Austin Ruse |
Uma violação é, frequentemente, o evento mais devastador,
em termos físicos e emocionais, da vida da vítima, que pode ser inundada por
sentimentos de culpa, tristeza e depressão. As vítimas falam mesmo de uma sensação
de sujidade. Nunca devemos menorizar este crime horrível.
É por isso que o argumento contra o aborto em casos de
violação é tão difícil de fazer passar por parte do movimento pró-vida e de
compreender pela sociedade. Esta é a posição da maioria dos grupos pró-vida e,
também, a posição da Igreja Católica. Matar uma criança inocente nunca é
justificável, mesmo que essa vida tenha sido fruto de uma violação.
A lógica é inatacável. Um nascituro é um ser humano único
que, por natureza, detém certos direitos. O principal de entre eles é o direito
à vida, que nunca pode ser abrogado, nem que seja em consequência de outro bem,
neste caso tentar apagar a terrível dor de uma vítima de violação. Um bebé por
nascer não pode ser punido pelos crimes do seu pai biológico.
Para dizer a verdade, muitos consideram isto uma perfeita
loucura. Para alguns, até parece uma crueldade. Como explica Serrin Foster,
presidente da Feministas pela Vida, a vítima de uma violação merece todo o amor
que possamos encontrar e devemos procurar punir o agressor de forma expedita e
justa.
Alguns argumentam: “Se obrigar uma mulher a carregar o
filho do seu violador, isso será uma recordação diária, ao longo de nove meses,
do momento mais traumático da sua vida”. Há uma certa verdade nisso. Se
catalogarmos o bébé como co-autor do crime, então a sua presença será uma
agressão diária. Na verdade, a pesquisa revela que esta é uma realidade para
muitas mulheres com gravidezes não planeadas ou indesejadas, não apenas de
violação. Elas encaram o bebé como uma ameaça às suas próprias vidas.
Mas algumas vítimas de violação chegam a um entendimento
diferente sobre o seu bebé. Existem testemunhos apaixonantes de mulheres que
temiam precisamente ver nos seus filhos a cara dos violadores, mas em vez disso
encontraram nada mais que a cara querida de um bebé.
As crianças concebidas por violação podem ser as melhores
testemunhas da verdade insofismável de que cada bebé humano é um dom de Deus.
Temos disso importantes exemplos, recordo-me assim de repente da advogada e
oradora Rebecca Keissling e da activista Ryan Bomberger.
Os activistas espertos procuram sempre combater em
terreno favorável, e não no terreno dos seus inimigos. É por isso que a luta
contra o aborto por nascimento parcial [também conhecido como aborto tardio, ou
do terceiro trimestre, no qual o bebé é rodado e o parto feito até que só a
cabeça continue dentro do corpo da mãe. Nessa altura fura-se o crânio com um instrumento
médico, de forma a que quando se termina o parto o bebé nasce já morto] teve
tanto sucesso na alteração do debate sobre a interrupção da gravidez nos
Estados Unidos. Essa campanha teve lugar no terreno preferido pelos defensores
da vida. Foi uma parvoíce da parte dos pró-aborto combater nesse terreno, que
os deixou tão mal vistos, mas não o puderam evitar. Até a Frances Kissling, na
altura presidente do movimento Catholics for a Free Choice [Católicos pela
Liberdade de Escolha], confessou que a defesa do aborto por nascimento parcial
custou ao seu movimento “muitos católicos pró-escolha”.
Lisa Askew, vítima de violação e o seu bebé |
Os nossos opositores neste campo também gostam de lutar
no seu próprio terreno. Querem fazer deste um debate sobre casos difíceis,
particularmente os casos de violação. Qualquer pessoa que fale deste assunto
com amigos, família ou até estranhos, quase imediatamente se vê confrontada com
a mesma situação em que se viu envolvido o congressista Todd Akin na semana
passada. Tornar possível o aborto para vítimas de violação é o argumento
pró-escolha por excelência, coloca-nos a nós na posição de defensar o que
parece indefensável.
Uma solução fácil é simplesmente ceder – a título
meramente argumentativo. “Tudo bem, fiquem com os casos difíceis. Podem ter o
aborto para os casos de violação e perigo para a vida da mãe. Isso equivale a
menos de 2% de todos os casos de aborto, ou cerca de 20 mil por ano”, [números
relativos aos EUA].
Este argumento revela como os casos extremos, embora
claramente complexos, são muito poucos no âmbito alargado do aborto. Muitos
americanos pensam que estes casos são a maioria. Deixar isto claro obriga os
defensores do aborto a ter que justificar os restantes 1,180,000 abortos que
são praticados por outras razões.
Tenha presente que a maioria dos americanos pensa que a
maior parte dos abortos devia ser proibida. Na sua vasta maioria os abortos são
feitos a mães e bebés saudáveis.
Mas o problema é que, a não ser que se dedique a esta
causa a tempo inteiro como voluntário ou como profissional, estes argumentos
não surgem de forma rápida ou fácil. No calor da argumentação qualquer pessoa
pode cometer erros.
Isto é especialmente verdade para o caso de políticos que
têm de estar a par de dezenas de assuntos ao mesmo tempo e precisam de estar
preparados para responder sobre todos eles a qualquer altura. Isto torna o
aborto em casos de violação um verdadeiro campo minado em termos políticos.
Regra geral o movimento pró-vida permite aos políticos
defender as excepções e ainda assim considerarem-se pró-vida. George Bush
defendia o aborto nos casos extremos mas o movimento considera-o o presidente
mais pró-vida da nossa história.
Enquanto defensores da vida consistentes devemos ajudar
as vítimas da violação a perceber que ficar com o seu bebé poderá não lhes
destruir a vida, mas antes ser precisamente aquilo que lhes dará alegria e
sentido.
Lisa Askew, que agora tem vinte e poucos anos, disse a um
jornal que tinha sido violada aos 16 anos. Ela ficou com o bebé, mas rejeitou-o
e não podia ser deixada sozinha com ele. Depois aconteceu alguma coisa, o amor
entrou em acção. “Eu sei que ele tem os olhos e o cabelo do pai, mas quando
olho para ele não vejo outra coisa que não o meu filho lindo. Nunca deixa de me
espantar que algo tão maravilhoso possa ter vindo de algo tão terrível. É o meu
rapazinho lindo e não o trocaria por nada deste mundo”.
(Publicado pela primeira vez na Sexta-feira, 24 de Agosto de
2012 em www.thecatholicthing.org)
Austin Ruse é presidente do Catholic Family & Human
Rights Institute (C-FAM), sedeado em Nova Iorque e em Washington D.C., uma
instituição de pesquisa que se concentra unicamente nas políticas sociais
internacionais. As opiniões aqui expressas são apenas as dele e não reflectem
necessariamente as políticas ou as posições da C-FAM.
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