Sou nova-iorquino por escolha, vivo na região desde 1977.
É aqui que espero vir a morrer. E ainda tenho memórias bem vivas do 11 de
Setembro de 2001.
Era uma manhã linda. Tinha deixado a minha mulher, Sydny,
na estação de Pelham por volta das 8h00 e voltado a casa para levar os meus
filhos, de 14 e de 12 anos, para a escola. Depois subi para o meu escritório em
casa para trabalhar no meu livro sobre cavalheirismo.
Pouco antes das 9h a Syd ligou do seu escritório na
Rockefeller Center e mandou-me ligar a televisão.
Na NBC vi fumo a sair da Torre Norte do World Trade
Center (WTC).
Revendo essas imagens hoje, como fiz para escrever esta
coluna, em nada diminui o choque. É a mesma coisa quando revemos filmes cujos
finais já conhecemos e não deixamos de ficar nervosos. Às 9h ainda ninguém
sabia que o primeiro avião não tinha atingido a torre por acidente.
Nestas imagens os pivots da TODAY, no dia 11 de Setembro,
não sabem que o fumo e as chamas dessa explosão são do Voo 11 da American
Airlines, com origem em Boston. Matt Lauer especula, corretamente, que se os
primeiros rumores são verdadeiros, e de facto foi um avião, então não pode ter
sido um aparelho pequeno a fazer um buraco tão grande no edifício, casando
tantas chamas e fumo.
Ainda assim, a Katie Couric diz que estão a receber
informações de que se tratava de uma pequena aeronave de passageiros. Neste
momento o oráculo do TODAY diz que são 9h02.
Como
disse o bombeiro:
Não reserve um quarto acima do quinto andar
Em qualquer hotel em Nova Iorque.
Eles têm escadotes que chegam mais alto
Mas ninguém os subirá.
Como disse o New York Times:
O Elevador procura sempre
O andar das chamas
E abre automaticamente
E não fecha.
Estes são os avisos de que não se deve esquecer
Se estiver a subir para fora de si mesmo
Se quiser embater no céu*.
É 2021 e estou a tentar manter-me calmo, objetivo e
racional – mas só me apetece gritar. Estou a olhar para imagens de há duas
décadas e quero gritar. Gritar o quê? Um aviso? Para quem?
Então, precisamente às 9h03h11, o voo da United Airlines
175, também oriundo de Boston, atinge a Torre Sul. Um produtor da NBC
questiona-se se não haverá um problema com o controlo de tráfego aéreo. Cerca
das 9h05 Matt Lauer diz que os incidentes foram intencionais.
E mais ou menos nesse momento Andy Card, que está com George
W. Bush numa sala de aulas na Florida, encosta-se e sussurra ao Presidente, “A
América está a ser atacada”.
A próxima coisa que fiz nesse dia foi ligar para o George
Marlin, Diretor Executivo da Autoridade Portuária de Nova Iorque e de Nova
Jérsia (1995-1997), ou seja, depois do atentado mal-sucedido de 93 na WTC e
antes do 11 de Setembro. Encontrei-me com ele uma vez num andar alto na WTC, de
onde se podia ver o Rio Hudson. George, que acorda cedo, descreveu-me como às
vezes ao nascer o sol iluminava nuvens baixas, pintando-as de dourado,
fazendo-as parecer anjos a viajar à velocidade da luz.
Passei muitas vezes
O quinto andar
Subindo
a custo
Mas
só uma vez
É que subi até lá acima.
Sexagésimo andar:
Pequenas plantas e cisnes a dobrar-se
Para dentro de sepulturas.
Andar duzentos:
Montanhas com a paciência de um gato,
Silêncio calçado com ténis.*
“Estás a ver o que está a acontecer?”, perguntei ao
George no 11 de Setembro.
“Não temos uma televisão no escritório”, respondeu, “mas
já ouvi. Terroristas?”
“Só pode. Ambos os aviões estavam cheios de combustível,
a caminho da costa ocidental.”
“Vai-me mantendo a par, se faz favor.”
Disse-lhe que assim faria.
Então, pouco antes das 10h15, o George ligou de volta.
“O Pentágono e a Pensilvânia também, certo?”
“Sim, e a Torre Sul desmoronou. Caiu diretamente para
baixo, sobre si mesmo.”
