Friday, 24 February 2023

Vigílias em Lisboa e retransmissores de Moscovo

Por mais que alguns estejam fartos, o grande tema continua a ser o Relatório da Comissão Independente. Ontem houve vigílias em vários pontos do país em que os católicos oraram em silêncio pelas vítimas, pela Igreja e pelos padres. O Patriarca de Lisboa esteve na vigília em Lisboa.

Antes disso D. Manuel Clemente celebrou missa de Quarta-feira de Cinzas e sublinhou que nesta questão dos abusos “não podemos falhar de modo algum”, utilizando ainda os termos “tristeza, vergonha, arrependimento”.

Como é que a Igreja deve receber os dados constantes deste relatório? Que leitura deve fazer de algumas das suas conclusões? O que vem a seguir? Foi sobre isso que conversei com o Octávio Carmo, jornalista da Ecclesia, no episódio da semana passada do podcast Hospital de Campanha. Se este assunto vos interessa – e se não interessa, devia interessar – ouçam esta conversa, mesmo!

Estive também no programa da Agência Ecclesia que foi para o ar na Sexta-feira passada a falar desta questão, desta vez com o Pedro Gil, do gabinete de imprensa da Opus Dei. Podem ver aqui.

A informação constante do relatório já me permitiu actualizar o post em que elenco todos os casos de abusos – ou alegados abusos – que houve em Portugal nas últimas décadas e já sabem que podem sempre consultar a cronologia que mantenho sobre este assunto desde 2012, e que também vai sendo actualizada.

Se acham que eu levo muito na cabeça por escrever sobre a questão dos abusos, então nem imaginem a porrada que às vezes levo pelas minhas posições críticas que assumo em relação à Igreja Ortodoxa Russa e o seu papel na guerra da Ucrânia, nomeadamente do seu Patriarca. Foi por isso com algum espanto que ontem li num artigo de opinião no Observador que há quem me considere “responsável por retransmitir a voz da Igreja Ortodoxa de Moscovo para o mundo católico”. Isto a propósito da minha recente entrevista ao bispo da Igreja Ortodoxa Russa para Portugal e Espanha, que entretanto foi publicada em versão portuguesa no Expresso. Já enviei para o Observador um curto artigo de esclarecimento, que espero poder partilhar convosco para a semana.

Deixo-vos, por fim, com o artigo desta semana do The Catholic Thing, em que John M. Grondelski explica porque é que mandamos celebrar missas pelos defuntos. Um artigo que vem mesm
o a calhar para uma altura em que começamos a caminhada quaresmal.

O que me leva à seguinte questão… Santa Quaresma para todos. Que seja um período de aprofundamento espiritual! Até para a semana, se Deus quiser.

Wednesday, 22 February 2023

“Esta Missa é celebrada em sufrágio pela alma de X”

John M. Grondelski
A frase que dá título a este artigo é tão comum que a maioria dos católicos nem se deve dar ao trabalho de pensar sobre o seu significado. Arriscaria dizer que muitos dos que estão presentes nas igrejas não conseguiriam explicar o que o padre está a dizer, para além de “estamos a rezar por X”. E embora isso seja verdade, há muito para além disso que uma geração anterior de católicos talvez pudesse articular, mas que, temo, a actual não consegue.

Porque é que rezamos por X?

Rezamos por X porque ele está morto e já não se pode valer a si mesmo. Isso não significa que os mortos estão simplesmente deitados, passivos. Invocamos os santos no Céu e pedimos as suas orações, eles também já morreram, mas acreditamos que nos podem ajudar.

Então porque é que rezamos por X?

Porque ele não se pode ajudar a si mesmo.

Teólogos de outros tempos poderiam ter escrito algo como “no mistério da economia da salvação de Deus, os mortos podem ajudar os outros através das suas orações, mas não se podem ajudar a si mesmos”. Essa explicação, porém, parece reduzir Deus a um fazedor de regras que “obriga” as pessoas a serem caridosas umas para com as outras, evitando que se possam ajudar a si mesmas. O problema é que isso não é verdade.

Podemos ajudar os outros porque é uma forma de caridade – no verdadeiro sentido teológico, e não apenas como quem dá dinheiro para uma boa causa. Mas mudar-nos a nós mesmos implica sermos verdadeiramente nós mesmos e, depois da morte, já não o somos. Os humanos são seres corporais e espirituais. A minha alma pode estar no purgatório, mas o meu corpo está no cemitério de Santa Gertrude.

É por isso que no Credo dizemos “creio na ressurreição dos mortos” e não apenas “na vida eterna da alma”. Foi toda a pessoa – corpo e alma – que me fez ser bom ou mau. Toda a pessoa – corpo e alma – deve agora partilhar o meu destino eterno.

Vemos, assim, que a alma não é capaz de se valer a si mesma, uma vez que é preciso a pessoa por inteiro – corpo e alma – para agir, o que já não é possível. Nós, porém, que continuamos a ser pessoas completas neste mundo e podemos por isso praticar a caridade, podemos ajudar os nossos entes queridos que já morreram.

O que por sua vez significa que devemos apreciar a absoluta importância da corporificação e da sua relevância para a vida neste mundo e no mundo que há de vir. Não obstante o cartesianismo e a dualidade que deturpam o pensamento ocidental, contrariamente a todas as ideologias da “identidade” que depreciam o corpo ou acreditam que este pode ser alterado através da vontade, o corpo tem valor.

(Claro que isto levanta uma série de questões sobre outras práticas funerárias actuais, desde a aceitação em larga escala da cremação à destruição deliberada – compostagem – do corpo para transformar o Tio Zé em solo. Mas deixemos isso para outro artigo.)

Percebemos, então, que devemos rezar pelos mortos. Mas porquê oferecer uma Missa?

Será porque “onde dois ou três se reunirem em seu nome” – e nós somos uma “comunidade”? Ou talvez porque algumas pessoas pensam que a oração comunitária multiplica a eficácia. Talvez para recordar o nosso antigo paroquiano que costumava vir à missa das 9h30, e se sentava ali mesmo?

Não.

Oferecemos “Missa por sufrágio da alma de X” porque a Eucaristia é um sacrifício, uma re-presentação do sacrifício de Cristo na Cruz, uma oferta do Preciosíssimo Dom que Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, ofereceu em e com o seu Verdadeiro Corpo e Sangue, que se torna verdadeiramente presente aqui e agora neste sacramento e que é verdadeiramente parte da grande dádiva de si mesmo “por nós e por nossa salvação”.

A compreensão, sequer, deste último parágrafo pressupõe uma compreensão da Eucaristia como sacrifício, e nos termos da Presença Real. Uma sondagem da Pew, de 2019, revelou que 69% dos católicos americanos contemporâneos pensam que a Eucaristia é apenas um símbolo. Se os autores da pesquisa tivessem perguntado, acredito que teriam descoberto uma iliteracia teológica equivalente no que diz respeito à Missa enquanto sacrifício.

Se não compreendermos a Eucaristia como um sacrifício em que Jesus Cristo se faz presente de novo, aqui e agora, corpo e sangue, alma e divindade, então também não podemos compreender a ideia do sufrágio pelos mortos, nem como ou porque é que a Missa pode contribuir de facto para o repouso da alma de X.

Se a Eucaristia não passa de uma refeição comunitária que nos une “simbolicamente” e nos recorda de Jesus, bem como dos nossos entes queridos, então na prática não passamos de protestantes. A ideia católica do verdadeiro valor da oração – em especial da Missa – pode, nesse caso, servir como pensamento piedoso, mas não é nada de real. Não faz sentido.

Tenho argumentado que a falta de uma compreensão católica do valor da Eucaristia como oferta sacrificial pelos mortos é a razão pela qual, sem saber verdadeiramente porque estamos num enterro ou numa Missa, os queremos transformar em “memoriais” que servem “tanto para os vivos como para os mortos”, uma mera recordação de boas memórias e frases sentimentais sobre “um sítio melhor” sem que as palavras tenham um verdadeiro sentido profundo. A necessidade dessas memórias alicerça-se hoje em dia na ausência de uma vigília tradicional, ou na substituição de corpos por fotografias em funerais pós-cremação.

Os bispos americanos começaram um “reavivamento eucarístico” em resposta ao escândalo de mais de dois terços dos católicos não compreenderem a Presença Real. Essas pessoas também não compreendem a Eucaristia como a Presença Real oferecida em sacrifício, e como isso agora serve para sufrágio da alma de X. Até que a verdadeira teologia eucarística seja recuperada e ensinada em larga escala, inteiras secções de doutrina católica continuarão a ser “mistérios”, não no sentido próprio das dimensões suprarracionais do divino, mas de iliteracia religiosa. Incluindo compreender porque é que “Esta Missa é celebrada em sufrágio pela alma de X”.  


John Grondelski (Ph.D., Fordham) foi reitor da Faculdade de Teologia da Seton Hall University, South Orange, New Jersey.  As opiniões expressas neste texto são apenas suas.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na Segunda-feira, 20 de Fevereiro de 2023)

© 2023 The Catholic Thing. Direitos reservados. Para os direitos de reprodução contacte: info@frinstitute.org

The Catholic Thing é um fórum de opinião católica inteligente. As opiniões expressas são da exclusiva responsabilidade dos seus autores. Este artigo aparece publicado em Actualidade Religiosa com o consentimento de The Catholic Thing.

Tuesday, 21 February 2023

Vigília de Oração a propósito dos Abusos Sexuais na Igreja

A divulgação do relatório da comissão independente sobre os abusos sexuais contra menores na Igreja não pode deixar nenhum católico indiferente.

À vergonha que colectivamente sentimos, junta-se a necessidade de, enquanto membros da Igreja, manifestar às vítimas e seus familiares o nosso pedido de perdão, pela passividade e omissão de vigilância, cuidado, atenção e acolhimento em que incorremos.

Independentemente de todas as iniciativas futuras que se impõem, em vários níveis, queremos desde já manifestar sentidamente esse pedido de perdão com uma iniciativa que se pretende simples, mas verdadeira, e que, com muita propriedade, desejamos que marque o início da Quaresma que se aproxima.

Pretendemos assinalar a nossa comum responsabilidade, enquanto leigos, pelos caminhos da Igreja.

Sublinhar a emergência e a exigência com que esperamos as respostas das estruturas e responsáveis da Igreja em Portugal.

Demonstrar-lhes a nossa solidariedade para que saibam (e sintam) que não estão sozinhos no caminho das transformações corajosas que são necessárias.

Queremos afirmar o nosso compromisso em não deixar que o silêncio volte a imperar.

Assim, convidamos os católicos portugueses, leigos, religiosos e ministros ordenados, a juntarem-se em vigília de oração silenciosa em frente à principal igreja da sua cidade ou vila, na próxima Quarta-feira de Cinzas, dia 22-2-2023, das 21 horas às 22 horas.

