Patrick Beeman |
Nesta época de Todos os Santos e dos Fiéis Defuntos
devemos recordar aqueles que tiveram uma grande influência nas nossas vidas espirituais.
Há um homem a quem eu estou particularmente agradecido.
A 19 de Setembro de 1997 tinha eu 14 anos. Estava
precisamente no meio dessa crise hormonal à qual chamamos puberdade, e no
início de uma crise de fé (que acabaria por me conduzir à Igreja Católica),
quando soube que Rich Mullins, autor de músicas como “Awesome God” e “Sing Your Praise to the Lord”,
tinha morrido num trágico acidente de carro. A notícia foi divulgada numa
estação de rádio cristã, e devastou-me.
O meu pai trabalhou numa rádio cristã durante grande
parte da minha infância e em nossa casa não se ouvia música secular. Quando
cheguei à adolescência, comecei a pensar nas grandes questões da vida: Deus,
verdade, fé, o sentido da vida. Senti-me imediatamente atraído às letras profundas
das músicas de Mullins e à beleza e clareza com que ele expressava a fé cristã.
Quanto mais ouvia, mais me sentia atraído pela sua vida
extraordinária, uma vida marcada pelo total abandono a Deus e alegria cristã
irreprimível, que são nada mais nada menos que os materiais que Deus usa para
escrever a história de um santo.
Rich Mullins tinha uma vertente ecuménica corajosa, um
sinal de contradição no meio da subcultura evangélica de que fazia parte e que
tinha, em parte, ajudado a edificar. Trilhava a fronteira entre o Catolicismo,
por um lado, com uma visão sacramental do mundo e o cheiro a incenso, imagens
de santos, corpo e sangue de Cristo sob a aparência de pão e vinho e, por outro
lado, (na medida do que tem de bom), as tendências anti litúrgicas e
iconoclastas do Cristianismo Evangélico. Aos 40 anos abraçou o celibato, em
forte contraste com a tendência geral protestante de ignorar esta opção tão
bíblica e viva de seguir a Cristo de forma apostólica.
Mullins abordou a sua vocação como um monge (ou
melhor: como os mendicantes dos quais cantava em “Land of My Sojourn”),
dando particular atenção às virtudes evangélicas da pobreza, castidade e
obediência. Para poder viver neste espírito, vendeu literalmente todas as suas
posses, tirou um curso de educação musical e mudou-se para uma reserva Navajo,
para servir o povo e ensinar nas suas escolas. Tinha ainda em comum com os
católicos o facto de ser um devoto de São Francisco.
Foram as suas tendências franciscanas que mais me
marcaram. Eram estranhas para a minha mente evangélica na mesma medida em que
eram estranhas à minha experiência de vida numa igreja não-denominacional.
Fazer-se pobre, abdicar do casamento, imagens de Nossa Senhora nas capas dos álbuns,
gosto pelo litúrgico, crença na presença real... Não são propriamente as marcas
típicas da teologia evangélica. Mas para mim soavam a verdade. Sem o perceber
sequer, estava a começar a aproximar-me de tudo o que me parecesse minimamente
católico.
Admirava o Rich Mullins como um filho admira um pai, pela autenticidade da sua fé. E sentia uma proximidade semelhante à que se sente para com um mentor ou director espiritual. Mas claro que nem nos conhecíamos. Lembro-me vagamente de lhe ter sido apresentado uma vez, quando era criança, quando ele actuou numa igreja, num concerto apoiado pela rádio onde o meu pai trabalhava.
Admirava o Rich Mullins como um filho admira um pai, pela autenticidade da sua fé. E sentia uma proximidade semelhante à que se sente para com um mentor ou director espiritual. Mas claro que nem nos conhecíamos. Lembro-me vagamente de lhe ter sido apresentado uma vez, quando era criança, quando ele actuou numa igreja, num concerto apoiado pela rádio onde o meu pai trabalhava.
Lembro-me de o ver descalço no palco com a sua
guitarra. Queria ser como ele. E ele queria ser como São Francisco. Isto pôs
fim a qualquer objecção que eu poderia ter em relação ao culto aos santos ou
forma como o Catolicismo encorajava a oração por sua intercessão. A devoção que
Rich tinha por São Francisco não retirava nada ao seu Cristianismo. Enchia-o de
vigor e de vida. Tornava o seu amor por Cristo mais forte e mais cristão. É
esta a lógica da devoção aos santos.
A sua morte tocou-me profundamente. Daquela forma
paradoxal que marca tantas verdades do Cristianismo, a morte de Rich deu-lhe ainda
mais vida. É o eco da oração de São Francisco: “É morrendo que se nasce para a
vida eterna”. À medida que o tempo passava, comecei a sentir uma ligação com
ele que era muito mais profunda que o sentimento de perda. Já pensei se isso
não será porque ele estava a rezar por mim, como certamente São Francisco
intercedia por ele.
No final da sua vida, Mullins estava com um pé
dentro da Igreja Católica. Tragicamente, a sua morte aconteceu apenas três dias
antes da data em que planeava entrar em comunhão plena.
As tempestades da juventude trazem sempre uma chuva forte
de curiosidade e de algum descontentamento. Mas para mim a música de Rich
Mullins era como o trovão que se segue aos relâmpagos de verdade que estavam a
atingir-me na minha caminhada em direcção à Igreja. Felizmente para os meus
pais a minha rebelião adolescente consistiu quase por inteiro da minha
conversão ao Catolicismo. Devo ter passado demasiado tempo com a malta errada:
nomeadamente São Francisco e o seu irmão mais novo, Rich Mullins.
Saiba mais sobre o musical de Rich Mullins, baseado
na vida de São Francisco de Assis.
Patrick C. Beeman é obstetra e ginecologista na região de
St. Louis. Quando não está a fazer partos, escreve sobre bioética, música,
medicina e cultura.
(Publicado pela primeira vez domingo, 2 de Novembro de
2014 no The
Catholic Thing)
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