Stephen P. White |
Hoje em dia não há falta de conversas sobre homens e masculinidade. Toda a gente parece querer saber o que é que se passa com os homens. Desde os debates sobre o transgénero, ao movimento Me Too, passando por preocupações com a perspectivas económicas e matrimoniais de homens jovens (sobretudo de classe operária) e ainda as implicações políticas destas dificuldades, a nossa cultura está saturada com questões que se prendem com a masculinidade. Muitas perguntas, muito debate, mas relativamente poucas respostas.
Alguns tratam a masculinidade
como uma mera construção, sem qualquer conteúdo essencial. O único propósito da
masculinidade – um propósito que nada tem de essencial, mas que é apenas prático
– é de assegurar poder ao serviço de uma classe opressora. Os fortes dominam os
fracos, os desportistas dominam os totós no liceu. Os machões tratam mal e são
condescendentes para com as mulheres. Estão a ver a ideia.
Depois temos aqueles que, muitas
vezes em reação à visão acima descrita de toxicidade, apresentam a
masculinidade como uma coleção de atributos físicos ou psicológicos: força física,
assertividade, confiança, disciplina, liderança, estoicismo, domínio, competitividade,
e por aí fora. Mas se seguirmos esta linha de pensamento, inevitavelmente
percebemos que a soma das partes é menor que o todo. A masculinidade enquanto
estilo de vida é tão desinteressante como a ideia de masculinidade como instrumento
de repressão patriarcal.
Em justiça podemos dizer que
nenhuma destas visões está inteiramente errada. É verdade que os homens se
aproveitaram de certas forças e vantagens sociais para maltratar mulheres. E há
certos atributos e qualidades que são e devem ser associadas à masculinidade,
tal como existem certos comportamentos e qualidades que são decididamente não-masculinas.
Agora, tal como a maioria dos
homens que conheço (pelo menos aqueles que considero serem bons exemplos
daquilo que é ser homem), eu não passo muito tempo a preocupar-me com o que
significa ser masculino, ou com a masculinidade. A verdade é que, de modo
geral, considero estas discussões sobre masculinidade bastante entediantes e
exageradas.
Acontece, porém, que no mês
passado fui convidado para ir falar a um grupo de estudantes universitários – na
maioria jovens homens – sobre o tema de “masculinidade sã”. Por isso fiz uma
pausa no meu já longo hábito de não pensar sobre “masculinidade sã”, para
pensar que sabedoria poderia oferecer a estes rapazes. Surgiram-me três pontos.
Primeiro: tanto quanto consigo
perceber, depois de pensar muito no assunto, a masculinidade sã não é mais do
que aquilo que acontece quando o homem leva uma vida virtuosa. Apenas isso. Um
homem virtuoso, pelo facto de o ser, vive a sua masculinidade de forma
saudável. Está mesmo na raiz da palavra “virtude”, do latim “virtus”, que se
refere às qualidades próprias de um “vir”, um homem.
Isto pode parecer demasiado simplista,
ou até circular, mas não é. Reparem que o contrário nem sempre é verdade. Nem
toda a gente que tem como objectivo viver uma “masculinidade sã” viverá de
forma virtuosa. Se queremos cultivar uma masculinidade saudável temos de
ensinar as virtudes aos homens, e a coisa irá ao sítio. Mas se dissermos aos
homens que têm de exibir uma “masculinidade sã” e depois não os instruirmos nas
verdadeiras virtudes, estamos a preparar o terreno para a confusão e o falhanço.
Falível e mortal, mas um pálido reflexo do amor de Deus |
Seja qual for a força moral ou
física que um homem tem, ela existe para que ele melhor possa servir aqueles
que lhe são encarregados. A prova mais clara disto está precisamente na
excepção: nada é menos “de homem”, nada é mais absolutamente antitético à
paternidade, do que um homem que se aproveita ou abusa de mulheres e crianças.
Terceiro: A paternidade é uma
condição terminal. Como todas as verdadeiras vocações, a paternidade encontra o
seu cumprimento pleno na dádiva da vida própria em serviço aos outros. Um pai
ama incondicionalmente, mesmo sabendo que ele irá diminuir na medida em que os
seus filhos aumentam e crescem. Mas a paternidade é sobre mais do que apenas
sacrifício próprio.
A maioria de nós aprende sobre
a paternidade, em primeiro lugar, com os nossos pais. Como filhos aprendemos
que os nossos pais são invencíveis, omniscientes, omnipotentes, fantásticos,
todo-amorosos. (Nem podia ser de outra maneira, tendo em conta a forma como a mãe
olha para ele). Mas à medida que crescemos vamos percebendo que isso não é bem
assim, os nossos pais são – esperamos – muito bons homens, mas não deixam de
ser apenas homens. Falíveis, com falhas, mortais.
Depois, como homens (e aqui
dirijo-me aos homens), tornamo-nos pais e a nossa visão da paternidade volta a
mudar. Se o meu pai não era perfeito, eu certamente também não sou! Mas os meus
filhos não sabem isso. Ainda.
E é então que começamos a perceber.
Aquela primeira imagem infantil da paternidade – invencível, omnisciente, omnipotente,
fantástico, todo-amoroso – essa é que é a verdadeira paternidade. Eu posso ser apenas
um pobre reflexo disso, mas isso não invalida que seja real. Existe mesmo um
Pai assim. Eu já conheci esse amor. Mais incrível ainda, apesar de todas as
minhas fraquezas, imperfeições e egoísmo, Ele permitiu-me um vislumbre de como
é amar como Ele ama. E permitiu-me, chamou-me, a exibir um vislumbre desse amor
aos meus próprios filhos. É um banho de humildade, e não pouco assustador.
É isso que significa dizer que
a paternidade é uma condição terminal. A paternidade não é apenas “até à morte”.
Tem um objectivo, dirige-se a algo. Aponta para Alguém que não sou eu. É uma
oportunidade imerecida para participar no amor de Deus Pai. A possibilidade de
ser, para outro, um vidro através do qual podem, ainda que de forma obscura,
vê-lo a Ele. Sim, é um banho de humildade, não pouco assustador, e incomensuravelmente
maravilhoso.
Stephen P. White é
investigador em Estudos Católicos no Centro de Ética e de Política Pública em
Washington.
(Publicado em The
Catholic Thing na Quinta-feira, 15 de Dezembro de 2022)
© 2022 The Catholic Thing. Direitos
reservados. Para os direitos de reprodução contacte:
info@frinstitute.org
The Catholic Thing é um fórum
de opinião católica inteligente. As opiniões expressas são da exclusiva
responsabilidade dos seus autores. Este artigo aparece publicado em Actualidade
Religiosa com
o consentimento de The Catholic Thing.
Caro Filipe, muito obrigado por partilhares este artigo! Muito útil para um pai quase a sê-lo.
ReplyDelete