Sugere-se que tragam uma vela acesa.

Não haverá discursos.

Em Lisboa, essa vigília ocorrerá em frente ao Mosteiro dos Jerónimos

No Porto, junto à Torre dos Clérigos

Em Braga, na Igreja dos Congregados

Em Coimbra, na Sé Nova

Em Fátima, na Igreja Paroquial

Em Oeiras, em frente à Igreja Matriz

Em Santarém, em frente à Igreja do Seminário

Em Évora, em frente à Igreja de Santo Antão, praça do Giraldo

Em Beja, junto ao monumento do Largo do Carmo

Em Ponta Delgada, no Santuário da Esperança

No Funchal, em frente à Igreja do Colégio

Em Palmela, na Igreja de São Pedro (das 19h-21h)

Convidamos todos os grupos da Igreja em Portugal, de qualquer natureza, a associarem-se e a divulgar esta iniciativa.

Um grupo de católicos,

Ana Rita Bessa

José Miguel Cardoso da Costa

André Folque

Mafalda Folque

Diogo Alarcão

Margarida Neto

Diogo Caldeira Pinto

Margarida Olazabal Cabral

Francisco Costa Macedo

Miguel Toscano Rico

João Pedro Tavares

Paulo Câmara

João Pereira Bastos

Sofia Galvão

Joaquim Pedro Cardoso da Costa

Teresa Olazabal Cabral 

Monday, 20 February 2023

Participação em A Fé dos Homens, com Pedro Gil

Estive com o meu amigo Pedro Gil no programa A Fé dos Homens, na passada sexta-feira, na RTP2 a falar sobre a questão do relatório. 

Podem rever o programa todo aqui.


Friday, 17 February 2023

O relatório, obviamente

Há sempre quem prefira fechar os olhos
Já saiu o relatório, e não se fala de outra coisa. Também eu passei os últimos dias a analisar o tema e tenho já vários textos e comentários escritos sobre ele.

Aqui podem ser as minhas primeiras reflexões sobre o relatório e as suas conclusões. Tentei, na medida do possível, relevar questões e pontos que não tinha visto sublinhados noutros locais.

Nestas alturas há sempre duas atitudes a tomar. A de abertura às críticas, procurando absorvê-las para crescer com elas e tornar a Igreja mais pura, mais santa, e a atitude contrária, de entrincheiramento, de rejeição, de suspeição sobre tudo o que é mais crítico. Esta segunda atitude já se começou a manifestar, alimentada por quem pensa que a Comissão e o relatório mais não são do que um instrumento de ataque à Igreja. É pena. Nessa linha muitas pessoas têm-se escudado num artigo espanhol que lança muitas dúvidas sobre o rigor do relatório e da sua metodologia. Achei que seria pertinente escrever um texto a analisar esse tal artigo espanhol e a mostrar porque é que discordo do cepticismo do autor.

Isto não significa que o relatório não tenha falhas e fraquezas. Nas reflexões sublinho algumas, mas que não são directamente culpa dos autores, mas neste texto mostro como alguns dos dados do relatório, nomeadamente as tabelas que pretendem mostrar o número de abusadores e a sua classificação, estão mal feitos, incompletos e incluem erros básicos.

Também escrevi sobre o relatório para o jornal online The Pillar.

O episódio desta semana do Hospital de Campanha é naturalmente sobre este tema. O Octávio Carmo ajudou-me a dissecar o relatório e a sublinhar os seus principais pontos. Ouçam, que vale muito a pena!

Entretanto, partilho convosco a iniciativa de um grupo de católicos que está a promover a realização de vigílias de oração em várias cidades do país na noite de Quarta-feira de Cinzas. Já há local para Lisboa, Oeiras e Santarém. Se mais alguém quiser organizar na sua vila ou cidade, avisem-me que eu meto a informação no post.

Especialmente numa altura destas, é preciso também ir procurar fontes de inspiração. O artigo desta semana do The Catholic Thing fala de como aquilo que nos define não são as nossas preferências ou fantasias, mas sim o amor infinito de um Deus que corre loucamente atrás de nós cada vez que nos desviamos do caminho. Leiam, é um bálsamo.

Hospital de Campanha - O Relatório

Neste episódio abordámos, claro está, o relatório da Comissão Independente, sobre os abusos na Igreja. 

A Inês não esteve presente, mas contei com a companhia do Octávio Carmo, que já tinha estado connosco há quase um ano para falar da reforma da Cúria

Há muito a dizer sobre o relatório, sobre a sua metodologia, as suas conclusões, os testemunhos que apresenta e, mais importante que tudo, como a Igreja deve reagir. Para este episódio voltámos a contar com a participação do Octávio Carmo, jornalista da Ecclesia, para uma conversa que vale bem a pena ouvir, sobre um tema que todos preferíamos que não existisse.

Sobre este tema sugiro ainda a leitura dos seguintes artigos: 

Reflexões sobre o relatório da Comissão Independente

Vigílias de oração a propósito dos abusos sexuais na Igreja

O Relatório e o artigo do Religión en Libertad

Afinal quantos padres abusadores é que o relatório encontrou?

Abusos em Portugal - O que sabemos e o que falta saber 

Cronologia dos casos de abuso sexual na Igreja em Portugal

Wednesday, 15 February 2023

O relatório e o artigo do Religión en Libertad

Só esta quarta-feira recebi de umas cinco pessoas diferentes um artigo do site “Religión en Libertad” que critica o relatório da Comissão Independente, pondo em causa a sua credibilidade.

O artigo contém alguns pontos interessantes, e o autor claramente ou leu o documento, ou leu muitos artigos sobre o mesmo. No entanto, e uma vez que este textoi está a ser circulado sobretudo por quem pretende minar a credibilidade e o trabalho da Comissão Independente, quero explicar aqui porque é que não partilho do cepticismo do autor.

A principal objecção do autor é o facto de o relatório ter por base apenas 34 entrevistas cara-a-cara e, de resto, depender de inquéritos anónimos. Diz ele que seria fácil a grupos feministas ou anticlericais preencher inquéritos falsos e assim deturpar os números finais do relatório.

É evidente que esse risco existe, como existe o risco de se terem contratado 34 actores para as entrevistas cara-a-cara, que fingiram terem sido abusados – uma hipótese que o próprio levanta, mas diz ser menos provável.

Agora, temos alguma razão para acreditar que um grupo de feministas radicais anticlericais se juntou para boicotar o trabalho do Comissão Independente? Não, não temos. E, mais importante, qual era a alternativa? Tendo em conta que estamos a falar de um tema traumático e de extraordinária complexidade, que a maioria das pessoas leva anos a processar se é que alguma vez encontra coragem para falar do assunto, que outra possibilidade havia para além de convidar as pessoas a preencher inquéritos de forma anónima?

A Comissão teria sempre de optar entre expor-se ao risco – menorizado através do cruzamento de dados que permitiu, de facto eliminar umas dezenas de respostas tidas como pouco fiáveis – e ter uma base de estudo, ou esperar apenas por pessoas que quisessem dar a cara, e chegar ao fim do prazo com 34 casos. Optou, naturalmente, pela primeira hipótese. Não podia ser de outra forma.

Mais, como também já referi, muito mais provável é os dados apresentados pelo relatório pecarem por escassos, uma vez que a distribuição geográfica das respostas recebidas é muito desigual e há uma desproporção de respostas de zonas urbanas e litorais em relação a zonas rurais e do interior. A falta de respostas do interior norte e das ilhas, por exemplo, leva a crer que os números reais de vítimas serão de facto mais elevados do que aparece no relatório, e que por isso os quase 5.000 casos estimados não sejam um excesso, como o autor parece pensar, mas talvez até uma estimativa conservadora.

Os casos na imprensa

Um dos dados em que Pablo J. Ginés se sustenta é o facto de o relatório ter dito que a pesquisa feita na imprensa permitiu identificar 19 casos. Escreve o autor:

El equipo investigador además dedicó una periodista a buscar durante 6 meses casos de abusos eclesiales contra menores en archivos de los periódicos portugueses de los últimos 70 años. La periodista revisó 27 periódicos online con detalle. Después consultó los archivos en papel de 4 grandes periódicos. Consultó por teléfono con los archiveros de otros periódicos. Encontró, en total, 19 casos de abusos. Varios los había recibido el equipo investigador por otras vías.
Es verdad que antes de 1974 la prensa portuguesa no publicaba historias de abusos en el clero. Pero también es verdad que en febrero de 2019 todo un equipo de periodistas del "Observador" dedicó 3 meses sólo a buscar casos de abusos a menores en entornos católicos, para su reportaje «Em Silêncio».

Insistamos: en 50 años de democracia en Portugal, toda la prensa del país, incluso buscando con dedicación, encontró sólo 19 casos de abusos a menores (que casi siempre eran los que llegaban a tribunales).

É verdade que o relatório diz que apenas encontrou 19 casos na imprensa, mais oito que não continham informação suficiente para serem contabilizados. Eu também estranhei quando li isso. A questão é que o jornalista da Religión en Libertad aceita esse número como um dado adquirido e, com base nisso, lança desconfiança sobre o resto do relatório.

O problema é que – e aqui sim, critico o relatório – esse número é incompreensível. Há 13 anos que eu sigo esta questão e que vou dando conta de todos os casos que foram públicos nesta cronologia. Recentemente juntei todos os casos, tratei-os e apresentei um resumo aqui.

Ora, segundo esse meu trabalho, quase todo ele documentado por notícias que vieram a público, existiram nos últimos anos 72 casos envolvendo abusos de menores em contexto eclesial. Este valor já inclui seis casos que constam dos tais 19 do relatório, e que me tinham escapado.

Nem todos os “meus” casos são de abusos, alguns são de encobrimento. Mas 63 são de abusos, entre padres, acólitos, sacristãos, escuteiros e professores de EMRC. Um deles, que saiba, nunca chegou a ser notícia, mas os outros foram e em 40 dos casos o nome ou é público ou é de fácil acesso por quem procura (isto é, se eu sei, acredito que a Comissão também conseguia descobrir, pelo que não seria necessário descartar o caso).

Porque é que a Comissão só descobriu 19 casos? Não faço ideia. Já lhes perguntei, talvez haja uma explicação lógica.

Mas pelo menos este argumento do autor da notícia espanhola cai por terra, embora ele não tenha grande culpa de se ter fiado no relatório nesse aspecto.

O jornalista pega ainda no facto de ter havido uma percentagem muito alta de mulheres vítimas. É certo que o número é surpreendente, mas daí a concluir que isso se deve a uma complot ou a uma tentativa em massa de defraudar a comissão, vai um longo passo.

