Wednesday, 8 September 2021

Jordan Peterson e a Busca por uma Vida com Sentido

Christopher Kaczor
O trabalho de Jordan Peterson tem provocado reacções fortes de defensores da ortodoxia woke, mas também reconsideração da sabedoria contida nas histórias da Bíblia por parte de ateus, agnósticos e pessoas que não se identificam com qualquer religião. No nosso livro Jordan Peterson, God, and Christianity: The Search for a Meaningful LifeMatthew Petrusek e eu procuramos mostrar que o método de Peterson de leitura das Escrituras pode ser encontrada mais cedo – e de forma mais rica – em figuras como Agostinho, Gregório Magno e São Tomás de Aquino. Mais, argumentamos que as trajectórias de muitas das linhas de raciocínio de Peterson completam-se no Catolicismo. “O Catolicismo é o expoente máximo da sanidade”, disse Jordan Peterson recentemente num podcast, e nós concordamos.

O Peterson traz consigo influências de psicologia jungiana, literatura russa, teoria evolucionista e as tragédias totalitárias do Século XX, para iluminar os textos bíblicos. Este método ecoa Santo Agostinho, que ensinou em De doctrina christiana que toda a sabedoria secular pode ser usada para interpretar a Escritura, porque todas as verdades, estejam onde estiverem, têm as suas raízes em Deus. Sem o saber, Peterson está a re-apresentar os ensinamentos de São Gregório Magno de que o Antigo Testamento se revela no Novo Testamento, isto é, que o Novo Testamento ilumina o Antigo. Tal como Aquino, Peterson vê a Bíblia como tendo uma riqueza de sentido profunda, que vai muito para além daquilo que qualquer intérprete consegue alcançar só por si.

Neste Quadro, Peterson oferece-nos interpretações marcantes de Adão e Eva, Caim e Abel, a Torre de Babel e o chamamento de Abraão. Para Peterson, estas histórias não são simplesmente sobre figuras antigas num mundo esquecido, mas sobre realidades humanas que continuam a ser tão relevantes hoje como no dia em que primeiro foram escritas.

Um dos pontos mais fortes do pensamento de Peterson é a forma como confronta diretamente o problema da dor, para o qual certamente contribui o terrível sofrimento que ele e a sua família têm suportado. Em 12 Regras para a Vida ele escreve que “A verdade é o antídoto para o sofrimento”. Em Beyond Order diz que o antídoto para o sofrimento é um bem que seja “o maior objectivo possível”. Noutro lado escreve “Não podemos viver sem alguma ligação ao divino – e a beleza é divina – porque sem ela a vida é demasiado curta, demasiado triste e demasiado trágica”. Podemos resumir Peterson dizendo que o antídoto para o sofrimento é a verdade articulada de forma corajosa, o bem do objectivo mais altivo e a experiência da beleza.

Na tradição católica, é Deus que é a verdade, o bom e o belo. Ecoando o pensamento de Diotima, no Simpósio, de Platão, Agostinho ensina que Deus é “a suprema beleza”. Nas suas Confissões, o bispo africano lamenta: “Tarde te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei!”.

Tomás de Aquino argumenta que Deus é o maior objectivo possível, o summum bonum, o bem perfeito que é procurado por aqueles que buscam a felicidade. Ao contrário dos conceitos dualistas sobre a realidade última, tal como “a força” da Guerra das Estrelas, que tem um lado claro e um lado escuro, Tomás afirma que Deus não é composto de forma alguma, e por isso não pode ser em parte bom e em parte mau. Tomás de Aquino afirma ainda que Deus é o maior dos bens, o bem perfeito, bem sem qualquer toque de mal.

E o que dizer da verdade? Aquino define a verdade como a correspondência entre a mente e a realidade. Em contraste, Peterson, inspirado por figuras como William James, tem uma compreensão pragmática da verdade como “o útil”. Isso já nos ajuda, de alguma forma, mas Peterson – pelo menos por enquanto – e outros de tradição junguiana, buscam os benefícios do bem sem o radicar no único lugar em que pode ser verdadeiramente radicado. 

Na Summa contra Gentiles, Aquino fornece mais razões para se crer que a mente de Deus e a realidade de Deus não só correspondem um ao outro como são de facto idênticos. A Mente Divina é a Essência de Deus, e a Essência de Deus é a Mente Divina. Mais, Deus é a Verdade Primordial porque Deus é Causa Primeira de todas as realidades físicas e psicológicas que conhecemos quando compreendemos a verdade. Se o antídoto para o sofrimento é a verdade, o bem e a beleza, então Deus é o antídoto para o sofrimento.

O aforismo de que “A Verdade é o antídoto para o sofrimento” está ligado ainda de outra forma à tradição católica. Jesus disse: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai, se não por mim” (João 14,6). Este caminho de Jesus não é apenas uma noção intelectual da verdade. Esta realidade, explorada de forma tão hábil pelo padre David Vincent Meconi no seu maravilhoso livro Christ Alive in Me: Living as a Member of the Mystical Body tem diferentes nomes, como divinização, teósis e deificação. O cristão afirma que somos convidados não só a tornar-nos alunos aplicados de um professor perceptivo, mas filhos adoptivos na Família Divina do Pai, Filho e Espírito Santo.

Se existe um antídoto parcial para o sofrimento nesta vida, encontra-se em união com Cristo que (segundo São Tomás de Aquino) experimentou o maior sofrimento possível e ofereceu a maior consolação possível. Isto não acontece apenas através do conhecimento dos ensinamentos de Jesus, mas através da partilha da vida que Jesus nos ofereceu como dom.

Mas, de facto, não existe antídoto perfeito para o sofrimento, pelo menos não nesta vida. Aqui em baixo haverá sempre dor, tanto físico como psicológico. Na verdade, os maiores santos, aqueles que viveram Cristo de forma mais plena, sofreram frequentemente, e muito. Mas o seu sofrimento tinha um sentido, porque as suas vidas tinham um propósito: amar a Deus e ao próximo. O amor é um bálsamo, mas não é um antídoto perfeito para as inevitáveis dificuldades da vida terrena. O sofrimento de Cristo apenas encontrou um antídoto perfeito quando ele morreu e ressuscitou dos mortos, e com o nosso sofrimento será igual. Se esta ressurreição é apenas um sonho piedoso, ou uma esperança fundada, é outra questão que surge nas explorações provocatórias de Peterson.


Christopher Kaczor é professor de Filosofia na Universidade de Loyola Marymount e co-autor, com Matthew Petrusek, de Jordan Peterson, God, and Christianity: The Search for a Meaningful Life.

(Publicado pela primeira vez na terça-feira, 7 de Setembro de 2021 em The Catholic Thing

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