David G. Bonagura Jr. |
Como muitos leitores do The Catholic Thing, alguns dos
quais com o dobro dos meus filhos, sabem, estes estão entre os comentários mais
polidos que os pais de famílias numerosas recebem de pessoas incrédulas,
gozonas ou frequentemente hostis. Nesta minha experiência recente pelo menos
esses dois amigos não recorreram a golpes sujos, como às vezes acontece. Desse
género o menos pessoal é o recorrentemente usado: “mas vocês não têm
televisão?”
A nossa sociedade já não tolera comentários ofensivos
sobre a aparência ou a etnia de alguém. Não é aceitável, na maior parte dos
casos, ridicularizar uma pessoa por causa da sua religião, apesar de a religião
em si ser um alvo comum dos intelectuais “iluminados” e das figuras públicas.
Já lá vai o tempo em que o anticatolicismo era considerado o “último preconceito
socialmente aceite”. Mas as acções preconceituosas, desde comentários ofensivos
a vandalismo de estátuas, costumam ser recebidas por legiões de defensores,
tanto institucionais como individuais, que estão dispostos a dar o corpo ao
manifesto pela fé. Pelo menos os detratores não podem ser anticatólicos e sair
incólumes.
De igual forma, hoje estamos proibidos de comentar sobre
o “estilo de vida” de outro – ou pelo menos de certas escolhas. O caixa do
supermercado não dirá nada sobre o cliente com vários piercings, tatuagens,
roupa rasgada e cabelo pintado de roxo. As redes sociais suspendem as contas de
utilizadores que fazem comentários negativos nesse sentido, ainda que a
admissão dessas mesmas “escolhas de estilo de vida” fosse impensável há uns anos.
Mas quando se chega ao “estilo de vida” de ter uma
família numerosa, o filtro pessoal e social desaparece. Depois de deixar passar
o punk, porque é que o caixa se sente obrigado a perguntar-me se são todos meus
quando me aproximo com os meus filhos? As redes sociais exercem algum tipo de
vigilância em defesa daqueles que são ridicularizados por ter famílias
numerosas? Desde estranhos a conhecidos, parece que as pessoas simplesmente não
conseguem deixar de comentar as famílias grandes. “Eles têm, tipo, seis
filhos”, disse recentemente o dentista à sua nova assistente, como se esse
facto tivesse alguma coisa a ver com o arranjo dos dentes do meu filho.
Às vezes até gente de ir à missa, bem-intencionada,
contribui para este assalto às famílias numerosas. Há anos que ouço, pelo menos
uma vez por mês, uma variação da boca “deves ter as mãos cheias”. Mais do que
uma vez, depois da missa, alguém usou os dedos para contar os meus filhos na
minha presença, como se fosse incompreensível para ele o que estava a ver.
Mas o pior, porém, são as ofensas que os meus filhos
adolescentes ouvem dos seus pares, de tempos a tempos, sobre os seus pais. Não
os posso reproduzir aqui para este público bem-educado, mas não terão
dificuldades em imaginá-los.
Tantos golpes, vindos de todos os lados, levam-me a
concluir que esta animosidade para com famílias numerosas é o último
preconceito aceitável na América.
Os pais de famílias numerosas sabem muito bem que estão
nas margens de uma sociedade que transformou as crianças em comodidades, em vez
de as colocar no centro, enquanto objetivo, da vida de casal. Na Cultura da
Morte as famílias pequenas são a norma esperada. Afinal de contas, quantas
pessoas são encorajadas agora a pensar na maçada que é criar crianças durante
anos a fio, prejudicando assim o tempo de lazer do pai e da mãe.
A família d'Avillez saúda a Cultura da Morte |
Num mundo assim as famílias numerosas continuarão a ser
um alvo a abater. São sinais de contradição: testemunhos de vida, amor e
sacrifício numa cultura que optou pela morte, apatia e egoísmo. As reações
automáticas quando se vêem muitos filhos revelam claramente uma consciência
pesada.
Uma vez que a principal razão pela qual pais católicos
optam por ter muitos filhos, nos dias de hoje, é o amor a Deus, encontramo-nos
novamente, nesta nossa era descristianizada e secular, na posição do Povo de
Israel, diante da escolha apresentada por Deus.
Ponho diante de vós a vida e a morte, a bênção e a
maldição. Escolhe a vida para viveres, tu e a tua descendência, amando o
Senhor, teu Deus, escutando a sua voz e apegando-te a Ele, porque Ele é a tua
vida. (Deut. 30, 19-20)
Talvez nunca tenhamos o equivalente a uma Liga Católica
dos Direitos Civis e Religiosos para defender as famílias numerosas da
discriminação. Não faz mal, não procuramos defensores neste mundo. Que as
famílias numerosas sejam o último preconceito socialmente aceite diz mais sobre
os perseguidores do que os perseguidos, que sabiam bem no que se estavam a
meter, “porque acreditou em mim, hei de salvá-lo, hei de defendê-lo, porque
conheceu o meu nome.” (Salmos, 91,14).
Os pais de famílias numerosas até se podem cansar das
bocas e piadas, mas aturá-las-ão com paciência, porque procuram a aprovação de
Deus, e não a da sociedade. Temos do Senhor a promessa de que a exclusão social
traz a inclusão celestial. Ironicamente, sendo a inclusão o último grito da
moda nos círculos iluminados, as famílias numerosas estão a percorrer o caminho
mais duro: “Felizes sereis, quando vos insultarem e perseguirem e, mentindo,
disserem todo o género de calúnias contra vós, por minha causa. Exultai e
alegrai-vos, porque grande será a vossa recompensa no Céu”. (Mt. 5, 11-12)
David G. Bonagura, Jr. leciona no Seminário de São José, em Nova Iorque. É autor de Steadfast in Faith: Catholicism and the Challenges of Secularism, que será lançado no próximo inverno pela Cluny Media.
(Publicado pela primeira vez na segunda-feira, 22 de Novembro de 2021 no The Catholic Thing)
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