Por fim, talvez uma das teorias mais fracas do autor seja de que algumas vítimas possam ter sido dissuadidas de participar no inquérito, por este alinhar com a ideologia do género, ao permitir que os inquiridos colocassem “outro” no “género”. Eu tenho sérias dúvidas de que alguém que finalmente tomasse a decisão de enfrentar um tema tão sensível da sua vida mudasse de ideias só porque chegou ao inquérito e viu que ele permite mais do “masculino” e “feminino” nas respostas.

Resumindo. O relatório não é perfeito, longe disso. Já apontei algumas fraquezas aqui e aqui. Mas a principal conclusão do relatório, de que existiram provavelmente milhares de casos de abuso sexual de menores na Igreja em Portugal ao longo dos últimos 70 anos, e que alguns ainda persistem, parece-me sólida e não vejo que a Igreja, nem ninguém, tenha a ganhar em semear dúvidas que têm por base, essencialmente, teorias da conspiração.

Queria só terminar por agradecer ao Pablo Ginés ter escrito este artigo e ter-se dado ao trabalho de analisar o relatório, mesmo que eu não concorde com as suas conclusões. É precisamente destas análises e do diálogo sobre as mesmas, que podemos chegar mais fundo na busca da verdade sobre esta questão.


Afinal quantos padres abusadores é que o relatório encontrou?

Há uma falha desnecessária e lamentável no relatório, que diz respeito ao número de padres identificados através dos testemunhos. 

A confusão deriva do facto de o relatório nunca nos dar os números isolados, optando por apresentar tabelas que são difíceis de interpretar, e que ainda por cima têm erros. 

Já explico a metodologia, mas para quem não tem paciência para ler mais, apresento já as minhas conclusões.

TOTAL DE VÍTIMAS: >611 - O > deve-se ao facto de alguns dos dados serem apresentados assim. 

De todos os números, este é talvez o menos fiável, porque as tabelas não permitem identificar se há duplicações entre o número de vítimas identificadas pelo relatório, o número de vítimas apresentados pelas dioceses/institutos religiosos/instituições e o número de vítimas identificadas pelo Grupo de Investigação Histórica. 

TOTAL DE ABUSADORES: 497 - Este número resulta da soma de todos os abusadores identificados pela comissão, pelas dioceses/institutos religiosos e instituições, menos os casos duplicados, que são 35.

TOTAL DE PADRES/RELIGIOSOS ABUSADORES: 413 - A soma total dos padres e religiosos identificados como abusadores nas tabelas é de 441. Contudo, embora o relatório não especifique se os casos duplicados são de padres, religosos ou leigos, há pelo menos 28 casos duplicados que só podem ser de padres, logo o número de padres nunca pode ser superior a 413, podendo inclusivamente descer para 409, caso os quatro restantes casos duplicados incertos sejam todos padres.

TOTAL DE FREIRAS ABUSADORAS: 4

TOTAL DE LEIGOS ABUSADORES: 82 - Resulta da soma de todas as tabelas e a subtração de dois casos de duplicação que só pode ser de um leigo. O número pode descer para 78 se todos os restantes quatro casos duplicados incertos sejam todos leigos.

TOTAL DE ABUSADORES INDETERMINADOS: 8

Ora, os mais atentos poderão ter reparado que a soma de padres/religiosos, leigos, freiras e indeterminados dá 507. Como se explica esta discrepância? Há quatro abusadores duplicados que não retirámos a nenhuma das outras categorias, por não sabermos se são padres ou leigos. Subtraindo esses quatro, ficamos com 503. Os restantes seis, por incrível que pareça, devem-se a erros nas tabelas!

Assim, na tabela das dioceses Braga aparece com um total de 45 abusadores, subdivididos em 40 padres, 5 leigos e 1 indeterminado, o que na verdade dá 46.

Évora tem 10 abusadores, dos quais 10 padres e um leigo, o que dá 11.

Santarém tem 7 abusadores, incluindo 7 padres e 2 leigos, o que dá 9. 

Viseu tem 7 abusadores, dos quais 7 padres e um leigo, o que dá 8.

Nas ordens religiosas masculinas temos os Capuchinhos com 2 abusadores, dos quais 2 são padres/irmãos e um é leigo, o que dá 3.

E, por fim, na Obra da Rua são dois abusadores, dos quais apenas 1 padre, o que obviamente dá 1.

Isto dá um saldo de seis abusadores (7 a mais e 1 a menos), o que, subtraído a 503 dá os tais 497.

Como é que sabemos que alguns dos duplicados têm de ser padres e outros têm de ser leigos? É simples. Veja-se o caso de Lisboa. A Comissão Independente recebeu relatos relativos a 66 padres e 10 leigos. A própria diocese fez chegar informaçao sobre 3 casos, todos padres e o Grupo de Investigação Histórica encontrou nos arquivos dados relativos a 8 casos, todos padres. Os casos duplicados aqui são 9. Dois desses estão entre os dados que chegaram através da diocese e outros 7 nos casos encontrados pelo Grupo de Investigação Histórica. Uma vez que a diocese e o GIH só encontraram casos relativos a padres, esses 9 casos duplicados só podem dizer respeito a padres. 

Infelizmente, em casos como o CNE, em que há 4 padres e 15 leigos apontados entre os abusadores, e quatro casos duplicados, não é possível saber se os duplicados são todos padres, todos leigos, ou uma mistura. 

Com isto, temos ainda mais uma questão a assinalar. Olhando para o número total de abusadores e para o total máximo de padres na lista, vemos que a percentagem de padres entre os abusadores é 83%, podendo descer até aos 82% se os quatro duplicados incógnitos forem todos padres. 

Mas a Comissão não disse que só 77% dos abusadores eram padres? Mais um dado pouco claro. Vejamos com atenção o que diz o relatório sobre isto: "Na esmagadora maioria dos casos, os alegados agressores eram padres (77% dos casos). (...) O segundo estatuto mais comum é o de professor em colégio religioso (9,6%), situação não raramente associada à primeira, pois o professor é igualmente padre. Em terceiro lugar (4,5%), surgem os casos em que as pessoas agressoras eram membros de ordens religiosas diversas (abades, madres, frades, freiras, entre outros)."

Ou seja, estas percentagens significam relativamente pouco. Só porque 77% dos agressores foram identificados como padres, não significa que alguns dos que foram identificados como professores, ou até outros, não fossem igualmente padres.

Em conclusão, eu tenho defendido sempre o trabalho da Comissão, e não são estes detalhes que põem em causa o relatório como um todo. Mas é uma pena que nesta parte a Comissão Independente não tenha feito um trabalho mais rigoroso. 





À Procura da Nossa Verdadeira Identidade

Peter Laffin
Um dos grandes dons da minha conversão ao Catolicismo foi o facto de me ter libertado do projecto fútil e aborrecido da auto-invenção. Como um autoproclamado “ateu sério” que se levava mais a sério ainda, eu levei a descrença em Deus até ao seu fim lógico: um mundo sem Deus é um mundo sem valores objectivos de qualquer tipo. Pela mesma ordem de razões, o indivíduo é uma tela em branco sobre a qual qualquer coisa pode ser pintada. Tendo engolido por inteiro as platitudes pós-modernas mais comuns sobre o romance da auto-invenção, arregacei as mangas e comecei a trabalhar no projecto do “eu” com particular vigor.

Mas tudo isso não passou de uma imitação juvenil de uma história que a nossa cultura não se cansa de repetir, a da criança cuja individualidade tem sido de alguma forma suprimida e que mais tarde aprendeu a encontrar a sua voz e a “dizer a sua verdade”. Mas o resultado é que me deixou amargurado, amassado e, no final de contas, aborrecido.

Hollywood faz com que esta história pareça glamorosa no grande ecrã, com imagens em câmara lenta que batem certo com a banda sonora. Mas na vida real o projecto da auto-invenção é marcado por fases sem qualquer glamour, que nos filmes são convenientemente ignorados. A criação da nossa própria identidade de raiz é um projecto limitador, frustrante e repleto de ansiedade. É o contrário da aventura de descobrir o nosso papel na grande história do cosmos, que expande a alma.

Este é um ângulo que devia ser mais explorado na evangelização: A Igreja oferece a promessa de aventura a um mundo irremediavelmente entediado pela sua própria reflexão no ecrã de um telemóvel.

Mais do que encorajar a miragem da auto-criação – como se fossemos suficientemente poderosos para nos criarmos a nós mesmos ou sequer alterar a substância das nossas almas – a fé revela a identidade humana como ela é, objectivamente, em relação ao Criador.

O Novo Testamento, em particular, oferece-nos pistas sobre a verdadeira identidade humana, na sua relação com Deus, na pessoa de Jesus Cristo. Na grande e variada quantidade de personagens que aparecem juntamente com Cristo, ou que surgem nas suas parábolas, reconhecemos partes de nós mesmos, e através das suas experiências discernimos verdades-chave sobre as diferenças entre o homem e Deus.

Se não lermos os Evangelhos apenas como exercícios académicos, mas como uma oportunidade para viver através dos olhos das suas personagens, damos por nós num constante estado de déjà vu. Os seus encontros com o Divino provocam um sentimento inquietante de acordar de um longo adormecimento. À Luz de Cristo um indivíduo é inteiramente exposto. A presença de Deus abre o alçapão do ego e vemo-nos lançados para um estado de autoconhecimento profundo.

As personagens individuais dos Evangelhos revelam-se-nos de acordo com as épocas inalteráveis do coração. Quando damos por nós numa grande tristeza por não conseguirmos largar os tesouros da terra pela eternidade identificamo-nos com o jovem rico. Quando sofremos com a ferida aberta do pecado não reparado identificamo-nos com a samaritana junto ao poço. Quando sentimos a tentação de abdicar das responsabilidades do nosso poder terreno, até nos identificamos com Pôncio Pilatos.

Até as personagens do reino animal nos transmitem verdades fundamentais sobre a natureza dos seres criados em relação à natureza de Deus. Na verdade, nenhuma personagem do Evangelho me diz mais sobre mim do que a personagem que dá o nome à parábola da ovelha tresmalhada.

As semelhanças superficiais entre mim e a ovelha tresmalhada saltam aos olhos. Em primeiro lugar, sempre me considerei demasiado individualista para correr com o rebanho. Pelo contrário, sempre tive a tendência para correr para a escuridão da floresta por impulso, nem que seja para provar que sou eu que comando o meu destino e que não preciso da ajuda nem da aprovação de ninguém. A ovelha tresmalhada era, como gostam de dizer os neopagãos, o meu “animal espiritual”.

