Randall Smith |
al “redução”.
Para nós, “redução” envolve
tornar as coisas mais pequenas. Literalmente, porém, a palavra latina reductio
significa “conduzir de volta”. Assim, a reductio das ciências à teologia
proposta por São Boaventura não envolve diminuí-las para encaixarem na
teologia. De todo. Pelo contrário, o seu objectivo era de mostrar como todas as
disciplinas, operando de acordo com os seus métodos próprios, podem
conduzir-nos a Deus.
Não é que estejamos à espera
que os professores de química, biologia ou física façam teologia nas suas
aulas. Muito pelo contrário. Partindo da compreensão da criação como uma
expressão do divino Logos e a encarnação do amor de Deus, quando um professor
de ciências naturais ensina aos seus alunos verdades sobre o mundo, ou sobre o
ser humano, está com este acto a conduzir as pessoas ao Deus Criador. Está a
ajudar os alunos a “ler” o que os académicos medievais chamavam “o Livro da
Natureza”, escrito pela mesma mão que escreveu o “Livro das Escrituras”.
Se estes professores começarem
as aulas com uma oração, ou se recordarem os seus alunos que “tudo o que
estudamos ajuda-nos a compreender o que Deus escreve no Livro da Natureza”,
isso é óptimo. Mas esse deve ser o pressuposto de toda a gente que participa na
aula, e não a matéria em si. Não existe nenhum requisito de fazer acção social
para provar que é católico. A caridade começa na sala de aula, lecionando com
generosidade e excelência.
Professores de química,
biologia e física cumprem o seu papel de fomentar uma educação católica
precisamente a ensinar química, biologia e física. Não cabe aos professores de
teologia dizer-lhes como devem leccionar nas suas aulas, tal como não lhe cabe
dizer a um pedreiro como construir uma parede. Há muito que a tradição católica
percebeu que cada disciplina tem a sua própria metodologia.
Porém, haverá sempre certas
orientações que ajudam as instituições católicas a proteger-se de forças
exteriores, umas das outras e até, por vezes, de si mesmas.
Uma universidade católica
recordará a cada disciplina que deve evitar tornar-se subserviente às tentações
do orgulho, da riqueza, ou do poder, e que não deve ajoelhar-se perante a coacção
de governos ou outras agências estatais. A sua principal obrigação deve ser
para com a verdade.
Assim, por exemplo, a Economia
numa universidade católica nunca deve resumir-se ao lucro, as Ciências
Políticas não podem focar-se apenas no poder e o estudo das outras disciplinas,
incluindo filosofia e teologia, nunca devem servir apenas o prestígio
profissional ou o orgulho. Não estamos na universidade para nos servirmos a nós
mesmos ou aos nossos egos, mas aos nossos alunos. Nem devemos servir uma
ideologia. Servimos a verdade, porque quando servimos a verdade é a Deus, que é
a Verdade, que servimos.
Uma instituição católica
também assegurará que cada disciplina respeita os seus próprios limites.
Biólogos, químicos e físicos não devem estar a fazer afirmações filosóficas que
não são sustentadas pelos métodos das suas disciplinas, tais como “a evolução
prova que Deus não existe” (o que é um disparate). Da mesma forma, filósofos e
teólogos não devem fazer afirmações sobre as ciências que ignoram os mais
recentes desenvolvimentos científicos.
Em tudo o que faz, uma
universidade católica deve praticar a reductio, mas deve resistir a
todas as formas desnecessárias de reducionismo. Do que falamos aqui?
São Boaventura |
Primeiro, o “reducionismo
metodológico”, através do qual os cientistas procuram “reduzir” os fenómenos
aos seus elementos constituintes. “Reduzimos” as coisas materiais às suas
estruturas atómicas. “Reduzimos” os traços físicos às causas genéticas. Esta
“redução metodológica” é comum às ciências naturais e próprio da sua
metodologia.
O problema é que os
cientistas, ou mais frequentemente o público, especialmente os media, também
enveredam pelo “reducionismo epistemológico” – a afirmação de que depois de
reduzirmos as coisas às suas partes constituintes já não há mais nada a saber
sobre elas. Por vezes, de forma mais radical, envolvem-se em “reducionismo ontológico”,
a afirmação de que as coisas não são mais do que as suas partes constituintes.
A tradição intelectual
católica sempre resistiu a estas duas formas de reducionismo. Pedir aos
cientistas para evitarem este tipo de erro não é mais do que pedir-lhes que
sejam fiéis às suas próprias disciplinas e não enveredarem pela epistemologia
ou metafísica.
Mais, uma instituição católica
insistirá que todas as disciplinas se mantenham abertas à visão plena da pessoa
e do florescimento humano que está no coração da tradição intelectual católica.
Todos os que procuram sinceramente a verdade têm um lugar na universidade
católica.
Já aqueles que odeiam a fé
católica ou que acham que qualquer fé é ridícula, ou que acreditam que a visão
católica da pessoa é odiosa e aberrante, ou que querem que a universidade
católica procure o dinheiro e o prestígio de outras escolas, devem evitar
tornar as suas vidas miseráveis numa universidade católica e arranjar emprego
noutro lado qualquer.
Assim, a reductio de
São Boaventura e o desejo da universidade católica de ver toda a verdade, seja
de que disciplina for, como uma condução de volta a Deus, nada tem a ver com a
afirmação do cientismo moderno de que o conhecimento científico é a única forma
de conhecimento e de que toda a realidade, incluindo os humanos, não é mais do
que uma coleção de átomos. A tradição intelectual católica afirma que toda a
verdade que alcançamos sobre o mundo nos dá um vislumbre do amor criativo e da
sabedoria de Deus.
Mas não há uma só disciplina
que nos diga tudo o que precisamos de saber, porque as realidades que Deus
criou, sobretudo os seres humanos, são muito mais do que aquilo que podemos
compreender quando as reduzimos a algo mais pequeno, algo que possamos dominar
e controlar.
Randall Smith é professor de teologia na Universidade de
St. Thomas, Houston.
(Publicado pela primeira vez em The
Catholic Thing na terça-feira, 18 de Outubro de 2022)
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