James V. Schall S.J. |
Certo dia um dos seus colegas foi insultado e desafiado por
uma mulher barulhenta e bastante pouco atraente. Era conhecida pelos seus
pontos de vista sobre a Igreja, tudo menos positivos. O homem da CTS falava
sobre confissão quando a senhora o interrompeu, em tom jocoso: “Oh, eu
conheço-vos, católicos. Os vossos rapazes vão se confessar à Igreja que fica em
frente à minha casa. A seguir vêm ter comigo para fazer amor”. Era preciso
lidar com esta mulher de forma cuidadosa.
O homem da CTS esperou para que a gravidade da acusação
tivesse o seu devido efeito. Depois respondeu, solenemente: “Minha senhora, não
fazia ideia que os padres estavam a dar penitências tão severas hoje em dia”.
Há que louvar o recurso à destreza e ao humor na teologia!
É preciso conhecer bem a prática e o ensinamento católico
para apreciar o humor nesta resposta. Muitas pessoas não acreditam no pecado e
disputam se, na prática, existe tal realidade. No entanto não deixam de acusar
os católicos de hipocrisia porque alguns deles confessam os seus pecados,
cumprem as penitências e depois, apesar das admoestações, voltam a cometê-los.
O próprio Cristo foi questionado sobre a quantidade de vezes
que se deve perdoar ao pecador. “Até setenta vezes sete”, disse, em Mateus
18,22. O Senhor parece ter ficado menos surpreendido com a existência de
pecadores insistentes do que nós. Ele percebeu, como Aristóteles, a dificuldade
que temos em ultrapassar os nossos vícios.
Cristo disse várias vezes que os rectos não precisam de
arrependimento. Ele veio salvar os pecadores, cuja existência parecia ser uma
evidência. A salvação dos pecadores pressupõe logicamente: a) a existência do
pecado (ou, melhor, que não fomos capazes de fazer o bem quando o podíamos ter
feito); e b) a existência de algum meio pelo qual esses pecados podem ser
reconhecidos e perdoados, nomeadamente uma “penitência”, seguida de
reconhecimento de culpa pelo sucedido por parte do pecador. Mais, o pecado não
é apenas uma rejeição humana e desordenada de um padrão objectivo do bem,
carrega consigo a noção de que todos os pecados são pessoais e que tocam na
verdadeira essência do pecador. Esta realidade explica porque razão nem os
homens nem os anjos podem “perdoar” os pecados, mas apenas Deus.
A desordem do pecado é algo que atinge até a divindade.
Jesus escandalizou os escribas e os fariseus ao afirmar que tinha o poder de
perdoar os pecados. Eles bem sabiam que ele estava a reclamar para si um poder
divino, que ele provou possuir implicitamente através dos milagres que fazia nestas
ocasiões.
Na verdade, as “penitências severas” serviam para mostrar que
o penitente estava consciente da desordem causada pelos seus pecados. Era tudo
o que se podia fazer para restaurar os danos causados à ordem moral. Platão já
tinha dito, e com razão, que por essa mesma razão devíamos desejar o castigo.
A ausência de penitência, severa ou outra, implica, no meu
entender, um mundo em que nada do que fazemos importa realmente. Isto é
precisamente o contrário do mundo que Deus criou. Neste mundo a sabedoria e o
pecado podem existir lado a lado. Porque quando a Palavra foi feita carne o
pecado deixou de ter a última palavra.
Será por isso que lemos nos Evangelhos que há mais alegria
no Céu por um penitente do que por 99 justos que não precisam de
“arrependimento?” (Lucas, 15,7)
Nota: Por decisão minha, retirei os primeiros dois
parágrafos deste artigo, pois para além de complexos não encontrei neles grande
ligação ao resto do texto. Contudo, para que não falte nada aos nossos
leitores, aqui ficam os dois parágrafos completos.
Filipe d’Avillez
Na audiência geral de 17 de Outubro de 2012 o Papa Bento XVI
disse que muitos problemas são causados pela compreensão incorrecta ou
incompleta de palavras precisas e sentidos de doutrina, em particular do Credo.
Pensamos que, desde que haja boas intenções, não precisamos de ser demasiado
precisos sobre o que ensinamos. Não é verdade que devemos a nossa obediência a
uma “Pessoa” e não a verdades abstractas? É verdade, desde que percebamos que a
verdade consiste numa pessoa afirmar, cuidadosamente, aquilo que é verdade e a
negar aquilo que não é.
A precisão do discurso e da definição estão na base da nossa
liberdade na lei. Cristo, como explicou Peter Kreeft no seu livro “Philosophy
of Jesus”, apresentou-se como um orador e pensador preciso. O termo “a Palavra
fez-se carne” carrega consigo uma longa história de pensamentos confusos, que
tiveram como efeito prático muitas coisas indesejáveis no nosso tempo. Dizer
“Cristo, enquanto pessoa, é a Verdade”, não nos livra de ter de falar em termos
precisos sobre quem e o que é que Ele é. Nem todas as palavras têm o mesmo
sentido.
James V. Schall, S.J., é professor na Universidade de
Georgetown e um dos autores católicos mais prolíficos da América. O seu mais
recente livro chama-se The
Mind That Is Catholic.
(Publicado pela primeira vez na Terça-feira, 25 de Junho
2013 em The
Catholic Thing)
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"Ele percebeu, com Aristóteles, a dificuldade que temos em ultrapassar os nossos vícios"
ReplyDeleteDá a ideia que Cristo aprendeu a essência da Humanidade com outro sábio... Mas como Cristo é Deus já o sabia, claro.
Rodrigo
Olá Rodrigo,
ReplyDeletePara evitar a confusão mudei para "Ele percebeu, como Aristóteles"
voltei a ler, mas pela segunda vez em simultaneo com a 'xungaria no céu'. épico.
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