Mas, como sempre, a história só ganha interesse quando Deus entra em acção. Num acto de desespero totalmente irracional o pastor – isto é, o Senhor – abandona o resto do seu rebanho, os noventa e nove que não se tresmalharam, para poder perseguir o que o fez. O coração do pastor sofre tanto com o desaparecimento de uma mera ovelha amada que ele se lança sem pensar duas vezes numa missão de socorro.

O leitor (este leitor, pelo menos) até fica admirado com a aparente irresponsabilidade. Pela lógica humana é algo que não faz sentido, não parece certo que o bem-estar de um deva ter precedência sobre o bem-estar de muitos. Também não faz sentido que um pastor deva agir contra o seu próprio interesse. Não deve ele preocupar-se com o valor geral do seu rebanho?

O que torna a parábola ainda mais estranha é o facto de, noutro lugar no Evangelho, Jesus nos dizer para sermos perfeitos como o Pai Celeste. Esta passagem não só revela a nossa identidade em relação a Deus, como ainda nos oferece um modelo de conduta. Será que o Senhor quer mesmo que imitemos o pastor nestas circunstâncias?

Mas a parábola não pode ser lida segundo a lógica humana. Os seus caminhos estão acima dos nossos caminhos, o seu amor tem uma lógica própria.

Se fecharmos os olhos e nos deixarmos submergir na Luz do seu amor, rapidamente compreendemos que, contra toda a razão, é claramente verdade. É tudo verdade. Deus corre imprudentemente atrás de cada um de nós enquanto caminhamos pelo vale da sombra da morte, pelas veredas escuras e as florestas profundas em que entramos devida à nossa própria ignorância e teimosia.

Ele persegue-nos porque Ele é amor e nós somos os seus amados. Ele está apaixonadamente envolvido nas nossas vidas, como se fôssemos o seu único amor. E como qualquer bom progenitor, aguentará tudo e dar-nos-á o que for necessário para que regressemos a casa em segurança. A sua bondade e a sua misericórdia acompanhar-nos-ão todos os dias da nossa vida.

Esta é a nossa verdadeira identidade: Na nossa fragilidade, afastamo-nos do caminho. Mas nunca estamos perdidos. Somos sempre procurados. Sempre amados. Isso é certamente melhor do que qualquer coisa que eu poderia ter inventado sozinhos.


Peter Laffin escreve de New England. O seu trabalho mais recente encontra-se no The Catholic Thing, The Washington Examiner, e The National Catholic Register.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing no Domingo, 12 de Fevereiro de 2023)

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The Catholic Thing é um fórum de opinião católica inteligente. As opiniões expressas são da exclusiva responsabilidade dos seus autores. Este artigo aparece publicado em Actualidade Religiosa com o consentimento de The Catholic Thing.


Tuesday, 14 February 2023

Reflexões sobre o Relatório da Comissão Independente

Neste artigo vou referir aspetos do relatório que me parecem interessantes mas que não tenho visto sublinhadas na maioria da comunicação social. O relatório pode ser consultado na íntegra aqui

Para quem lê inglês, convido a ver o meu artigo para o The Pillar, sobre o relatório. Podem ainda assistir ao meu comentário na SIC Notícias, cerca das 8h20 de terça-feira, e na sexta-feira estarei no programa da Ecclesia, na RTP2. 

Testemunhos – 4812 vítimas. Este número em si, diz pouco, sobretudo na medida em que é uma estimativa, e uma estimativa que certamente peca por defeito. Mais do que o número total de vítimas, que nunca vamos conhecer, impressiona ler os testemunhos de quem sofreu abusos. Há muitos testemunhos que são especialmente emotivos, mas o que mais me assombrou foi a do rapaz que foi violado, juntamente com colegas, numa viagem de finalistas do sexto ano (Pg. 233). A descrição de como os rapazes se consolaram, da impotência que sentiam perante o abusador, é aterradora. Não chego ao ponto de dizer que toda a gente deve ler esse e outros testemunhos do relatório, mas que deve ser leitura obrigatória para clérigos e para todos os que trabalham com crianças e pessoas vulneráveis, sim. Estou apenas a sublinhar um dos testemunhos que mais me marcou, há outros tão ou mais impressionantes e muitos estarão ainda por contar.

Sete – Este relatório tem muitos números, e muitos deles impressionam. Mas o "sete", que se refere ao número de vítimas que se calcula terem-se suicidado é um que deve ficar para sempre gravado na nossa memória.

O relatório – Um dos grandes pontos a reter deste relatório é a existência do relatório em si. Não nos podemos esquecer que para muitos bispos, e outros na Igreja, a criação de uma Comissão Independente era vista como desnecessária, ou como um ataque à Igreja. As dioceses, dizia-se, já tinham as suas próprias comissões, a que qualquer um poderia recorrer. Ora, só em dez meses a Comissão Independente recebeu dezenas de vezes mais testemunhos do que todas as comissões diocesanas juntas em dois anos ou mais. A Igreja pode não ter culpa, e pode até ter as melhores intenções, mas as vítimas simplesmente não confiam nela e nas suas comissões – algumas chefiadas por bispos o padres – para acolher e tratar as suas denúncias. Nesse sentido, e por mais defeitos que tenha – e tem alguns, que já veremos – a existência do relatório é uma vitória e comprova a necessidade de se ter criado a Comissão Independente.

Colaboração – Portugal não é o primeiro a ter uma Comissão a estudar a problemática dos abusos sexuais na Igreja, e se Deus quiser não será o último. Eu tenho acompanhado esta questão em vários países e por isso posso dizer que é verdadeiramente admirável e assinalável a forma como a Igreja e a Comissão colaboraram pacificamente ao longo do ano que passou. Há mérito dos dois lados, mas merecem elogios os membros da Comissão que sempre fizeram questão de sublinhar e agradecer a forma como os bispos lhes facilitaram a vida, e de dizer que este problema dos abusos é um fenómeno social, em primeiro lugar, e não deve se deve tomar a parte pelo todo. Esta colaboração não impediu, porém, os membros da Comissão de criticar os bispos onde isso lhes pareceu necessário. Uma das grandes vantagens disto é o facto de ser impossível a quem quer que seja na Igreja que tenha dois dedos de testa reclamar de uma caça às bruxas, ou uma perseguição anticlerical. 

Bom senso - Noutros países estes relatórios têm servido para fazer exigências e recomendações estapafúrdias ou simplesmente persecutórias, como apelar ao fim do celibato como medida para combater os abusos, ou sugerir leis que obriguem os padres a violar o segredo da confissão. Não foi surpreendente, tendo em conta os sinais dados pela Comissão ao longo dos meses, mas é bom ver que este relatório evita essas tentações. [Já me chamaram atenção para o facto de, ao contrário do que aqui escrevi, o relatório sugerir que a Igreja "reveja" a questão do selo da confissão. Ainda assim, uma sugestão de revisão é diferente de um pedido explícito para acabar com ele, como aconteceu noutros lados.]

Falta de colaboração – Não há regra sem excepção. É incompreensível que ao longo de dez meses um bispo, o de Beja, e um administrador apostólico, de Setúbal, não tenham acedido às tentativas de contacto dos membros da comissão. O relatório cita ainda um bispo que não identifica – mas cuja identidade torna evidente com a informação que disponibiliza – que claramente não está alinhado com o resto do episcopado no que diz respeito à urgência desta questão, e continua a alimentar a teoria da vitimização da Igreja, mas ele pelo menos aceitou ser entrevistado. Os outros dois, nem isso. Não sei mais detalhes, porque o relatório também não os fornece, mas espero que esta informação seja comunicada à CEP e a Roma e que seja tomada devida nota, a não ser, claro, que haja algum factor atenuante que não conhecemos.

25 e 100+ – Estes são dois dos dados mais significativos do relatório e devem ser lidos em conjunto. Foram enviados 25 relatos para o Ministério Público, por haver indícios de crime não prescrito. Contudo, a Comissão sublinha a improbabilidade de uma parte significativa destes casos poderem ser efectivamente investigados, por falta de informação. É importante notar que estes 25 relatos não dizem necessariamente respeito unicamente a padres, nem a 25 abusadores diferentes. Pode haver leigos à mistura, e pode haver múltiplos casos ligados a um só abusador. Depois, foi dito – já em entrevistas, e não na conferência de imprensa – que a lista que vai ser enviada à CEP com os nomes de padres suspeitos de terem cometido abusos e que estão ainda no activo tem mais de 100 nomes.

Ora, juntando as duas peças, podemos concluir que a esmagadora maioria dos suspeitos nessa tal lista cometeram os seus abusos há tempo suficiente para terem prescrito. Isto leva a crer – embora não possamos ter a certeza – que uma quantidade considerável desses casos dizem respeito a eventos passados há várias décadas e que muitos dos padres envolvidos possam estar já na idade da reforma, ou perto, e talvez até já sejam de idade avançada.

Obviamente isso não significa que não se investigue, mas devemos ter em conta que o facto de haver uma lista com mais de 100 padres activos não implica que exista uma centena de ameaças actuais dentro da Igreja.

Prescrições e expulsões – Esta manhã, em entrevista à SIC Notícias, perguntaram-me o que achava que a Igreja devia fazer com a tal lista de mais de cem nomes de potenciais abusadores. O mais fácil, neste momento, é apelar à expulsão imediata do ministério sacerdotal, mas essa pode não ser a melhor solução. Em primeiro lugar, é preciso avaliar e determinar se a alegação é credível. Não nos esqueçamos que houve mais do que um caso nos últimos anos em que um padre suspeito foi de imediato suspenso enquanto o assunto era investigado, tendo-se concluído pela impossibilidade da prática daquele crime. A presunção da inocência continua a ser um bem valioso.

Felizmente, não obstante a presunção da inocência, a Igreja tem mais margem de manobra nestes casos do que o Estado. O Ministério Público investiga e se encontrar indícios leva a tribunal e daí pode resultar uma absolvição ou uma condenação. No caso da Igreja, porém, pode-se determinar que a denúncia é credível, ainda que não seja possível prová-la sem margem para dúvida e, perante esses dois factos, tomar medidas para, jogando pelo seguro, afastar o padre de qualquer contacto com pessoas vulneráveis, obrigá-lo a receber acompanhamento psicológico, etc.,

O que deve então a Igreja fazer com os padres sobre os quais pendem suspeitas credíveis, ainda que os crimes tenham prescrito civilmente, ou que não seja possível provar a culpabilidade sem margem para dúvidas? Nesses casos a expulsão do estado sacerdotal pode até ser a solução mais fácil, mas não é necessariamente a melhor. É que um padre abusador cujo crime tenha prescrito e que seja demitido – por imposição ou por vontade própria – do estado clerical, deixa de estar sob a alçada da Igreja e já não pode ser punido civilmente. Fica, assim, livre para seguir a sua vida. A Igreja fica com menos uma dor de cabeça, mas a sociedade não fica mais segura. Aqui, pede-se por isso que a Igreja evite as soluções fáceis e que continue a manter a segurança das potenciais vítimas sempre no centro do seu agir e das suas preocupações. 

