Wednesday 2 October 2019

Quem Restaurará a Igreja?

Stephen P. White
A frequência dominical está em queda. As contribuições financeiras ao nível tanto da paróquia como da diocese também. Há anos que assistimos a um decréscimo dos casamentos e baptismos de crianças. A maioria destas quedas não começou com a crise dos abusos, mas os dados do ano passado indicam que a crise as acelerou.

Quem é que reedificará a Igreja? De onde virá a renovação que todos sabemos ser necessária, e que tanto desejamos ver? Dos bispos? De Roma? Já disse várias vezes: Se algum dia chegar, uma autêntica reforma da Igreja virá através de, e com, o bispo de Roma e os bispos em comunhão com ele. Mas para quem tem fé isso não passa de uma tautologia, não nos leva muito longe.

Confiar que o Senhor preservará a sua Igreja não requer que acreditemos ou esperemos que a reforma surja de Roma ou que comece por iniciativa de um dos sucessores dos apóstolos. A história revela que a maioria das reformas eclesiais não começaram com o Papa. A maioria das reformas não começaram sequer com os bispos. O padrão é sempre o mesmo, a renovação começa com a santidade, esteja ela onde estiver.

A santidade não é património do clero. Aliás, a santidade não é só para quem é ordenado. O chamamento à santidade é universal e estende-se a todos os baptizados, ou melhor, a toda a humanidade. Estive uma vez numa conferência em que alguém estava a comentar uma frase do Papa Francisco sobre a santidade. Ao meu lado estava uma conhecida activista de justiça social, que exclamou: “Eu nunca pensei em santidade, nem um dia na minha vida”. Não duvido minimamente.

E porque não? Porque há muito trabalho a fazer neste Vale de Lágrimas que não requer sequer uma gota de santidade. Ser uma pessoa decente não nos obriga a sermos perfeitos como o Pai no Céu é perfeito. Mas somos chamados a mais, muito mais do que isso.

Na sua primeira homilia como Papa, Francisco alertava todos os que o acabavam de eleger para a futilidade das boas obras que não proclamam Cristo:

“Podemos edificar um monte de coisas, mas se não confessarmos Jesus Cristo, está errado. Tornar-nos-emos uma ONG sócio-caritativa, mas não a Igreja, Esposa do Senhor. Quando não se caminha, ficamos parados. Quando não se edifica sobre as pedras, que acontece? Acontece o mesmo que às crianças na praia quando fazem castelos de areia: tudo se desmorona, não tem consistência.”

Se nos esquecermos disto – se os nossos esforços, por mais bem-intencionados que sejam, se separarem da proclamação da Boa Nova – então os nossos esforços não só falharão, mas tornarão as coisas piores. “Quando não confessamos Jesus Cristo”, diz o Papa, “confessamos o mundanismo do diabo, o mundanismo do demónio”.

A questão é esta: o trabalho de restaurar a Igreja – de abordar as necessidades urgentes do momento, de procurar a justiça de forma sincera, de restaurar o Corpo maltratado de Cristo – não se pode substituir à proclamação do Evangelho. São uma e a mesma coisa. Agora, neste momento de crise, não é tempo de colocar a evangelização de lado para lidar com problemas aparentemente mais urgentes: “Deixem os mortos enterrar os seus mortos. Vai e proclama o Reino de Deus”.

O arcebispo Charles Chaput, da Filadélfia, disse-o de uma forma belíssima. As suas palavras são de 2012, mas adaptam-se perfeitamente aos nossos dias:

O pecado faz parte do território humano e é uma ameaça diária ao nosso discipulado. E se os nossos corações enregelarem, se as nossas mentes se fecharem, se os nossos espíritos se tornarem gordos e gananciosos, aninhados na nossa pilha de bens, então a Igreja neste país murchará. Aconteceu antes, noutros tempos e noutros lugares, e pode acontecer aqui. Não podemos mudar o mundo sozinhos. E não podemos reinventar a Igreja. Mas podemos ajudar Deus a mudar-nos a nós. Podemos viver a nossa fé com zelo e com convicção – e Deus tratará do resto.

O Senhor está a purificar a sua Igreja. Ainda bem, dizemos nós. Não era sem tempo, dizemos. Mas estamos dispostos a deixá-lo purificar-nos a nós? Podemos mesmo esperar que a Igreja seja purificada e, ao mesmo tempo, esperar que nós, que somos membros da Igreja, sejamos poupados à dor e à angústia dessa purificação?

Quem restaurará a Igreja? Ele. E se estivermos dispostos, Ele realizará grandes coisas através de nós. Só nos custará tudo – o que afinal de contas não é nada.

Tomai, Senhor, e recebei, toda a minha liberdade, a minha memória, o meu entendimento e toda a minha vontade, tudo o que tenho e possuo; Vós mo destes, a Vós, Senhor, o restituo. Tudo é vosso, disponde de tudo, à vossa inteira vontade. Dai-me o vosso amor e graça, que esta me basta. (Uma oração de Santo Inácio de Loyola)

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