Não há aqui a menor sugestão de que “Não a deixa fanada o tempo, nem sua variedade maravilhosa poderá tornar-se, com o hábito, sediça”.

Mas falar de um amor que perdura mesmo quando as feições se perdem é falar de um “bem” não material, um bem da alma. Implica necessariamente a existência de algo no esposo que é admirável de forma duradoura, uma forma que, justamente, atrai o respeito e a afeição persistente. Mas isso implica também a existência de uma componente moral indelével no amor que é entendida desta forma – o amor no seu sentido mais sério, o amor que encontra expressão coerente no compromisso de casamento.

Estamos próximos do primeiro aniversário daquele momento, em Junho do ano passado, quando o Supremo Tribunal, em U.S. v. Windsor, deu mais um passo no sentido de destruir a instituição do casamento. Na altura ouvimos toda a gente a dizer que “as pessoas devem poder casar-se com quem amam”.

Mesmo sem ir ao fundo do sentido de “amor”, essas palavras de ordem foram imediatamente reveladas como um slogan vazio por quem quisesse questioná-las minimamente.

É impossível negar o verdadeiro amor que existe entre pais e filhos, avós e netos, e no entanto essas relações não podem ser menosprezadas só porque não encontram a sua expressão no contacto sexual, confirmado pelo casamento. E o problema dos “poliamorosos” e dos polígamos? O seu amor não se limita aos casais, mas são compostos de combinações de três pessoas, quatro, ou até mais. Porque é que estas pessoas não têm direito a casar-se com “quem amam”?

Cupido e Psyche, Orazio Gentileschi
Apesar de tudo isto, recentemente ocorreu-me que nem falamos a mesma linguagem quando os defensores do casamento homossexual discorrem apaixonadamente sobre o “amor”. Em Setembro de 2001 Gareth Kirby, editor do jornal gay-lésbico Xtra West, escreveu:

Sabemos que uma relação de 30 anos não é melhor que um caso de nove semanas ou um engate de nove minutos – é diferente, mas não é melhor... Sabemos que a intimidade instantânea envolvida naqueles 20 minutos perfeitos em Stanley Park pode ser uma coisa profundamente bela.

Tenho amigos sérios do outro lado desta barricada e tenho a certeza que não aceitariam esta definição de amor como aquela que procuram num casamento homossexual.

As palavras de Gareth Kirby aparecem citadas por Robert Reilly no seu recente livro Making Gay Okay. O título engraçado esconde o facto de este ser um trabalho sério, profundo, que recorda Aristótoles, São Tomás de Aquino e Rousseau, bem como estudos empíricos. Esses estudos confirmam, ao longo dos anos, a quantidade surpreendente de parceiros sexuais entre os homens homossexuais.

Num estudo de grande escala, em 2009, 35% dos homens “afirmaram terem tido relações sexuais com menos de 100 homens; 42% tinham tido relações com entre 100 e 499 homens e 23% com 500 parceiros ou mais.”

Mesmo os activistas mais fanáticos evitariam rotular estas relações com centenas de homens, alguns desconhecidos e com a duração de 20 minutos, como amor. A lição é que mesmo os activistas homossexuais estão dispostos a criticar padrões de comportamento que têm sido característicos da população homossexual há décadas.

Sendo esse o caso, porque há de ser inadmissível que outros levantem as mesmas interrogações críticas sobre o significado da vida homossexual? E como é que se admite que o Estado castigue quem julga, precisamente da mesma maneira que os activistas, a forma como algumas pessoas vivem a sua “orientação sexual”?


Hadley Arkes é Professor de Jurisprudência em Amherst College e director do Claremont Center for the Jurisprudence of Natural Law, em Washington D.C. O seu mais recente livro é Constitutional Illusions & Anchoring Truths: The Touchstone of the Natural Law.

(Publicado pela primeira vez na Terça-feira, 17 de Junho de 2014 em The Catholic Thing)

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