Stephen P. White |
As recentes festividades de Todos os Santos e Fiéis Defuntos dão-nos a ocasião para nos afastarmos das circunstâncias presentes da Igreja e do mundo, e para ver as coisas com um horizonte mais alargado.
Mais do que uma constelação
distante de exemplos morais, mais do que uma hoste de intercessores a rezar por
nós diante do Trono da Graça, a Comunhão dos Santos é aquilo que espera cada um
de nós cuja salvação foi alcançada pelo sacrifício de Jesus Cristo. A gloriosa
diversidade de santos é aperfeiçoada pelo esplendor de Deus Trino, cuja vida
agora partilham em pleno, na mesma medida em que o relfecte.
Se fomos feitos para a
beatitude, se é esse o nosso destino final e objectivo, então a comemoração dos
Fiéis Defuntos é uma recordação de que o caminho é estreito. As almas no
Purgatório irão para o Céu. Mas enquanto rezamos pela sua purificação e rápida
entrada na beatitude, não podemos se não recordar a necessidade urgente de
arrependimento e de conversão nas nossas próprias vidas.
O que nos traz de volta ao
lugar onde estamos, esta Igreja peregrina na Terra. E a verdade é que por aqui
as coisas não andam especialmente bem.
Ao longo dos últimos meses e
até anos a Igreja tem estado a atravessar mais um dos seus períodos de autorreflexão,
que às vezes mais parecem um exercício de umbiguismo do que de examinação de
consciência, em particular em torno do Sínodo sobre Sinodalidade.
Roma parece estar a
preparar-se para declarar que o sínodo foi um enorme sucesso, antes mesmo de
ter começado – isto apesar de algumas sérias preocupações com os níveis de
participação e ingenuidade, para usar um termo simpático, em relação a alguns
dos fundamentos da fé.
Independentemente do sínodo, é
desconcertante ver que muito poucos católicos parecem compreender o que
significa “sinodalidade” ou o que este Sínodo pretende alcançar. E é ainda mais
desconcertante que toda a gente envolvida no sínodo parece estar disposta a
passar ao lado deste facto inconveniente.
Por meio do nosso baptismo,
todos participamos da missão da Igreja. Cada um de nós participa desta missão
de acordo com a nossa particular vocação e circunstância. E a natureza
hierárquica da Igreja e da autoridade eclesial existe para servir, e não para
contradizer, esta missão compartilhada. Não existe um sector do Povo de Deus a
quem este imperativo missionário não diga respeito.
Esta é, de forma resumida, a
visão da Igreja conforme o Vaticano II e o Lumen Gentium, e em todo o lado onde
a Igreja floresce é essa a realidade que vemos em acção. Se é isso que
significa sinodalidade, então não podia ser mais a favor.
Mas se é isso que significa a
sinodalidade, não é certamente assim que o Sínodo tem sido “vendido” e
“promovido”.
É compreensível que todos
aqueles que são responsáveis por conduzir o processo sinodal queiram que este
seja um sucesso. Mas ao enfatizar a radical novidade do Sínodo, numa tentativa
aparente de o tornar “relevante” e “excitante”, estão a prestar-lhe um mau
serviço. Todo esse marketing e os slogans, que se aproximam do triunfalismo,
que estão a sair de Roma parecem quase pensados para exacerbar o problema.
Na conferência de imprensa de
apresentação do Documento da Etapa Continental, um dos conselheiros do
secretário-geral do sínodo disse que “a sinodalidade não é uma forma de ser
Igreja, é a forma de ser Igreja”. Tudo bem, mas então é suposto acreditarmos
que até agora a Igreja não tem sido verdadeiramente a Igreja? Devemos acreditar
que todos os ensinamentos e a sabedoria da Igreja ao longo de mais de dois mil
anos não foram também fruto de cuidadoso discernimento?
Devemos mesmo acreditar que o sensum
fidelium consiste das opiniões de uma proporção minúscula dos católicos que
estão vivos hoje, ignorando dois milénios de testemunhos cujo discernimento e
santa sabedoria são agora tratados muitas vezes com desprezo e rancor
simplesmente porque descobrimos uma coisa nova e brilhante para substituir o
que é “antigo” e “atrasado”?
A sinodalidade ou tem raízes
profundas na vida da Igreja, ou é radicalmente e totalmente nova, mas não pode
ser ambos. Aqueles que enfatizam a segunda para tentar convencer os fiéis de
que o progresso está a ser um enorme sucesso – apesar de poucos perceberem alguma
coisa do sínodo ou se preocuparem sequer com o assunto – parecem ter vistas
curtas. Certamente isso não é um exemplo do tipo de discernimento e reflexão
sóbrios dignos deste sínodo ou da Igreja.
A semana passada juntámo-nos
ao resto da Igreja na celebração dos santos e para rezar pelas almas dos fiéis
defuntos. Enquanto a barca de Pedro atravessa mares revoltos, podemos treinar
ser uma “Igreja de escuta” voltando as nossas atenções para o testemunho
daqueles que, pelas suas vidas, proclamaram a Verdade que salva. Ouvir, e
imitar, aqueles que descobriram o caminho pela graça, através da porta
estreita.
Uma vez que estamos
rodeados por tão grande nuvem de testemunhas, livremo-nos de tudo o que nos
atrapalha e do pecado que nos envolve e corramos com perseverança a corrida que
nos é proposta, tendo os olhos fitos em Jesus, autor e consumador da nossa fé.
Ele, pela alegria que lhe fora proposta, suportou a cruz, desprezando a
vergonha, e assentou-se à direita do trono de Deus. (Hebreus 12, 1-2)
Eis uma palavra em que podemos
confiar. Eis o Povo de Deus, determinado a livrar-se do pecado, com os olhos
fixos em Jesus. Eis a Igreja da qual nós pecadores, aqui na Terra, somos apenas
uma pequena parte. Ouçamos esta nuvem de testemunhas e caminhemos – ou corramos
mesmo – juntamente com eles ao longo do caminho estreito.
Stephen P. White é
investigador em Estudos Católicos no Centro de Ética e de Política Pública em
Washington.
(Publicado em The
Catholic Thing na Quinta-feira, 3 de Novembro de 2022)
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