Wednesday 15 September 2021

De um Céu Limpo e Azul

Sou nova-iorquino por escolha, vivo na região desde 1977. É aqui que espero vir a morrer. E ainda tenho memórias bem vivas do 11 de Setembro de 2001.

Era uma manhã linda. Tinha deixado a minha mulher, Sydny, na estação de Pelham por volta das 8h00 e voltado a casa para levar os meus filhos, de 14 e de 12 anos, para a escola. Depois subi para o meu escritório em casa para trabalhar no meu livro sobre cavalheirismo.

Pouco antes das 9h a Syd ligou do seu escritório na Rockefeller Center e mandou-me ligar a televisão.

Na NBC vi fumo a sair da Torre Norte do World Trade Center (WTC).

Revendo essas imagens hoje, como fiz para escrever esta coluna, em nada diminui o choque. É a mesma coisa quando revemos filmes cujos finais já conhecemos e não deixamos de ficar nervosos. Às 9h ainda ninguém sabia que o primeiro avião não tinha atingido a torre por acidente.

Nestas imagens os pivots da TODAY, no dia 11 de Setembro, não sabem que o fumo e as chamas dessa explosão são do Voo 11 da American Airlines, com origem em Boston. Matt Lauer especula, corretamente, que se os primeiros rumores são verdadeiros, e de facto foi um avião, então não pode ter sido um aparelho pequeno a fazer um buraco tão grande no edifício, casando tantas chamas e fumo.

Ainda assim, a Katie Couric diz que estão a receber informações de que se tratava de uma pequena aeronave de passageiros. Neste momento o oráculo do TODAY diz que são 9h02.

Como disse o bombeiro:

Não reserve um quarto acima do quinto andar

Em qualquer hotel em Nova Iorque.

Eles têm escadotes que chegam mais alto

Mas ninguém os subirá.

Como disse o New York Times:

O Elevador procura sempre

O andar das chamas

E abre automaticamente

E não fecha.

Estes são os avisos de que não se deve esquecer

Se estiver a subir para fora de si mesmo

Se quiser embater no céu*.

É 2021 e estou a tentar manter-me calmo, objetivo e racional – mas só me apetece gritar. Estou a olhar para imagens de há duas décadas e quero gritar. Gritar o quê? Um aviso? Para quem?

Então, precisamente às 9h03h11, o voo da United Airlines 175, também oriundo de Boston, atinge a Torre Sul. Um produtor da NBC questiona-se se não haverá um problema com o controlo de tráfego aéreo. Cerca das 9h05 Matt Lauer diz que os incidentes foram intencionais.

E mais ou menos nesse momento Andy Card, que está com George W. Bush numa sala de aulas na Florida, encosta-se e sussurra ao Presidente, “A América está a ser atacada”.

A próxima coisa que fiz nesse dia foi ligar para o George Marlin, Diretor Executivo da Autoridade Portuária de Nova Iorque e de Nova Jérsia (1995-1997), ou seja, depois do atentado mal-sucedido de 93 na WTC e antes do 11 de Setembro. Encontrei-me com ele uma vez num andar alto na WTC, de onde se podia ver o Rio Hudson. George, que acorda cedo, descreveu-me como às vezes ao nascer o sol iluminava nuvens baixas, pintando-as de dourado, fazendo-as parecer anjos a viajar à velocidade da luz.

Passei muitas vezes

O quinto andar

Subindo a custo

Mas só uma vez

É que subi até lá acima.

Sexagésimo andar:

Pequenas plantas e cisnes a dobrar-se

Para dentro de sepulturas.

Andar duzentos:

Montanhas com a paciência de um gato,

Silêncio calçado com ténis.*

“Estás a ver o que está a acontecer?”, perguntei ao George no 11 de Setembro.

“Não temos uma televisão no escritório”, respondeu, “mas já ouvi. Terroristas?”

“Só pode. Ambos os aviões estavam cheios de combustível, a caminho da costa ocidental.”

“Vai-me mantendo a par, se faz favor.”

Disse-lhe que assim faria.

Então, pouco antes das 10h15, o George ligou de volta.

“O Pentágono e a Pensilvânia também, certo?”

“Sim, e a Torre Sul desmoronou. Caiu diretamente para baixo, sobre si mesmo.”

