Embora nada disto me faça especialista em sínodos, dá-me
uma certa perspectiva, assente na experiência, a partir da qual consigo apontar
os problemas que ameaçam tornar o próximo encontro no Vaticano uma experiência
em sinodalidade menos satisfatória do que os participantes, ou o Papa
Francisco, possam querer.
O primeiro e mais evidente problema é o tamanho.
Dizem-nos que o sínodo de Outubro vai ter 364 delegados eleitores, 120 nomeados
pelo Papa em Julho. Em contraste, os sínodos passados tendiam a ter 250
participantes, ou menos – e mesmo isso era muito.
A principal questão que isto levanta é evidente. Como é
que 364 pessoas, vindas de muitas nações e culturas diferentes, e sem qualquer
conhecimento prévio uns dos outros, podem esperar chegar a um consenso – ainda
que interino – sobre o que quer que seja em apenas 25 dias (tendo ainda em
conta que uma boa parte do tempo será dedicado a liturgias e eventos
cerimoniais)?
Claro que a resposta honesta é que não podem. E isso
aponta para o segundo grande problema. Os organizadores do sínodo – presumindo
que estão todos a agir de boa fé – provavelmente sentir-se-ão na obrigação de
apresentar qualquer coisa, com base nas notas tiradas durante as discussões e nas suas próprias ideias preconcebidas.
Com o tempo a escassear, o resultado deste trabalho será
apresentado aos participantes, já cansados, numa altura em que estes estarão à
procura de alguma coisa – qualquer coisa – para mostrar como fruto da primeira
fase do Sínodo da Sinodalidade. Infelizmente, porém, todo o processo
contribuirá ainda para reforçar as suspeitas que já existem de manipulação.
E recordem-se, entretanto, que já está agendado para
Outubro de 2024 um segundo sínodo, provavelmente definitivo. Se a primeira fase
está a tornar-se grande e impraticável, é difícil ver como a segunda pode
escapar a um destino igualmente infeliz e inconclusivo.
O terceiro problema tem a ver com secretismo – ou, talvez
seja mais correcto dizer uma ausência demoralizante de transparência. Na
preparação de sínodos passados, a Conferência Episcopal dos Estados Unidos
optou por eleger os seus delegados em sessões abertas das suas assembleias
gerais, na presença dos jornalistas. O Vaticano não gostava disso, mas os
bispos persistiram.
Desta vez, aparentemente para cumprir com as regras do
Vaticano, os bispos americanos escolheram os seus delegados em sessões secretas
e os nomes só foram divulgados quando a Santa Sé anunciou os restantes
participantes. Quanto à informação durante o encontro de Outubro, resta saber
como é que o Vaticano lidará com isso, mas a preferência por secretismo e
centralização revelada até agora não dá grande confiança de que este encontro
vai ser aberto e transparente.
De acordo com o documento de trabalho para o sínodo, as
consultas pré-sinodais revelaram vários temas mais ou menos sensíveis para
colocar em cima da mesa, incluindo padres casados, diaconisas e o ministério para pessoas LGBTQ+. Nesse contexto, é de notar que para além dos cinco bispos
americanos escolhidos pelos seus pares como delegados, o Santo Padre nomeou
outros cinco que são normalmente considerados particularmente em linha com as
suas opiniões.
Claro que o Papa está no seu direito, mas há aqui uma
certa tensão com a imagem do sínodo como um processo sem um desfecho
predeterminado e onde todos são livres de manifestar a sua opinião.
Por fim, deixa-me oferecer uma observação pessoal sobre
este exercício eclesial.
Temos ouvido dizer repetidamente que o resultado desejado
de todo este processo é uma Igreja sinodal equipada para evangelizar as
periferias. Muito bem. Mas que mensagem é essa que queremos fazer chegar às
periferias? “Juntem-se a nós num enorme processo de consulta a que chamamos
‘Igreja’"? Espero francamente que não.
Em busca de uma resposta melhor, recorri à poderosa
encíclica Fides et Ratio do Papa João Paulo II, de 1998. Aí encontrei algumas
questões que, segundo João Paulo, as pessoas sempre colocaram: Quem sou eu? De
onde vim e para onde venho? O que há depois desta vida? Porque é que existe o
mal?
Estas podem bem ser questões perenes, mas há muitas
razões para pensar que hoje muitas pessoas – incluindo muitas que estão nas
periferias – já não as colocam. Em vez disso, o canto da sereia desta nossa
cultura secularizada, distrai-os com imagens, sons e apelos constantes ao
consumo que os movem a fazer outro género de perguntas: Como é que posso obter?
Como posso guardar? Como posso gozar? O que é que eu quero, ainda sem o saber?
Se aquilo que eu disse está certo, segue-se que a Igreja
sinodal deve reconhecer essas questões sobre obter, guardar, gozar e
aprender a querer e tê-las como ponto de partida para levantar as tais questões
perenes. Por outras palavras, muito mais do que as habituais questões
prementes, terá de abordar – de forma urgente – a evangelização, como dizer às
pessoas, com amor e convicção, que hoje, como sempre, as respostas que procuram têm um nome
e uma face humanas: Jesus Cristo.
Russell
Shaw é autor de Papal Primacy in the Third
Millennium (2000).
O seu mais recente livro é American Church: The Remarkable
Rise, Meteoric Fall, and Uncertain Future of Catholicism in America (2013).
(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na Quinta-feira, 27 de Julho de 2023)
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