Pe. Placid Czismazia. Pe. Chris Rabay. Pe. Roch Kereszty. Pe. Gilbert Hardy. E, claro, o Pe. David
Balas. Estes são os nomes de alguns
dos Cisterciences húngaros com quem tive a bênção de estudar quando fiz os meus
estudos de pós-graduação na Universidade de Dallas. Todos tinham fugido da
Hungria depois da supressão do mosteiro cisterciense de Zirc (pronuncia-se
Zeerts), nos arredores de Budapeste. Podíamos ouvir as suas histórias mil vezes
e mal teríamos passado a superfície.
Há a história do Pe. Placid,
por exemplo, a passear pelas ruas de Budapeste durante a ocupação nazi,
arriscando execução sumária no caso de ser apanhado, para poder visitar os seus
alunos nas suas casas e acompanhar os seus estudos de Latim e Grego. Disse-me
uma vez que queria dar-lhes a máxima regularidade possível e uma sensação de
esperança, de estarem a preparar-se para um futuro melhor depois da guerra. E
que mais fazer quando o mundo está embrenhado em guerra do que estudar línguas
clássicas?
Depois havia o Pe.
Chris Rabay, com cerca de um metro e meio, mas duro que nem pedra e com a
constituição de uma boca de incêndio, de quem se dizia que tinha carregado um
dos seus irmãos cistercienses às cavalitas através das montanhas, depois de
este ter partido o tornezelo durante a perigosa travessia.
Havia ainda o Pe. Gilbert
Hardy, o paradigma do burocrata da Europa de Leste: os papéis todos em ordem,
os formulários todos assinados, os ficheiros completos. Eu irritava-o imenso.
Quando era reitor chamou-me ao seu gabinete e exigiu saber: “Rahndy, em que
prrugrama estáz?”. “Estou a acabar o mestrado em Teologia e já comecei o
mestrado em Filosofia”. Abanou a cabeça. Esta não era a
ordem correcta. Perguntou de novo,
muito de vagar: “Em que prrugrama estáz?”. Ao que dei exactamente a mesma
resposta. Andámos assim para a frente e para trás onze vezes, ele a perguntar,
eu a responder. Lembro-me de pensar na altura que ele daria um bom vilão do
James Bond. Estava cheio de medo que ele carregasse num botão e me atirasse
para uma piscina de tubarões.
As histórias não têm
fim. Mas todas essas histórias individuais são parte de uma história maior. Um
desses tipos de “história maior” – a história maior de todas – é a história da
salvação: a história da nossa queda e redenção pela morte sacrificial de Cristo
na Cruz, a sua ressurreição dos mortos e ascensão para a direita de Deus, de
onde nos envia o seu Espírito Santo e onde espera para nos receber no seio do
Seu Pai, na comunhão eterna de amor Trinitário.
A maioria dos homens
que referi aceitaram, para usar as palavras de T.S. Elliot, a “constituição do
silêncio". O que é feito agora das suas vidas, das suas lutas, da sua sabedoria,
do seu amor? Enquanto cristãos acreditamos que nada foi obliterado nem se
perdeu com a morte. Pelo contrário, ficou preservado e glorificado na sua
verdadeira Fonte e Fim, naquele que é tanto o Alpha como o Omega.
Mas há outra história,
um pouco mais próxima de nós. As autoridades comunistas mandaram esvaziar e
fechar o mosteiro cisterciense em 1950. Muitos dos monges fugiram do país e
estabeleceram novas abadias em locais inóspitos e selvagens como Spring Bank,
Wisconsin e Dallas, Texas, enquanto outros continuaram a viver clandestinamente
na Hungria, alguns como padres diocesanos, outros como leigos, mantendo os seus
votos e celebrando missas em privado, na medida do possível.
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A abadia de Zirc |
Mas em 1989, depois de
o povo da Hungria ter sido libertado do “paraíso comunista” que os soviéticos
lhe tinham impingido, aconteceu uma coisa incrível: A ordem cisterciense
recebeu o mosteiro de Zirc de volta, bem como quatro escolas. O problema era (e
é), que o mosteiro de Zirc foi construído ao longo de séculos e em tempos
passados tinha servido de abrigo a centenas de monges. Agora vivem lá cerca de
35. É como um miúdo de cinco anos a tentar calçar os sapatos tamanho 44 do pai.
Vai levar uns quantos anos até caberem nos paramentos que lhes foram deixados
pelos seus antecessores.
Mas recordo-me de um
pequeno poema do Robert Frost, no qual ele avisa:
Quando, por vezes, a
multidão for conduzida
A levar longe de mais
o elogio ou a culpa,
[Devemos] escolher
algo como uma estrela
Para fixar a nossa
mente e para nos fixar.
Quando formos tentados
pelo medo de que a Igreja vai ser “varrida pelas forças da história” – aborto,
casamento gay, supressão de instituições e empresas católicas – devemos lembrar-nos
que houve uma época em que as forças do poder e do dinheiro conspiraram com a
elite intelectual da Hungria para suprimir os cisterciences e destruí-los
completamente. Dizia-se que viviam “na idade das trevas” e que estavam
condenados a “serem ultrapassados pela história”, enquanto se pensava (e alguns
católicos concordavam), que os seus opressores representavam o futuro: algo
brilhante, reluzente e novo. “Vamos enterrar-vos”, diziam (esquecendo que a
ressurreição sempre foi o presente especial de Cristo para os fiéis).
E hoje, onde andam
esses reformadores utópicos? Varridos para a lixeira da história, naquele
espaço que reservamos não só para os falecidos, mas para os brutos, os reles e
os cobardes. Não estão apenas mortos, a sua memória é motivo de desprezo.
E os cistercicienses?
Os cistercienses estão de volta a Zirc – bem como em Spring Bank e Dallas. A rezar. A ensinar. Como
fazem há séculos. Provando novamente que, apesar das mais recentes maquinações
do Inimigo:
Tudo estará bem e
Todas as coisas estarão
bem
Pela purificação do
motivo
Na terra da nossa
súplica
Randall Smith é
professor na Universidade de St. Thomas, Houston, onde recentemente foi nomeado
para a Cátedra Scanlon em Teologia.
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