Wednesday, 7 December 2022

O Problema das Conferências Episcopais

Stephen P. White
Em Novembro passado, como acontece todos os anos, decorreu o encontro plenário da Conferência Episcopal dos Estados Unidos (USCCB), em Baltimore. Tal como fazem de três em três anos, os bispos elegeram um novo presidente, desta vez foi o Arcebispo Timothy Broglio, das Forças Armadas, que substitui o Arcebispo José Gómez, de Los Angeles.

A eleição levou a uma onda de histerismo de alguns dos suspeitos do costume nos media católicos, que acusaram os bispos de estarem a “repudiar” o Papa Francisco, ou de estarem a optar por um “Catolicismo pós-episcopal”. Os argumentos em si não merecem ser rebatidos neste espaço.

O que vale a pena fazer é discutir a importância desproporcional que se tem atribuído nos últimos anos a estas eleições, bem como à própria conferência episcopal.

A principal função da conferência episcopal é ajudar os bispos no seu ministério. Muito, se não mesmo a maior parte do trabalho da USCCB é feito por funcionários, que são na maioria leigos. O que significa que o papel principal do presidente é sobretudo administrativo, e não pastoral, embora seja verdade que o presidente pode moldar (mas não ditar) o trabalho e as prioridades da conferência, e que representa a Igreja americana em Roma.

Mas a USCCB não é, certamente, a sede da Igreja Católica nos Estados Unidos. Nem sequer é o órgão que governa o Catolicismo americano (embora os bispos, no seu conjunto, tenham alguma capacidade para criar leis particulares). O presidente da conferência episcopal não é um patriarca dos Estados Unidos, nem o pastor-mor da Igreja americana.

Nada disto significa que a conferência, ou a sua liderança, não são importantes. São. Mas a sua importância é sobretudo a de assistência aos bispos. Eles existem para ajudar os bispos no seu ministério, e não para os substituir.

Desde o início do seu pontificado o Papa Francisco tem enfatizado e elevado, de várias formas, o papel das conferências episcopais nacionais e regionais. E não sem razão.

Em primeiro lugar, e mais importante, o Concílio Vaticano II, em particular no Lumen Gentium e no Christus Dominus, dá especial atenção ao ministério dos bispos e ao princípio da colegialidade. Os bispos não são gerentes de sucursais na estrutura empresarial do catolicismo, nem são apenas delegados da autoridade papal. Os bispos possuem autoridade legítima própria.

Esta autoridade tem a sua expressão máxima quando agem de forma colegial, sempre cum Petro et sub Petro (com e sob Pedro). Daí a imensa importância dada aos concílios ecuménicos. Este entendimento da autoridade episcopal tem raízes que remontam a muito antes do Vaticano II, recuando até aos primeiros séculos da Igreja.

No Evangelii Gaudium o Papa Francisco escreveu que a visão do Concílio Vaticano II para as conferências episcopais ainda não foi plenamente cumprida, uma vez que “este desejo não se realizou plenamente, porque ainda não foi suficientemente explicitado um estatuto das conferências episcopais que as considere como sujeitos de atribuições concretas, incluindo alguma autêntica autoridade doutrinal”. O resultado, segundo Francisco tem sido uma excessiva centralização e uma dependência indevida de Roma. “Uma centralização excessiva, em vez de ajudar, complica a vida da Igreja e a sua dinâmica missionária.”

Arcebispo Timothy Broglio
Uma boa parte do seu entusiasmo por fortalecer a autoridade das conferências episcopais deriva, certamente, da longa experiência do Papa Francisco enquanto presidente da Conferência Episcopal da Argentina e, mais especificamente, a sua experiência no encontro da Conferência Episcopal da América Latina (CELAM), em Aparecida, em 2007.

Esta afinidade por uma “descentralização saudável”, como o Papa Francisco por vezes lhe chama, molda a sua compreensão da sinodalidade, incluindo, aparentemente, a sua disposição para dar grande margem de manobra a experiências erráticas de eclesiologia, prática pastoral e disciplina sacramental como a que está a ocorrer agora na Alemanha.

Mas apesar de toda esta ênfase na descentralização, este pontificado também foi marcado por alguns gestos invulgarmente duros de centralização. A implementação da Traditiones Custodes, por exemplo, limitou substancialmente a capacidade dos bispos individuais de regulamentar questões litúrgicas nas suas próprias dioceses (em especial no que diz respeito à Missa Tradicional), chegando ao ponto de ditar que missas podem ou não ser publicadas nos boletins paroquiais.

O Papa Francisco também promulgou muito mais legislação do que qualquer um dos seus antecessores. Essa legislação, por sua vez, tem sido implementada e aplicada de forma algo irregular e inconsistente (um exemplo são as regras do Vos estis lux mundi sobre como lidar com casos de abusos sexuais). Frequentemente o estilo de governação do Papa tem tido o efeito contrário ao pretendido, centralizando a autoridade em Roma, diminuindo a autoridade individual dos bispos e tornando a pessoa do Papa (e não a lei, nem o ensinamento magisterial) o ponto de referência principal da vida católica.

O que nos traz a uma recente entrevista que o Papa concedeu à América, a revista dos jesuítas dos Estados Unidos, em que Francisco fez umas declarações refrescantemente simples e clarificadoras sobre a importância da autoridade pastoral dos bispos em relação às conferências episcopais:

Acho que é enganador falar da relação entre os católicos e a conferência episcopal. A conferência episcopal não é o pastor, o pastor é o bispo. Por isso corremos o risco de diminuir a autoridade do bispo quando olhamos apenas para a conferência episcopal. A conferência episcopal existe para juntar os bispos, para estes poderem trabalhar juntos, discutir assuntos, fazer planos pastorais. Mas cada bispo é um pastor. Não dissolvamos o poder do bispo, reduzindo-o ao poder da conferência episcopal. Porque a esse nível as tendências concorrem, umas mais à direita, outras mais à esquerda, mais aqui, mais ali, e seja como for a conferência episcopal não tem uma responsabilidade de pele e osso, como o bispo tem com o seu povo, um pastor com o seu povo.

As palavras do Papa podem ser lidas como uma correcção de todos os que consideram as conferências episcopais, e não os próprios bispos, como a principal fonte de autoridade episcopal na Igreja. Se a “descentralização saudável” que o Papa deseja vai produzir unidade em vez de divisão crónica, terá de depender menos da liderança desta ou daquela conferência episcopal do que daquele bispo – o bispo de Roma – que é verdadeiramente o primeiro de entre os seus irmãos.


Stephen P. White é investigador em Estudos Católicos no Centro de Ética e de Política Pública em Washington.

(Publicado em The Catholic Thing na Quinta-feira, 1 de Dezembro de 2022)

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