Se, como proclama São Paulo, “Cristo ressuscitou, e é primícias
daqueles que adormeceram” (1 Cor. 15,20), então podemos compreender algo do que
nos espera ao olhar atentamente para o que Cristo revelou com a sua morte e
ressurreição. Uma coisa que deve ser imediatamente evidente é que a promessa
cristã da vida eterna não é a mesma coisa que o objetivo transhumanista da
imortalidade. A promessa de que os cristãos jamais morrerão não existe.
No Evangelho de João, pouco depois de Jesus ter lavado os
pés dos seus discípulos, ele diz-lhes: “Na casa de meu Pai há muitos aposentos;
se não fosse assim, eu vos teria dito. Vou preparar-vos um lugar. E se eu for e
vos preparar um lugar, voltarei e levar-vos-ei para junto de mim, para que
estejam onde eu estiver. Vocês conhecem o caminho para onde vou” (João 14, 2-4).
Só com base nesta afirmação podemos bem imaginar que
Jesus está a dizer que vai para um lugar e que mais tarde mostrará aos
apóstolos como é que lá se chega. Tomé, sem compreender, diz: “Senhor, nós não
sabemos para onde vais, como podemos saber o caminho?” (Jo. 14,5). Mas Tomé não
captou o sentido subtil das palavras de Jesus. Ele é “o caminho”. Por isso
quando diz, “vocês conhecem o caminho”, o que quer dizer é “vocês conhecem-me,
e Eu sou o caminho”. De facto, é precisamente isso que ele diz a Tomé: “Eu sou
o caminho, a verdade e a vida”. (João 14,5)
Perto do final do conto humorístico de Mark Twain “Os
Diários de Adão e Eva”, Adão, que inicialmente tinha resistido a Eva, esta nova
criatura que está a invadir o seu espaço, chora sobre a sua campa, tendo
compreendido que “onde ela estava, aí estava o Éden”. O “Diário” de Twain é uma
comédia romântica, e não uma obra de teologia complexa, mas levanta questões
importantes: O paraíso é um lugar, ou uma pessoa? Enquanto cristãos não somos
também chamados a reconhecer que o Paraíso não é apenas um lugar, mas sim a
união a uma Pessoa (ou Pessoas) – Cristo, que envia o Espírito Santo para
“implementar a caridade em todo o mundo no meu coração” e nos introduz numa
união com o Pai?
Na Última Ceia Cristo diz aos seus discípulos que Ele
deve partir, mas que depois enviará o Espírito Santo para os ajudar e guiar. E,
eventualmente, Ele “parte” mesmo. Mas depois da sua morte na cruz faz uma pausa
antes de regressar ao Pai (por assim dizer) e passa mais algum tempo com os
discípulos.
Porquê? Não lhes tinha dito já tudo o que precisavam de
saber? Não lhes mostrou “o Caminho?” Têm a prova da sua ressurreição dos mortos
no túmulo vazio.
Se, como São Paulo afirma, Cristo é as “primícias”
daquilo que os fiéis defuntos vão poder gozar na ressurreição geral, o que é
que as suas aparências nos revelam sobre a vida ressuscitada?
Sugiro duas coisas.
Primeiro, a sua morta não o desligou, como se poderia
pensar, do Pai; pelo contrário, Ele partilha inteiramente a glória do Pai, que
é revelada mais plenamente agora que Ele ressuscitou dos mortos. Mas, em
segundo lugar, a pessoa diante deles ainda é o Jesus que conheciam e amavam.
Dizemos às vezes que a presença de Cristo entre os onze na sala onde estavam
escondidos, era uma presença glorificada, mas isso não significa que Ele estava
menos presente para eles do que durante a sua vida. Ainda podiam sentar-se,
conversar e comer com Ele.
O que nos é prometido, então, pelo Cristo ressuscitado,
que é as “primícias” daquilo que também nós vamos gozar, é de que poderemos,
depois da morte, obter a união plena com Deus e partilhar da comunhão eterna de
amor partilhada entre o Pai, Filho e Espírito Santo. E porém, nesta união com o
Deus Trino, não nos vamos perder como um pingo de água no oceano.
Aquilo que muitos temem na morte, seja a deles ou a dos
outros, é a perda da ligação com as pessoas que amam. Se pensamos que ir para o
Céu é como ir para Cleveland (só que melhor), então ficamos tristes porque
eles, ou nós, “vamos embora”, ainda que esperemos que seja para “um sítio
melhor”. Mas se o Céu é uma união com o Pai em Cristo através do Espírito, e se
Cristo vive e está em cada um de nós, então também nós nos mantemos em comunhão
com os nossos entes queridos – mais intimamente e plenamente, até – no Corpo de
Cristo e na comunhão dos santos.
Uma das maiores tragédias, quando as pessoas perdem a fé
na Presença Real de Cristo na Eucaristia, é de que rapidamente perdem a sua
esperança na comunhão dos santos – de que mesmo na morte continuamos presentes
para os nossos amados e eles connosco. Se Cristo não ressuscitou e está
presente para nós, então o mesmo se aplica a todos aqueles que amamos. E isso é
algo demasiado triste para contemplar.
Por isso regozijemos na Boa Nova. Cristo ressuscitou, o
amor não foi derrotado, as portas da morte foram escancaradas e os santos
correm ao nosso encontro em alegria.
Randall Smith é professor de teologia na Universidade de St. Thomas, Houston.
(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na quarta-feira, 7 de Abril de
2021)
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