Carlos Caso-Rosendi |
Nas altas horas do dia 9 de Agosto, 2018, os senadores da
Argentina rejeitaram a legalização do aborto: 38 votos contra, 31 a favor. Dois
senadores abstiveram-se. A proposta de lei incluiu desde o início várias
contradições claras. Por exemplo, o texto votado no senado classificava o
aborto como um “direito” – na verdade, um direito exclusivo e absoluto da
mulher – apesar de a Constituição reconhecer claramente que a vida de todos os
seres humanos está protegida desde o momento de concepção até à morte natural.
O movimento para legalizar o aborto na Argentina tem sido
financiado na maior parte por organizações estrangeiras baseadas nos Estados
Unidos e na Grã-Bretanha, com o apoio adicional de fundos públicos fornecidos
pelas autoridades locais, a vários níveis. Também tem chegado apoio substancial
dos media, detidos em larguíssima medida por corporações estrangeiras. É fácil
perceber que se trata apenas de mais um tijolo no muro anti-vida que os
globalistas estão a erguer um pouco por todo o mundo.
Desde o fim do domínio colonial espanhol, grupos de
argentinos têm passado o tempo a odiar-se furiosamente. As desavenças
sobrevivem durante décadas, dividindo irmãos em guerras amargas que
escandalizariam os Hatfield e os McCoy.
A recente campanha para legalizar o aborto não foi
excepção. Os católicos e outros grupos cristãos opuseram-se, na maioria, à nova
lei. Do outro lado havia alguns grupos pequenos mas barulhentos e, claro, os
media generalistas. Ambos financiados por grandes corporações globalistas na
Europa e na América.
Os adversários do aborto organizaram várias marchas e
eventos, incluindo uma manifestação gigante, em todo o país, organizada por
grupos de acção católica. Pessoas de todos os meios marcharam contra a proposta
de lei na capital, Buenos Aires, e também noutra marcha organizada por cristãos
não-católicos, com o apoio e a participação de simpatizantes católicos
pró-vida. Essas manifestações foram ordeiras e limpas, pacíficas e de grandes
dimensões.
Os defensores do aborto recorreram ao vandalismo,
agressão física e verbal, blasfémia,
nudez e ataques a locais de culto católicos,
especialmente em Buenos Aires. Tudo com o apoio dos principais programas de
rádio e televisão, em que os argumentos da oposição eram descritos pelos
“cognoscenti” como superstições medievais, indignos de uma sociedade do século
XXI.
Na semana que precedeu a votação final no Senado, a
Igreja Católica cumpriu o seu dever de recolher assinaturas, expressar
preocupação e propor soluções razoáveis (embora o silêncio de Roma tenha sido
ensurdecedor). Um padre católico que conheço lamentou que a maioria dos seus
colegas padres e bispos estavam mais preocupados em não criar ondas do que em
defender a verdade e a vida – o que não me espanta nada.
Embora os chamados “pró-escolha” tenham culpado a
“poderosa hierarquia católica” pela sua derrota estrondosa, a verdadeira
oposição do lado católico veio dos leigos que rapidamente se organizaram para
defender a vida em várias frentes e estavam já prontos para desafiar a
constitucionalidade da lei, caso passasse. Os bispos mostraram o seu apoio
depois de o movimento ter chegado a uma certa massa crítica, umas semanas antes
da votação no senado.
O debate no Senado decorreu ao mesmo tempo que
procuradores federais e juízes prenderam uma dúzia de empresários de topo,
ligados a uma vasta rede de lavagem de dinheiro e subornos que, de acordo com
os primeiros cálculos, saqueou as finanças públicas em cerca de 100 mil milhões
de dólares durante a última década. O escândalo tem ramificações internacionais
que serão reveladas nas semanas e meses que vêm.
Um dos efeitos secundários desse esquema gigante tem sido
o crescimento exponencial da percentagem – agora próxima dos 50% – de
argentinos a viver abaixo da linha de pobreza. O aumento da pobreza e a
tentativa de legalizar o aborto representa uma mistura muito peculiar. Porquê?
Porque os mesmos políticos que criaram estas condições miseráveis, roubando aos
pobres, argumentam agora que as mulheres grávidas devem ter o “direito” a
abortar se forem tão pobres que não podem educar a criança.
Chamar cínico a esse argumento é pouco, mas num espaço
familiar como este não tenho outros termos que possa usar.
Para a Argentina, este é o final de um século de
declínio. O que é mais decadente do que um grupo de legisladores reunir-se para
dar a certos cidadãos licença para matar os mais fracos e indefesos? Como é que
o mundo reagiria se fosse uma lei para descriminalizar a escravatura, a matança
de judeus ou a violação de mulheres? Há alguma diferença substancial entre
essas e o aborto?
A República Argentina, em tempos orgulhosa e rica, bateu
no fundo. O clube fechado de aldrabões que passam por líderes empresariais
conseguiu destruir o que restava da economia, com a ajuda de políticos imorais,
um sistema judicial corrupto e uma população que se mantém hipnotizada pelo
canto da sirene do peronismo e as palavras de ordem esgotadas da Esquerda
política dos anos 70.
No meio deste total desastre, fico contente por ver que
os católicos normais tiveram a coragem de sair à rua e mostrar aos seus
corruptos líderes políticos, empresariais e eclesiásticos que não vão permitir
que os globalistas exterminem a nossa população.
A “ordem” social que temos aturado durante tanto tempo
está a chegar ao fim. Afinal de contas, está na natureza da cultura da morte,
eventualmente, morrer. Os poderosos não esperavam que isto acontecesse. Pelo
que isto é também um apelo aos católicos em todo o mundo para ouvirem as palavras
do nosso Papa: hagan lío (“façam barulho”) porque temos uma igreja para
limpar e um mundo cheio de almas por salvar.
Carlos Caso-Rosendi é um autor argentino-americano. Converteu-se
ao catolicismo em 2001. Fundou o site de língua espanhola Primera Luz e tem o seu
próprio blog em inglês, Carlos Caso-Rosendi. Entre os seus livros incluem-se Guadalupe: A River of Light e Ark of Grace – Our Blessed Mother in Holy Scripture. Vive em Buenos Aires.
(Publicado pela primeira vez no sábado, 18 de Agosto de
2018 em TheCatholic Thing)
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