Christopher Kaczor |
O Peterson traz consigo influências de psicologia
jungiana, literatura russa, teoria evolucionista e as tragédias totalitárias do
Século XX, para iluminar os textos bíblicos. Este método ecoa Santo Agostinho,
que ensinou em De doctrina christiana que toda a sabedoria secular pode
ser usada para interpretar a Escritura, porque todas as verdades, estejam onde
estiverem, têm as suas raízes em Deus. Sem o saber, Peterson está a
re-apresentar os ensinamentos de São Gregório Magno de que o Antigo Testamento
se revela no Novo Testamento, isto é, que o Novo Testamento ilumina o Antigo.
Tal como Aquino, Peterson vê a Bíblia como tendo uma riqueza de sentido
profunda, que vai muito para além daquilo que qualquer intérprete consegue
alcançar só por si.
Neste Quadro, Peterson oferece-nos interpretações
marcantes de Adão e Eva, Caim e Abel, a Torre de Babel e o chamamento de
Abraão. Para Peterson, estas histórias não são simplesmente sobre figuras
antigas num mundo esquecido, mas sobre realidades humanas que continuam a ser
tão relevantes hoje como no dia em que primeiro foram escritas.
Um dos pontos mais fortes do pensamento de Peterson é a
forma como confronta diretamente o problema da dor, para o qual certamente
contribui o terrível sofrimento que ele e a sua família têm suportado. Em 12
Regras para a Vida ele escreve que “A verdade é o antídoto para o sofrimento”.
Em Beyond Order diz que o antídoto para o sofrimento é um bem que seja “o maior
objectivo possível”. Noutro lado escreve “Não podemos viver sem alguma ligação
ao divino – e a beleza é divina – porque sem ela a vida é demasiado curta,
demasiado triste e demasiado trágica”. Podemos resumir Peterson dizendo que o
antídoto para o sofrimento é a verdade articulada de forma corajosa, o bem do
objectivo mais altivo e a experiência da beleza.
Na tradição católica, é Deus que é a verdade, o bom e o
belo. Ecoando o pensamento de Diotima, no Simpósio, de Platão, Agostinho
ensina que Deus é “a suprema beleza”. Nas suas Confissões, o bispo africano
lamenta: “Tarde te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei!”.
Tomás de Aquino argumenta que Deus é o maior objectivo
possível, o summum bonum, o bem perfeito que é procurado por aqueles que buscam
a felicidade. Ao contrário dos conceitos dualistas sobre a realidade última,
tal como “a força” da Guerra das Estrelas, que tem um lado claro e um lado
escuro, Tomás afirma que Deus não é composto de forma alguma, e por isso não
pode ser em parte bom e em parte mau. Tomás de Aquino afirma ainda que Deus é o
maior dos bens, o bem perfeito, bem sem qualquer toque de mal.
E o que dizer da verdade? Aquino define a verdade como a
correspondência entre a mente e a realidade. Em contraste, Peterson, inspirado
por figuras como William James, tem uma compreensão pragmática da verdade como
“o útil”. Isso já nos ajuda, de alguma forma, mas Peterson – pelo menos por
enquanto – e outros de tradição junguiana, buscam os benefícios do bem sem o
radicar no único lugar em que pode ser verdadeiramente radicado.
Na Summa
contra Gentiles, Aquino fornece mais razões para se crer que a mente de
Deus e a realidade de Deus não só correspondem um ao outro como são de facto
idênticos. A Mente Divina é a Essência de Deus, e a Essência de Deus é a Mente
Divina. Mais, Deus é a Verdade Primordial porque Deus é Causa
Primeira de todas as realidades físicas e psicológicas que conhecemos quando
compreendemos a verdade. Se o antídoto para o sofrimento é a verdade, o bem e a
beleza, então Deus é o antídoto para o sofrimento.
O aforismo de que “A Verdade é o antídoto para o
sofrimento” está ligado ainda de outra forma à tradição católica. Jesus disse:
“Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai, se não por mim”
(João 14,6). Este caminho de Jesus não é apenas uma noção intelectual da
verdade. Esta realidade, explorada de forma tão hábil pelo padre David Vincent
Meconi no seu maravilhoso livro Christ Alive in Me: Living as a Member of the Mystical Body
tem diferentes nomes, como divinização, teósis e deificação. O cristão afirma
que somos convidados não só a tornar-nos alunos aplicados de um professor
perceptivo, mas filhos adoptivos na Família Divina do Pai, Filho e Espírito
Santo.
Se existe um antídoto parcial para o sofrimento nesta
vida, encontra-se em união com Cristo que (segundo São Tomás de Aquino)
experimentou o maior sofrimento possível e ofereceu a maior consolação
possível. Isto não acontece apenas através do conhecimento dos ensinamentos de
Jesus, mas através da partilha da vida que Jesus nos ofereceu como dom.
Mas, de facto, não existe antídoto perfeito para o
sofrimento, pelo menos não nesta vida. Aqui em baixo haverá sempre dor, tanto
físico como psicológico. Na verdade, os maiores santos, aqueles que viveram
Cristo de forma mais plena, sofreram frequentemente, e muito. Mas o seu
sofrimento tinha um sentido, porque as suas vidas tinham um propósito: amar a
Deus e ao próximo. O amor é um bálsamo, mas não é um antídoto perfeito para as
inevitáveis dificuldades da vida terrena. O sofrimento de Cristo apenas
encontrou um antídoto perfeito quando ele morreu e ressuscitou dos mortos, e
com o nosso sofrimento será igual. Se esta ressurreição é apenas um sonho
piedoso, ou uma esperança fundada, é outra questão que surge nas explorações
provocatórias de Peterson.
Christopher
Kaczor é professor de Filosofia na Universidade de Loyola Marymount e co-autor,
com Matthew Petrusek, de Jordan Peterson, God, and
Christianity: The Search for a Meaningful Life.
(Publicado pela primeira vez na terça-feira, 7 de Setembro de
2021 em The Catholic Thing)
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