Distribuição geográfica – O relatório é bom, mas tem fraquezas. A principal, a meu ver, é a total falta de representatividade de algumas dioceses, sobretudo as do norte e centro interior do país, bem como Angra e Funchal. Olhando para o mapa que o relatório disponibiliza na página 118, a realidade é aflitiva. Há vários distritos de onde a Comissão recebeu menos de cinco chamadas, da Madeira recebeu zero. (O que não significa que não tenham sido feitas denúncias relativas a essas dioceses.)

Isto não põe em causa a validade dos testemunhos já recebidos, mas deixa o relatório e a Igreja abertos a críticas por os números finais não serem fiáveis. Por tudo isto é ainda mais urgente a criação de uma segunda comissão, de preferência permanente, que vá aprofundando estes resultados e para que outras vítimas, que ainda não tiveram a coragem, se possam apresentar.  

Números confusos – Uma outra crítica a fazer ao relatório é que, apesar de milhares de dados, há informações bastante básicas que não constam. Em lado nenhum, por exemplo, se refere o dado dos mais de 100 padres ainda no activo, que Pedro Strecht depois mencionou em entrevistas. Mas há mais. Em lado nenhum se refere o total de padres suspeitos. Existe uma série de tabelas que permite calcular por alto o número, nas páginas 385-388. Nestas tabelas pode ver-se o número de casos que a Comissão encontrou em cada diocese. Está lá o total de casos revelados nos testemunhos, o total de casos reportados pelas próprias dioceses e o total de casos encontrados pelo grupo de investigação histórica. A metodologia depois repete-se para as ordens religiosas masculinas, femininas e algumas instituições, como escuteiros e Opus Dei. Uma vez que existe o risco de duplicação de casos, existe uma outra coluna que mostra quantas duplicações é que há, o problema é que não se percebe se a duplicação é com leigos ou padres, etc.,

Ainda assim, fazendo as contas cheguei à seguinte conclusão: Os casos no relatório incluem 497 abusadores, dos quais 414 padres/religiosos, 79 leigos e 4 freiras.

Se detectarem algum erro com os números digam-me… Não esquecer que sou de humanidades.

E os bispos? – Apresentado o relatório, que dizer dos bispos? Tanto quanto vi, até porque não são referidos nomes de dioceses ou locais, para proteger identidades, o relatório não permite concluir se existe forte suspeita de algum bispo ainda em funções ter encoberto conscientemente algum caso de abusos. Contudo, caso a comissão tenha algum dado que aponte nesse sentido, isso deve ser comunicado tanto à CEP como à nunciatura, e devem ser tiradas as devidas consequências.

Outro dado interessante é que o relatório refere que, quando chamados a identificar os seus abusadores, menos de 1% respondeu “chanceler, capelão, bispo ou diácono”. Sendo que 1% de 512 é 5.1, isto permite concluir que terá havido uma denúncia para cada uma dessas categorias. Nesse caso, levanta-se a questão de saber quem foi o bispo que foi denunciado? Ainda é vivo? Foi denunciado por abusos, ou por encobrimento? Certamente não será a comissão a referi-lo – e nem sabemos se o tal bispo foi identificado – mas a pergunta fica no ar.

Friday, 10 February 2023

Relatório à vista... Estejam preparados

Estamos a três dias da apresentação do relatório sobre abusos sexuais na Igreja portuguesa, feito pela Comissão Independente. Em antecipação desse momento, dediquei as passadas semanas a elaborar um documento que resume tudo aquilo que já se sabe sobre os abusos cometidos no âmbito eclesial. Aqui encontrarão todos os casos que foram tornados públicos em Portugal nos últimos anos, e o que se passou com cada um deles, incluindo os resultados de processos civis e canónicos. É evidente que o relatório trará muitas novidades, mas só conseguiremos compreender bem esse impacto se tivermos noção daquilo que já se sabe. Está tudo aqui, e caso saibam de mais algum caso que não esteja na lista, mas que tenha sido tornado público, informem-me para eu poder completar.

Preparei também uma série de questões que pedem resposta com este relatório. Quando ele for divulgado é natural que toda a gente foque sobretudo o número total de testemunhos recebidos e o número de alegados abusadores. Mas há muita coisa que é importante saber para se poder contextualizar bem esses dados. Qual o universo total de padres no país nos anos avaliados? Há uma estimativa do número de casos total, e não apenas dos denunciados? A comissão aceitou todos os testemunhos por si, ou houve algum método de avaliar a sua credibilidade? Vejam aqui aquelas que considero serem as questões fundamentais e, mais uma vez, partilhem comigo sugestões de outras que me possam estar a escapar.

O número de mortos devido ao terrível terramoto que afectou principalmente a Turquia e na Síria já ultrapassou os 15 mil, incluindo pelo menos um padre católico. Esta tragédia vem relevar o enorme sofrimento do povo sírio, já duramente afectado por anos de guerra, Covid, uma crise financeira terrível e sanções que são dirigidas aos governantes, mas que como sempre acabam por dificultar a vida aos mais pobres. A fundação Ajuda à Igreja que Sofre está no terreno a ajudar, sobretudo em Alepo e Latakia, e quem quiser fazer donativos para ajudar na reconstrução de casas de membros da comunidade cristã pode obter mais informação aqui. Os líderes da comunidade cristã pedem orações e solidariedade, mas todos concordam que é urgente acabar com as sanções para que o país possa finalmente reerguer-se.

Alguma vez ficou com dúvidas sobre se devia pedir coisas a Deus? Acontece a todos. Randall Smith explica porque é que não nos devemos preocupar mais com o assunto, e continuar a pedir e a bater à porta, neste artigo do The Catholic Thing.

Deixo-vos ainda com os meus artigos para o The Tablet sobre o chumbo pelo Tribunal Constitucional de mais uma tentativa de legalizar a eutanásia, e ainda com o artigo que escrevi sobre a questão do palco para a JMJ.

Thursday, 9 February 2023

Perguntas pertinentes para o lançamento do relatório da Comissão Independente

Quando o relatório for divulgado há informação que será certamente conhecida logo, como por exemplo o número total de testemunhos. Mas há outras questões que importa saber.

Neste post juntei alguns que me ocorreram. Convido-vos a acrescentar outros, que podem colocar na caixa de comentários.

As perguntas em itálico foram acrescentadas depois da publicação, por sugestão de leitores

Leia também: Casos de abusos em Portugal. O que já sabemos, o que falta saber e Cronologia de casos de abusos em Portugal

  • De todos os testemunhos, quantos dizem respeito a padres/religiosos e quantos dizem respeito a leigos?
  • Tendo em conta que um abusador pode ter originado vários casos de abuso, qual o número total de padres/religiosos e de leigos alegadamente abusadores, de acordo com os testemunhos?
  • Qual era o universo total, nem que seja estimado, de padres/religiosos em Portugal no quadro temporal a que diz respeito o relatório? E com base nisso, qual a proporção ou percentagem de padres que são suspeitos de ter cometido abusos?
  • Para ter um termo de comparação, qual é, em média, o número anual de queixas de abusos de menores, e, segundo o fenómeno do iceberg, qual é o número estimado de abusos de menores por ano em Portugal?
  • Há algum testemunho de abusos praticados por mulheres, religiosas ou leigas?
  • Qual a distribuição geográfica dos testemunhos recebidos? Se possível, por diocese.
  • Qual a distribuição temporal dos testemunhos recebidos? Nomeadamente, quantos dizem respeito aos últimos 25 anos? Quantos aos últimos 10 anos?
  • A comissão usou algum método para avaliar a credibilidade das acusações, ou contabilizou todas, sem as avaliar?
  • Tanto quanto a comissão sabe, existem casos revelados no relatório que já tenham sido alvo de processo judicial? Se sim, sabe-se quantos foram alvo de condenação, quantos de absolvição, ou quantos foram arquivados por falta de indícios?
  • Tanto quanto a comissão sabe, existem casos revelados no relatório que já tenham sido alvo de processo canónico? Se sim, sabe-se quantos foram alvo de condenação, quantos de absolvição, ou quantos foram arquivados por falta de indícios?
  • Havendo testemunhos anónimos, e outros que não identificam os abusadores, a comissão pode ter a certeza de, nos seus números, não haver duplicação de casos?
  • Numa conferência de imprensa Pedro Strecht disse que houve situações em que o abuso foi “endémico”. Quantos casos desses é que a Comissão identificou? Quais são?
  • O relatório apresentado à CEP e o que será tornado público são idênticos? Se não, o que os distingue? Que conteúdos são só dadas a conhecer aos bispos que não são inseridos no relatório público?
  • Qual é o sexo das vítimas?
  • Qual a relação entre o sexo do abusador e o sexo das vítimas?
  • Quais os contextos mais específicos de abuso identificados (seminários, colégios, catequese, escutismo, acólitos, casa das vítimas, contextos exteriores à acção da Igreja, etc)?
  • Tendo havido denúncia, que tipo de acolhimento houve por parte das estruturas eclesiais (catequistas, chefes de escuteiros, padres, bispos etc)?
  • Qual a relação das vítimas com a Igreja após os abusos (mantêm-se integrados na paróquia/movimento, há uma ruptura imediata, há uma ruptura gradual, há uma ruptura posterior, perdem a fé)?

Abusos em Portugal – O que já sabemos, o que falta saber

[Nota: O Relatório da Comissão Independente refere seis casos que encontrou numa pesquisa na imprensa e que ainda não constavam desta lista. Acrescentei-as também à cronologia. Por enquanto não estou a acrescentar outros casos referidos no relatório que não tenham sido alvo de notícia, ou do meu conhecimento, antes da publicação do relatório.
Desde que foi publicado este resumo acrescentei dois possíveis novos casos, criando uma nova entrada na listagem das dioceses, chamada "Desconhecido". Tudo o que for acrescentado depois da data de publicação original está em itálico.
No dia 10/2 corrigi as percentagens, que estavam ridiculamente erradas, uma vez que... sou de humanidades... 
Ultimamente não tenho tido tempo de actualizar as percentagens, pelo que peço que não as considerem]
Desde que comecei a acompanhar esta questão, em 2012, dei conta de um total de 65 alegações de abusos sexuais de menores, ou pessoas vulneráveis, cometidos em ambiente de Igreja. Seguem-se algumas estatísticas. As pessoas em causa são referidas pelo nome apenas em casos em que este já é do conhecimento público. A inclusão dos nomes significa apenas que houve alegações e nada diz sobre a veracidade das mesmas, havendo até várias situações de pessoas sobre as quais foram levantadas suspeitas e que acabaram absolvidas.

