Pe. Paul Scalia |
Na verdade, a forma directa como se pedem estas
instruções ao Senhor já são indicativas da atitude filial necessária para a
oração: “Um dos seus discípulos disse-lhe, “Senhor, ensina-nos a rezar’”. O
primeiro passo para a oração é compreender, como este discípulo, que não
sabemos rezar como convém (Rom. 8,26). A oração não começa com a nossa força e
com os nossos conhecimentos, mas com a nossa fraqueza e docilidade.
Esta verdade é dura para os orgulhosos, mas consoladora
para todos os que já tentaram rezar e não foram capazes. Para rezar temos de
reconhecer que precisamos de ser instruídos. Na verdade, todas as orações
começam com “Senhor, ensina-me a rezar”.
Uma componente essencial desta oração filial é a
perseverança. Vemos isto no Patriarca Abraão, cuja oração antecipa a dos filhos
de Deus. (Cf. Gen. 18, 20-32). Nesta discussão sobre o destino de Sodoma e
Gomorra ele parece uma criança a suplicar por mais uns minutos antes de ter de
ir para a cama. Com a perseverança de uma criança que já tem em vista um
objetivo e não se deixará dissuadir, Abraão está continuamente a regressar ao
Senhor com uma nova proposta.
Mas existe uma diferença importante entre a perseverança
de Abraão e a nossa. Ele apela à justiça de Deus, que não desbaratará os
inocentes com os culpados. Abraão clama: Não deverá o juiz de todo o mundo agir
com justiça? Na verdade, devia. Mas nós apelamos mais até à misericórdia de
Deus. Pedimos-lhe que sustenha a sua fúria e que nos dê a sua ajuda não porque a
merecemos, mas porque precisamos radicalmente dela. A nossa fraqueza reivindica
a sua assistência.
É este seu apelo à misericórdia do Pai que Nosso Senhor
enfatiza nas suas instruções. Temos confiança na nossa oração ao Pai não porque
gozamos de um direito absoluto aos seus dons, mas porque sabemos que somos seus
filhos. Por isso é que podemos regressar continuamente a Ele. Pois se nós, que
somos maus, somos capazes de mostrar misericórdia, quanto mais o nosso Pai que
está nos céus se apressará a ajudar-nos?
Claro que, sabendo do fim terrível que tiveram Sodoma e
Gomorra, podemos pensar que o esforço de Abraão foi em vão. De que serviu toda
a sua insistência? Aparentemente, nada. E isso chama atenção para outra
dimensão da oração verdadeiramente filial: o abandono à vontade do Pai. Um
filho descansa na certeza de que a vontade do Pai é supremamente boa. Se uma
oração não é atendida é porque o Pai sabe melhor e tem um bem maior em mente.
Jesus reza no horto das Oliveiras |
Vemos o próprio Senhor a adotar esta postura quando Ele
reza a mais difícil de todas as orações filiais: “Abba, Pai, para ti tudo é
possível. Afasta de mim este cálice, mas não seja feita a minha vontade, mas a
tua”. (Mc. 14,36).
De certa forma, esse bem maior já está realizado em cada
acto de oração. A oração de Abraão não foi desperdiçada porque através dela ele
cresceu na sua capacidade de entrar em diálogo com Deus. Sim, devemos
apresentar as nossas necessidades terrenas a Deus. Podemos, contudo,
tornarmo-nos tão focados na resposta externa às nossas orações – o “remediar”
da situação – que deixamos de ver os efeitos internos que a oração tem em nós.
O nosso Pai não quer simplesmente resolver todos os
nossos problemas por nós. Ele quer algo mais. Deseja que nos aproximemos dele
nas nossas orações, confiando-lhe as nossas preocupações. E se ele resolver, de
facto, os nossos problemas, é para que ao experimentar o seu poder e bondade
possamos confiar ainda mais nele.
E isto leva-nos àquela última e misteriosa linha na
catequese do Senhor: “Quanto mais o vosso Pai que está no Céu dará o Espírito
Santo a quem o pedir?” Procuramos e pedimos muitas coisas na nossa oração.
Batemos (e às vezes com força) na porta do Céu com vários pedidos. Mas as
palavras de Nosso Senhor indicam que o fim último das nossas petições não é
esta coisa ou aquela, mas algo maior: o próprio Espírito.
Nosso Senhor responde sempre às nossas orações (dizendo
ou sim ou não) como o objetivo de dar ou aumentar o dom do Seu Espírito. A
nossa oração pode ser dirigida apenas a esta ou aquela situação, mas Ele quer
que seja mais, para nos aproximar mais de Si. Ele deseja não tanto que
recebamos o que pensamos precisar aqui e agora, mas que cresçamos em união com
Ele.
Quer o compreendamos ou não, a nossa oração é sempre
dirigida a este aumentar do Espírito, o Espírito de Filiação, que reza de
dentro de nós e nos permite clamar: Abba! Pai!
O Pe. Paul Scalia (filho do falecido juiz Antonin Scalia,
do Supremo Tribunal americano) é sacerdote na diocese de Arlington e é o
delegado do bispo para o clero.
(Publicado pela primeira vez no domingo, 28 de Julho de
2019 em The Catholic Thing)
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