Pe. Mark Pilon |
Recentemente um amigo, bom católico e bom homem,
discordou de mim quando eu argumentei que a contracepção e a mentalidade
contraceptiva não só mudaram os conceitos sociais de casamento e família, como
poderão ter minado fatalmente as culturas e as nações previamente cristãs. É
uma visão negativa, admito, mas também acho que é bastante realista e penso que
é crucial que a enfrentemos como cristãos.
Ele contra-argumentou que a minha visão é demasiado
simplista e que ignora o facto de a queda do índice de natalidade anteceder em
pelo menos um século a invenção da pílula. Mais, existem por detrás disto muitas
causas complexas para além dos contraceptivos, causas de natureza económica,
social, geográfica, etc. Tudo isto é verdade.
Mas esta visão deixa de fora o factor essencial. A
contracepção não é a única causa da queda demográfica radical, mas é, sim, o
meio pelo qual essa queda foi conseguida de forma tão eficiente em tantos
sítios. Obviamente as correntes ideológicas, como o movimento contra o
crescimento populacional, também desempenharam um papel fundamental e há
certamente outros factores envolvidos, mas estes não explicam o que há de
verdadeiramente diferente e novo neste decréscimo demográfico secular.
Historicamente tem havido várias razões, tanto pessoais
como sociais, para que as pessoas limitem o tamanho das suas famílias. Mas
quando as pessoas limitavam o tamanho das suas famílias no passado –
normalmente através da abstinência ou do uso de métodos de barreira – não
estavam a negar, em si, o plano de Deus para o casamento, estavam simplesmente
a recusar-se a segui-lo por razões pessoais, boas ou más.
Também não afirmavam, como fazem cada vez mais pessoas
hoje, que a esterilidade é mesmo preferível em relação à fertilidade, nem que a
esterilidade no casamento é igual a, se não mesmo preferível à, fertilidade no
casamento. Por outras palavras, não tomavam parte numa redefinição da relação
essencial entre o casamento e a procriação.
Mas esse já não é o caso. E a crescente aceitação do
conceito de casamento homossexual é, a este respeito, um poderoso sinal dos
tempos, a último desenvolvimento das implicações da contracepção para o
casamento e para a sociedade.
A mentalidade contraceptiva não é apenas uma construção
mental, nem uma questão secundária. Esta mentalidade é precisamente aquilo que
há de novo na tendência histórica da infertilidade, a tendência para separar
radicalmente a fertilidade do casamento, para negar que a procriação é um
factor essencial de um verdadeiro casamento.
Essa tendência chegou agora ao seu ápice na afirmação,
tanto legal como na opinião pública, de que o exemplo extremo de união sexual
infértil, o acto homossexual, deve ser reconhecido como base para um casamento.
Esse é o cerne da questão na igualdade do casamento, o equiparar de actos
homossexuais a actos que estão intrinsecamente ligados à fertilidade, mesmo que
nem sempre resultem na procriação. O casamento gay é o último passo na
redefinição do casamento em relação à fertilidade e a procriação. Esse processo
de redefinição de casamento iniciou-se com a gradual aceitação moral da
contracepção.
Outro passo foi o desenvolvimento de técnicas e meios
contraceptivos que causam directamente esterilidade, não apenas no acto mas na
pessoa. A pílula era considerada uma alteração temporária (talvez não tão
temporária para muitas mulheres) do corpo da mulher, por forma a evitar a
fertilidade. Agora existem intervenções cirúrgicas, tanto para homens como para
mulheres, que tornam o corpo permanentemente estéril, uma alteração ainda mais
radical da natureza humana.
Pecado contra o primeiro mandamento? |
Quando começámos a alterar tecnologicamente o corpo
humano e a sua fertilidade, tratou-se de uma verdadeira mudança na nossa relação
com Deus. A fertilidade não é apenas mais um aspecto da nossa natureza humana.
É o elo de ligação mais íntimo entre a natureza corporal do homem com o Deus da
criação, um aspecto essencial da humanidade enquanto criada à imagem de Deus.
O Senhor é verdadeiramente um Deus de fertilidade, ainda
que não seja o Deus da fertilidade dos pagãos. Aliás, pelo menos os pagãos
estavam, dessa forma, a honrar a relação essencial entre a fertilidade humana e
o divino. Eles percebiam aquilo que o nosso mundo tão esclarecido já não
percebe. É por isso que João Paulo II ensinou que a contracepção era também um
pecado contra o primeiro mandamento. É uma nova forma de idolatria em que o
homem se eleva ao estatuto de divindade e as consequências são muito extensas,
indo muito para além do mal da contracepção.
A contracepção afectou tudo: casamento, fé, consciência
moral, autoridade do magistério, já para não falar no colapso da sociedade,
causado pela revolução sexual que facilitou e, agora, a destruição de
populações e nações inteiras.
Em Junho os juízes do Supremo Tribunal tomarão uma
decisão sobre a natureza do casamento, mas essa decisão interessa pouco. As
sondagens já mostram que o mal tomou conta das massas na Europa e aqui. Mesmo
muitos cristãos aceitam que uma noção profundamente deturpada de casamento seja
aceite como igual ao verdadeiro plano de Deus para o casamento, como aparece no
Génesis.
É provável que esta atitude acabe por determinar o
destino de muitas nações.
O padre Mark A. Pilon, sacerdote da Diocese de Arlington,
Virginia, é doutorado em Teologia Sagrada pela Universidade de Santa Croce, em
Roma. Foi professor de Teologia Sistemática no Seminário de Mount St. Mary e
colaborou com a revista Triumph. É ainda professor aposentado e convidado no
Notre Dame Graduate School of Christendom College. Escreve regularmente
em littlemoretracts.wordpress.com
(Publicado pela primeira vez no sábado, 23 de Maio de
2015 em The Catholic Thing)
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