Robert W. Shaffen |
Os críticos dão muitas razões
para descontinuar o apoio militar americano. Em primeiro lugar, argumentam, a
Ucrânia não é uma democracia comparável à dos Estados Unidos. O seu Governo é
corrupto, e por isso não merecedor do apoio americano. Em segundo lugar, as
contribuições de armas e de munições enfraquecem a capacidade dos Estados
Unidos se defenderem em caso de um ataque inimigo. Em terceiro lugar, alguns
comentadores, como Sohrab Ahmari, acreditam que o preço do apoio americano será
a introdução na Ucrânia do liberalismo ocidental, com a consequente corrupção
moral e cultural da sociedade.
Outras personalidades, como Michael
Brendan Dougherty, da National Review, temem que a América seja arrastada para
o conflito nuclear que conseguiu, com tanto esforço, evitar durante a Guerra
Fria do século XX. Outro grupo preocupa-se com o facto de o envio de armas
estar a encorajar a China a tomar de assalto o Taiwan e, finalmente, há aqueles
que, como J. D. Vance e Matt Walsh, simplesmente acham que os americanos não
têm nada que se meter na guerra entre a Rússia e a Ucrânia.
Do lado contrário, os
defensores do apoio à Ucrânia invocam a contenção da Rússia, que voltou a
revelar a brutalidade pela qual tem sido responsável incontáveis vezes ao longo
da história. O compromisso americano para com os direitos humanos exige que o
poder dos Estados Unidos seja colocado ao dispor daqueles que resistem a
agressões injustas – algo semelhante ao programa Lend-Lease de FDR para um
Reino Unido isolado durante a II Guerra Mundial. Desta perspectiva os Estados
Unidos devem procurar estar activamente do lado da conduta civilizada.
Mas há outro factor que
devemos ter em consideração. É que o combate ucraniano também envolve a
segurança da Igreja Católica na Europa de Leste. O destino das Igrejas
Católicas de rito latino e oriental dependem do resultado da guerra. Por um
lado, se a Ucrânia colapsar completamente, a história sugere que a Rússia
voltará a suprimir a Igreja Católica Bizantina, que forma a maioria nas zonas
ocidentais da Ucrânia (tendo Lviv como sua “capital”).
A Ucrânia foi originalmente evangelizada
por gregos, pelo que os ucranianos adoptaram a teologia e a liturgia do
Cristianismo oriental no século X. A queda de Constantinopla para os turcos em
1453 minou a influência e a autoridade do respectivo patriarca, e as
subsequentes negociações entre os papas e os ucranianos conduziram à
reunificação das igrejas. Os ucranianos mantiveram as suas tradições, mas
submeteram-se à autoridade do Papa.
Ratificada a União de Brest-Litovsk,
em 1596, passou a existir a Igreja Greco-Católica Ucraniana, ao abrigo do Reino
Unido da Polónia e da Lituânia. Desde então os ucranianos formam a maior das
igrejas católicas de rito oriental.
Historicamente a Rússia sempre
alimentou o ódio ao Catolicismo Bizantino e a sua perseguição. Os russos
desprezavam a obediência bizantina a Roma, que associavam ao inimigo Católico
Romano Polaco. Os moscovitas consideravam os católicos bizantinos traidores.
Quando a Rússia imperial avançou para ocidente e para sul, no século XVIII, as
igrejas greco-católicas foram destruídas ou expropriadas e os seus padres
enviados para as prisões do Czar, na Sibéria.
Quando Catarina a Grande estendeu
as fronteiras imperais da Rússia através da conquista e da repartição,
pressionou os católicos bizantinos a submeterem-se à Ortodoxia. Os padres
católicos que desafiassem a Czarina eram deportados e substituídos por clero
Ortodoxo Russo. O Catolicismo foi forçado à clandestinidade no Império Russo,
embora a Igreja tenha sobrevivido e prosperado nos territórios mais pequenos da
Ucrânia ocidental que ficaram sob o domínio da Áustria dos Habsburgos, que eram
católicos.
Não se pode esperar que seja o
antigo agente da KGB, Vladimir Putin, a estender a mão aos católicos bizantinos
da Ucrânia. Ele já está a deportar os ucranianos de leste e jamais reconheceria
uma religião cujos fiéis aceitam a autoridade do bispo de Roma. O domínio russo
da Ucrânia seria catastrófico para o catolicismo bizantino.
Essa ameaça foi sublinhada no
início da guerra pelos mais importantes hierarcas da Igreja Greco-Católica da
Ucrânia. O Arcebispo Maior Sviatoslav Shevchuk, líder da Igreja, expressou o
seu medo pelo futuro da mesma. Fez notar que alguns padres católicos já foram
submetidos a torturas e afirmou que concessões territoriais à Rússia
enfraqueceriam fatalmente o seu país.
Mais ou menos ao mesmo tempo o
Arcebispo Metropolita da Arquieparquia Greco-Católica Ucraniana de Filadélfia
afirmou que “esta batalha é, simplesmente, sobre se a Ucrânia aceita ser uma
colónia e se os ucranianos aceitam ser submetidos”. Depois de mais um ano de
guerra o povo ucraniano – católicos e ortodoxos – já deram uma resposta
convincente.
O sucesso militar da Rússia
também constitui uma ameaça para a segurança do Catolicismo de rito latino. Uma
Ucrânia dominada pela Rússia aumentaria a fronteira entre a Polónia e o seu
antigo inimigo. A ameaça à Lituânia também cresceria muito. Uma vez que ambos
estes países são aliados formais dos Estados Unidos (ao contrário da Ucrânia)
as Forças Armadas americanas estão obrigadas por tratado a socorrê-los em caso
de guerra.
A Administração de Biden descartou
a possibilidade de uma invasão russa até que esta aconteceu. A equipa de Biden
disse que seria uma loucura Putin iniciar uma grande guerra na Europa, como se
não houvesse contributos históricos de loucos para aquilo a que Churchill
chamou “o longo e lamentável catálogo de crime humano”.
Mas a Rússia invadiu na mesma.
Um ataque contra a Polónia ou a Lituânia seria uma loucura ainda maior. Mas
alguém se atreve a contar com a racionalidade de Putin?
Robert W. Shaffern é professor
de história medieval na Universidade de Scranton. Também lecciona cursos de civilizações
antigas e bizantinas, bem como sobre o Renascimento Italiano e a Reforma. É autor de The Penitents’ Treasury:
Indulgences in Latin Christendom, 1175-1375.
(Publicado pela primeira vez
em The
Catholic Thing na quinta-feira, 13 de Abril de 2023)
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