É assim que a resposta aparece
na notícia publicada
na Renascença:
Questionado se a resolução
do problema pode passar pela suspensão imediata dos alegados padres abusadores
de menores, Manuel Clemente respondeu: "Essa é uma pena muito grave, é a
mais grave que a Santa Sé poderá dar e é a Santa Sé que a poderá dar".
"Se nós tivermos
factos, e factos comprovados e sujeitos a contraditório, claro - nós estamos
num país de direito e de leis - só pode ser feita pela Santa Sé, não é uma
coisa que um bispo possa fazer por si", referiu.
Estamos aqui perante duas
coisas completamente diferentes, e não é preciso ser especialista em direito
canónico para o perceber. Por um lado, a suspensão preventiva de um padre do
ministério, enquanto se investiga um caso. Por outro, a demissão de um padre do
estado clerical, ou a suspensão definitiva, enquanto sentença de um caso
transitado em julgado.
Por isso, quando o bispo auxiliar de Braga, D. Nuno Almeida, publica este artigo referindo a possibilidade de o bispo poder afastar um padre acusado de abusos, não está a contradizer - embora pareça - o Patriarca, porque o Patriarca estava a referir-se a outra coisa.
Vejamos então, passo-a-passo,
o que deve acontecer quando há uma denúncia de abuso sexual de menores.
1. A diocese recebe a denúncia
e, rapidamente, avalia se ela é credível. Ser credível não significa que tem de
haver provas irrefutáveis, significa apenas que a acusação não é absolutamente inverosímil
ou fútil. Exemplo: Há uns anos o padre de Cacilhas foi denunciado por abusar de
uma criança num jardim de infância. A diocese investigou e rapidamente se
concluiu que o padre em questão nem sequer esteve no jardim de infância no dia
da acusação. Não há credibilidade, o assunto morre ali.
2. Caso haja alguma
credibilidade na denúncia, será necessário proceder a uma investigação mais
aprofundada. A partir desta altura o padre não só pode, como deve ser suspenso
preventivamente. E, note-se, é o bispo que o deve fazer. Não é
preciso qualquer envolvimento da Santa Sé. Claro que isto não é uma declaração
de culpa, é apenas uma medida preventiva enquanto decorre a investigação. Nalguns
casos, até como forma de mostrar vontade de colaboração, é o padre que pede à
diocese que seja afastado do ministério enquanto o processo decorre, mas essa é
sempre uma prorrogativa do bispo, que pode impor a suspensão unilateralmente.
3. Concluída a investigação há
duas hipóteses. A primeira é que o caso pode ser considerado manifestamente
falso, e nesse caso a diocese pode arquivar. Em todos os outros casos, seja
porque existe alguma dúvida, ou porque existe mesmo quase certeza de culpa, o processo
é enviado para o Dicastério para a Doutrina da Fé, em Roma, que é quem tem
autoridade para lidar com estes casos. Nos últimos anos tem sido feito um
grande esforço por parte do dicastério para tratar destes assuntos com a maior
celeridade possível, e não é costume os processos demorarem mais do que dois ou
três meses, como se viu nos casos recentes em Portugal.
4. De Roma vem uma decisão e a
respectiva sentença, ou eventualmente um pedido de aprofundamento. Uma das
possíveis sentenças, nos casos em que se dá como provado o abuso de menores, é
a demissão do estado clerical. Só pode ter sido a isto que D. Manuel Clemente se
referia quando falou de “pena muito grave”, até porque a suspensão preventiva
não é uma pena, mas sim uma medida cautelar. Contudo, mesmo aqui há um engano,
porque na verdade ela não é “a pena mais grave que a Santa Sé poderá dar”, pois
a pena mais grave, seja para um clérigo, seja para um leigo, é a excomunhão.
Devo dizer que não sou formado
em direito canónico, nem civil. É possível que haja aqui uma questão semântica,
e que “suspensão”, tecnicamente, seja apenas referente à pena definitiva e não à
medida cautelar. Tenho dúvidas, até porque os próprios comunicados do
patriarcado costumam usar o termo “suspensão”, mesmo nos casos em que é o
próprio acusado que o pede. Contudo, mesmo que assim seja, agora não é o tempo
de tecnicalidades, é preciso é que as coisas fiquem bem explicadas. Se existe
esse dado, então também isso pode e deve ser explicado de forma simples, usando
a linguagem apropriada. Agora, deixar uma confusão destas no ar é que nunca é a
solução.
Ainda hoje publiquei
outro texto sobre a conferência de imprensa da passada sexta-feira em que terminava
a pedir que os bispos tratem de uma vez por todas de arranjar quem os ajude
profissionalmente com a comunicação, ou se já os têm, que os ouçam. Lisboa é
dos casos em que sei que tem sido feito muito nesse sentido.
Há de sempre acontecer haver
casos de mensagens cruzadas ou até de erros de comunicação. Os patriarcas não
estão livres disso… O que não se compreende é que passadas 24 horas não haja
uma nota do Patriarcado a esclarecer que – seja de quem for a culpa, Patriarca
ou jornalistas – a mensagem que passou está factualmente errada e fazer os
devidos esclarecimentos.
E para que fique claro que
isto é assim, vejamos os seguintes exemplos recentes:
- No dia 27 de Janeiro o padre André Filipe da Costa Gonçalves, da diocese de Viana do Castelo, foi suspenso – a seu pedido – depois de ter sido confrontado com uma denúncia de abuso sexual de um menor. Encontra-se suspenso enquanto o processo decorre.
- No dia 7 de Outubro o padre Luís Cláudio Ferreira dos Santos foi suspenso da sua actividade sacerdotal no Patriarcado de Lisboa enquanto esperava o desenrolar de um processo que acabou por ser arquivado.
- Em Agosto o padre João Cândido da Silva, de Lisboa, foi suspenso enquanto aguardava o resultado de uma investigação de violação de uma mulher, maior de idade. Não se trata de um caso de abuso de menores – embora aparentemente o padre esteja a ser investigado também nesse âmbito pela PJ – mas o caso revela mais uma vez a possibilidade de suspensão sem necessidade de ingerência da Santa Sé.
- Em Outubro de 2022 um padre foi suspenso enquanto a diocese do Algarve investigava uma acusação contra ele, da qual foi posteriormente ilibado.
- O padre Luís Miguel da Costa, de Viseu, está suspenso do seu ministério sacerdotal enquanto decorre a investigação sobre o envio de uma mensagem a solicitar um acto sexual a um menor. O processo ainda decorre.
- O padre Duarte Andrade e Sousa pediu a suspensão do seu ministério enquanto era investigado por envio de mensagens de teor impróprio para um grupo que incluía menores de idade. O processo foi arquivado tanto civil como canonicamente.
- Em Janeiro de 2022 o Pe. Manuel Machado foi afastado de toda a actividade enquanto aguardava o desenrolar de um processo canónico por abuso de menores. O processo foi mais tarde interrompido quando o padre pediu para ser demitido do estado clerical.
Os crentes deviam organizar-se e não dar nem mais um cêntimo de ofertas a esta hierarquia podre, só para não ofender ninguém.
ReplyDeleteEles só percebem a linguagem do dinheiro. Que cheiro a esturro.