Wednesday 4 July 2018

Preconceito Anticristão Despercebido

Hoje em dia quando pensamos em cristãos perseguidos a maior parte de nós pensa em locais como a China, o Médio Oriente, ou estados pária como a Coreia do Norte, Venezuela ou Cuba. São casos apontados ocasionalmente, mas que recebem pouca publicidade nos media seculares. Normalmente são os meios de comunicação religiosos, católicos e protestantes, que se ocupam de nos manter informados sobre as dificuldades dos nossos correligionários no mundo moderno.

Mas existe toda uma outra dimensão de ameaças aos cristãos que passa praticamente despercebida. Sabemos que existe pressão sobre organizações religiosas e igrejas na América – bem como crentes isolados como floristas ou pasteleiros – para se acomodarem às tentativas do Estado ou das agências federais para impor uma nova ética sexual, ou para aplicar as leis que regulam o “discurso de ódio” ou o preconceito contra crentes.

Até agora o Supremo Tribunal tem sido bastante bom a proteger a liberdade religiosa. E se o Presidente Trump – como é provável – conseguir nomear para o tribunal mais um juiz (ou dois?) que seja sensível à importância das defesas constitucionais da liberdade religiosa, poderemos ter protecção a longo prazo do constante ruído anticristão nas universidades, nos media e em Hollywood.

Há anos que tenho conhecimento da existência de problemas semelhantes na Europa, onde normalmente não existem as mesmas protecções ou recursos jurídicos que nós temos ao abrigo da Primeira Emenda. Mas não tinha noção da verdadeira extensão dos problemas que lá existem – e penso que poucos terão – embora agora tenhamos um excelente instrumento com o qual os podemos medir.

O Observatório de Intolerância e Discriminação contra Cristãos na Europa publicou um relatório de 74 páginas, relativo a 2018, que nos abre verdadeiramente os olhos (podem lê-lo online, aqui). Não se trata simplesmente de uma compilação de queixas ou de reacções exageradas aos choques típicos de sociedades pluralistas. Fornece um retrato de um problema extensivo que deve interessar a toda a gente que se importa com a liberdade, incluindo a liberdade religiosa.

Uma das coisas mais marcantes do relatório é o cuidado com que foi elaborado, a começar pelos termos que o definem: “O termo ‘intolerância’ refere-se à dimensão social ou cultural e, no pior caso, inclui crimes de ódio contra cristãos; o termo ‘discriminação’ refere-se à dimensão legal e inclui interferências com a liberdade de expressão, religião, consciência, livre associação e reunião, direitos paternais, liberdade contratual, remoção de símbolos cristãos pelo Governo, leis que afectam os cristãos de forma negativa e acesso desigual à justiça”.

Ao ler este parágrafo ficamos espantados por saber que estas coisas estão a acontecer na Europa, hoje. O observatório cita o Papa Francisco que diz que existem dois tipos de perseguição anticristã. A primeira é aberta, como se vê em locais como o Paquistão, e é clara, explícita e inegável. A segunda é “perseguição bem-educada (…) disfarçada de cultura, de modernidade ou de progresso”.

O relatório também divide a perseguição na Europa em duas categorias com nomes mais coloquiais: “Apertar” e “esmagar”. Os apertos estão a transformar-se num fenómeno internacional, como se vê por estas discrições, que têm paralelos na América: “Em França, um farmacêutico foi sancionado por se recusar a vender um DIU, um aparelho abortivo. Parteiras suecas que se recusam a participar em abortos perderam os recursos por despedimento injustificado e tiveram de pagar custas de tribunal. Um lar católico na Bélgica foi multado por impedir que os médicos administrassem uma injecção letal e outro na Suíça foi ordenado a permitir o suicídio assistido nas suas instalações, sob pena de perder os apoios estaduais”.

Isto já é mau em si. Mas os casos de esmagamento são ainda mais preocupantes. Muitos envolvem ataques por parte de muçulmanos a membros do clero ou a pessoas que ostentam cruzes ou outros artefactos religiosos. Se apenas ouve as notícias dos media generalistas, dificilmente saberia que estas coisas acontecem, a não ser que surja um caso impossível de ignorar, como o assassinato, em 2016, do padre Jacques Hamel, em França, às mãos de dois extremistas muçulmanos.

Mas não são apenas os muçulmanos. A maior parte do relatório do Observatório descreve mais de 500 casos de intolerância e discriminação, acompanhados de links que lhe permitem ver o que se passou em maior detalhe.

Um dos sinais da seriedade de tudo isto é que o Observatório não se contenta meramente em relatar estes abusos, mas faz sugestões concretas sobre o que poderá ajudar a contrariar aquilo que parece ser uma moda em crescimento. Duas dessas sugestões chamaram-me a atenção e são cruciais para sociedades onde se tornam cada vez mais aceitáveis atitudes anticristãs: “Os líderes de opinião devem ter noção da sua responsabilidade em formar um discurso público tolerante, e devem evitar estereotipar negativamente os cristãos ou o cristianismo. Os artistas devem respeitar os locais e os símbolos religiosos, tendo em conta que o objecto da sua arte poderá ser muito sagrado para os fiéis”.

Isto já seria muito bom, claro, embora os nossos intelectuais antirreligiosos não devam levar tais conselhos muito a peito. No fim das contas, porém, são as autoridades públicas, a todos os níveis, que devem ser confrontadas com as provas dos seus próprios preconceitos e erros. E devem ser obrigados a não os esquecer.

No caso americano da Masterpiece Cakeshop o nosso Supremo Tribunal notou, correctamente, a hostilidade aberta revelada pelo comissários dos direitos civis do Colorado para com o pasteleiro que se recusou a criar um bolo especial para um casamento gay. Desde então algumas pessoas comentaram que a decisão do tribunal não representou propriamente uma vitória, porque deu a entender que o tribunal só agirá quando existirem provas de preconceito anticristão aberto.

É bom que tenhamos isso em conta, uma vez que vão surgir outros casos parecidos. Mas os nossos amigos europeus fizeram bem em denunciar governos, a todos os níveis, por permitir discriminação subtil e – como temos visto nos Estados Unidos – o abuso de leis contra a discriminação para discriminar os cristãos.

Não vai ser uma batalha fácil. Mas quanto mais nós fizermos em termos de registar e denunciar o tipo de abusos identificados pelo Observatório, mais difícil será para os preconceituosos anticristãos.


Robert Royal é editor de The Catholic Thing e presidente do Faith and Reason Institute em Washington D.C. O seu mais recente livro é A Deeper Vision: The Catholic Intellectual Tradition in the Twentieth Century, da Ignatius Press. The God That Did Not Fail: How Religion Built and Sustains the West está também disponível pela Encounter Books.

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na Segunda-feira, 2 de Julho de 2018)

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