Gunnar Gundersen |
A sondagem
recentemente publicada pela Pew Forum, que dá conta da continuada erosão da
fé cristã nos Estados Unidos, levou a uma torrente de comentários sobre a
América “pós-cristã”. E mesmo antes desta última ronda de previsões o termo “pós-cristão”
já tinha sido usado por muitos comentadores.
Entre estes
inclui-se o Rod Dreher, que o usou no subtítulo do seu livro “A Opção Beneditina”. Mas será que uma nação
pode alguma vez tornar-se pós-cristã?
Tendemos a discutir
o estado da religião na América da mesma maneira que falamos de modas sociais
que vamos ultrapassar, como perucas ou cassetes VHS – a sociedade há de se
esquecer. A América, pensamos, vai cansar-se do Cristianismo.
Mas o Cristianismo
não é uma teoria, é um encontro com uma Pessoa, com o Alpha e o Omega. Cristo é
o fim de todas as coisas. Não é possível simplesmente ultrapassá-lo depois de
O ter aceite.
Tal como diz o Papa
Bento XVI em Spe
Salvi, uma sociedade que rejeita Cristo não se limita a seguir em frente.
Pelo contrário, este tipo de sociedade irá, como disse Kant, colocar-se em
oposição a Cristo. Assim, em vez de pós-cristã, uma sociedade que rejeitou o
Cristianismo deve tornar-se necessariamente anticristã. “Portanto, não há
dúvida de que um ‘reino de Deus’ realizado sem Deus – e por conseguinte um
reino somente do homem – resolve-se inevitavelmente no ‘fim perverso’ de todas
as coisas, descrito por Kant [reino do Anticristo]: já o vimos e vemo-lo sempre
de novo.” [23]
Nos lugares onde a
Cruz é substituída por símbolos estranhos e novas ideologias, aqueles que vivem
de acordo com a Cruz não podem se tolerados. Desde a Revolução Francesa à
Revolução de Outubro da Rússia, já vimos esta novela vezes e vezes sem conta. A
nossa deriva nesta direção poderá estar disfarçada pelas boas maneiras anglo-americanas, mas isso não muda o objetivo final pretendido.
A imagem romântica
de cristãos resistentes a sobreviver segundo a “opção beneditina” numa América
pós-cristã pode parecer bonita, mas não passa de uma fantasia. Não haverá onde
nos escondermos se os nossos vizinhos decidirem que o Cristianismo não é digno
do seu amor.
É de realçar que
alguns académicos e activistas de esquerda já começaram a descrever o baptismo
infantil e a formação cristã como formas de abuso infantil ou violações dos direitos
humanos. Se a tendência de descristianização continuar não é provável que esta posição
continue remetida para as margens durante muito mais tempo, partindo do
princípio que ainda o é. Aliás, uma das principais defensoras desta teoria é a
antiga Presidente da Irlanda, Mary McAleese, que a desenvolveu na sua tese,
feita na Universidade Gregoriana de Roma. Não é propriamente uma pessoa das
margens.
A ideia de que será possível chegar a um nobre entendimento entre os
cristãos e os arquitectos da América pós-cristã não deve ser levada a sério.
Aquilo de que precisamos é de testemunho e da disposição para sermos francos sobre
a necessidade do Cristianismo para o correcto funcionamento da democracia no
Ocidente, como explica o cardeal Joseph Ratzinger:
Entretanto o facto permanece que esta democracia [moderna] é produto da
fusão das heranças grega e cristã e por isso apenas pode sobreviver com esta
ligação fundacional. Se não voltarmos a reconhecê-lo e, por conseguinte,
aprendermos a viver a democracia com vista ao Cristianismo e o Cristianismo com
vista ao estado livre democrático, arriscamo-nos certamente a perder a
democracia.
O pacto do Mayflower |
John Adams disse o
mesmo, da seguinte maneira: “A nossa Constituição foi feita para um povo moral
e religioso. É inteiramente desadequado ao governo de qualquer outro”. E em
Gettysburg Abraham Lincoln também reconhece que esta República se colocava “sob
Deus”. Este entendimento penetrou o nosso juramento, o lema e os feriados
nacionais.
Os cristãos devem insistir que a sociedade não pode ser livre e
simultaneamente anticristã. As primeiras colónias foram fundadas para promover
a religião cristã através do Governo consentido. Isso fica claro nas palavras
do Pacto do Mayflower: Tendo empreendido
para a Glória de Deus, e Avanço da Fé Cristã, e Honra do nosso Rei e País, uma
viagem para estabelecer a primeira colônia no norte da Virgínia; os presentes
fazemos pacto solene e mutuamente na Presença de Deus e nós próprios, para
conjuntamente formar um Corpo Político Civil para nossa Ordem, Preservação e
Fomento dos objetivos referidos acima.
Ratzinger
reconheceu que a fusão dos ideais democráticos com o dever cristão, própria da
América, marcou o nascimento da democracia moderna: “A democracia como a
entendemos hoje não surgiu automaticamente a partir desta raiz mas, de facto,
foi formada primeiramente à luz das circunstâncias especiais do
congregacionalismo americano, ou seja, à parte das tradições clássicas
europeias da relação Igreja-Estado que cá se desenvolveu historicamente”. Esta
fusão espalhou-se depois pelo mundo à medida que a influência global da América
aumentou.
Os nossos
concidadãos precisam de ouvir dizer que a democracia americana não pode
sobreviver sem o respeito e o apoio da moral e da religião judaico-cristãs.
Isto não é o mesmo que defender uma visão teocrática de Governo, é simplesmente reconhecer a raiz que alimenta o sistema democrático, que hoje muitos
reconhecem como estando em perigo.
John F. Kennedy,
Ronald Reagan e Barack Obama todos reconheceram a vontade dos primeiros colonos
de fundar a América como uma cidade no topo de um monte – recordando o sermão
de John Winthrop:
Veremos que o Deus de Israel está entre nós, quando dez de
nós serão capazes de resistir a mil dos nossos inimigos, quando ele fizer de
nós um louvor e uma glória, tanto que os homens dirão das próximas colónias: ‘que
o Senhor a faça como a de Nova Inglaterra’. Pois devemos considerar que seremos
como uma cidade no topo de um monte.
Winthrop
acrescentou um aviso, que os nossos políticos tendem a não mencionar mas que
ecoa nas palavras de Bento XVI :
Os olhos de todos os povos estão sobre nós. E
se formos falsos com o nosso Deus nesta obra que empreendemos, e assim o
levarmos a retirar de entre nós a sua presença, fará de nós uma história e uma lição
para o mundo.
Um aviso pertinente
de que apenas teremos esta República – sob Deus – enquanto a conseguirmos
manter.
Gunnar
Gundersen é investigador na James Wilson Institute on Natural Rights and the
American Founding. A sua área de pesquisa inclui Liberdade Religiosa, Direitos
de Propriedade e Jurisprudência.
(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing no
sábado, 16 de Novembro de 2019)
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