Total de casos: 103

Casos envolvendo leigos: 18

Casos envolvendo padres, seminaristas e religiosos: 84

Casos envolvendo bispos: 4 (todos de encobrimento, nenhum de abusos)

Casos não especificados: 1


Dioceses sem casos públicos

Angra do Heroísmo

Aveiro

Beja

Forças Armadas

Portalegre-Castelo Branco


Resultados de processo civil

Absolvição: 7 (5 padres, 2 leigos) (6.6%)

Arquivamento: 17 (1 entretanto reaberto) (1 leigo, 1 seminarista, 15 padres, 1 que diz respeito à ordem de São João de Deus, mas que não nomeava suspeitos) 20%)

Condenação: 12 (4 padres, 8 leigos) (17.3%)

Em curso: 11 (1 bispo, 7 padres, 3 leigos) (13.3%)

Não investigado ou não se aplica: 28 (3 bispos, 24 padres/religiosos, 1 leigo) (24%) (inclui casos em que o alegado abusador morreu sem ser investigado ou sem que se saiba, casos em que o crime canónico não é considerado crime civil, etc.)

Prescrição: 6 (6 padres) (8%)

Incógnito: 21 (19 padres em diversas dioceses e 2 leigos em Portalegre-Castelo Branco e Beja) (6.6%)

 

Resultados de processo canónico (Não se aplica a leigos)

Absolvição: 6 (7.4%)

Arquivado: 5 (5.5%)

Condenado: 7 (11.1%)

Concluído por dispensa voluntária do sacerdócio: 2 (3.7%)

Em curso: 10 (7.4%)

Não investigado: 28 (46.3%)

Incógnito: 22 (20.37%)

N/A: 4 (Suicídio ou morte natural do suspeito) (1.9%)

Casos envolvendo leigos:

  • Fernando Silvestre, professor de EMRC na diocese de Braga, é acusado de 87 crimes de abuso sexual sobre 15 vítimas. A investigação está em curso.
  • João Martins, dirigente dos escuteiros, foi acusado de abusos em 2014 e acabou por se suicidar na cadeia.
  • Um catequista de 29 anos foi condenado a 7 anos de cadeia, em 2014, por abuso sexual de quatro menores, com idades entre os 9 e os 11 anos.
  • Marco Ferreira, ajudante de catequese na diocese de Évora, aguarda julgamento por acusação de abuso de duas meninas de 12 anos.
  • Duas leigas, funcionárias de uma instituição na diocese da Guarda foram a tribunal em 2021 acusadas de encobrimento, mas foram absolvidas.
  • Ricardo Jorge, monitor no Colégio dos Maristas, foi condenado em 2020 a oito anos de pena efectiva por abuso de menores.
  • Um leigo, funcionário da Casa do Telhal, foi condenado a pena suspensa por abuso sexual de pessoas vulneráveis.
  • Um leigo, dirigente dos escuteiros, foi condenado em 2017 a seis anos de cadeia por abuso sexual de menores ao seu cuidado
  • Um voluntário do Opus Dei foi acusado de abuso de menores em 2019. O processo civil foi arquivado, mas a instituição afastou-o de qualquer contacto com menores, não tendo sido possível confirmar a veracidade das alegações.
  • Adelino Novais, um leigo que tinha tentado sem sucesso entrar para os franciscanos, apresentava-se como frade e dirigia uma casa de acolhimento para jovens em Fátima, onde terá abusado de menores nos anos 60.
  • O chefe dos acólitos de Felgueiras foi condenado a dois anos de prisão, com pena suspensa, por ter abusado sexualmente de uma aluna da catequese, de 14 anos. Na sequência de uma tentativa de suicídio os pais aperceberam-se dos abusos e denunciaram o abusador.
  • Um casal de acólitos na diocese de Aveiro incentivou um jovem de 13 anos a participar em actos sexuais. O homem foi condenado a cinco anos com pena suspensa.
  • Um casal de acólitos do distrito de Aveiro, mas diocese do Porto (e não de Aveiro como tinha indicado por lapso) incentivou um jovem de 13 anos a participar em actos sexuais.  A mulher foi condenada a um ano, com pena suspensa. 
  • Um sacristão, conhecido como Antoninho, foi condenado a oito anos por pedofilia, no Arco da Calheta, Diocese do Funchal.
  • No comunicado em que dá conta da lista que recebeu da Comissão Independente, o bispo de Portalegre-Castelo Branco diz que a diocese recebeu recentemente uma denúncia relativa a um leigo que terá cometido abusos numa instituição da Igreja diocesana. O caso está a ser averiguado, informa o bispo, que não esclarece se as autoridades foram alertadas.
  • No comunicado em que á conta da lista que recebey da Comissão Independente, a diocese de Beja refere que um dos casos diz respeito a um leigo que era sacristão na cidade de Moura ou numa freguesia do concelho, mas descreve a situação como "vaga". Em todo o caso, o suspeito já morreu. 
  • No comunicado em que dá conta da lista que recebeu da Comissão Independente, a diocese de Beja refere outro caso, que não constava da lista, mas que diz respeito a um seminarista que foi expulso do seminário por assédio sexual e aguarda sentença do tribunal civil. 

 

 Casos envolvendo clero, por diocese ou ordem religiosa

 Algarve (1)

  • Um padre foi acusado de abusos por um ex-residente de uma instituição de acolhimento onde prestava assistência religiosa. O caso estava prescrito na altura da denúncia, mas houve processo canónico que ilibou o padre. Fontes da diocese disseram à Actualidade Religiosa que se desconfiava ser um caso de vingança pessoal.
Angra (2)
  • Um padre nomeado pela Comissão Independente, e afastado cautelarmente do exercício das suas funções enquanto decorrem investigações.
  • Um padre nomeado pela Comissão Independente, e afastado cautelarmente do exercício das suas funções enquanto decorrem investigações.

Aveiro (3)
  • Por lapso, o relatório da Comissão Independente identifica pelo primeiro nome, Domingos, um padre acusado de abusos por uma vítima. O padre era director espiritual num seminário. O lapso permitiu a identificação do sacerdote por parte da Actualidade Religiosa. É provável que este seja um dos três nomes referidos na lista entregue à diocese pela Comissão Independente. 
  • Um dos três padres nomeados na lista entregue pela Comissão Independente, mas que já morreu há vários anos, segundo a diocese.
  • Um padre ainda no activo, que consta da lista entregue pela Comissão Independente, mas que já foi investigado tanto civil como canonicamente, tendo o processo sido arquivado em ambos os casos.

Beja (7) 

  • Um padre da lista entregue pela Comissão Independente, já morto. Caso refere-se a 1963
  • Um padre da lista entregue pela Comissão Independente, já morto. Caso refere-se a 1967/68 e diz respeito a um padre com responsabilidades educativas.
  • Um padre da lista entregue pela Comissão Independente, já morto. O padre é de Serpa, ou de uma freguesia desse concelho. Situação descrita como "vaga".
  • Um padre da lista entregue pela Comissão Independente, já morto. O caso refere-se ao início dos anos 80 e terá ocorrido em Mértola, embora o padre não fosse pároco de lá.
  • Um padre referido no comunicado da diocese em que dá conta dos quatro casos acima referidos, mas que não constava da lista dada pela Comissão Independente. Trata-se de um padre que se envolveu com uma rapariga de 17 anos e que foi demitido do estado clerical por Roma.
  • Um padre acusado de perseguir um menor. O caso foi entregue às autoridades civis e o padre acabou absolvido.
  • Um padre sobre quem recaiu uma denúncia anónima vinda da CDF, em Roma. O caso foi entregue à PJ, e acabou arquivado por falta de provas.

Braga (8)

  • O padre Abel Maia foi acusado de abusar de um jovem adulto que tinha uma dependência emocional dele e sofria de problemas psiquiátricos. O caso foi arquivado civilmente, uma vez que a vítima negou os factos em tribunal. Houve processo civil, porém, que condenou o padre a cinco anos sem contacto com menores. A diocese diz que a pena escrupulosamente cumprida e o padre está de novo em funções. Mais tarde surgem novas denúncias relativas a abusos praticados sobre seminaristas quando Abel Maia era director do Seminário dos Montes Claros, dos dehonianos, em Coimbra.
  • Um “padre jovem ainda no activo” foi denunciado por uma jovem de ter abusado dela ainda no tempo de D. Jorge Ortiga. Este não terá dado seguimento, mas mais tarde o seu sucessor, D. José Cordeiro, remeteu o processo para o Ministério Público e abriu um processo canónico. Ambos ainda decorrem. Não se sabe se foi aplicada alguma sanção provisória.
  • Cónego Fernando Sousa e Silva, acusado de comportamentos abusivos com menores. Decorreu um processo em 2019 do qual resultaram medidas disciplinares. D. José Cordeiro publicou uma carta sobre este caso em que falou de “vítimas” e não “alegadas vítimas” e convidou-as a vir prestar declarações na diocese, mas ninguém apareceu. Desconhece-se se chegou a ser aberto um novo processo canónico, uma vez que civilmente não parece haver investigação.
  • D. Jorge Ortiga, suspeito de encobrimento por não ter denunciado o supracitado “padre jovem ainda no activo”. Não haverá qualquer processo civil ou canónico em curso.
  • Um padre admitiu em 2022 ter praticado abusos cerca de 40 anos antes. O caso foi denunciado ao Ministério Público mas não houve processo canónico uma vez que o abusador abandonou voluntariamente o sacerdócio.
  • A Comissão Independente envia para o Ministério Público uma denúncia anónima de um padre, que não é identificado, que terá abusado de um menor de 12 anos em 2015. Uma vez que nem o padre, nem a vítima foram identificados, o caso é arquivado pelo MP.
  • A Comissão Independente envia para o Ministério Público uma denúncia anónima de um seminarista que terá cometido abusos quando estava no seminário menor. Uma vez que nem o seminarista, nem a vítima, foram identificados, o caso é arquivado pelo MP.
  • No relatório final, a Comissão Independente refere o caso do Padre Joaquim Carneiro, da Aveleda, cujo caso terá sido noticiado no início dos anos 90. Consegui apurar que o Padre Joaquim foi absolvido em processo civil, havendo alguma incerteza sobre a existência de um processo canónico, mas acreditando-se que, tendo havido, foi também absolvido.
  • No seguimento da entrega da lista elaborada pela Comissão Independente à diocese, foi preventivamente afastado o padre Abílio Meireles.

 Bragança (1)

  • O padre José Belmiro Lino Rodrigues é acusado em 2019 de ter mantido uma relação com um rapaz de 17 anos, muitos anos antes. Pela idade do rapaz, não se trata de um crime do ponto de vista civil, mas sim do ponto de vista canónico. O processo canónico ainda deve estar a decorrer, aguardando-se uma decisão de Roma. Enquanto isso, o padre ainda consta do Anuário Católico, mas está sem nomeação.