George suspirou
“Foi isso que os arquitectos me disseram que iria
acontecer.”
Algo da minha conversa com o George fez-me querer rezar,
mas era complicado. Queria agradecer a Deus o facto de ele ter saído da
Autoridade Portuária quatro anos antes, mas entendi que o seu sucessor poderia
estar morto (e estava). Ainda assim, rezei. E sabia que não estava sozinho.
Imaginei aquilo que certamente era verdade, que através da nação, agora unida,
milhões de pessoas se encontravam de joelhos, e não como sinal de rendição.
A Igreja de São Pedro, ali perto, tornou-se por momentos
uma morgue, quando o corpo do padre Mychal Judge foi colocado diante do altar. Foi
vítima da queda de destroços na Torre Norte depois de ter entrado a correr no
edifício para ministrar aos mortos, moribundos e feridos. Foi designado “Vítima
0001”, a primeira pessoa a ser declarada morta no 11 de Setembro.
O escritório da minha mulher foi evacuado porque o Rock Center
foi considerado um potencial alvo. Ela tentou ligar-me, mas depois das 10h30
ninguém podia ligar para dentro ou para fora da cidade. Então andou a pé 20
quarteirões até ao apartamento da irmã e depois as duas saíram para ir comer
num quiosque local, enquanto ouviam as sirenes infindáveis e começavam a ver
pessoas cobertas de pó a subir, em silêncio, vindas da baixa de Manhattan.
As escolas fecharam mais cedo. A ansiedade dominava a
nossa pequena vila dos subúrbios porque tantas amigos e familiares trabalhavam
na zona financeira de Manhattan, alguns mesmo nas Torres Gémeas.
O meu filho mais velho, Bobby, estava preocupado com a
mãe e ligou da escola. Tranquilizei-o. Depois encontrou o seu irmão Jon e
vieram a pé para casa. O Jon foi para o quarto ler, mas o Bobby queria ir para
o jardim jogar à bola.
Estávamos no Jardim a lançar a bola e a apanhar – as
minhas mãos ardiam com a força dos seus passes – quando um caça F-15 passou por
cima de nós, a voar muito rente. Se o piloto tivesse baixado a asa e olhado
para baixo teria visto a sua cara.
Quem vivia onde eu vivo conhece pessoas que morreram no
11 de Setembro, ou pelo menos os seus familiares. Eu tinha-me divertido à brava
no casamento do Tommy Hohlweck, em 1978. A minha amiga Debra Burlingame vivia
ao virar da esquina e era irmã do Charles “Chic” Burlingame que pilotava o voo
da American 77, que atingiu o Pentágono. Apenas dias antes tinha estado junto à
linha do campo com o Pat O’Shea, enquanto víamos os nossos filhos a jogar
futebol americano. E em um ou dois encontros locais tinha conhecido o seu irmão
Danny, bem como o Monty Hoard. Perdemos nove habitantes de Pelham naquele dia,
incluindo o bombeiro Joe Leavy, que estava de folga, mas correu para o Ground
Zero e nunca regressou.
Eu fui membro do New York Athletic Club até 2011. Na
entrada há três memoriais com os nomes dos mortos: Primeira Guerra Mundial,
Segunda Guerra Mundial e 11 de Setembro de 2001.
Hoje foi declarado o fim da longa guerra que se seguiu ao
11 de Setembro. Rezo para que assim seja. Temo que não.
Andar quinhentos:
Mensagens e cartas de há séculos,
Pássaros para beber,
Uma cozinha de nuvens.
Andar seis mil:
As estrelas,
Esqueletos a arder,
Os seus braços a cantar.
E uma chave,
Uma chave muito grande,
Que abre algo –
Uma porta útil –
Algures –
Ali em cima.*
*Este poema profético “Subindo para o Céu num Elevador”,
escrito por Anne Sexton, foi escrito em 1975. A minha mulher publica-o todos os
11 de Setembro na sua página de Facebook.
Brad Miner é editor chefe de The
Catholic Thing, investigador sénior da Faith & Reason Institute e faz
parte da administração da Ajuda à Igreja que Sofre, nos Estados Unidos. É autor
de seis livros e antigo editor literário do National Review.
(Publicado pela primeira vez no sábado, 11 de Setembro de
2021 em The Catholic Thing)
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