Presidente Raul Castro e Cardeal Ortega, frente-a-frente |
Tomemos um caso concreto que na altura deu muito que falar.
No auge da perseguição aos timorenses pelos indonésios, a Igreja, sobretudo a
nível internacional, foi criticadíssima por não falar mais firmemente em favor
dos timorenses, que ainda por cima são na vasta maioria católicos e se
mantinham firmemente agarrados à sua identidade cristã.
O Vaticano não falava abertamente por medo de hostilizar
ainda mais o regime de Jakarta, com potenciais repercussões para as outras
comunidades cristãs que vivem naquele arquipélago. Recorde-se que, na altura,
ninguém tinha grande esperança numa eventual libertação de Timor-Leste.
Todavia, trabalhava-se nos bastidores, e havia gestos. O Papa
João Paulo II, por exemplo, beijava sempre o solo de um novo país. Quando
chegou a Dili todos aguardavam para ver qual seria o gesto. O Papa beijou um
crucifixo, que depois levou ao solo.
E há muitos outros casos também. O mais polémico, ainda
hoje, tem a ver com Pio XII e a Alemanha Nazi. Os seus críticos alegam que não
fez o suficiente para condenar os crimes dos nazis, mas os seus defensores
dizem que é fácil falar em retrospectiva, mas que na altura ele tinha que
decidir entre trabalhar nos bastidores ou hostilizar abertamente um regime que depois
poderia vingar-se na população católica não só da Alemanha mas também dos
países ocupados. Tomou a decisão correcta? O debate continuará aceso, sem
dúvida.
Não é por isso surpreendente que estejamos a assistir a uma
situação parecida em Cuba. A Igreja foi muito louvada por conseguir sacar
importantes cedências do regime, sobretudo a libertação de dezenas de presos
políticos. Mas essas cedências só se conseguem com proximidade, e a proximidade
tem um preço. Agora são alguns opositores que acusam o Arcebispo de Havana de
ser um “lacaio” do regime.
A questão é séria. A atitude da Igreja em Cuba estará a
credibilizar o regime e, por isso, a prolonga-lo? Seria mais vantajoso
colocar-se numa posição de hostilidade aberta? Devemos estar sequer a falar de
vantagens ou desvantagens, numa questão que se prende com a fidelidade ao Evangelho
e defesa de direitos humanos básicos?
Não são questões fáceis mas são importantes, nem que seja
para realçar os perigos inerentes a estas “relações próximas” com regimes
ditatoriais.
Filipe d’Avillez
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