“Ficaram muito espantados e perguntavam uns aos outros:
‘O que é isto?
Um ensinamento novo dado com autoridade: Ele manda até
nos espíritos maus, e eles obedecem!’” Não devemos simplesmente passar por cima
deste espanto e admiração, como se isso fosse apenas Jesus a ser Jesus, antes
devíamos pensar no que o causou.
A autoridade está no centro da vida e da missão do
Senhor, e está também no centro dos seus conflitos com os líderes de Israel. A
legitimidade da sua vida pública – e, na verdade, da sua própria Pessoa –
resume-se a esta simples questão: “Com que autoridade fazes estas coisas, ou
quem te dá autoridade para as fazer?” (Marcos 11,28).
Os chefes dos sacerdotes, escribas e anciãos fazem essa
pergunta no final da vida pública de Jesus. Mas a questão estava na ordem do
dia desde o início. Logo no princípio do seu ministério na Galileia, sob o
olhar crítico dos escribas e dos fariseus, Jesus curou um paralítico, demonstrando
que “o Filho do Homem tem a autoridade de perdoar os pecados na terra” (Marcos
2, 10). Isto é, tem autoridade divina.
No Evangelho de João, o seu ministério público começa com
a questão da sua autoridade sob o Templo. “Que sinal nos dás para fazer isto?”
(João 2,18). Em resposta, Jesus estabelece a prova que será dada, a prova de
que tem autoridade até sobre o Templo. “Destruí este templo, e em três dias eu
o reedificarei” (João 2, 19). Assim, promete a sua ressurreição como prova da
sua autoridade divina.
Com que autoridade? Essa é a questão central. Hoje, um
ouvido moderno entenderá isto como uma pergunta retórica que descarta a própria
noção de autoridade. Mas, pelo contrário, os contemporâneos de Nosso Senhor
apreciavam a realidade da autoridade, ainda que abusassem dela (como acontece
com os homens em todas as idades). Eles compreendiam que existe uma autoridade
divina e uma autoridade terrena. Tinham era dificuldade em acreditar que o
carpinteiro de Nazaré a possuía.
Também não devemos pensar na autoridade de Cristo como
algo que Ele meramente possui (como se de alguma forma fosse possível não a
possuir). A razão pela qual é central para a sua missão e vida pública é porque
faz parte dele, parte do seu ser Filho de Deus. Ele é a Palavra de autoridade
de Deus, o autor de todas as coisas, e revela o Pai, com autoridade e
autenticidade, porque está eternamente no seio do Pai.
Isto também aponta para o propósito da autoridade de
Cristo. Ela está ordenada para o nosso bem, que no final de contas é a
reconciliação com o Pai. Como vemos na sinagoga em Cafarnaum, Jesus exerce a
sua autoridade para ensinar e para curar; para comunicar verdade e graça. Verdade
para iluminar e graça para santificar. A maior verdade que comunica é a
revelação de Deus enquanto Pai, e de Ele mesmo enquanto Filho eterno. A maior
graça que comunica é ter parte na vida do Pai, tornando-nos “participantes da natureza
divina” (2 Pedro 1, 4).
A realidade e a gravidade da autoridade da Igreja
deveriam humilhar os seus pastores, que a exercem em nome de Cristo. O seu
dever não é o de reinterpretar o Evangelho, ou de mudar paradigmas, mas de
transmitir fielmente a verdade e a graça que vêm do Pai.
Um dos frutos mais nefastos do pensamento moderno é a
confusão de autoridade com poder, levando-nos a crer que tudo não passa de um
golpe de poder. Assim, quem possui autoridade é por isso mesmo um opressor. A
autoridade é sempre autoritária. Logo, a autoridade das instituições e do
próprio passado devem ser desmantelados, por não passar de um instrumento dos
opressores.
Como todas as revoluções, esta contra a autoridade acaba
por comer os próprios filhos. Tendo rejeitado o princípio da autoridade, o
pensamento moderno veio a desconfiar da autoridade do próprio pensamento.
(Haverá alguma disciplina nas universidades que não seja considerada opressora
e a precisar de ser desconstruída?). Ironicamente, é a Igreja Católica – a mais
autoritária e opressiva das instituições – que entra em campo e confirma que
sim, na verdade, a mente humana é capaz de alcançar a verdade. A autoridade da
Igreja vem libertar a mente humana dos grilhões do cepticismo.
“Não queremos que este homem seja nosso Rei” (Lucas
19,14). Estas palavras, de uma das parábolas mais assombrosas do Senhor,
expressam bem a rejeição autodestrutiva da autoridade de Cristo. A alma fiel,
contudo, longe de desprezar essa autoridade, deseja submeter-se a ela. Sabemos
que, não fosse a sua autoridade sobre nós, estaríamos ainda mergulhados no erro
e no pecado. Quanto mais Cristo domina sobre nós com a sua autoridade, mais
claramente vemos a verdade e mais livremente vivemos pela graça. E, quanto mais
nos submetemos à autoridade da sua verdade e graça, mais nós mesmos nos
tornamos pessoas que falam e agem com autoridade.
O Pe. Paul Scalia é sacerdote na diocese de Arlington,
pároco da Igreja de Saint James em Falls Church e delegado do bispo para o
clero.
(Publicado pela primeira vez no domingo, 28 de Janeiro de
2024 em The Catholic Thing)
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