A conclusão de Havel é que o merceeiro não tem qualquer
interesse na união dos trabalhadores, nem está comprometido com essa ideia, mas
sente – correctamente – que tem de colocar o cartaz, sob pena de ser mal visto,
e devidamente punido, pelas forças que dominam a sociedade. Resumindo, a
colocação do cartaz é um esforço necessário para que de resto seja deixado em
paz por um sistema totalitário.
Já essas forças que dominam a sociedade, que neste caso
são comunistas, também não têm qualquer interesse no conteúdo nem na mensagem
do cartaz, para além do facto de a sua colocação na vitrine da mercearia
simbolizar a submissão do merceeiro à ideologia dominante.
É um sistema, conclui Havel, que depende da mentira e se
perpetua na mentira. “Têm de viver dentro de uma mentira. Não precisam de
aceitar a mentira. Basta que tenham aceitado a sua vida com ela e no seio dela.”
Como não pensar neste exemplo ao ver a onda de instituições
a atropelar-se durante este mês de junho para colocar à martelada a bandeira
arco-íris em toda a sua estratégia de comunicação? Desde a Câmara Municipal de
Lisboa a clubes de futebol, bancos, marcas de carro e de cerveja, todos sentem
a necessidade de se juntar à turba.
Mas alguém acredita que a Volkswagen e a Heineken estão mesmo
preocupados com aquilo que representa a bandeira arco-íris? (se é que é
possível haver acordo sobre o significado da bandeira…). Claro que não. Eles estão
é preocupados com as consequências de não colocar aquele símbolo, pois ele
tornou-se a bandeira oficial de um movimento social que persegue de forma
impiedosa os seus inimigos e não aceita qualquer desvio da nova ortodoxia.
É evidente que isto não é apenas um problema desta causa
e desta bandeira. Pode acontecer com qualquer causa que assume contornos de
ideologia. Facilmente imaginamos uma aldeia rural e conservadora em que um
indivíduo ateu empedernido se sente obrigado a ir à missa na Páscoa para não
ser mal-visto pelos seus vizinhos. E isso também é grave.
Neste caso da bandeira arco-íris a prova da total insinceridade
destas manifestações de apoio “à causa” está em todo o lado. Veja-se o caso
recente do FC Barcelona, que mudou a sua imagem de perfil nas redes sociais,
incorporando a bandeira arco-íris, em todas as contas menos na árabe, porque lá
a coisa tende a não ser tão bem aceite. E acham que o TikTok está mesmo tão
empenhado como dá a entender pela publicidade nos estádios do Euro 2020? Acham
que eles fazem essa mesma publicidade na China, onde a empresa está sedeada? (Um leitor, a quem agradeço, partilhou entretanto este link que mostra que esta prática é aliás generalizada)
Vaclav Havel |
E porque é que me preocupa isto? Eu sou o primeiro a assinar por baixo se me perguntam se todos devem ser tratados com igualdade e respeito, independentemente da sua orientação sexual. Assino por baixo porque isso é um requisito básico dos direitos humanos, em que acredito, e de uma visão cristã da humanidade, que procuro ter sempre.
Mas o que se está a passar nada tem a ver com a dignidade inerente e indelével de todos os seres humanos, é meramente uma questão de imposição ideológica que assume contornos claramente totalitários. Ninguém quer saber em que é que você acredita, desde que exteriormente se comporte conforme a ortodoxia. Ninguém quer saber o que faz em prol dos homossexuais, desde que um dia por ano a sua foto de perfil nas redes sociais adopte as cores do arco-íris. Isto é a cultura da mentira e é uma das grandes marcas do totalitarismo. Porque o totalitarismo não precisa de ser apoiado por uma estrutura política ditatorial nem precisa de gulags e de campos de concentração para manifestar a sua intolerância.
Não é só o FC Barcelona:
ReplyDeletehttps://twitchy.com/gregp-3534/2021/06/02/cowardly-brands-embrace-pride-month-just-not-in-every-country/
Grande artigo. Concordo na íntegra. Este tema gera grande discussão e muitas vezes no seio familiar. É difícil mediar essas discussões.
ReplyDeleteO Francisco tem coragem de vir defender o Orban contra toda a narrativa impostora da comunicação soicial?
ReplyDeleteGrande, grande artigo! Parabéns!
ReplyDeleteDesculpe, quis dizer Filipe
ReplyDeleteÉ isto mesmo Filipe! Falar de forma simples, eficaz e elegante tem tudo de cristão! É um tema difícil para mim, que ainda hoje recebi uma informação sobre a implementação da "linguagem neutral" pelo MEC (Min.Educação e Cultura)-Brasil, pois me reconheço uma conservadora meio rígida, e vejo com clareza o que as Instituições e movimentos internacionais fazem, há anos, em diferentes lóbis. Hoje, tudo nos "empurra" na direção que muitas vezes não se quer. Um exemplo pessoal é o da vacinação atual contra a Covid19, e já estamos em (20)21, com variantes aos milhares. Em Março de 2020, assisti a uma palestra com uma gestora da BIAL, um médico-investigador em vacinas no Inst. Medicina Tropical, com coronavirus (já existe há 1 século). Nada bate certo com o que ouvi sobre a viabilidade, construção, validação e comercialização de uma vacina! Mas quem se recusa, fica sem poder circular ou se apresentar em determinados locais. A falta de confiança é geral e em quase tudo e a insegurança e a incapacidade criam raízes em nós. Como cristã, faço um esforço diário para manter a Alegria de fazer parte da Criação e, o Filipe, ajuda: Muito Obrigada. Vou refletir sobre o que escreve e talvez possa "usar" algumas das suas conclusões nos meus diálogos...
ReplyDeleteCompletamente de acordo! Obrigado Filipe
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