Michael Pakaluk |
Se estiver a pensar quantos minutos de
exercício é que devia fazer por dia para manter-se saudável, talvez já saiba
que a resposta é 30 minutos. Mesmo que não soubesse, não duvidaria que existe
uma resposta objectiva, e saberia onde a procurar (por exemplo, através do
Ministério da Saúde).
E compreenderia que esse número
corresponde a um mínimo. Alguém que precisa de perder peso, ou um atleta em
treino, teria de fazer muito mais que isso. Mas compreenderia esta ideia do
que, objectivamente, uma pessoa precisa para se manter saudável. Viver bem
implica conseguir encaixar pelo menos 30 minutos de actividade vigorosa no seu
dia. Todos sentimos e compreendemos isto, de forma implícita.
Mas eu gostaria de colocar a pergunta equivalente
em relação à alma. Dizemos que existe uma alma, e que o corpo representa, de
várias formas, a alma. Existe a actividade da alma, em como força e saúde. Por
isso parece evidente que se possa colocar a pergunta: quantos minutos por dia é
que devia exercitar a minha alma para uma boa saúde espiritual? Mas neste
campo, embora seja muito mais importante, tendemos a pensar que não existe
resposta objectiva e que não saberíamos bem a quem perguntar se precisássemos de
uma indicação.
Repare que me estou a referir a tempo que “pomos
de parte”. Claro que há esforços físicos que fazem parte do dia-a-dia – ir a pé
para o trabalho, levantar sacos de compras, etc., e é bom que a nossa vida
inclua estas coisas. Da mesma forma, podem existir actos de “exercício
espiritual” nas actividades diárias. Mas eu estou-me a referir a períodos de
tempo que são apenas para exercício corporal ou espiritual.
Vejamos a questão desta forma. Pode-se
distinguir, em princípio, a oração da ascese. A oração pode ser entendida como
uma conversa com o Senhor. A ascese é qualquer actividade que requeira e
construa autodisciplina.
Teoricamente, pode haver conversas com o
Senhor que não requeiram autodisciplina. Muitas pessoas entendem a oração desta
forma. Pensam numa conversa entre dois amigos, como dois homens sentados em
cadeirões, a fumar charutos e a beber whisky, tendo uma grande conversa. E
então acham que a oração é assim, como se estivessem confortavelmente sentados
a ter esse tipo de conversa agradável com Deus.
O Asceta - Pablo Picasso |
Outro exemplo seria Benjamin Franklin, que
fazia um autoexame todos os dias, com base numa tabela de virtudes, e há ainda
quem resolva problemas de sudoku ou palavras cruzadas, para manter a mente
alerta.
Mas embora a oração e a ascese espiritual
sejam, em princípio, coisas diferentes, na prática conjugam-se. A oração é uma
conversa com o Senhor, de facto. Mas se o Senhor estiver a caminho do deserto?
Então não poderá conversar com ele sem se despir de tudo o resto.
Ou então imagine que o Senhor está a
escalar uma montanha, e que para conversar com Ele é preciso subir também?
Talvez já tenha escalado montanhas e saiba exactamente quanta autodisciplina
precisa para empreender uma subida íngreme durante quatro ou cinco horas. Mas
Nosso Senhor deu-nos precisamente estes exemplos de sair para o deserto para
rezar, e de escalar uma montanha para rezar (Lc. 5,16, 6,12). Duvido que o
tenha feito se não nos quisesse mostrar algo sobre a natureza da oração.
Bem vistas as coisas, não existem exemplos
no Novo Testamento de Jesus a procurar um cadeirão para rezar.
A ideia errada de que se “encontra” tempo
para rezar parece ligada à confusão de que a oração é, na prática, separável da
ascese – como se a oração simplesmente aparecesse ou ocorresse de forma
espontânea. Como se escalar uma montanha fosse apenas algo que surgisse
naturalmente na nossa vida do dia-a-dia: “Fui trabalhar, acabei aqueles
projetos, e então a ocorreu-me que o melhor a fazer era escalar uma montanha”.
A oração requer ascese – por causa do
pecado original, por causa das exigências do discipulado, por causa do poder da
Cruz. Também nos podemos espantar com o facto de (embora a oração seja fruto de
uma busca de amor, tal como a conversa), a ascese não deixa de ser uma forma eficiente
de desenvolver autodisciplina para todas as áreas da vida. Mais até do que
práticas de ascese directa (excepto para disciplina intelectual pura – aí mais
lhe vale resolver problemas de cálculo).
Voltando, portanto, à questão original:
Quanto tempo por dia devia dedicar à oração? Podemos responder que seria o
tempo necessário para exercitar a alma.
Afinal, para esta questão parece haver uma
resposta objetiva, e autoridades competentes. Olhando para os santos e grandes
Papas, vemos que recomendam a missa diária (30 minutos); a oração do terço (15
minutos); a oração do Evangelho do dia e de um livro espiritual (15 minutos) e
oração mental diária (pelo menos 15 minutos, mas idealmente uma hora) – o que leva
a um total de duas horas. Por isso, ao que parece, para viver uma boa vida
cristã devemos encaixar duas horas de oração no nosso dia.
Se viajar para os Estados Unidos poderá
surpreender-se com a quantidade de americanos obesos que existem. Mas talvez
encontre também uma equipa de atletas universitários a caminho do seu voo.
Desconfio que se existissem juízes capazes de ver as nossas almas, como
acontece num dos mitos de Platão, eles ficariam espantados ao ver o quão
espiritualmente obesos nós parecemos todos.
E os cristãos, que deviam parecer-se mais
com aquela equipa de atletas, são iguais a todos os outros.
Michael Pakaluk, é um académico associado
a Academia Pontifícia de São Tomás Aquino e professor da Busch School of
Business and Economics, da Catholic University of America. Vive em Hyattsville,
com a sua mulher Catherine e os seus oito filhos.
(Publicado pela primeira vez em The
Catholic Thing na terça-feira, 20 de Agosto de 2019)
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