 Coimbra (4)

  • Um padre é acusado de abusos em 2015 através de uma carta anónima, nunca substanciada. A Diocese pediu que se enviassem dados concretos, caso alguém os tivesse, mas isso nunca aconteceu. Suspeita-se de um caso de vingança pessoal. O padre nunca foi identificado publicamente e o caso foi arquivado pelo MP, nunca tendo sido aberto um processo canónico.
  • Um padre é suspeito de ter cometido abusos numa instituição de acolhimento de rapazes, onde trabalhava. Confrontado com as acusações foi viver e trabalhar para um país africano de língua portuguesa. Em 2015 procurou voltar para a diocese de Coimbra, e chegou a ser nomeado, mas quando o novo bispo foi informado das suspeitas rescindiu a nomeação e o padre em questão voltou para o PALOP onde estava antes a trabalhar, tendo morrido de causas naturais entretanto.
  • O padre Sebastião Cruz é acusado por uma mulher de ter abusado dela quando era interna num colégio interno, em Coimbra, na década de 70-80. A acusação é feita no programa “A Prova dos Factos”, da RTP1.
  • O padre António de Sousa foi acusado de abusos em 1971 pelo pai de uma menina que se queixava que ele a beijava e metia a mão nas cuecas. O caso gerou polémica e divisões na paróquia, mas o padre chegou a ser julgado e absolvido em tribunal civil. Nunca houve investigação canónica.

 Évora (4)

  • O padre Heliodoro Nuno é suspenso e investigado por alegado encobrimento ao não ter agido com celeridade para remover um catequista que terá abusado de duas meninas de 12 anos. O processo é arquivado pelo Ministério Público e o processo canónico é arquivado por indicação de Roma, sendo o padre reintegrado.
  • O padre José António Gonçalves suicida-se horas depois de ter entrado uma denúncia na Comissão Diocesana de alegados abusos sexuais de um adulto vulnerável, por via de mensagens impróprias. Este sacerdote não constava da lista de padres abusadores elaborada pela Comissão Independente
  • Um padre, cujo nome não foi divulgado, é afastado cautelarmente do ministério enquanto decorre uma investigação sobre alegados abusos cometidos no seminário menor de Évora, na década de 80. O nome é um de dois que constava da lista enviada à diocese pela Comissão Independente. O outro nome da lista é de um padre, também não nomeado, que já morreu. 
  • Um dos dois padres de Évora nomeados pela Comissão Independente como alegadamente estando no activo, afinal já morreu. 

 Funchal (4)

  • O padre Frederico, de nacionalidade brasileira, foi acusado de abuso sexual e homicídio de um jovem na ilha da Madeira. Foi condenado a 13 anos de cadeia, seguidos de expulsão de Portugal. Durante o julgamento, quatro adultos disseram ter sido abusados pelo padre quando ainda eram menores. O bispo Teodoro de Faria defenderam a inocência do padre. A meio da sentença, numa precária, o padre fugiu com a sua mãe para o Brasil, onde ainda reside. Continua a garantir a sua inocência. Nunca chegou a haver processo canónico.
  • O Cónego Carlos Nunes é acusado de ter praticado abusos em 2014. O caso é arquivado pelo Ministério Público e não chega, por isso, a ser investigado pela diocese, estando o sacerdote ainda em funções.
  • O padre Anastácio Alves é acusado, em 2018, de ter praticado abusos em 2005. Embora o caso tenha sido arquivado pelo Ministério Público, o padre é condenado em processo canónico e suspenso. Abandona o país e acaba por pedir dispensa do estado clerical, que lhe é concedida.
  • Dos quatro nomes entregues pela Comissão Independente à Diocese do Funchal, um é desconhecido pela diocese, e por isso não será contabilizado nesta lista, e três foram identificados mas não têm já qualquer cargo atribuído. Havendo a possibilidade de dois deles serem o Padre Frederico e o (ex)padre Anastácio Alves, para efeitos desta listagem será contabilizado apenas mais um caso, cuja existência está confirmada, mas cujo nome ainda não é conhecido.

 Guarda (4)

  • O padre Luís Mendes foi acusado, julgado e condenado a 10 anos de pena efectiva pela prática de abusos no seminário do Fundão. Foi condenado também em processo canónico, e demitido do estado sacerdotal.
  • O padre Ângelo Martins foi acusado, juntamente com duas leigas, de encobrir dois residentes de uma instituição de acolhimento que suspeitos da prática de abuso sexual de menores. Levado a tribunal juntamente com as duas leigas funcionárias, foi absolvido e continua ao serviço. Não existiu processo canónico.
  • O padre Vítor Manuel Alago Lourenço foi acusado em 2022 de abusos que terão sido praticados a partir do ano 2017. A diocese passou todas as queixas ao MP, mas o bispo optou por não suspender o padre, dizendo que “em caso algum, desejo contribuir para transformar qualquer notícia, declaração ou até acusação sem investigação, em condenação direta e sumária na praça pública". Este padre é um dos nomes que consta da lista entregue à diocese pela Comissão Independente. No dia 10 de Março a diocese anunciou o seu afastamento cautelar enquanto decorre a investigação prévia.
  • Um de dois padres nomeados na lista entregue pela Comissão Independente à diocese. O nome não é divulgado, mas o sacerdote já morreu em 1980.

 Lamego (4)

  • O padre António Júlio Fernandes Pinto foi detido em 2022 por suspeita de abusos continuados sobre uma pessoa com deficiência que estava à sua guarda. O processo civil está em curso.
  • Um padre de nome desconhecido, referido por D. António Couto como tendo  um processo já em curso quando este explicou que recebeu apenas dois nomes na lista entregue pela Comissão Independente. Disse na altura ter já dois processos a decorrer, sendo que um é do Padre António Júlio, este será o outro.
  • Um padre referido na lista entregue pela Comissão Independente, sobre o qual D. António Couto pediu mais informação.
  • Um padre referido na lista entregue pela Comissão Independente, sobre o qual D. António Couto pediu mais informação.

 Leiria-Fátima (1)

  • D. José Ornelas foi denunciado por alegadamente encobrir o caso envolvendo o Pe. Abel Maia, de Braga, quando era ainda superior dos dehonianos. O processo foi entregue ao Ministério Público, mas tendo em conta a natureza do caso e quem faz a denúncia, a Actualidade Religiosa explicou aqui porque é que este caso não tem credibilidade. Mais tarde, em Março de 2023 D. José Ornelas volta a ser apontado como responsável por encobrir crimes de abuso de menores praticados por Abel Maia, mas desta vez no seminário dos dehonianos em Coimbra. A CEP contesta que o então padre José Ornelas não se encontrava em Coimbra nos anos em que Abel Maia era director do seminário.

 Lisboa (11)

  • O padre Inácio Belo foi acusado em 2012 de abusos praticados em 2003. Desconhece-se se existiu processo civil, foi suspenso do ministério, mas acabou por abandonar o sacerdócio. Consta que é actualmente pastor evangélico.
  • Nuno Fraga Aurélio foi acusado em 2013 de ter cometido abusos durante os anos 90 sobre um menor que mais tarde se suicidou. O processo civil foi arquivado e o padre foi ilibado em processo canónico.
  • O padre Duarte Andrade e Sousa foi suspenso preventivamente enquanto se investigava o alegado envio de mensagens impróprias num grupo de WhatsApp que incluía menores de idade. O processo no Ministério Público acabou por ser arquivado e de Roma veio ordem de arquivamento do processo canónico. O sacerdote está de novo no activo.
  • Em 2022 surgiram denúncias de um padre que era então capelão hospitalar. O padre não chegou a ser identificado na imprensa, mas a Actualidade Religiosa sabe o seu nome. O Caso remontava a 2003 e não foi denunciado na altura às autoridades civis porque a própria vítima assim o pediu. Pela mesma razão não foi iniciado um processo canónico, embora o padre tenha sido afastado de qualquer obra da Igreja que envolvesse menores de idade. Contudo, a Igreja não interveio quando o padre abriu uma instituição de acolhimento de jovens, fora do âmbito canónico. Não existe qualquer acusação contra o padre desde 2003. Actualmente o padre está com cancro, em fase terminal.
  • D. Manuel Clemente, Patriarca de Lisboa, foi acusado de encobrimento no caso supracitado do padre capelão hospitalar. O Patriarca nega ter encoberto o caso, dizendo que foram respeitadas todas as normas da época e que foi por sua iniciativa que se encontrou com a vítima, em 2019.
  • O padre Luís Cláudio Ferreira dos Santos foi acusado em 2022 de ter cometido abusos anos antes. O processo não foi investigado pelo Ministério Público por estar prescrito. Seguiu um processo canónico em que não foi provada a acusação, tendo por isso o padre sido ilibado e voltado ao activo.
  • Num email anónimo enviado a todo o clero do Patriarcado de Lisboa são levantadas suspeitas sobre eventuais abusos cometidos por um cónego, em 2003. Estas suspeitas nunca surgiram na imprensa, e a Actualidade Religiosa não conseguiu obter qualquer informação que indique serem verdadeiras. O padre em questão esteve envolvido num caso de alegado assédio, mas entre adultos, tendo admitido precisar de apoio psicológico e estando por isso suspenso de actividade.
  • O padre João José Cândido da Silva foi acusado de violação por uma mulher, maior de idade. Mais tarde surgiu a informação de que o sacerdote estaria a ser investigado também por suspeita de abuso de menores, cometido anos antes, em Vila Real. Está em curso um processo civil, mas desconhece-se se está em curso um processo canónico.
  • Em 2022 surgiu a história de um padre de Lisboa que terá sido acusado de abusos pela família da alegada vítima. Contudo, em vez de denunciar o caso, a vítima chantageou o padre por 10 mil euros, para manter silêncio. O padre não foi nomeado na imprensa, e terá morrido em 2021, de causas naturais.
  • O padre José Francisco Faria terá mantido uma vivência homossexual activa, incluindo com menores, durante vários anos. Não há qualquer notícia de investigação civil ou canónica. Morreu em 2019.
  • O "padre Y", mencionado no relatório da Comissão Independente, tem uma queixa na Comissão e enquanto capelão de uma instituição de ensino superior "dava-se a intimidades com as alunas, que se queixaram". Não é certo se a queixa na comissão é de uma dessas alunas - que teria de ser menor na altura, para ser considerada pela comissão - ou outro caso. Nem o padre, nem a diocese são identificados no relatório, mas a Actualidade Religiosa sabe tratar-se de um padre de Lisboa que, entretanto, como consta no relatório, abandonou o sacerdócio e casou. Não houve qualquer processo civil ou canónica. 