George suspirou

“Foi isso que os arquitectos me disseram que iria acontecer.”


Algo da minha conversa com o George fez-me querer rezar, mas era complicado. Queria agradecer a Deus o facto de ele ter saído da Autoridade Portuária quatro anos antes, mas entendi que o seu sucessor poderia estar morto (e estava). Ainda assim, rezei. E sabia que não estava sozinho. Imaginei aquilo que certamente era verdade, que através da nação, agora unida, milhões de pessoas se encontravam de joelhos, e não como sinal de rendição.

A Igreja de São Pedro, ali perto, tornou-se por momentos uma morgue, quando o corpo do padre Mychal Judge foi colocado diante do altar. Foi vítima da queda de destroços na Torre Norte depois de ter entrado a correr no edifício para ministrar aos mortos, moribundos e feridos. Foi designado “Vítima 0001”, a primeira pessoa a ser declarada morta no 11 de Setembro.

O escritório da minha mulher foi evacuado porque o Rock Center foi considerado um potencial alvo. Ela tentou ligar-me, mas depois das 10h30 ninguém podia ligar para dentro ou para fora da cidade. Então andou a pé 20 quarteirões até ao apartamento da irmã e depois as duas saíram para ir comer num quiosque local, enquanto ouviam as sirenes infindáveis e começavam a ver pessoas cobertas de pó a subir, em silêncio, vindas da baixa de Manhattan.

As escolas fecharam mais cedo. A ansiedade dominava a nossa pequena vila dos subúrbios porque tantas amigos e familiares trabalhavam na zona financeira de Manhattan, alguns mesmo nas Torres Gémeas.

O meu filho mais velho, Bobby, estava preocupado com a mãe e ligou da escola. Tranquilizei-o. Depois encontrou o seu irmão Jon e vieram a pé para casa. O Jon foi para o quarto ler, mas o Bobby queria ir para o jardim jogar à bola.

Estávamos no Jardim a lançar a bola e a apanhar – as minhas mãos ardiam com a força dos seus passes – quando um caça F-15 passou por cima de nós, a voar muito rente. Se o piloto tivesse baixado a asa e olhado para baixo teria visto a sua cara.

Quem vivia onde eu vivo conhece pessoas que morreram no 11 de Setembro, ou pelo menos os seus familiares. Eu tinha-me divertido à brava no casamento do Tommy Hohlweck, em 1978. A minha amiga Debra Burlingame vivia ao virar da esquina e era irmã do Charles “Chic” Burlingame que pilotava o voo da American 77, que atingiu o Pentágono. Apenas dias antes tinha estado junto à linha do campo com o Pat O’Shea, enquanto víamos os nossos filhos a jogar futebol americano. E em um ou dois encontros locais tinha conhecido o seu irmão Danny, bem como o Monty Hoard. Perdemos nove habitantes de Pelham naquele dia, incluindo o bombeiro Joe Leavy, que estava de folga, mas correu para o Ground Zero e nunca regressou.

Eu fui membro do New York Athletic Club até 2011. Na entrada há três memoriais com os nomes dos mortos: Primeira Guerra Mundial, Segunda Guerra Mundial e 11 de Setembro de 2001.

Hoje foi declarado o fim da longa guerra que se seguiu ao 11 de Setembro. Rezo para que assim seja. Temo que não.

Andar quinhentos:

Mensagens e cartas de há séculos,

Pássaros para beber,

Uma cozinha de nuvens.

Andar seis mil:

As estrelas,

Esqueletos a arder,

Os seus braços a cantar.

E uma chave,

Uma chave muito grande,

Que abre algo –

Uma porta útil –

Algures –

Ali em cima.*

*Este poema profético “Subindo para o Céu num Elevador”, escrito por Anne Sexton, foi escrito em 1975. A minha mulher publica-o todos os 11 de Setembro na sua página de Facebook.


Brad Miner é editor chefe de The Catholic Thing, investigador sénior da Faith & Reason Institute e faz parte da administração da Ajuda à Igreja que Sofre, nos Estados Unidos. É autor de seis livros e antigo editor literário do National Review.

(Publicado pela primeira vez no sábado, 11 de Setembro de 2021 em The Catholic Thing)

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