Randall Smith |
Há semanas escrevi sobre uma senhora britânica, muito querida, que me informou de que “simplesmente
não podia” criar a sua filha na Igreja Católica, porque esta proíbe a
contracepção. Na altura pensei que se tratava de uma razão bizarra para se
escolher uma religião, e ainda penso, mas entretanto ouvi uma história ainda
melhor.
Conheço um jovem
rapaz que está absolutamente de rastos porque a mãe da sua noiva, que é
católica, informou a filha de que se recusava determinantemente a ir ao seu
casamento caso o casal insistisse em não
usar contraceptivos. “Criei uma filha inteligente e independente”, sublinhou, “suficientemente
inteligente para entrar em [uma prestigiada universidade da Ivy League]. Essa
filha devia ser suficientemente inteligente para não se tornar escrava das regras
de um bando de velhos, brancos, celibatários e de saias em Roma.”
Simpático, não? E
muito tolerante.
Talvez não valha
a pena explicar que uma batina não é uma “saia”, da mesma maneira que uma veste
tradicional de homens africanos não é uma “saia”. Será que ela se teria
atrevido a chamar “saia” a um “Grand Boubou” africano? Se enviou a filha para
uma universidade da Ivy League, não me parece. E na mesma linha, suponho que
mais vale esquecer o facto ainda mais óbvio, pelo menos para quem lá esteve, de
que não são só brancos que trabalham no Vaticano. Será que ela teria dito algo
do género: “Como é que consegues ouvir um bando de velhos africanos, asiáticos
e latino-americanos em Roma?” Não é provável.
Quanto à questão
do celibato, bom, aí terá razão. Mas criticar pessoas que aceitam conselhos
sobre a sexualidade de padres celibatários em Roma é como criticar pessoas qeu
aceitam conselhos de monges tibetanos sobre consumismo. Já ouviram alguém dizer: “Como é que podes aceitar conselhos
sobre compras daquele monge budista no Tibete? Ele nunca tem de ir ao Centro
Comercial”; Não pois não? Porque será?
É porque o
anti-catolicismo é um dos últimos preconceitos aceitáveis neste país. As
pessoas dizem coisas sobre católicos que não sonhariam dizer sobre outros
grupos e revelam um grau de ignorância que seria simplesmente vergonhosa
noutros contextos, mas que não desperta qualquer embaraço quando se dirige a
católicos ou ao Catolicismo.
Mas a minha
questão é outra: Onde está a tão propalada tolerância? Quem está a obrigar os outros?
São mesmos os padres católicos em Roma que estão a “policiar” o quarto desta
rapariga, ou é a sua mãe? Quem é que está aberto ao diálogo? O Magistério cujos
membros escreveram, literalmente, centenas de páginas racionais sobre o
assunto; ou a mãe que sem hesitações condena a sua filha por ser “estúpida” por
se atrever a pensar em não usar contracepção?
Os católicos que
concordam com os ensinamentos da Igreja a este respeito têm de aturar este tipo
de ignorância e intolerância a toda a hora. Pergunte a qualquer mulher católica
que tenha ido recentemente a um ginécologista quantas vezes teve de ouvir
sermões por não aceitar receitas para contraceptivos, e como os médicos são
paternalistas quando enfrentam esta recusa “infantil”. Pergunte a qualquer
mulher católica que tenha estado grávida nos últimos tempos como foi tratada
pelos médicos quando surgiu a questão de despistar deficiências.
Nos últimos anos
muitas mulheres me têm perguntado se é mesmo “obrigatório por lei” fazer uma
amnicentese para averiguar se o feto pode ter deficiências. Respondo-lhes que
ainda não. Mas médicos de muitas áreas insistirão que se faça, sem dúvida para
se protegerem de processos caso o bebé acabe por ter deficiências “indesejadas”,
tornando o nascimento “indesejado” também.
Santa Perpétua e Santa Felicidade, corações livres |
Nestas
circunstâncias quem é que está, verdadeiramente, do lado de da liberdade das
mulheres? Quem está a forçar as mulheres a fazer aquilo que não querem, e quem
está a tentar educar as mulheres para tomarem decisões educadas e responsáveis
sobre a sua fertilidade? Aquela mãe que se recusa a ir ao casamento da filha se
ela não usar contracepção está a ajudar a sua filha a fazer uma escolha educada
e responsável sobre a sua fertilidade? Ou está a escolher por ela a partir de
uma posição de alegada superioridade?
Porque é que a
liberdade, para estas pessoas, consiste sempre em verem-se livres do
Catolicismo? A liberdade de se ser autêntica e verdadeiramente católico
raramente aparece no radar destas almas “tolerantes”.
Lembro-me bem como
os meus pais ficaram tristes e escandalizados quando anunciei que me ia tornar
católico, isto das mesmas pessoas que sempre insistiram que “qualquer decisão é
correcta, desde que seja correcta para ti”. Aparentemente, qualquer escolha
seria “certa” desde que não fosse a escolha católica. A “liberdade” era sempre
em função dos “constrangimentos” com que não concordavam, nunca a liberdade de
ser algo diferente e verdadeiramente contra-corrente.
Francamente, tendo
em conta a forma como me tinham educado – a valorizar a “liberdade” e a “autonomia”
acima de tudo – tive tentado a desligar o telefone nas suas caras, de formas
indignada, e dizer: “Quem são eles para questionar as minhas decisões?” Mas há
aquela questão do mandamento sobre honrar o pai e a mãe. É irónico, não é? Que
os valores deles de liberdade e autonomia me fizeram querer desligar, mas foi a
minha fé católica, que tanto desprezavam, que me manteve ao telefone.
Na altura
pareceu-me claro, e continua a sê-lo hoje, onde está a verdadeira liberdade. Há
quem nos queira negar essa liberdade e, ironia suprema, é em nome da liberdade
que o querem fazer. Gente dessa existe há muito tempo. São os mesmos que
aconselharam Santa Perpétua quando aguardava a sua execução: “Rejeita Cristo
apenas em palavras; em privado, ninguém quer saber o que fazes”.
O dela era um
coração que conhecia a verdadeira liberdade.
Randall Smith é professor de teologia na Universidade de St. Thomas, Houston.
(Publicado pela
primeira vez em www.thecatholicthing.com no Sábado, 11 de Agosto de 2012)
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