Portalegre-Castelo Branco (2)

  • Um de dois padres que consta da lista entregue pela Comissão Diocesana à diocese, mas que já morreu na década de 1960.
  • Um de dois padres que consta da lista entregue pela Comissão Diocesana à diocese, mas que já morreu na década de 1980. 

Porto (2)

  • D. Manuel Linda foi denunciado por alegadamente encobrir o caso envolvendo o Padre Heitor Nunes, da Diocese de Vila Real. A vítima do Padre Heitor Nunes disse, em 2022, que na altura em que iniciou o seu relacionamento com o sacerdote confidenciou ao então padre Manuel Linda. O agora bispo do Porto diz não ter qualquer recordação dessa conversa. Importa dizer que este caso do padre Heitor foi divulgado pela primeira vez em 2019 no jornal O Observador e na altura a vítima não referiu este detalhe. Em 2022, nas diferentes vezes em que fez a denúncia, terá apresentado versões diferentes. Tanto quanto a Actualidade Religiosa sabe, não foram iniciados processos civil ou canónico para investigar a alegação.
  • O Cónego António Ferreira dos Santos foi acusado em 2008 de ter praticado abusos. A denúncia não foi levada a sério, depois de se ter concluído que o denunciante agia por vingança pessoal contra o padre. Não houve processo civil ou canónico.

 Santarém (2)

  • O padre António Júlio Ferreira dos Santos foi acusado de tocar de forma inapropriada uma escuteira, durante um acampamento. O padre foi condenado a 14 meses de pena suspensa pelo tribunal civil e a uma pena canónica de termo limitado sem contacto com menores, sem nomeação e com obrigação de acompanhamento profissional. Cumprida a pena, o padre voltou ao activo e colocado como director paroquial, e não pároco, de uma paróquia onde pode ser acompanhado por outro padre.
  • O padre Carlos (apelido desconhecido) foi acusado de ter praticado abusos sob uma criança nos anos 60. A criança, agora adulta, denunciou o caso no programa “A Prova dos Factos”, da RTP1, em 2023.

 Setúbal (4)

  • Um padre foi acusado por acólitos de ter praticado abusos. A diocese abriu um processo canónico que concluiu pela sua absolvição. O caso não foi denunciado às autoridades civis, e não terá sido investigado pelo Ministério Público. A Actualidade Religiosa recebeu indicações que apontam para se ter tratado de uma acusação falsa. Segundo o relatório da Comissão Independente houve outro caso envolvendo este padre mas a diocese considerou na altura que não havia dados suficientes para se abrir um processo penal. Em todo o caso, recomendou-se uma admoestação e um pedido de desculpa formal ao denunciante, um ex-seminarista. O instrutor do processo diz que considerou a versão do denunciante mais credível que a do denunciado. Tudo indica ser este o padre referido na lista entregue pela Comissão Independente à diocese que terá sido alvo de dois processos, segundo a diocese, que não configuravam abuso de menores. É possível que os acólitos e ex-seminarista que se queixaram fossem maiores de idade na altura. Contudo, a diocese diz que a Comissão terá recebido em relação a ele uma queixa de abuso de menores, pelo que aguarda mais informação. Diz que o padre está sem nomeação pública neste momento, embora no anuário conste uma nomeação, de natureza não paroquial.
  • Um padre da diocese de Setúbal foi acusado por uma mãe de ter abusado do seu filho menor, ainda criança. O caso foi entregue às autoridades que concluíram não haver qualquer credibilidade na acusação, uma vez que o padre nem sequer estava no local indicado no dia em que teriam acontecido os abusos. Na lista da Comissão Independente vem uma referência a um padre que foi preventivamente afastado enquanto decorreu um processo por abuso de menores, mas que depois de concluído o processo foi reintegrado. É possível que seja esta situação. Sem ter a certeza de que se trata de uma pessoa diferente, não se vai elencar outro caso nesta lista.
  • Um padre nomeado na lista entregue pela Comissão Independente. Nos arquivos da diocese nada consta, pelo que foi pedida mais informação.
  • Um padre nomeado na lista entregue pela Comissão Independente. Nos arquivos da diocese nada consta, pelo que foi pedida mais informação.

 Viana do Castelo (3)

  • O padre André Filipe da Costa Gonçalves foi confrontado com uma denúncia de ter abusado de um rapaz de 17 anos, em 2022. Assumiu os factos e foi suspenso pela diocese. A vítima veio a dizer que a relação entre os dois foi consensual, mas o direito canónico considera que a idade de consentimento são 18 anos, pelo que esse dado em nada afecta esse processo. Pode, contudo, impedir uma acusação formal por parte do Ministério Público, a quem foram entregues pela diocese todos os indícios.
  • Um padre consta da lista entregue pela Comissão Independente, mas está sem nomeação por estar num estado de grande fragilidade pessoal, segundo o bispo.
  • Um padre consta da lista entregue pela Comissão Independente, mas já morreu "há vários anos", segundo o bispo. 

 Vila Real (5)

  • O padre Pedro Ribeiro foi condenado em 2016 por ter enviado imagens explícitas a menores de idade, em 2015. Pedro Ribeiro foi condenado a vinte meses de pena suspensa e ao pagamento de seis mil euros de indemnização. Em processo canónico o padre foi condenado a passar quatro anos num mosteiro, sem exercer o sacerdócio. Tendo passado essa pena, o padre está actualmente em processo de incardinação numa ordem religiosa, que opera na mesma diocese.
  • O padre Heitor Nunes foi acusado em 2019 de ter mantido uma relação com uma menor de idade, de 14 anos, em 2002. O processo foi arquivado pelo Ministério Público, mas o processo canónico condenou-o e suspendeu-o. Entretanto Heitor Nunes pediu dispensa do sacerdócio.
  • O padre Manuel Machado foi acusado em 2022 de ter praticado abusos entre 1987 e 1991. Apesar de estar incardinado em Lisboa à data da acusação, na altura dos factos era padre da diocese de Vila Real. Segundo a imprensa, terá havido apenas uma vítima, que sofreu mais de 100 abusos. O processo encontrava-se prescrito civilmente à data da denúncia e o processo canónico foi interrompido a partir do momento em que o padre pediu e obteve dispensa do estado clerical.
  • Um padre foi acusado de ter abusado de um menor de 14 anos. A denúncia foi feita pela vítima, que no entanto não se quis identificar, nem identificou o padre, pelo que não foi possível abrir processo civil ou canónico. Segundo a vítima, os abusos ocorreram uma vez e o padre, que na altura tinha 50 anos, pediu-lhe desculpa. Porém, a vítima diz saber de mais menores que foram abusados pelo mesmo sacerdote.
  • Um padre veio referido na lista entregue pela Comissão Diocesana à diocese de Vila Real. O padre não é da diocese, embora resida lá. Foi imediatamente afastado do ministério, enquanto a diocese de origem foi avisada. Não é certo que este padre não seja o referido no ponto acima, que na altura não foi identificado.

 Viseu (5)

  • O padre Luís Miguel da Costa foi acusado em 2021 de ter enviado uma mensagem de teor explícito a um menor de idade que conheceu num almoço. O caso foi denunciado às autoridades civis e decorrem actualmente processos civil e canónico, estando o padre suspenso enquanto aguarda o seu desenrolar. Este é muito provavelmente um dos nomes referidos na lista produzida pela Comissão Independente e entregue à diocese.
  • Um padre foi acusado por uma mulher, em 2021, de a ter “violentado” vários anos antes. O padre estará ainda no activo. Segundo o jornal que divulgou o caso, este processo terá chegado à Comissão Diocesana através de uma denúncia feita pelo Serviço de Escuta dos jesuítas. Este é muito provavelmente um dos nomes referidos na lista produzida pela Comissão Independente e entregue à diocese.
  • Um de cinco padres referidos na lista entregue à diocese pela Comissão Independente. Segundo o bispo, o caso já foi devidamente entregue e tratado ao nível canónico e civil, embora não se tenha dito o resultado. 
  • Um de cinco padres referidos na lista entregue à diocese pela Comissão Independente. Segundo o bispo, o caso já foi devidamente entregue e tratado ao nível canónico e civil, embora não se tenha dito o resultado. 
  • Um de cinco padres referidos na lista entregue à diocese pela Comissão Independente. Segundo o bispo, o caso já foi devidamente entregue e tratado ao nível canónico e civil, embora não se tenha dito o resultado. 

 São João de Deus (1)

  • Um padre da ordem de São João de Deus foi investigado em 2012 por alegados abusos de pessoas com incapacidade psíquica, entre 2004 e 2010. Foi absolvido em processo civil e canónico. Apesar disso esteve impedido de exercer cargos de responsabilidade durante cinco anos na ordem, e de voltar a trabalhar na instituição onde terão ocorrido os abusos. Um leigo, funcionário da instituição, foi condenado no mesmo processo.

 Salesianos (1)

  • Um órgão de informação referiu uma suspeita de abusos de um padre salesiano, que terá sido praticado na zona de Cascais em 2005/2006. O caso terá sido arquivado pelo Ministério Público, por prescrição. Desconhecem-se quaisquer outros dados sobre este processo, incluindo se chegou a haver processo canónico, ou a identidade do padre.

 Jesuítas (8)

  • Segundo informação disponibilizada pela Companhia de Jesus, há registos de oito membros da ordem que praticaram abusos ao longo dos últimos 70 anos. Todos já morreram. Entre os suspeitos haverá padres, mas também irmãos, que não sendo ordenados são considerados religiosos professos, e por isso constam desta lista, e não da lista dos leigos. 
Desconhecido (2)
  • Uma notícia de um jornal refere o caso de um padre que é suspeito de ter abusado de vários seminaristas, alunos de catequese e acólitos. Diz que dois dos seminaristas abusados são agora padres numa diocese no sul do país. Contudo, a forma como o artigo está escrito deixa a possibilidade, não confirmada, de este padre ser o Inácio Belo, de Lisboa, referido mais acima. Devido a essa incerteza, e sem outros elementos que o clarifiquem, optei por não considerar este caso para a contagem.
  • O mesmo artigo acima citado refere o caso de um padre de uma diocese do norte que é suspeito de ter abusado de seminaristas, alguns dos quais abandonaram o seminário. Uma vez que existe a possibilidade, não confirmada, de este ser o mesmo caso já referido de Bragança, também optei, enquanto não chegam mais detalhes, por não o considerar para a contagem total.

Casos não especificados (1)
  • Em 2010 surge uma denúncia vaga sobre a Ordem Hospitaleira de São João de Deus nos Açores. Ninguém, nem padre nem leigo, é mencionado especificamente e a investigação não dá em nada. 

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