Wednesday, 5 January 2022

Para 2022 temos Boas e Más Notícias

Francis X. Meier

De vez em quando um jovem pergunta-me se deve tornar-se um escritor católico, e como. Dou sempre a mesma resposta. Temos boas e más notícias. Agora que estamos no início de 2022, vale a pena olhar para os desafios particulares que todos enfrentamos nestes dias. Sendo de ascendência irlandesa-alemã, e melancólico por natureza, vou começar pelas más notícias:

1. O público católico está a diminuir. Isto tem impacto sobre os recursos materiais.

2. Muitos dos que permanecem estão a ficar mais velhos, ou então não estão bem-formados em termos da imaginação sacramental e substância intelectual da Igreja.

3. Os media generalistas são hostis; não se limitam a formar os nossos pensamentos, mudam também a forma como pensamos.

4. O Governo é cada vez menos nosso amigo.

5. Os nossos sistemas económicos e políticos encorajam ao mesmo tempo a auto-absorção e a dependência; o resultado irónico é um sentido alargado de isolamento e impotência.

6. Salvo várias excepções, a liderança da Igreja é fraca. Há mais de 50 anos que os católicos americanos operam segundo premissas erradas. A assimilação levou à digestão pela cultura secular da vida autenticamente católica autêntica, que agora está a ser eliminada como desperdício num sistema orgânico. Não somos simplesmente pós-protestantes, mas pós-calvinistas. A América tem raízes calvinistas e, como argumenta o historiador Carlos Eire, de Yale, no seu livro “Reformations”, o calvinismo cauterizou a imaginação sobrenatural (eliminando o Purgatório, a comunhão dos santos, os sacramentos, as relíquias) e reorientou radicalmente a religião para as preocupações e resultados materiais deste mundo. Ao fazê-lo, abriu as portas para a secularização e a descrença.

7. O resultado de tudo o que escrevi acima é um ambiente de conflito e de declínio que conduz à acédia. Beleza, paz, esperança e alegria são factores frequentemente ausentes da Igreja e da sua vida religiosa – o que por sua vez faz a questão de Deus parecer esclerótica e irrelevante.

Passemos então às boas notícias:

1. Muitas das más notícias são, na verdade, boas notícias, na mesma medida em que um duche frio pode ser um remédio desagradável, mas eficiente, para curar uma bebedeira. A humilhação da experiência católica americana é boa porque os seus frutos têm sido insuficientes. A vida católica nos Estados Unidos produziu vários homens, mulheres e feitos excepcionais, incluindo alguns santos, mas também – pelo menos ao longo das últimas sete décadas – um bom número de fraudes, de amigos de Peniche e de cobardes.

2. Como gostava de dizer o guru da economia Peter Drucker, cada sucesso acarreta as sementes do falhanço, porque facilmente conduz ao excesso de confiança. Mas o inverso também é verdade. Cada falhanço carrega consigo as sementes do sucesso, desde que aprendamos as lições certas com o nosso falhanço. Uma das lições que devemos considerar é esta: Devemos amar as melhores virtudes do nosso país, mas no final de contas não é este o nosso lugar. O nosso lar e a nossa fidelidade pertencem a outrem.

Joseph Ratzinger


3. As nossas actuais circunstâncias não são surpreendentes, foram previstas com uma exactidão incrível por Joseph Ratzinger há mais de meio-século. A Igreja do futuro próximo será mais pequena. Mas será também mais vigorosa, pura, autêntica e preparada para voltar a crescer quando as falsas premissas da nossa cultura resultarem num fracasso. A fé é fértil, e por isso tem futuro. A descrença é um ventre estéril.

4. O conflito nem sempre é mau; às vezes é santo e bom. Produz clareza; a clareza revela a verdade; e a verdade torna-nos livres. Talvez não confortáveis, mas livres. Obriga-nos a escolher onde colocar a nossa lealdade e a enfrentar o que e quem somos verdadeiramente.

5. As Escrituras são para levar a sério: Onde abunda o mal, superabunda a graça e a bondade. Há milhares de pessoas boas a fazer coisas extraordinárias que são ignoradas pela cultura secular. Continua a existir um núcleo católico que está sedento de boa escrita, bom pensamento e encorajamento. É aqui que começa a renovação.

Quanto ao porquê e ao como de ser um autor católico… e na verdade para todos nós…

O porquê: Todos nós temos uma fome de compreender o verdadeiro significado das nossas vidas. A fé católica é verdadeira na sua explicação da realidade, e por isso satisfaz-nos a um nível visceral. A cultura liberal americana baseia-se na ficção de que a liberdade exige a rejeição de paradigmas morais e de verdades universais vinculativos. Mas a maioria das pessoas – e por boas razões – não consegue lidar com a tarefa impossível de criar e sustentar o seu próprio significado. Isto cria ansiedade. O que depois requer anestesia. O que por sua vez leva a uma cultura de dependência e escravidão. A fé católica é uma mensagem de libertação, esperança e significado; uma mensagem realística porque explica o pecado humano e fornece formas de redenção e de reconciliação.

O porquê: O cristianismo é relacional. Não é uma “ideologia”. A maioria das pessoas chega a Deus através da sua presença nas vidas de outras pessoas. É verdade que há quem chegue à Igreja através da conversão intelectual – como Edith Stein, por exemplo – mas a maioria tem um encontro com Deus, através do testemunho de outra pessoa, que muda a sua forma de ver o mundo. É por isso que as histórias são frequentemente mais poderosas que os argumentos. As pessoas adoram histórias; aprendemos ao mesmo tempo que somos informados e entretidos. E esta é a substância da boa escrita. Leiam o grande ensaio de Georges Bernanos “Sermão de um Agnóstico na Solenidade de Santa Teresa”, ou o excelente conto “Vislumbre de Explicação”, de Graham Greene.

Leiam. Leiam. Leiam com olhar crítico. Mas leiam tudo – católico ou não católico. Algumas das maiores influências no meu pensamento adulto não foram cristãs ou sequer religiosas, mas li-as de uma perspetiva católica aprendida de outros e depois refinada por mim. Leiam pelo estilo (Ernest Hemingway; Neil Postman; mesmo loucos como Terry Southern). Leiam pelo conteúdo (J.R.R. Tolkien, C.S. Lewis, Leszek Kolakowski, Christopher Lasch, Roger Scruton, Pierre Manent, George Parkin Grant). Comparem estilos e trunfos editoriais: NY Times vs. LA Times vs. Wall Street Journal.

Cultivem o vosso vocabulário, mas comprometam-se com a simplicidade. Sejam impiedosos na edição do vosso próprio material. Devem conhecer de cor e salteado o ensaio de George Orwell “Política e a Língua Inglesa”. E por uma questão de sanidade, afastem-se do Twitter. Pelo menos até aprenderem a pensar e expressarem-se como humanos adultos. O Twitter alimenta o conflito. Gera impudência e comentários estúpidos e venenosos. Já estamos saturados de ambos.

Por fim, e talvez mais difícil: tentem dar o benefício da dúvida aos outros. Critiquem assuntos e comportamentos, não pessoas. Por norma, a palavra falada pode ser ignorada ou esquecida.

A palavra escrita é eterna.


Francis X. Maier é conselheiro e assistente especial do arcebispo Charles Chaput há 23 anos. Antes serviu como Chefe de Redação do National Catholic Register, entre 1978-93 e secretário para as comunidades da Arquidiocese de Denver entre 1993-96.

Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing no Sábado, 1 de Janeiro de 2022)

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