Francis J. Beckwith |
“Sabes, nós [a
Primeira Dama e eu] somos ambos cristãos praticantes e claro que pode parecer
que esta posição nos coloca em conflito com as opiniões de outros mas, sabes,
quando pensamos na nossa fé, aquilo que pensamos que está na raiz é, não só o
sacrifício de Cristo por nós, mas também a Regra de Ouro, sabes, tratar os
outros como gostaríamos de ser tratados. E penso que é isso que tentamos
transmitir às miúdas e é isso que me motiva enquanto presidente e penso que
quanto mais coerente eu for na fidelidade a esses preceitos, serei melhor pai,
melhor marido e, espero, melhor Presidente.”
Admiro o Presidente por não ter vergonha de invocar a
autoridade e os ensinamentos de Cristo quando nos revela as suas deliberações
internas a respeito deste assunto. Numa era em que muitas das nossas
instituições que influenciam a cultura desprezam, instintivamente e sem pensar
duas vezes, as considerações teológicas como sendo sub-racionais, a honestidade
do Presidente é refrescante e bem-vinda.
Mas parece-me que a sua invocação da Regra de Ouro, por mais
apropriada, audaciosa e louvável que possa ser, não justifica a sua mudança de
opinião. A Regra de Ouro – “o que quiserdes que vos façam os homens, fazei-o também
a eles” (Mt. 7,12) – não é um quid pro
quo para a satisfação recíproca. Nesse caso, significaria que se se
fossemos mosoquistas, por exemplo, deveríamos infligir dor aos outros.
Quando Cristo nos deixou a Regra de Ouro como parte do
Sermão da Montanha (Mt. 5-7, 27), sabia que os seus ouvintes o compreenderiam
da mesma maneira que compreenderam outras partes dessa homilia, incluindo a
pergunta: “Qual de vós, se o seu filho lhe pedir pão, lhe dará uma pedra?” (Mt.
7, 9).
Se a Regra de Ouro fosse apenas um pacto de auto-satisfação
mútua para proteger as preferências de todos, então uma boa resposta à pergunta
de Jesus seria: “Mas Jesus, e se o meu filho me pedisse uma pedra, porque
preferia comer uma pedra do que um pão?”
Seria uma pergunta tola, porque a Regra de Ouro não é
simplesmente sobre proteger as preferências do nosso próximo mas, antes,
promover o seu bem. O Presidente, ironicamente, tem de confiar nesta
interpretação, mais antiga, para que façam sentido as suas referências às
responsabilidades enquanto “pai” e “marido”, porque o significado primordial
desses termos está integrado numa cultura moral herdada que ele não inventou,
mas que agora rejeita.
Jesus coloca-se a si e aos seus ensinamentos firmemente
nesta tradição moral. “Não lestes que o Criador, desde o princípio, fê-los
homem e mulher, (...) Por isso, o homem deixará o pai e a mãe e se unirá à sua
mulher, e serão os dois um só? Portanto, já não são dois, mas um só.” (Mt. 19,
4-6).
Jesus até reconhece que há uns que não se podem casar porque
nasceram assim, outros pela interferência dos homens e há aqueles que renunciam
ao casamento por amor do Reino do Céu (Mt. 19,12).
Esta compreensão do casamento é tão essencial para o
Evangelho que Cristo e os seus primeiros discípulos compararam a relação do
Senhor com a Sua Igreja à relação entre um noivo e a sua noiva. (Ver Mt 9,15, Mc 2,19, Lc 5,34, Jo
3,29, 2 Cor 11,2, Ef 5,25, Ef 5,31-32, Rev 19,7, Rev 21,2, Rev 21,9, Rev
22,17).
Porque a Regra de Ouro é, como Cristo o disse, “a Lei e os
Profetas” (Mt. 7, 12), é o fundamento da missão da Igreja na Terra, o que
significa que para o Cristão a Regra de Ouro integra-se inteiramente na
teologia moral da Igreja, incluindo o seu entendimento do casamento e do
bem-comum.
Embora o Presidente esteja enganado no que diz respeito à
Regra de Ouro, seria interessante saber até que ponto está disposto a aplicar
esta sua interpretação da mesma de forma mais generosa, para verdadeiramente
“tratar os outros como gostaria de ser tratado.”
Aplicá-la-á aos nascituros, ou até aos
sobreviventes de aborto?
Ou a instituições associadas à Igreja, ou mesmo privadas,
que não podem, por razões de consciência, fornecer cobertura de serviços
contraceptivos ou abortivos conforme
previsto no decreto da HHS?
Há dias em que gostava que Cristo nos tivesse deixado um
ensinamento diferentes sobre o casamento, um que não nos obrigasse a defender
aquilo que é claramente um conceito impopular nestes meios académicos em que
ganhamos a vida. Mas o Senhor espera de nós obediência total, mesmo quando
confrontados com perseguições e marginalizações.
Porque tal como Ele referiu, apenas nove versículos depois
de ter dito a Regra de Ouro, “Nem todo o que me diz: ‘Senhor, Senhor’ entrará
no Reino do Céu, mas sim aquele que faz a vontade de meu Pai que está no Céu.”
(Mt. 7, 21)
(Publicado pela primeira vez na Sexta-feira, 11 de Maio 2012
em http://www.thecatholicthing.org)
Francis
J. Beckwith é professor de Filosofia e Estudos Estado-Igreja na
Universidade de Baylor. É autor de “Return
to Rome: Confessions of An Evangelical Catholic” (Brazos, 2009) e um dos
quatro principais autores de "Journeys
of Faith: Evangelicalism, Eastern Orthodoxy, Catholicism and Anglicanism"
(Zondervan, 2012).
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