David G. Bonagura Jr. |
“Com a subida dos
rendimentos, descem os campanários… A felicidade chega e Deus põe-se a andar”.
Olhando para o
chamado “primeiro mundo”, esta afirmação,
no geral, parece ter algum mérito. Ao longo dos últimos séculos, à medida que
os nossos confortos materiais se multiplicaram lentamente, o fervor religioso
tendeu a diminuir. Mas este declínio não aconteceu da mesma forma nas partes
menos abastadas do mundo. Uma vez que esta vaga de secularismo no mundo
desenvolvido parece ter coincidido com uma era de avanço tecnológico e
material, parece adequado perguntar se a fé religiosa pode sequer sobreviver
neste clima.
A aparente
incompatibilidade entre a fé e o conforto humano não é nova. O próprio Senhor
anteviu esta tensão fazendo o aviso: “É mais fácil a um camelo passar no buraco
de uma agulha, do que um rico entrar no Reino de Deus”, (Mt. 19,24). Esta
admoestação seguiu-se à conversa entre Jesus e o jovem rico, que preferiu regressar
triste para os seus muitos bens do que seguir Jesus.
Por outro lado, a
fé parece ser mais firme quando as pessoas estão necessitadas. No seu desespero,
dez leprosos procuraram Jesus. Satisfeitos os seus pedidos, apenas um se
lembrou de prestar homenagem ao seu Salvador. A inspiração heróica dos mártires
incentivou a fé de muitos crentes durante os tempos de opressão. Nos nossos
dias, as Igrejas Católicas estavam significativamente mais cheias ao meio-dia
de terça-feira, 11 de Setembro de 2001, do que na mesma hora uma semana antes
ou nas terças-feiras seguintes.
Mesmo a nossa
prática quaresmal parece apontar nesta direcção. Com o jejum privamo-nos
deliberadamente de comida e outros confortos físicos para incentivar o
crescimento espiritual. Na primeira semana da Quaresma pedimos a Deus: “Fazei
que a nossa alma, purificada pela penitência corporal, resplandeça cada vez
mais com a luz da vossa presença”.
Teria Marx razão?
Será que a religião é o ópio do povo, destinado a ser erradicado mal se obtenha
a quantidade certa de riqueza e bem-estar material? A fé no mundo desenvolvido e
cada vez mais abastado está destinada a ser eliminada?
Em primeiro lugar,
não há nada de errado com os bens materiais ou confortos físicos, em si.
Depois, até ver, a fé tem claramente sobrevivido à disseminação de bens de luxo
e à secularização. Muitos continuam a crer, mesmo de forma fervorosa, incluindo
algumas das pessoas mais ricas e confortáveis de entre nós. Há paróquias e
regiões no mundo desenvolvido onde a prática religiosa é fervorosa e há ricos e
pobres que continuam a responder ao chamamento das vocações religiosas. Por
isso não parece ser o caso que a riqueza e o conforto sejam incompatíveis com a
fé.
Mas parece justo
concluir que o estilo de vida do mundo desenvolvido, como o conhecemos agora,
tem o potencial para ser hostil à fé. Os nossos corações irrequietos e
destinados a Deus, nas palavras de Santo Agostinho, podem facilmente ser
distraídos (no sentido literal de “arrastados para longe”) pela disponibilidade
geral de confortos, conveniências e remédios que prometem a felicidade. Por
entre o ritmo de vida incansável e o barulho de fundo constante do nosso mundo,
a voz de Deus, que prefere o silêncio e a quietude, torna-se mais difícil de
ouvir.
Generation Smartphone - No need for God? |
Mas o primeiro mundo
é bem mais do que um aglomerado de coisas, barulhos e actividades. O poder da
tecnologia e dos bens materiais deu lugar a um espírito único, uma
característica da era moderna que desembocou no mundo moderno: O serviço e a
adoração de nós próprios como fim último para o qual estes bens existem. Em vez
de encarar o nosso progresso como forma de construir o Reino de Deus, o mundo
desenvolvido preferiu usar a tecnologia para banir Deus, numa tentativa de nos
tornarmos soberanos auto-suficientes do Universo. Enquanto sociedade,
permitimos que os materiais nos conduzissem ao materialismo – a crença de que
apenas aquilo que é físico e tangível tem verdadeiro significado.
Neste ambiente, é
difícil para uma fé num Deus invisível e imaterial, que não promete a eliminação
dos nossos sofrimentos, mas a dádiva de um tipo de união com ele actualmente
incompreensível, ganhar raízes em mentes já por si cativadas por bens materiais
e as suas promessas. Imaginem a reacção de um adolescente típico à descrição
das visões beatíficas enquanto o seu smartphone brilha com todo o tipo de
imagens e mensagens. Claro que há adolescentes que perceberam o vazio do
materialismo actual e abraçaram a fé, mas são relativamente poucos.
Hoje os inimigos da
fé do mundo desenvolvido são tão formidáveis como em qualquer altura da
história da salvação. E esta história demonstra que os católicos têm obtido os
seus maiores sucessos na evangelização de povos inteiros quando motivados por
duas crenças profundas: Um grande amor por Cristo, ao ponto de martírio, e o
entendimento de que aqueles que encontram não podem ser salvos se não aceitarem
o Evangelho.
Nosso Senhor
prometeu que as portas do Inferno não prevalecerão contra a Igreja, mas isso
não garante que as almas permaneçam dentro dela. Um número preocupante de
concidadãos no mundo desenvolvido ouviram o Evangelho mas não escutaram. Se os
nossos esforços de evangelização não forem tão zelosos como os dos missionários
do passado, o mundo desenvolvido poderá tornar-se a razão da pergunta preocupante
de Jesus: “Quando filho do homem vier, encontrará fé sobre a terra?” (Lc. 18,8).
David G. Bonagura,
Jr. é professor assistente de Teologia no Seminário da Imaculada Conceição, em
Huntington, Nova Iorque.
(Publicado pela
primeira vez no Domingo, 22 de Março de 2015 no The Catholic Thing)
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