Wednesday 30 October 2019

Secularismo Militante e Repressão Religiosa na América Latina

Eric Patterson
Quando pensamos em locais do mundo onde a expressão de fé é restringida, não se costuma pensar no Hemisfério Ocidental. Os Estados Unidos têm uma população religiosamente ativa. A América Latina está adornada com a arte e a arquitectura do Catolicismo. Mas olhando mais de perto vemos tendências antirreligiosas – ou mesmo casos de perseguição aberta – em várias cidades da América Latina.

Existem pelo menos dois tipos de perseguição religiosa. A primeira é levada a cabo por pessoas que reclamam uma justificação religiosa para fazer mal a outros, como no Irão. A segunda acontece em países como na China, onde indivíduos ou comunidades são perseguidos por causa da sua religião. O Estado Islâmico exemplifica o pior do pior: um cabal que assenta a sua autoridade em justificações explicitamente religiosas para poder praticar a violência, ao mesmo tempo que persegue comunidades com base na sua identidade religiosa.

Felizmente a maior parte da América Latina não tem de lidar com conflitos ou perseguição religiosa como vemos noutras partes do mundo. Porém, olhando para a paisagem atual da América Latina, existem exemplos de perseguição explícita. Esta repressão é normalmente da responsabilidade dos velhos secularistas: autoritários movidos pelo dogma materialista, secular, anti-fé da esquerda dura do Século XX.

Nalguns sítios, sobretudo em Cuba, existem restrições legais pesadas que foram desenhadas para colocar os crentes sempre em risco de violar a lei. Depois vemos esses cidadãos a serem perseguidos pela polícia, multados e detidos. Por exemplo, de acordo com o Departamento de Estado dos Estados Unidos o gabinete de Assuntos Religiosos do Partido Comunista Cubano e o Ministro da Justiça recorrem a “ameaças, restrições às viagens internacionais e internas, detenções e violência contra alguns líderes religiosos e seus seguidores, restringindo ainda os direitos dos reclusos de praticar livremente a sua religião. Os líderes religiosos e dos media dizem que o governo continua a assediar ou deter membros de grupos religiosos que lutam por mais liberdade política e religiosa.”

É extremamente difícil registar uma igreja, arrendar propriedades, abrir uma nova igreja, renovar edifícios que já existem ou construir uma igreja nova em Cuba, seja protestante ou católica.

Hugo Chavez e os seus sucessores têm sido muito críticos da Igreja Católica quando isso lhes convém. A Venezuela também tem assistido a um aumento grande de anti-semitismo, em larga medida devido a propaganda antijudaica e anti-Israel por parte do Governo. Tanto na Venezuela como na Nicarágua figuras religiosas, tanto clericais como leigas, têm sido investigadas, assediadas e nalguns casos acusadas e condenadas por tomarem posições públicas contra a corrupção.

Hoje o México é um local religiosamente diverso e vibrante, mas também existem casos de perseguição. Alguma desta é um legado da revolução (1910-1920) e das políticas secularistas de partidos do Século XX, tal como o PRI, que governou o país anos e anos, e o PRD socialista. De acordo com pelo menos um relatório contemporâneo o México é o local mais perigoso do mundo para padres católicos e para leigos, sobretudo por se oporem aos cartéis de droga e à sua violência e corrupção.

Melhor filme estrangeiro nos óscares de 2018
À parte disso, ainda existem no México sítios onde as autoridades locais punem – com espancamentos e prisão, entre outros – quem se converte do Catolicismo a outra fé. Infelizmente isto é um problema global: o uso de violência governamental para inibir ou punir o direito fundamental de tomar decisões religiosas, incluindo de mudar de religião, que sejam consistentes com as suas consciências.

Mais a norte vemos perseguição menos violenta, mas há uma tendência para o secularismo violento que procura empurrar as pessoas, instituições e ideias religiosas para fora da praça pública. Normalmente isto é feito com expedientes jurídicos, usando como armas novas regulações de forma a retirar aos crentes o seu ganha pão e os seus direitos religiosos.

No Canadá, por exemplo, o Quebec passou recentemente uma lei que impede os funcionários públicos de usar símbolos religiosos em serviço. Trata-se de uma clara violação da Constituição do Canadá, uma vez que impede um cristão de usar um pequeno crucifixo ao pescoço, um judeu de usar um quipá e uma muçulmana de cobrir o cabelo no local de trabalho.

Nos Estados Unidos temos visto leis e processos semelhantes, forçando empresas privadas, organizações religiosas e instituições privadas de solidariedade social a violar as suas convicções mais profundas ao obrigá-las a pagar por contracetivos ou sobre se os empregados têm ou não a obrigação de cumprir com os valores religiosos dos seus empregadores.

Veremos a mesma coisa na América Latina num futuro próximo? Infelizmente, parece que sim. O primeiro sinal é o aumento do secularismo das populações urbanas e das elites. Segundo organizações como a Pew, e outras, há dados que apontam para níveis muito baixos de prática religiosa entre católicos, sobretudo em cidades influentes como Buenos Aires, Rio de Janeiro e La Paz. As sondagens mostram números cada vez maiores de pessoas que nem sequer fingem identificar-se culturalmente como católicas, preferindo o termo “secular”: Uruguai (42%), Cuba (25%), Chile (25%), Argentina (21%), e quase 10% no Haiti, Brasil, Venezuela, Equador e Suriname.

Em segundo lugar, estamos a assistir uma campanha jurídica agressiva em muitas capitais, sobretudo no que diz respeito a questões de vida, casamento e orientação sexual/identidade de género. Só em 2018 o Uruguai e o Chile aprovaram leis que tornam mais fácil aos transgéneros mudar as suas identidades nos documentos oficiais; tribunais em Costa Rica e no Equador declaram inconstitucionais proibições de casamentos entre pessoas do mesmo sexo e um tribunal nas Bermudas declarou a inconstitucionalidade de uma lei que restringia o direito ao casamento entre pessoas do mesmo sexo. Os media estão a desempenhar o seu papel: o melhor filme estrangeiros dos óscares o ano passado foi para um filme chileno sobre rejeição e triunfo de transgéneros que se tornou uma sensação na região.

Num artigo em que documenta orgulhosamente todos estes avanços progressistas, o autor avisa que “estão a surgir sinais de uma contramaré conservadora. Liderada por evangélicos e católicos conservadores, os cidadãos estão a organizar-se para exigir o fim de políticas progressistas sobre diversidade de género, sexualidade e direitos reprodutivos”. O próximo passo será, logicamente, catalogar os ensinamentos religiosos sobre sexualidade como “discurso de ódio”. As primeiras tentativas já chegaram aos tribunais.

Os defensores da liberdade religiosa apoiam o direito fundamental de todos os cidadãos, incluindo aqueles com quem alguns discordam, apresentarem argumentos inspirados na sua fé na praça pública. Isto devia estar acima de posições religiosas ou partidárias, sejam elas conservadoras ou progressistas. Contudo, os novos secularistas da América Latina, tal como os antigos, estão a tentar usar o poder coercivo do Governo para impor uma nova ideologia à população, uma que ameaça claramente uma visão de fé da vida, da família e das instituições fundamentais da sociedade.


(Publicado pela primeira vez na segunda-feira, 16 de Setembro de 2019 em The Catholic Thing)

Eric Patterson, é vice-presidente executivo da Religious Freedom Institute, em Washington, D.C. Entre os 14 livros que já escreveu incluem-se “Latin America’s Neo-Reformation: Religion’s Influence onContemporary Politics” e “Politics in a Religious World: Building a ReligiouslyInformed U.S. Foreign Policy”.


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