Michael Pakaluk |
A beatificação e a canonização
de Vianney foram das mais rápidas dos tempos modernos, antes das reformas
promovidas pelo Papa João Paulo II. Pio X beatificou-o em 1905 e no dia 31 de
maio de 1925 foi canonizado por Pio XI.
Num
artigo recente referi-me à conhecida citação de S. Josemaria Escrivá, de
que “as crises do mundo são crises de santos”. Podemos concordar com essa
frase, mas ainda assim não compreender bem o seu alcance. O seu significado
parece variar tanto em relação ao indivíduo, e à própria crise, como o conceito
de santidade. Consideremos os exemplos de Juan Diego, Tomás Moro, John Henry
Newman, madre Teresa e João Paulo II. Mas por hoje consideremos Vianney.
Em retrospectiva, Vianney
parece ser um de vários padres e religiosos criados na sequência da Revolução
Francesa para trazer França de volta à fé. Era um rapaz durante o Reino de
Terror da Revolução Francesa. Assistiu à execução de padres e ao encerramento
de igrejas por ordem das autoridades civis. Mas, para ele, a necessidade de
padres tornou-se ainda mais palpável, e não menos. E não era caso único. Entre
os que foram ordenados diáconos com ele em Lyons estavam Marcellin Champagnat
(canonizado por João Paulo II em 1999) e Jean-Claude Colin, fundador dos padres
maristas.
Mas embora os santos sejam as
respostas às crises, não aspiram a ser “respostas às crises” – nem, pode-se dizer,
seriam santos se o fizessem. Aspiram a amar Deus de forma apaixonada,
independentemente das crises. O biógrafo de Vianney, Joseph Vianney, interpreta
as conhecidas dificuldades do padre com o Latim e a Filosofia à luz disto
mesmo.
Do ponto de vista humano,
escreve Joseph, pode-se pensar que a crise em França seria confrontada por
apologética brilhante na Sorbonne, ou pela bela oratória na catedral de Notre
Dame. Mas a Igreja estava ainda mais necessitada de párocos rurais. “para
demonstrar, pela santidade das suas vidas, a verdade do Evangelho, no qual as
pessoas tinham deixado de crer. A criança de Dardilly havia sido escolhida, de
entre todas as outras, para ser o modelo desses santos padres, que são
indispensáveis para a execução do plano divino.”
Anos mais tarde um sacerdote
trouxe ao confessionário do Cura d’Ars um problema de consciência complexo, que
tinha confundido os maiores teólogos morais, e viu que foi resolvido de forma
imediata, elegante e convincente pelo simples pastor. Perguntou a Vianney onde
tinha obtido um conhecimento teológico tão astuto e o santo respondeu apontando
ao genuflectório.
O Cura estava profundamente convicto
da sua própria indignidade e não retirava qualquer consolo da sua virtude.
Rezava ardentemente para que não se tornasse o centro das atenções. Por
exemplo, através das suas orações milhares de peregrinos a Ars foram curados de
males físicos. Mas, aparentemente em resposta às mesmas orações, nunca eram
curados imediatamente. Ele dizia-lhes para regressarem a casa e rezarem uma
novena a Santa Filomena – e ao nono dia eram curados, sem atenções, longe de
Ars.
No pico do verão os peregrinos
que aguardavam em filas podiam sair durante alguns momentos para respirar ar
fresco, de forma a não desmaiar. Mas ele passava o tempo todo atrás de uma
cortina, dentro de uma caixa, alimentado pelo respirar dos penitentes e,
frequentemente, pelo seu cheiro.
E essas 16 ou 17 horas eram
passadas a ouvir pecados. Esta era a grande causa do seu sofrimento. “Desfaleço
com melancolia nesta terra maldita”, disse, certa vez, a um colega padre. “A
minha alma está numa tristeza de morte. Os meus ouvidos nada ouvem se não
coisas dolorosas que partem o meu coração com tristeza”. O seu biógrafo
compara-o a São Pedro, obrigado a assistir à Paixão do Senhor durante 17 horas
por dia.
Dormia em cima de tábuas,
apenas algumas horas por noite, suportando dores crónicas. Só a graça e o amor
podem explicar a energia que sentia durante o dia. A comida que consumia
diariamente não chegaria para uma pessoa sobreviver por meios naturais. Mais
tarde, por obediência, passou a tomar um bocado de pão com leite depois da
missa. O seu biógrafo conta-nos um incidente revelador. “O irmão Jerome, que estava
frequentemente presente durante este leve repasto, notou que ele consumia o pão
primeiro e só depois bebia o leite. ‘Mas, Monsieur le Curé’, observou ele um
dia, quando viu a dificuldade com que ele engolia o pão, ‘se molhasse o pão no
leite, seria muito melhor’. ‘Sim, eu sei’, respondeu Vianney, suavemente.”
A vida de um pároco era muito
mais difícil do que a de um religioso, dizia ele. “Pensa-se que aquilo de que
um padre precisa é de meditação, oração e união íntima com Deus. Mas o cura
vive no mundo; conversa, mistura-se com a política, lê os jornais, tem a cabeça
cheia destas coisas; depois vai ler o seu breviário e celebra missa; e faz tudo
isto como se fosse uma coisa normal!”
De facto! As suas palavras
aplicam-se tanto a leigos como a padres seculares. E as crises deste mundo são
crises de santos.
Michael Pakaluk, é um
académico associado a Academia Pontifícia de São Tomás Aquino e professor da
Busch School of Business and Economics, da Catholic University of America. Vive
em Hyattsville, com a sua mulher Catherine e os seus oito filhos.
(Publicado pela primeira vez
em The Catholic Thing na terça-feira, 4 de Agosto de
2020)
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