Wednesday, 13 February 2019

Redescobrindo o Born-Alive Act

O Governador da Virgínia, Ralph Northam, conseguiu, na semana passada, expressar abertamente a posição do Partido Democrata sobre o aborto: que não existe qualquer obrigação de proteger a vida de uma criança que tenha o desplante de sobreviver a um aborto quando, claramente, não é “desejada”.

Isso foi o suficiente para estimular o senador Ben Sasse, do Nebraska – que nunca perde a oportunidade de fazer gestos de grande paixão moral, mesmo quando não está disposto a fazer o trabalho necessário para os levar a bom porto. Sasse já tinha introduzido no Senado o “Born-Alive Abortion Survivors Protection Act” [Lei de Protecção de Nados Vivos Sobreviventes ao Aborto] e então pediu imediatamente um voto para segunda-feira à noite, para ver se a lei poderia ser aprovada “sem objecções”.

Claro que não pôde. O objectivo da lei é de restaurar as penas que foram removidas da lei original, a “Born-Alive Infants’ Protection Act” de 2002. Essa lei inicial tinha como objectivo colocar estabelecer no direito esta premissa chave: que uma criança que sobreviva a um aborto e nasça viva tem o mesmo direito que qualquer outro Ser Humano à protecção da lei.

Alguns dos leitores saberão que eu tive um papel em redigir estas propostas de lei e em defendê-las. É uma história que remonta a 30 anos atrás. Num caso em particular, nos anos 70, uma criança sobreviveu a um aborto durante 20 dias, foi sujeito a cirurgia e acabou por morrer. A questão estava em saber se existia a obrigação de fornecer apoio médico àquela criança e a resposta, segundo o juiz Clement Haynsworth, foi que não.

Ele “explicou” que a partir do momento em que uma mulher grávida optava por um aborto “o feto neste caso não é uma pessoa cuja lei estadual pode proteger”. Por outras palavras, o direito ao aborto corresponde ao direito a um “aborto efectivo”, ou seja, uma criança morta.

Alguns de nós pensámos que poderíamos começar por aí, para testar os limites desse “direito ao aborto”. Sugerimos então o “primeiro passo mais modesto”: a proposta de simplesmente proteger a criança que tenha sobrevivido ao aborto. [A história dessa lei, as razões que lhe eram subjacentes e a forma como passou, são narradas no meu livro “Natural Rights and the Right to Choose”.]

Mas essa era uma proposta inaceitável para os defensores do aborto, porque perceberam que assim toda a sua posição se desenvencilhava. Se aceitassem que o nado-vivo era uma criança humana, com direito a protecção da lei, nós poderíamos perguntar o que é que a mesma criança tinha de diferente cinco minutos, ou cinco dias, ou cinco meses antes?

Ben Sasse
E foi por isso que os nossos aliados ficaram tão admirados quando a lei foi finalmente apresentada no ano 2000 e promulgada em 2002. O já falecido Henry Hyde ficou estupefacto quando a National Organization of Women se opôs a esta modesta lei para proteger os nados-vivos. A ironia é que os nossos adversários compreenderam a lei melhor que os nossos amigos, porque entenderam o princípio no coração da coisa.

Decidiu-se, contudo, retirar à lei as penalizações, tanto civis como criminais, para evitar que o Presidente Clinton a vetasse. Ficaríamos contentes com uma “lei pedagógica” que transmitisse informações que chocariam o grande público: que o direito ao aborto, proclamado em Roe v. Wade, abrangia a totalidade da gravidez, podendo mesmo chegar ao direito de matar a criança depois de nascer.

Seja como for, sem as penalizações a lei tornou-se quase impossível de aplicar. E viríamos a descobrir que estas coisas aconteciam muito mais do que tínhamos pensado em 2002. Enfermeiras começaram a contar histórias de bebés nados-vivos e colocados em salas para morrer.

Mas depois veio o choque do caso de Kermit Gosnell, na Filadélfia. Era o momento ideal para regressar à lei original e restaurar as penalizações, civis e criminais, que lhe tinham sido retiradas. A lei foi aprovada duas vezes na Câmara dos Representantes, em Setembro de 2015, com 248 votos a favor e 177 contra, e em Janeiro de 2018, com 241 a favor e 183 contra.

Todos os republicanos apoiaram a lei, e todos os votos contra foram dos democratas. Este foi o voto que revelou a grande verdade, que de acordo com o entendimento do partido à esquerda no nosso quadro político, o direito ao aborto não se limitava à gravidez, aplicando-se também ao direito a matar o bebé sobrevivente.

Esse dado poderia ter ganho contornos enormes na eleiçãopresidencial de 2016, mas ninguém parecia consciente disso, incluindo católicos influentes nos media como Bret Baier, que tinham à sua disposição os vastos recursos das redes à sua disposição.

Quando, há anos, nos contentámos com uma “lei pedagógica” pensámos que esta seria uma forma dramática de fazer esta informação chegar ao grande público. O que não contávamos era que os media simplesmente ignorassem a história, não lhe dando qualquer cobertura.

Este poderia ter sido o momento de redenção para Ben Sasse. A energia que o possui agora teria sido mais útil o ano passado, obrigando a uma votação da lei no Senado, depois de ter passado na Câmara Baixa. Ou se aprovava a lei, ou então os democratas seriam obrigados a tomar posição sobre o assunto antes das eleições.

A sua desatenção levou-nos a perder essa vantagem. A questão agora está em saber se, desta vez, ele será capaz de levar a coisa até ao fim. Conseguirá romper com o blackout dos media e colocar este assunto onde merce estar, isto é, no centro do debate público e na eleição de 2020?

Howard Kainz é professor emérito de Filosofia na Universidade de Marquette University. Os seus livros mais recentes incluem Natural Law: an Introduction and Reexamination (2004), The Philosophy of Human Nature (2008), e The Existence of God and the Faith-Instinct (2010)

(Publicado pela primeira vez em The Catholic Thing na Quinta-feira, 7 de Fevereiro de 2019)

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